Estudo sobre de Apocalipse 1:4-9
Estudo de Apocalipse 1:4-9
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O Apocalipse tem uma dupla introdução. À abertura semelhante à de um livro, com uma conotação típica do at, segue-se agora uma introdução própria de uma carta, à maneira do nt.111 Também o encerramento do livro (a partir de Ap 22.6) inegavelmente evidencia outra vez o elemento de uma carta no v. 21.
João, às sete igrejas que se encontram na (província da) Ásia. A província da Ásia foi abordada exaustivamente nas qi 8-15. Cabe gravar as sete igrejas nominalmente citadas em Ap 1.11 definitivamente como primeiras destinatárias do Apocalipse, e o livro foi proclamado de pleno direito precisamente nas reuniões destas igrejas locais. Ao mesmo tempo, porém, há diversas razões a favor do argumento de que no presente texto o número sete não é apenas portador de um valor numérico, mas também simbólico.112 Naquele tempo, sete podia significar simplesmente plenitude,113 singularmente a plenitude sagrada, a saber a perfeição intencionada e ordenada por Deus. Disso resulta que João enfocou, além dos primeiros destinatários, um grupo maior de receptores, a saber, todas as igrejas na província, que se viam envolvidas nos mesmos conflitos (uma circunstância que, por decorrência, valia para a totalidade do cristianismo na região do Mediterrâneo!). A tentação, que naquele tempo cercava as comunidades cristãos na forma do culto ao imperador, da apostasia do Senhor de todos os senhores (Ap 1.5) e da prostração diante de senhores menores, assedia a igreja de Jesus Cristo em todas as épocas e em todos os continentes. Logo, as sete igrejas nominalmente citadas são representantes de todos nós. O chamado: “Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas”, bem como a bem-aventurança: “Bem-aventurados aqueles que lêem (publicamente) e aqueles que ouvem as palavras da profecia e guardam as coisas nela escritas” visam ser ouvidas até hoje (cf. também qi 13 e 15).
Graça e paz a vós outros. Esta saudação de abertura aparece em muitos escritos do nt.114 Neste aspecto, João está sintonizado com os demais apóstolos. Contudo, a continuação possui características próprias: … da parte daquele (cujo nome é) que é, que era e que há de vir.115 A expressão remonta à autodesignação de Deus em Êx 3.14. Lá consta três vezes “Eu sou quem sou” (blh), o que o judaísmo posterior gostava de relacionar com os três tempos: Deus era, é e será. Entretanto, cumpre observarmos duas modificações:
Em primeiro lugar, no fundo o presente texto não está falando e pensando em três, mas sim em dois tempos (como também em Ap 1.8; 1.17,18; 21.6 e 22.13; diferente é em Ap 4.8; cf. Hb 13.8). Isso sucede semelhantemente a Isaías 41.4; 44.6; 48.12: a afirmação do presente tem a preferência! Deus proclama com majestade: “Eu sou!” Diante dele os ídolos, diante dos quais Israel se curvava, são “ninguéns” (cf. Jr 18.15; Jn 2.9; Sl 31.7). Não possuem existência própria. Os profetas ironizavam em todos os detalhes que os ídolos somente existem enquanto houver trouxas que acreditam neles116 (cf. Is 44.[6-8] 9-20; especialmente o v. 19). Portanto, o “Eu sou” de Deus tem um conteúdo grave e é extremamente agressivo. Na primeira vez ele é contraposto de modo vitorioso e arrasador ao Faraó no Egito, depois no livro de Isaías contra os grandes reis da Babilônia, agora contra Roma e as pretensões de seus imperadores-deuses. Em cada uma destas ocasiões Deus intervém na situação do seu povo intimidado com esta auto-apresentação onipotente: Eu estou presente de forma inabalável! – Em seguida, este testemunho é explicado pelo esquema de dois tempos. “Eu sou” alcança o tempo atrás e diante de si, ele abarca a história do universo como seu iniciador e consumador, como o “Todo-Poderoso”, conforme é formulado também em Ap 1.8; 4.8; 11.17. Tudo o que há entre começo e fim está sob o Seu poder, porque Ele tem todo o poder. É capaz de enfrentar todos os tempos e todas as circunstâncias. Nenhuma época o encontra constrangido, inseguro, sem saída ou fraco. Em conseqüência, o voto de graça e paz não é proferido em nome de um Deus filosófico atemporal e distante do mundo, mas sim no nome do Senhor poderoso sobre a história.
