Interpretação de Romanos 2
Romanos 2
Romanos 2 continua a exploração teológica iniciada no capítulo anterior, aprofundando-se nos temas da justiça, do julgamento e da responsabilidade humana diante de Deus. Aqui está uma interpretação dos pontos-chave em Romanos 2:
1. O Julgamento Imparcial de Deus: Em Romanos 2:1-4, Paulo se dirige àqueles que julgam os outros enquanto se envolvem nos mesmos comportamentos pecaminosos. Ele sublinha o princípio de que o julgamento de Deus é imparcial, condenando não apenas as ações dos outros, mas também os próprios pecados. Esta passagem destaca a importância da humildade e do auto-exame antes de pronunciar julgamento sobre os outros.
2. Acumulando a Ira de Deus: Paulo enfatiza que aqueles que continuam no pecado impenitente estão “acumulando ira” para si mesmos no dia do julgamento de Deus (Romanos 2:5). Este conceito reforça a gravidade do pecado e suas consequências, bem como a necessidade de arrependimento e de voltar-se para Deus.
3. O Justo Julgamento de Deus: Romanos 2:6-11 ensina que o julgamento de Deus é baseado em ações. Ele retribuirá a cada um segundo as suas obras, sejam judeus ou gentios. Esta passagem sublinha o princípio da justiça no julgamento de Deus e destaca que Deus não é parcial; Ele recompensa a justiça e pune a maldade.
4. O Papel da Lei: Paulo discute o papel da lei, particularmente para a comunidade judaica. Ele reconhece que ter a lei é uma vantagem, mas enfatiza que não basta apenas possuir a lei. A verdadeira justiça vem da obediência à lei, não apenas de ouvi-la ou tê-la (Romanos 2:12-16).
5. Circuncisão do Coração: Paulo introduz o conceito de circuncisão do coração (Romanos 2:25-29). Ele argumenta que a verdadeira circuncisão não é externa e física, mas interna e espiritual. Envolve uma transformação do coração e é uma questão de espírito, não de letra. Esta ideia prenuncia as discussões posteriores de Paulo sobre o papel da fé e do coração na justiça.
6. Responsabilidade dos Judeus e dos Gentios: Paulo enfatiza que tanto os Judeus como os Gentios são responsáveis perante Deus pelas suas ações. Ser judeu ou ter a lei não isenta ninguém do julgamento de Deus. São aqueles que obedecem à lei e têm um coração circuncidado que são verdadeiramente o povo de Deus (Romanos 2:28-29).
Em Romanos 2, Paulo continua a construir o seu argumento sobre a universalidade do pecado e a imparcialidade do julgamento de Deus. Ele desafia qualquer senso de superioridade moral ou justiça própria e enfatiza a importância da justiça autêntica através da obediência à lei de Deus e de um coração transformado. Este capítulo prepara o cenário para as discussões posteriores de Paulo sobre a justificação pela fé e o papel de Jesus Cristo em garantir a justiça para todos os que crêem.
Interpretação
2:1-16 O homem que Paulo considera julgando não foi dito se é judeu ou gentio. Ao que parece, Paulo tinha o judeu em mente, uma vez que o homem que julga, experimentou a bondade e a paciência de Deus de maneira especial. A recompensa do Senhor para cada pessoa será de acordo com as obras dela – não de acordo com os seus próprios privilégios. Deus julgará com justiça, quer um homem viva sob a lei Mosaica ou longe dela.2:1-4. A palavra julgas (krinon) ocorre três vezes no versículo 1 (E.R.C.). Tem aqui o significado de fazer juízo desfavorável, criticando ou censurando. O homem que é indesculpável é aquele que tem grande capacidade de crítica, mas não autodisciplina. O juízo de Deus é... contra os que praticam tais cousas. Tais cousas. As ações do crítico são idênticas às ações daqueles que ele critica. O catálogo de pecados em Romanos 1 é positivamente inclusivo. Inveja, murmuração e contenda são consideradas faltas nos outros, mas o crítico desculpa essas coisas nele mesmo, como se fosse “um justo senso de necessidade”, “uma simples declaração de fato”, ou ''uma corajosa posição ao lado da verdade”.
