Herodes e os Romanos

HERODES, ROMANOS, ESTUDO BIBLICOS, TEOLOGICOS
Herodes e os Romanos

Em 163 a.C, então, os judeus perderam sua independência quando Pompeu, mais uma vez, os submeteu ao “jugo dos pagãos”. Desse momento em diante, o espírito do nacionalismo judeu transformou-se em revolta e continuou até a completa destruição de Jerusalém e do Estado judeu em 70 d.C.

Os anos que se seguiram a 63 a.C. realmente foram muito atribulados, e as complicações não podem ser mencionadas aqui a não ser ligeiramente. Antipater, cujo nome é proeminente na história dos judeus nos vinte anos seguintes, a princípio deu forte apoio a Pompeu, mas em 48 a.C; quando Pompeu foi derrubado, ele transferiu seu apoio para o rival, César. Como resultado, César concedeu muitos consideráveis privilégios aos judeus, não apenas na Judéia, mas também na Dispersão. Antipater foi nomeado governador da Judéia, recebendo também a cidadania romana. Mas, apesar de todos os benefícios decorrentes de sua amizade com César, Antipater era amargamente odiado pelos judeus, sem dúvida justamente por causa de sua dependência de Roma e por ser idumeu (isto é, edomita) de nascimento. Esse ódio se intensificou quando, depois da morte de César em 44 a.C, o procônsul Cassius entrou na Síria e, com extrema severidade, impôs pesados tributos ao povo. No ano seguinte, Antipater foi envenenado por seus inimigos.

Quando Antônio subiu ao poder, após a batalha de Filipos em 42 a.C, ele nomeou os dois filhos de Antipater, Fasael e Herodes, tetrarcas sob o governo do etnarca Hircano II, a quem ele confirmou no Sumo Sacerdócio. Mas logo surgiram sérios problemas. Antígono, filho de Aristóbulo, o Hasmoneu, ganhou o apoio de Partiano, que apoiava suas reivindicações ao trono. Fasael e Hircano foram feitos prisioneiros; o primeiro cometeu suicídio e o outro foi levado ao exílio. Porém, Herodes escapou e foi direto para Roma, onde assegurou uma entrevista com Antônio. Ali, para sua própria surpresa, ele foi designado rei da Judéia (40 a.C). Porém, ele ainda tinha que enfrentar Antígono, que havia tomado posse da Judéia. Com ajuda dos romanos, ele derrotou seu rival em 37 a.C, após um cerco de três meses a Jerusalém. Antígono foi condenado à morte e assim começou o reinado de Herodes, o Grande.

Sob o governo de Herodes (37-4 a.C.) e de seus filhos, a política de helenização propagou-se rapidamente. Ele queria, tanto quanto possível, ser “tudo para todos os homens” - para os judeus, um judeu, para os pagãos, um pagão. Seu casamento com Mariane, a neta de Hircano, era uma indicação de seu desejo de agradar aos judeus como foi, por exemplo, a construção do novo Templo de Jerusalém, iniciada no ano 20 a.C. Porém, mesmo assim, não foi possível conciliar o povo com sua origem iduméia e com seus planos de helenizar o reino. Num aspecto importante, ele perdeu a simpatia de muitos de seus súditos judeus: na dinastia hasmoneana, o Sumo Sacerdote e o rei eram a mesma pessoa; Herodes, sendo idumeu, não poderia ser o Sumo Sacerdote, e assim ele adotou a política de, tanto quanto possível, degradar esse ofício. Com isso em vista, ele quebrou o princípio hereditário no qual o sumo sacerdócio estava baseado e aboliu o direito vitalício desse ofício. Depois disso, o Sumo Sacerdote passou a ser designado por ele e mantinha o ofício enquanto agradasse ao rei.

A política de helenização que Herodes empreendeu era devida, pelo menos em parte, à própria natureza de seu reino, que abrangia muitas cidades gregas e incluía inúmeros gregos entre os cidadãos. Ele tem sido chamado, às vezes, de “patrono do helenismo” e esse título pode ser plenamente justificado em muitos sentidos. Por exemplo, ele fez pouco uso do Sinédrio judeu e em seu lugar estabeleceu um conselho real nos moldes helenísticos; substituiu a antiga aristocracia hereditária por uma nova aristocracia de serviço e elevou essa nova classe de acordo com as práticas helenísticas. Sua política de administração, de natureza burocrática fortemente centralizada, seguia também as linhas do helenismo. O historiador Josefo nos diz que “ele indicou jogos solenes a serem celebrados a cada cinco anos em honra a César, e construiu um teatro em Jerusalém, como também um imenso anfiteatro na planície” (Ant., 15.8.1, seção 267-69). Era um partidário liberal dos Jogos Olímpicos e “foi declarado nas inscrições do povo de Elis para ser um dos atdministradores permanentes destes jogos” (Ant, 16.5.3, seção 149). Suas extensas operações de construção provam a alegação de que ele encorajava o culto ao Imperador, porque todos os muitos templos que construiu por toda a Palestina eram dedicados a César. Os fariseus, particularmente, ficaram horrorizados quando souberam que Herodes realmente havia permitido que os pagãos erigissem estátuas a ele, em seu reino. Lemos sobre certos homens, sucessores legítimos dos antigos Macabeus, que entraram em santa aliança para impedi-lo, até mesmo sob risco de morte, de perpetrar sua política de helenização.