Igualmente se faz frente à especulação judaica tardia e grega acerca de Deus, não dizendo que Ele será, mas que Ele virá, sim, que Ele está vindo. Isso corresponde à proclamação do at e dos profetas a respeito de Deus. Ele não repousa como uma estátua em seu lugar, permanecendo inerte diante de nossas observações. Não, movido pela aflição do mundo e pela santidade de seu nome, Ele abandona o seu lugar e entra no nosso lugar. Por conseqüência, os homens da Bíblia não vasculhavam os horizontes em busca de um Deus “lá longe”. Numa apaixonada expectativa imediata, eles anunciaram aquele que está vindo. Sob este nome foi proclamado também Jesus de Nazaré (p. ex., Mc 1.7), e na pessoa dele as pessoas repetidamente se deparavam com o Deus vivo, que está vindo até nós. Em muitos cristãos a vinda de Deus até nós foi reprimida por outra idéia, a saber, de que nós um dia chegaremos até Deus.
Entretanto, graça e paz provêm igualmente dos sete espíritos. Em Ap 4.5, estes sete espíritos são equiparados a sete tochas, em Ap 5.6 aos sete olhos do Cordeiro. Em Ap 3.1 afirma-se: Jesus “tem os sete Espíritos de Deus”. Acaso trata-se de entes angelicais, talvez dos sete anjos do trono, de Ap 8.2? Há muitos argumentos contra a interpretação de serem anjos. No presente livro os anjos jamais são designados de “espíritos”. Tampouco são os causadores de graça e paz. Como “conservos” (Ap 22.9) eles apenas poderiam intermediar. Além disso, os sete Espíritos não são mencionados, nos cap. 4 e 5, entre os adoradores, embora todos os anjos e entes criados sem exceção se ajoelhem. Finalmente, o fato de que aqui se trata de uma solene saudação de abertura leva a esperar que no que se segue ouviremos de Deus, do Espírito Santo e de Jesus Cristo (nesta ordem também em 1Pe 1.2, cf. 2Ts 2.13,14). Que fariam anjos entre o Pai e o Filho?
Por isso os “sete Espíritos” do presente texto provavelmente não devem ser interpretados como um grupo de anjos, mas como a plenitude (cf. nota 113) do único Espírito (Ef 4.4), que foi dado às sete igrejas locais, i. é, à igreja toda. Nenhuma igreja local está sem a sua voz e forças, nem mesmo Laodicéia.117
A respeito do Espírito de Deus que atua em figuras múltiplas consta que ele se acha diante do seu trono. Esta afirmação expressa a posição de serviço.118 Conforme Ap 4.5 ele presta serviço ao trono, iluminando e glorificando o que está sentado no trono. De acordo com Ap 5.6 ele é um enviado a todas as igrejas e conforme Ap 3.1 ele é aquele por meio do qual Jesus age. É assim que também Jo 14–16 ensina acerca do “Consolador”: Ele é enviado (Jo 15.26; 14.26; 16.7), está a serviço de Jesus nas igrejas (Jo 16.13,14) e glorifica Jesus como Deus (Jo 16.14). Uma vez que a saudação às sete igrejas é emitida em nome deste Espírito, “graça e paz” não vêm a ser pálidas banalidades. “Graça e paz” do Espírito Santo significa que as igrejas, na situação aflitiva em que se encontram, podem corresponder à sua vocação. A plenitude dos efeitos do Espírito Santo é derramada sobre a multidão de problemas da igreja e de seus membros.
A saudação de abertura, portanto, está sob o número três: Deus, Espírito Santo, Cristo. Contudo, a pessoa de Cristo, por sua vez, é iluminada de três maneiras119 e mais uma vez glorificada de três formas com vistas à sua obra na igreja. Quem esperar afirmações fundamentais para a obra toda diante desta eloqüência súbita não estará no caminho errado.