Paulo apela para a consciência do homem: Pensas que te livrarás do juízo de Deus? (isto é, à sentença pronunciada por Ele?) A tradução desprezas (v. 4) pode ser uma tradução forte demais para kataphroneo, em relação ao contexto. Parece que seria melhor traduzir assim: Ou será que alimentas ideias erradas a respeito da (Arndt, pág. 421) bondade, paciência e longanimidade de Deus? A palavra arrependimento envolve muito mais do que o abandono de uma prática antiga. Envolve o começo de uma nova vida religiosa e moral (veja Arndt, págs. 513, 514). Uma vez que a bondade de Deus não traz castigo imediato, não se deve crer que o Senhor seja indiferente ao pecado. Longe disso! Por causa de sua bondade divina, Ele quer levar os homens por um novo caminho de vida. Ter ideias erradas a respeito disso é descansar numa falsa complacência. O juízo de Deus é certo.
2:5-11. O Todo-Poderoso examina a conduta do homem e o julga de acordo com ela. Um homem cujo coração é duro e impenitente, armazena a ira de Deus contra ele. A ira... de Deus armazenada nos céus é o mais trágico estoque que um homem poderia acumular para si. Observe a nota sobre o juízo individual no versículo 6. Qual é a disposição ou perspectiva daqueles que buscam a glória, a honra e a imortalidade?
Perseverando em fazer o bem (v. 7), caracteriza a perspectiva daqueles que buscam os alvos enumerados. O resultado é que recebem vida eterna do Juiz. Aqueles que por causa da contenda são desobedientes à verdade e obedecem à injustiça, recebem a ira e o juízo. As obras são sempre o ponto central do quadro neotestamentário do juízo. São indicação externa de uma confiança ou entrega interior da pessoa. O Senhor, é claro, olha para ambos, o interior e o exterior. Mas a atividade exterior revela a convicção interior. É preciso apenas que se compare a forma do verbo em 2:9 – que faz o mal (constantemente) – com a do verbo em 2:10 – que pratica o bem (constantemente) para se ver que as atitudes revelam as convicções (ou a falta delas). Isto não significa que aqueles que fazem o bem constantemente têm um pleno conhecimento de Deus. Mas sem uma confiança em Deus, a qual exige algum conhecimento, os homens não serão capazes de executar constantemente e com determinação aquilo que Deus diz que é bom.
2:12-16. Uma vez que em Deus não existe parcialidade, como Ele vai lidar com aqueles que pecara sem a lei e aqueles que pecam debaixo da lei? A resposta se encontra nas frases – perecerão e serão julgados (v. 12). Tanto os que vivem debaixo da lei como aqueles que vivem sem a lei foram declarados pecadores. O tempo aoristo aqui (pecaram) acentua uma ação completa. Resume todos os pecados da pessoa cometidos durante a sua vida. Por causa do total desses pecados, os homens que não tiveram a oportunidade de viver debaixo da lei mosaica, perecerão. Do mesmo modo, por causa do total dos seus pecados, aqueles que viveram debaixo da lei serão julgados. Embora uma linguagem diferente fosse usada para descrever o juízo de Deus, este juízo é certo e justamente dispensado, quer a lei mosaica exerça alguma parte no juízo, quer não. Até onde o juízo está envolvido, o que conta é a situação, não a tomada de consciência deste ou daquele estado. Os que praticam a lei hão de ser justificados, isto é, serão absolvidos, serão declarados justos.