Mesmo quando eram capturados e torturados e condenados à morte, havia outros prontos a tomar seus lugares. Em seguida à morte de Herodes em 4 a.C, irromperam tumultos na Galileia, que desse tempo em diante ficou conhecida como berço do nacionalismo judaico. Josefo nos diz que um certo Judas, o Galileu, associado a Zadoque, fariseu, rebelou-se contra Roma e fundou uma nova seita em 6 d.C. Esse é presumivelmente o partido que mais tarde veio a ser conhecido como Zelotes (em grego) ou Cananeus (em aramaico) ou Sicaris (em latim) e que passou a ser um espinho na carne dos romanos por muitos anos. Com matança, a rebelião na Galileia foi sufocada por Arquelau, filho de Herodes (4 a.C. — 6 d.C.) que o sucedeu como governador da Judeia, apenas para ser banido anos mais tarde pelos romanos como resultado de uma apelação contra ele por judeus e samaritanos. A exceção de um curto período de três anos, nos quais o neto de Herodes, Agripa I (41-44 d.C), governou como rei da Judéia, o país foi dirigido por uma sucessão de procuradores romanos (6 d.C. -66). Durante todo esse período, o nacionalismo judeu foi crescendo em intensidade e encontrou uma expressão particularmente perigosa nas atividades dos Zelotes, que consideravam o governo estrangeiro dos romanos como uma situação intolerável. Essas atividades eram motivadas não apenas por propósitos políticos, mas também por profundas convicções religiosas, porque aparentemente os Zelotes consideravam a si mesmos como a verdadeira linha sucessória dos antigos Macabeus.

É interessante notar que pelo menos um dos discípulos de Jesus pertenceu, ou havia pertencido, a esse partido. Ele é chamado Simão, o Zelote (Lucas 6.15, Atos 1.13) ou Simão, o Cananeu (Mateus 10.4, Marcos 3.18). Tem sido discutido que outros também podem ter pertencido, como Judas Iscariotes (do latim sicarius, “assassino”?), Simão Barjonas (do acadiano barjona “terrorista”?) e Tiago e João, os “filhos do trovão” (Marcos 3.17). Em pelo menos uma ocasião, pensa-se que Paulo era um Zelote (Atos 21.38) e o próprio Jesus foi associado aos líderes do movimento Zelote pelo mestre Gamaliel (Atos 5.36,37). Jesus não era um Zelote, mas, sem dúvida, alguns de seus contemporâneos judeus e dos romanos o consideravam como tal.

Os Zelotes eram essencialmente homens zelosos para com Deus — agentes de Sua ira contra os caminhos idólatras dos pagãos. Eles criam que eram chamados por Deus para se engajarem em uma Guerra Santa contra o “poder das trevas”. Nesse particular, compartilharam as crenças de muitos outros judeus patrióticos, incluindo os Pactuantes de Qumran. De fato, a esse respeito, à exceção dos colaboracionistas saduceus, não há, às vezes, uma linha clara de demarcação entre uma seita e outra.

Mesmo Josefo, que cuida em isolar os Zelotes e imputar a eles a vergonha da Guerra dos Judeus, em pelo menos uma ocasião, associa os Zelotes aos Essênios, e, como temos visto, associa-os aos fariseus em sua origem. Seu patriotismo era, sem dúvida, mais obviamente expresso do que o dos outros, e seu zelo por Deus os tornou bem preparados para empunhar a espada como um instrumento de salvação apontado por Deus, mas como o Dr W. R. Farmer diz: “Quando as coisas ficaram claras, toda a nação foi chamada a uma luta de vida ou morte entre o povo de Deus e seus inimigos. Todos os judeus patriotas, quer fariseus, essênios ou zelotes, seriam chamados a dar todo o seu empenho na Guerra Santa.” O mesmo escritor observa que os Zelotes eram, sem dúvida, considerados por muitos de seus compatriotas como “extremamente zelosos” e “um tanto rápidos no gatilho”, em comparação com os outros partidos do país. O que é certo é que eles contribuíram muito para começar a guerra com Roma que assolou de 66 a 70 d.C. e terminou com a destruição de Jerusalém e de todo o Estado judeu. Apenas mais uma vez, em 132 d.C, houve uma tentativa de lutar pela independência do Judaísmo em uma revolta liderada por Ben Kosebah, comumente chamado de Bar Kochba, ajudado pelo influente Rabino Akiba. Três anos mais tarde, a rebelião foi esmagada e Jerusalém foi remodelada como cidade pagã.

A batalha entre o judaísmo e o helenismo havia terminado e por todas as aparências a batalha fora perdida. Mas, assim como o helenismo não se pôde resistir apenas pela força, assim também o judaísmo não pôde ser extinto pelo poder das armas. O Estado judeu caiu, mas o judaísmo prevaleceu, porque quando a conquista foi negada e o acordo proibido, ao contrário do cristianismo, que se expandiu para o mundo helenístico para “pensar melhor, viver melhor e morrer melhor” os pagãos, o judaísmo escolheu para si o caminho da separação. Esse passo significativo foi dado por Jonatas ben Zakkai que, enquanto a batalha assolava a vida de Jerusalém, pouco antes de sua queda, partiu para a cidade de Jamina no litoral da Palestina e fundou uma escola que iria marcar o início de uma nova era para o povo judeu. Eles já não tinham Jerusalém; eles já não tinham o Templo; mas lá em Jamina eles tinham o estudo da sagrada Lei de Deus, e isso para eles era mais do que a própria vida. Por ela seus pais haviam lutado e morrido; por ela seus filhos iriam viver.


Fonte: Between the Testaments: From Malachi to Matthew, de Richard Neitzel Holzapfel.


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