E da parte de Jesus Cristo, a Fiel Testemunha. Ao criar aqui e em Ap 3.14 o predicado de Cristo “testemunha”, João não está pensando somente em que o Senhor defendeu a verdade de Deus pela palavra (assim é o entendimento em 1Tm 6.13 e Jo 18.37). O conceito de testemunha é aprofundado. Ele contém o empenho com a palavra e com a vida. A testemunha (em grego, mártys) é, no nosso livro, a testemunha de sangue. Foi com esta acepção que mais tarde o termo grego penetrou no linguajar geral, a saber, como “mártir”.120 Também aqui evoca-se a morte de Jesus.
Característica da testemunha é a fidelidade. À testemunha fiel contrapõem-se as falsas testemunhas. Isto é esboçado pelos capítulos sobre a Paixão nos evangelhos. As testemunhas falsas, contratadas, na história da Paixão falavam em nome do Israel renegado. Israel devia dar testemunho a favor de Deus (Is 43.9-13; 44.6-11), ou seja, também a favor do Deus de Cristo. Esta era a vocação deste povo. Contudo testemunhou contra Deus e seu Ungido junto com os gentios. Cristo, em contraposição, foi o único que permaneceu obediente e fiel “até à morte e morte de cruz” (Fp 2.8). Assim ele representou o verdadeiro Israel, ainda que fosse executado como suposto blasfemo contra Deus. Os verdadeiros blasfemos, no entanto, são evidenciados como sendo os que zombaram de Cristo. Enquanto blasfemos de Cristo, os judeus se colocaram do lado dos gentios, deixando de ser, por isso, judeus segundo a eleição (cf. Ap 2.9; 3.9).
Através do primeiro predicado Jesus foi definido, portanto, em sua relação com Deus. Contudo, assim como em Fp 2.6-11 sua soberania sobre todas as coisas para Deus decorre da sua morte , assim também acontece agora. O predicado seguinte atesta sua soberania sobre a igreja, e o terceiro, seu domínio sobre o mundo:
E o Primogênito dos mortos. Esta designação não é nenhuma criação própria de João. Também em Rm 8.29; Cl 1.15,18; Hb 1.6 ele é chamado de “primogênito” (de modo análogo em 1Co 15.20). Ser o primeiro nascido significava direito de domínio (Gn 49.3; Sl 89.27), e especificamente sobre os irmãos que nasceram depois. Em decorrência, esta designação posiciona o Exaltado em relação com a igreja (cf. Rm 8.29: “entre muitos irmãos”). Em que está alicerçada a primogenitura de Jesus Cristo? O acréscimo “dos mortos” aponta para a Páscoa. As angústias da morte foram as dores de parto (At 2.24). A nova vida de Cristo não tem mais a morte à sua frente, mas sim atrás de si. É o começo de uma nova criação sem morte. Enquanto toda a outra vida deve tributo à morte, sabemos que, “havendo Cristo ressuscitado dentre os mortos, já não morre; a morte já não tem domínio sobre ele… quanto a viver, vive para Deus” (Rm 6.9,10). A maneira como isso vale para a igreja será tratado em Ap 2.8-11.
Entretanto, a nova vida não constitui uma “vida inerte” que permanece em si própria ou entre os “irmãos”, como Rm 8.29. Conforme Cl 1.15 Cristo é também o “primogênito de toda a criação”. O primeiro cristianismo não permitiu que este horizonte mais amplo lhe fosse obstruído. Também João transcende o círculo mais estreito: e o Soberano dos reis da terra! Com esta afirmação de João, que no mais gosta de designar Satanás como o “príncipe deste mundo” (Jo 12.31; 14.30; 16.11), o Ressuscitado entra numa profunda rivalidade com os dominadores deste mundo. Em última análise, porém, ele não luta “contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes” (cf. Ef 6.12). Estes poderes, no entanto, dispõem de ferramentas imanentes e humanas. Não apenas Cristo está preparando para si um corpo, um órgão da sua vontade na terra. As ferramentas que o adversário de Cristo escolheu para si e pelas quais ele foi reconhecido como seu rei maior, são os “reis sobre a terra”. Em consonância com o Sl 2.2 eles repetidamente aparecem como inimigos de Deus e de Cristo, p. ex., em Is 24.21; Ap 6.15; 17.2,18; 18.3,9; 19.19; 21.24. Sua hostilidade incendiou-se (Sl 2.1) quando o Messias foi instalado como o Rei maior (Sl 2.6). Deste modo eles se tornaram cativos do “príncipe deste mundo” e passaram a ser vassalos do grande antagonista de Jesus Cristo. Agora estão sob o encanto da “mulher” (Ap 17.18) e no séquito da “besta” (Ap 19.19).