A esta altura surge uma pergunta profunda: Os praticantes da Lei se limitam àqueles que conhecem e praticam a lei mosaica? Em 2:14 Paulo responde “não” à pergunta e explica a razão. Os gentios que não têm a lei mosaica, procedem por natureza de conformidade com a lei. A expressão natureza (physei) tem sido interpretada com o significado de “seguindo a ordem natural das coisas” (veja Hans Lietzmann, Der Brief und die Romer, também Handbuch zuni Neuen Testament. Digressão sobre Rm. 2:14-16). Mas o contexto aqui não tem a mesma ênfase de 1:20. Por isso parece muito melhor aceitar que natureza significa “instintivamente”. O que está envolvido neste tipo de resposta? Quando os gentios praticara instintivamente os requisitos da Lei, eles os fazem de conformidade com a lei (2:14). Eles exibem a norma da lei gravada nos seus corações. Esses gentios têm uma norma e padrão interior colocada por Deus em seus corações. Esse padrão interior é a base tanto para a reação de suas consciências quanto do seu raciocínio. A consciência (v. 15) é uma reação intelectual automática a um determinado padrão. Contrastando, raciocínio envolve reflexão. Os pensamentos resultantes de tal reflexão, representam um julgamento ponderado, em contraste à reação intelectual e automática da consciência. As consciências de muitas pessoas associadas produzem um testemunho mútuo. Do mesmo modo os julgamentos de valores combinados do grupo são difundidos. As decisões resultantes, às vezes reprovam as pessoas do grupo, e às vezes falam em sua defesa. Embora Paulo não descreva todo o conteúdo desse padrão interior, ele assegura que existe. Sabemos que tanto a consciência quanto a razão podem decidir que certa atitude é ruim e outra atitude é boa. Os gentios, quando corretamente reagem diante desse padrão, não ficara completamente sem lei. São praticantes obedientes da lei que Deus coloca em seus corações. Seda melhor ligar o 2:16 ao 2:13: “Os praticantes da lei serão justificados... no dia em que Deus julgar os segredos dos homens”.
Esta passagem dá alguma luz sobre o destino eterno daqueles que nunca ouviram o Evangelho. Como Deus lidará com essas pessoas no dia do juízo? Estes versículos parecem indicar que Ele observará suas ações tal como observará as ações daqueles que conhecem a Lei, e aqueles que ouviram o Evangelho, e que Ele julgará todos de acordo com tais observações. Então, a obediência a este padrão interno não anula o princípio da salvação pela fé? Não. A fé é essencial para aqueles que obedecem ao padrão interno e para aqueles que obedecem à Lei ou ao Evangelho. Mas quão mais rico e mais completo se torna o nosso conhecimento de Deus, a medida que for revelado através do seu Filho!
A busca da glória, honra e incorruptibilidade (v. 7) não passariam de egoísmo. Mas a busca dessas coisas com a determinação de fazer o que é bom (v. 7) significa que aquele que busca está cônscio de um padrão de bondade. Se este padrão fosse uma simples abstração, como seria difícil perseverar na bondade.
Mas se o padrão é o próprio Deus – ainda que imperfeitamente percebido (e quem de nós percebe Deus perfeitamente?), a fé ou a submissão a Ele estabelecerá as bases para a perseverança constante naquilo que é bom. Por que, então deveríamos levar impacientemente o Evangelho àqueles que nunca ouviram? Antes de tudo, porque Deus no-lo ordenou (Mt. 28:19, 20; Atos 1:8). Segundo, é essencial, pois Deus quer que cada pessoa seja confrontada com o conhecimento de Deus (Is. 11:9; Hc. 2:14; Is. 45:5, 6; 52:10; 66:18, 19; II Ts. 1:8) e tenha oportunidade de se lhe entregar e de ampliar o conhecimento dEle (Jo. 14:7; 17:3; II Co. 2:14; Tt. 1:16; I Jo. 2:3-6; 5:19, 20; Fp. 3:8-10; II Pe. 3:18). Finalmente, é essencial por causa do que Cristo é – o clímax da revelação de Deus (Hb. 1:1 , 2).
