Lucas 23 — Comentário Evangélico

Comentário Evangélico




Lucas 23

23:1-56 Julgamento e crucificação de Jesus

23:1-25 Julgamento diante de Pilatos e silêncio diante de Herodes

No tempo de Jesus, os judeus não tinham autoridade para decretar uma pena capital. Todas as sentenças de morte deviam vir do governador romano e ser executadas pelas autoridades romanas. Esta foi a razão pela qual o conselho de anciãos (também chamado Sinédrio), o qual incluía os principais sacerdotes e escribas (22:66), entregaram um compatriota judeu a Pilatos, que foi governador romano da Judéia de 26 a 36 d.C.

No Sinédrio, a acusação contra Jesus foi de blasfêmia, por ousar chamar a si mesmo de Filho de Deus (22:70-71). Diante de Pilatos, no entanto, essa acusação particular não foi mencionada, pois sabiam que seria descartada como uma disputa meramente religiosa entre os vários grupos judaicos. A acusação foi, portanto, apresentada em termos políticos: Encontramos este homem pervertendo a nossa nação, vedando pagar tributo a César e afirmando ser ele o Cristo, o Rei (23:2).

Lucas nem se incomoda de indicar quão infundadas eram tais acusações. Em vez disso, introduz um clímax em 23:4 quando Pilatos, depois de emitir o que parece ser a concessão mais incriminatória, declara seu veredicto: “Inocente!”. E insiste: Não vejo neste homem crime algum (23:4). Descobrindo, então, que Jesus era galileu e sabendo que Herodes Antipas estava em Jerusalém para a Festa da Páscoa, Pilatos aproveita a oportunidade de livrar-se de um caso complicado e envia Jesus a Herodes para ser julgado (23:6-7).

Herodes era um homem mau (3:19), que havia aprisionado e depois decapitado João Batista (3:19-20; 9:9). Era também aquele que, ao ouvir notícias extraordinárias a respeito de Jesus, havia imaginado quem seria ele (9:7-9). A razão pela qual Herodes desejava “ver” Jesus era presenciar algum milagre (23:8). Mas Jesus não fazia sinais ou milagres por encomenda, pois o propósito deles era chamar as pessoas ao arrependimento, e Herodes, naquele momento, não era um candidato provável ao arrependimento.

Parece que Herodes considerava Jesus uma espécie de curiosidade ou fonte de entretenimento. Mas Jesus não estava disposto a desempenhar esse papel. Ele é aquele que tira o pecado do mundo. Portanto, durante seu julgamento diante de Herodes, Jesus permaneceu completamente silencioso. Herodes não recebeu nenhuma resposta para suas perguntas (23:9). Não havia nada a ser dito a Herodes, e este entendeu a mensagem! Sendo assim, enviou Jesus de volta a Pilatos!

Tendo Jesus de volta sob sua custódia, Pilatos reúne tanto os membros do Sinédrio quanto o povo e dirige o que representa a quarta e final fase do julgamento de Jesus (23:13-25). Ele relembra com firmeza que já declarou Jesus inocente das acusações políticas que lhe haviam sido apresentadas pelo Sinédrio e acrescenta que o mesmo fez Herodes (23:14-15). Conclui, portanto, a sessão, anunciando que mandaria que os soldados o açoitassem e depois o soltaria (23:16). Por três vezes, Pilatos declara que Jesus é inocente e que mandaria açoitá-lo e depois o soltaria (23:4,15-22). Mas sem resultado. A cada vez, os líderes religiosos e o povo respondiam com gritos de Crucifica-o, Crucifica-o (23:21,23). E então Pilatos soltou aquele que estava encarcerado por causa da sedição e do homicídio, a quem eles pediam; e, quanto a Jesus, entregou-o à vontade deles (23:24-25).