Diante deste pano de fundo, a designação de Cristo como “Soberano dos reis da terra” contém um programa fascinante. É o programa da Ascensão e o programa do presente livro: o Crucificado, que foi ressuscitado dentre os mortos, governa “até que haja posto todos os inimigos debaixo dos pés” (1Co 15.25; cf. Sl 110.1). Um por um, e um após o outro, ele supera os poderes, derruba-os de seus tronos e força-os a caírem de joelhos. “O último inimigo a ser destruído é a morte” (1Co 15.26). Enquanto se encaminha nesta direção, ele saúda a sua igreja com graça e paz.
Dissiparam-se os sons da saudação de abertura da parte do Deus Todo-Poderoso, do Espírito que age inesgotavelmente, e de Jesus Cristo, a quem a Sexta-Feira da Paixão, a Páscoa e a Ascensão iluminam de três maneiras. Contudo, João não pode finalizar deste modo a abertura de cunho epistolar. Um Deus assim e uma saudação destas não podem ficar sem eco. Assim, João se torna o porta-voz da igreja que responde, e se eleva numa doxologia (glorificação solene). Neste louvor ele se atém estreitamente à tríplice definição de Jesus Cristo. Complementa-a desdobrando sua tríplice obra especificamente na igreja.
Àquele que nos ama. No presente texto, amor121 não é o amor de Deus pelo mundo todo, como, p ex., em Jo 3.16, mas amor preferencial, ou seja, é um sinônimo de eleição.122 Entretanto, este amor que elege em última análise aponta para todos: os eleitos foram escolhidos dentre todos em favor de todos (cf. v. 6). A quem se dirigiu essa eleição? “A nós, a nós, a nós!” ouve-se três vezes neste texto. Quem pode compreendê-lo? Será que os cristãos realmente aparecem neste mundo como os amados de Deus? Não deveriam ser mais perfeitos, mais adornados, mais admirados? Na realidade, naquele tempo combatia-se a idéia de que fossem amados de Deus (cf. o exposto sobre Ap 3.9). Quem, afinal, consegue entender que “Deus escolhe o que não é nada” (1Co 1.26-29)? Sem deixar de levar a sério essas questões – agora chegou o momento em que o leitor precisa aderir à adoração.
O evangelho de João interpreta o amor de Jesus a seus discípulos a partir da Sexta-Feira da Paixão. Em Jo 13.1, o incipiente relato da Paixão é colocado sob o título: “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim”. De modo similar Paulo vê a correlação entre o amor de Jesus e sacrifício (Gl 2.20; Ef 5.2,25). Aqui, porém, expressa-se a durabilidade deste amor. O amor com o qual ele nos amou, está presente.
Ele nos ama. Sem sofrer mudança, ele está diante da comunidade como aquele que a ama. Ele também ama até mesmo Laodicéia (Ap 3.19). Ele ama aos que disciplina. Sim, ele nos ama! Todos nós temos o direito de fazer coro à oração da doxologia.
A obra de Jesus em nós é explicada mais:
E, pelo seu sangue, nos libertou dos nossos pecados. Desde a noite pascal no Egito, remissão123 e sangue formam um conjunto. Lá também pode-se localizar o modelo originário124 daquilo que na Bíblia significa “remissão”: comprar de volta125 os prisioneiros da terra estranha, à qual não pertencem, que sempre os escravizará e explorará. Isso era o Egito para o povo de Israel. No entanto, o verdadeiro proprietário, o Deus de Abraão, lsaque e Jacó, finalmente faz valer os seus direitos sobre este povo e, na noite pascal, o redime com mão poderosa para a aliança com ele e para que lhe sirva.