Uma vez que Cristo é a suprema revelação de Deus, e uma vez que o N.T. é o registro que confronta os homens com Cristo, outros métodos de revelação divina devem ser considerados apenas fragmentários. Isto é especialmente verdade no que se refere aos dois métodos discutidos em Romanos 1; 2: (1) o testemunho das coisas que foram criadas (1:20); 2) o padrão interno colocado nos corações (2:14, 15). Todavia, eles são canais divinamente escolhidos, cuja existência e função Paulo convida seus leitores a considerar seriamente.
2:17-29 Aqui Paulo descreve vividamente as oportunidades dos judeus, e destaca como até mesmo essas não levaram os judeus a uma vida de obediência e comunhão com Deus.
2:17-20 O fracasso do judeu tornou-se mais conspícuo por causa dos seus privilégios e sua fé. Ele repousava na lei. Ele se gloriava (orgulhava-se) em Deus. Ele conhecia a vontade de Deus. Aprovas as coisas excelentes (ou aquelas que são essenciais). Ele podia fazer a vontade de Deus porque fora oralmente instruído na Lei. Ouvira os rabinos discutindo os pontos cruciais. Por causa de tais antecedentes, o judeu tinha confiança. Ele podia ajudar e instruir os demais, porque ele tinha certeza de que tinha a forma da ciência e da verdade na Lei (v. 20).
2:21-24 Paulo insiste na derrota dos judeus, perguntando-lhes se suas atitudes estão de acordo com os seus ensinamentos (2:21, 22). Tu, pois, que ensinas a outrem não te ensinas a ti mesmo? (v. 21) Por que, é claro, que o faz. Nas outras três perguntas: Furtas? Adulteras? Roubas os templos? Paulo não diz que tipo de resposta espera. Mas ele destaca que o judeu, transgredindo a Lei da qual tanto se orgulha, desonra a Deus – Aquele que deu a Lei. O nome de Deus é blasfemado entre os gentios por causa da maneira de agir dos judeus. A última frase – como está escrito – não se refere a alguma passagem do V.T. em particular que fala dos pecados dos judeus como causa da blasfêmia contra o nome de Deus. Antes, Paulo parece ter juntado Is. 52:5 e Ez. 36:21-23.
2:25-29 Aqui o apóstolo aponta para o que ele considera um verdadeiro judeu. Ele mostra que o gentio que guarda (a palavra ohylasso também pode ser traduzida para observa, ou segue) os preceitos da lei (v. 26) é um verdadeiro judeu. O rito da circuncisão só declara que um homem é judeu se este praticar a Lei. Para um judeu, tornar-se transgressor da Lei é, realmente, diante de Deus, tornar-se incircunciso. Além de um gentio ser um verdadeiro judeu, se observar os preceitos da Lei, ele, que é fisicamente incircunciso, se assentará para julgar o judeu que tem as qualificações físicas, mas nenhuma obediência (v. 27). Esta é uma declaração de Paulo, não uma pergunta. No versículo 27 Paulo destaca que o judeu que será julgado pelo gentio, é aquele judeu que é transgressor da Lei, não obstante a letra e a circuncisão (cons. dia, Arndt, III, 1, c, pág. 179). Eis aí a tragédia daquele que tem uma lei escrita objetiva, e o sinal exterior da aliança de Deus com o seu povo, mas que no entanto nunca se apropriou da realidade. Numa última palavra ao judeu, Paulo destaca que não é o exterior, mas a condição interior do coração que toma um homem verdadeiramente judeu, isto é, filho de Deus (v. 29). A verdadeira circuncisão é uma espécie de circuncisão do coração (cons. Lv. 26:41; Dt. 10:16; 30: 6; Jr. 4:4; 9:26; Atos 7:51). Esta verdadeira circuncisão não está na esfera da legalidade - um código escuto - mas antes na esfera do espírito, isto é, na área da vontade.
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