23:26-38 Jesus a caminho do Calvário

Ao longo de sua carreira, Jesus havia concentrado seu ministério na zona rural. Agora, no final de sua vida, uma pessoa da zona rural, Simão de Cirene, carrega a cruz após Jesus (23:26). Esta ação ilustra a natureza do discipulado, que envolve tomar a cruz e seguir a Jesus (9:23; 14:27). Também ilustra quem é Jesus: aquele que vai adiante e abre o caminho para que os outros o sigam. Jesus tinha ido adiante de seus discípulos (19:28); agora, eles deveriam segui-lo pelo caminho aberto por ele. Simão de Cirene é um modelo para os discípulos que compartilham dos sofrimentos de Jesus.

Lucas relata a presença de mulheres entre os lamentadores que acompanhavam Jesus (23:27-31). Enquanto os discípulos haviam dormido durante a agonia de Jesus no Getsêmani (22:39-46), as mulheres o seguem, chorando. Elas são as únicas que ainda estão com ele. Os soldados estão absorvidos lançando sortes e dividindo as roupas de Jesus entre si (23:34), o povo apenas observa, e as autoridades zombam: Salvou os outros; a si mesmo se salve (23:35). Abandonado por todos, exceto pelas mulheres, Jesus está sozinho e desolado.

23:39-49 A crucificação

Ironicamente, a inscrição que indicava a acusação contra Jesus, e que foi pregada na cruz acima de sua cabeça, é profundamente verdadeira. Na morte, bem como na vida, ele é o Messias. Ou, à maneira peculiarmente romana, os executores haviam formulado sua identidade: ele é o Rei dos Judeus (23:38).
Apenas Lucas relata a conversa entre Jesus e os criminosos ao seu lado, culminando com a declaração de Jesus ao criminoso arrependido: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso (23:43). Além disso, apenas Lucas registra o grito de Jesus: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito (23:46).
0 criminoso que teme a Deus e sabe que merece morrer (23:40-41) repreende o outro criminoso e suplica a Jesus: Lembra-te de mim quando vieres no teu reino (23:42). Jesus responde: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso (23:43). Até o fim, a missão de Jesus e o seu reino foram estendidos aos rejeitados, aos “publicamos e pecadores” (7:34).

As palavras finais de Jesus morrendo sobre a cruz Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito! também refletem sua fidelidade.

Imediatamente após pronunciar essas palavras, ele expirou (23:46). Jesus encerrou seu ministério terreno com uma oração tranquila, extraída de Salmos 31:5: “Nas tuas mãos, entrego meu espírito; tu me remiste, Senhor, Deus da verdade”. Nesta oração, o crente declara sua absoluta confiança de que Deus o remirá. A versão de Lucas sobre a crucificação insiste em que Jesus confiou e teve fé em Deus até o fim. Após orar essas palavras, ele morreu. Deus nunca o perdeu de vista.

23:50-56 O sepultamento de Jesus

Jesus, embora crucificado como um agitador político, não foi sepultado como criminoso. Como o sábado se aproximava, e preparações necessárias deviam ser observadas para sua comemoração, seu corpo foi removido da cruz para evitar a contaminação desse período sagrado (Dt 21:22-23). José de Arimateia toma a iniciativa de dar a Jesus um enterro honrado. Ele é apresentado como membro do Sinédrio, homem bom e justo (que não tinha concordado com o desígnio e ação dos outros) (23:50-51). Embora os membros do concilio houvessem condenado Jesus à morte (Mc 14:64), José assume a atitude corajosa de reclamar o corpo de Jesus junto a Pilatos.

Como faltava muito pouco tempo para o início do sábado, José não conseguiu preparar adequadamente o corpo de Jesus para o enterro. Seu corpo nu foi simplesmente envolvido num lençol de linho. As testemunhas desse acontecimento foram as mulheres que haviam seguido Jesus desde a Galileia. Após o enterro, elas voltaram para casa e prepararam especiarias e perfumes para o corpo de Jesus.