Em lugar de “do Egito” afirma-se aqui: “dos nossos pecados”. Com isso fica esboçado o âmbito do poder escravizador. O conceito do pecado será ilustrado nos cap. 2 e 3. Na província da Ásia que florescia em termos econômicos e culturais, nem sempre se identificava o pecado como o escravocrata. A sentença do evangelho deve ter repercutido nos ouvidos de forma rebelde, como uma voz de um mundo diferente: “todo o que comete pecado é escravo do pecado!” (Jo 8.34). Somente quem se tornou livre do pecado por intermédio do Senhor Jesus Cristo reconhece realmente o que ele é.
Como, porém, escravos do pecado poderão pessoalmente fazer algo por sua libertação? Pois em cada impulso e em cada movimento eles são novamente prisioneiros do pecado, agem como pecadores e, em conseqüência, movem-se mais profundamente para dentro do pecado, assim como no passado Israel, quanto mais começava a pensar em sua liberdade, caía de modo cada vez mais desesperador debaixo do jugo egípcio. Ou o que escravos teriam para dar em troca de sua liberdade? Deus é o único que pode libertar, e até isso somente à suas custas. Foi o que sucedeu na noite pascal! Não era noite escura apenas exteriormente. Do ponto de vista do ser humano, há uma escuridão da redenção assim como também existe uma escuridão da criação. Em ambos os casos – criação e redenção já são paralelizados no at – aquilo que mais atinge o ser humano é o menos claro para ele. Por isso ele também é o menos capacitado para afirmar algo sobre aquilo que mais o atinge, a não ser que lhe seja dito.
Dificilmente se poderá falar da redenção de maneira mais pertinente do que na linguagem sacrificial: “Ele nos remiu por seu sangue”. Para o povo de Israel no Egito, a abertura para a liberdade e para o serviço a Deus consistiu numa abertura sangrenta, ensangüentada por um sangue que não era seu (Êx 12.22). Essa é a experiência originária inesquecível deste povo. A experiência originária do povo da nova aliança é a escuridão da redenção na Sexta-Feira da Paixão.126 Novamente vigas ensangüentadas e a confissão: “Pelo sangue de Jesus temos liberdade” (Hb 10.19 [tradução do autor]), “para servir ao Deus vivo” (Hb 9.14).
A recorrente identificação do “sangue de Cristo” com a morte de Cristo não condiz com o nt. Em primeiro lugar, o discurso de que ele derrama o seu sangue retira de sua morte a conotação passiva. Mas ele não somente morreu como o Cordeiro, mas também atuou como sacerdote nesta morte. Em segundo lugar, o “sangue de Cristo” abarca, além da morte que ficou para trás, também sua contínua e presente intervenção em favor dos pecadores. Ele permanece como o grande personagem sacrificial e o Sumo Sacerdote sobre o mundo atual, uma verdade que jamais será anunciada de modo intenso demais neste mundo.127
Amados, libertados! Contudo, isso ainda não é tudo. Cumpre chegar à harmonia tríadica da obra de Jesus: e nos constituiu reino, sacerdotes para o seu Deus e Pai. Somente neste ponto é que o amor chega ao alvo, somente aqui a redenção alcança seu sentido. A igreja não foi amada e libertada para nada. A obra da redenção abrange mais que isso: culpa nossa – clemência dele! Ela continua: aptos para o serviço! O amor recebido e aclamado não pode ser privatizado. Está em jogo o serviço a Deus. A expressão precisa mais uma vez ser contraposta ao Egito, à dominação do pecado, ao qual se prestava serviço de escravo no passado. Agora o povo resgatado está livre para o seu novo e, apesar disso, legítimo proprietário, para Deus. Servir-lhe não é trabalho escravo, pois, afinal, ele é “seu Pai”, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo,128 cujo sangue é enaltecido. Não pode ser diferente: esta redenção cria um povo sacerdotal.
Nessas considerações João está nova e profundamente enraizado no at. No Sinai, na hora em que propriamente se tornou um povo, Israel ouviu as palavras (Êx 19.6): “vós me sereis reino de sacerdotes”. Ao que parece não há uma ênfase especial em “reino”. No contexto, este termo não é outra coisa senão um substitutivo para “povo”, “Estado” ou “nação”. Este Estado deveria assumir o papel de um Estado sacerdotal na série dos demais países. É nisso que reside a ênfase. A diferença em relação aos outros povos não reside na relação de propriedade em si. No fundo todos os povos são povos de Deus. Anteriormente é dito com clareza: “Toda a terra é minha”. Com a eleição de Israel Deus não abre mão das demais nações. O Criador não abandona a sua criação. Essa instalação como povo de Deus singular acontece não em detrimento, mas precisamente em benefício das nações do mundo. Israel deve buscar e encontrar sua razão de ser no âmbito da família dos povos no serviço sacerdotal, não na dominação, conquista, posse e liderança, como outras nações. Portanto, desta formulação não se deve depreender uma vocação dupla, de maneira que ao lado do serviço sacerdotal seria imperioso anunciar um segundo aspecto, o reinado de Israel ou da igreja. Pelo contrário, a formulação em Êx 19.6, repetida literalmente aqui, visa ser sintetizada: reino sacerdotal, sendo que a ênfase recai sobre “sacerdotes” enquanto algo novo e singular. A comparação com passagens como Is 61.6 tão somente o confirma.129
De acordo com este versículo, quem é o povo de sacerdotes da terra? São as sete igrejas na Ásia e todas as comunidades com as quais João se une ao dizer: a nós, a nós, a nós! Com isso atingimos o processo fundamental do nt: Israel foi representado unicamente ainda por Jesus. Um título de Israel após o outro deposita-se sobre essa única fronte: Ele é o Filho amado, ele é o Servo obediente, a Testemunha fiel, o Profeta etc. Contudo, dentro deste verdadeiro Israel na figura do Cristo crucificado e ressuscitado nascem pessoas, a saber, judeus e gentios. Em seu corpo eles se tornam um só corpo (Ef 2.16), um só templo, um só povo de sacerdotes. Fora deste Jesus não existe povo de Deus, mas “nele” cada um faz parte dele. Nele agora também comunidades gentílico-cristãs recebem títulos de Israel. Não que os gentios convertidos assumissem o lugar de Israel (cf. notas 90 e 320), mas “em Cristo” eles agora pertencem ao verdadeiro Israel. – Também o evangelho de João traz consistentemente o motivo dos que crêem em Cristo como sendo o verdadeiro Israel.
Em que consiste a tarefa do sacerdote? Por um lado ele se encontra diante de Deus como quem ora. Repetidamente a igreja é retratada no Apocalipse como igreja que ora e louva. Em Ap 1.20 sua natureza é explicitada pela figura do candeeiro do Templo. Este utensílio não pode ilustrar o serviço missionário para fora (como a imagem das estrelas), visto que não era visível fora do templo. Não, o candeeiro queimava diante de Deus. “O Pai procura adoradores que o adoram em espírito e em verdade” (Jo 4.23,24). Ele busca resposta à sua glória. A igreja é a parte da humanidade que já agora responde a Deus. Suas orações pertencem às coisas mais relevantes do nosso tempo. Por meio delas a igreja se posiciona responsavelmente na história, como Ap 8.3-5 há de mostrar. E o Senhor promete as “obras maiores” (Jo 14.12-14) em resposta às orações dos discípulos. Quando a igreja esquece essa sua posição em relação a Deus, ela se torna irrelevante e supérflua. Na próxima oportunidade ela é deixada de lado, e nenhuma mão se moverá em sua defesa (Ap 2.4,5).
Também queremos indicar já agora o outro lado do serviço130 sacerdotal: a igreja é porta-voz de Deus perante as pessoas. Ela está colocada ao lado das pessoas como testemunha e profetiza. Também essa linha perpassa o Apocalipse: não negar, mas apegar-se ao nome de Jesus, vencer pela palavra do testemunho! Grande é sua tentação de silenciar, de deturpar a verdade e até de amaldiçoar em vez de falar sacerdotalmente como porta-voz de Deus, até mesmo no caso extremo (Ap 2.10b). Assim como a igreja tem de permanecer diante de Deus com sua oração, assim ela também tem de permanecer diante das pessoas com o seu testemunho, se quiser continuar sendo igreja. Ela somente será invencível se não se subtrair a ambas as tarefas.
Foi, portanto, para isso que o “rei dos reis” constituiu a igreja: a saber, para ser sacerdotisa. Ele também poderia ter investido seu poder em algo diferente. Não o fez e não o faz, às vezes para o desgosto do seu povo. Extraordinariamente importante e digna de reflexão geral é neste contexto a atitude de Jesus perante Pilatos conforme Jo 18,19. O açoitado não usa o menor gesto ou movimento para exercer pressão e subir no trono do poderoso, saindo de seu papel. Ele está sendo impelido para a cruz, para ser exaltado naquele local e para ser rei desde a cruz, como testemunha da verdade (Jo 18.37). Que papel poderão desempenhar, então, aqueles que são da verdade e ouvem a sua voz?
Da tríplice experiência espiritual: amados, libertados e chamados, eleva-se agora a verdadeira doxologia: a ele (cabe) a glória e o domínio. O leitor da Bíblia recorda-se do papel importante que as doxologias desempenham no último livro da Bíblia. Repetidamente Deus e o Cordeiro são enaltecidos, lá no céu e no futuro. Tanto mais deve-se considerar que já na terra e no próprio presente se louva a Deus. Essa doxologia ainda se eleva com a voz frágil de uma pequena minoria, a igreja. Contudo a igreja sabe que um dia seu canto será o louvor do mundo inteiro. Ela canta como precursora o cântico do futuro. A criação toda se unirá em coro, e finalmente será tributada toda a honra a Jesus (Ap 5.13,14).
Naquele tempo era possível conceder glória131 e domínio132 a Jesus somente se fossem tirados do imperador, pois ambas as expressões ocorrem comprovadamente em cânticos de louvor a César (qi 5). Diante deste pano de fundo, a adoração de Cristo representava ao mesmo tempo uma rejeição ao imperador e, por isso, um desafio e um risco. Isso valia tanto para João, que anotou essas palavras na ilha de Patmos, quanto também para os leitores públicos nas cidades e das comunidades que diziam Amém a elas. Talvez o mundo em redor não compreendesse este processo de imediato, mas o interpretasse como assunto meramente interno das comunidades. Porém, ouvidos estranhos podiam tornar-se altamente sensíveis por meio de qualquer circunstância. De repente depreendiam desta adoração e destas confissões de fé a profunda descrença diante das grandezas que recebiam veneração em todo o redor. Assim, uma veneração chocava-se contra a outra (qi 1-2). Quem adora a Cristo precisa contar com conseqüências de longo alcance. Contudo, quem não o adora também sofrerá conseqüências. Nunca orar ou não orar é somente um assunto de foro íntimo. Quem ora logo também será porta-voz de Deus perante os humanos e terá de prestar contas sobre isso.
Honra e poder competem a Jesus pelos séculos dos séculos. Amém! Essa expressão quer dizer literalmente: até as épocas de todas as épocas, até toda a eternidade.133 Da eternidade de Deus começaram a falar os profetas, quando as guerras de extermínio no século vi a.C. se precipitaram sobre Israel. Com essa expressão eles se referiam à fidelidade inalterável de Deus para com sua obra, que prevalece como um quebra-mar em todas as tempestades que Deus faz cair sobre a maré dos tempos. Quando tudo vacila e desaba, permanecem a graça e a paz da parte dele, e a glória e o poder para ele. A igreja pode lançar âncoras neste fundo de fidelidade de Deus. É sobre essa base que ela afirma Amém.
Esse “Amém” é repetido e até intensificado no final do versículo seguinte: sim, Amém! (veja o comentário correspondente). Numa inegável emoção repercute agora o tema do livro inteiro. Torna-se, evidente, porém, que ele se volta para o futuro e se vira dos amados para os inimigos:
7 Eis que vem com as nuvens. Ainda que essas palavras de Dn 7.13 tivessem uma grande importância no pensamento do primeiro cristianismo, o versículo não é simplesmente transcrito. O profeta de Patmos, cheio do Espírito, seria o último a atuar apenas como mero copista (cf. qi 23). Não há como observar com cuidado suficiente a incorporação de material do at em correlações próprias. No presente ponto (mas não no v. 13) João deixa de citar o “Filho do homem” de Dn 7.13. No livro de Daniel o Filho do Homem é um personagem totalmente sem traços de juiz, que sequer chega a ver os seus inimigos, mas tão somente comparece para a recepção solene. Como veremos, de forma alguma é este o sentido no presente versículo. Trata-se agora justamente da condenação dos inimigos na vinda de Cristo (cf. Ap 14.14-20). Igualmente foi deixada fora, em comparação com Daniel, a observação de que “nas nuvens” representa as nuvens “do céu”. João é impelido menos pelo interesse pelas origens que pela característica do poder inerente à vinda. As nuvens servem como insígnia do poder.134 Ele vem com as nuvens, i. é, “com grande poder e glória”, como é desdobrado em Mt 24.30. A vinda com as nuvens se contrapõe à sua vinda de outrora nas fraldas, cujo significado simbólico foi igualmente destacado (Lc 2.12). Não é correta a canção natalina alemã que afirma que o menino Jesus vem “de novo a cada ano”. Todas as fórmulas natalinas de um menino Jesus humildezinho e gracioso são tagareladas diante de um presépio vazio. Nosso livro arde acerca de uma proclamação totalmente diversa de Cristo. Ele está em vias de chegar. Sim, porém com as nuvens! Afinal, Cristo não vem a Deus como o Filho do Homem em Daniel, à sala do trono celestial, mas para o mundo humano. Tudo isso é proclamado com certeza máxima, como se já estivesse em andamento: Vejam! Vejam!
De imediato João funde este acorde inicial de Daniel com elementos de Zc 12.10-14:135 e todo olho o verá. Este “ver” não é o de Ap 22.3,4: “Os seus servos contemplarão a sua face, e na sua fronte está o nome dele”, ou de Mt 5.8: “Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus”. Não é olhar e contemplar até fartar-se, mas olhar apavoradamente, sendo obrigado a presenciar aquilo diante do qual a pessoa gostaria de esconder-se (cf. Ap 11.11,12; 6.15-17; Lc 23.30). Refere-se a todos os olhos: os sonolentos, os zombeteiros, os atrevidos e os polidos. Eles o verão, sem serem desviados nem interrompidos, a ele, somente a ele.
Um provérbio define: “Quem não quer ouvir, sofre as conseqüências”. João diz: quem não quer ouvir, tem de ver (com pavor). Inúmeras vezes ele convida para ouvir. Ouvir é característica do tempo da graça. Deus fala. Significa graça quando a cada vez há um “pregador” no culto. Diante disso, ver (para os que não estão dispostos a ouvir) significa a interrupção da pregação e da graça. Então não há mais necessidade de pregação alguma. Afinal, todos os olhos estão vendo. Isso significa: fim do debate, chega de alegações e desculpas. Num mesmo momento todos caem de joelhos diante da verdade e glória daquele que veio.
Nosso Senhor, portanto, dispõe de um instrumento de poder simples, porém eficaz, para comprovar a culpa dos seres humanos. Basta que se mostre a eles. Ele usou este meio no começo de nossa era, a saber, na Páscoa, quando a questão era conquistar um grupo de testemunhas. Os discípulos estavam completamente desfalecidos na fé. Descartaram como lendas os primeiros rumores da ressurreição. Foi aí que o Senhor da glória se mostrou a um círculo restrito. Desta forma, “ver” desempenhou um papel decisivo nas histórias da Páscoa. É possível comprovar que naquela situação ninguém que não tivesse visto veio a crer. No fim do tempo da graça Deus utilizará o mesmo meio, ainda que sob outras premissas. Nosso tempo situa-se entre ver os primórdios e ver o final. “Ele foi visto!” e “Todos o verão!” – estes constituem os dois testemunhos entre os quais nós somos convocados à fé.
Até quantos o traspassaram hão de vê-lo. Inequivocamente João relaciona este trespassamento com o golpe de lança (Jo 19.37). Obviamente o dado histórico é que foi somente um único, um soldado romano, que desferiu o golpe de lança. Na presente exposição, no entanto, todas as ações hostis a Cristo concentram-se neste um corte de lança. O mundo inteiro está com a mão na lança. Saulo de Tarso não foi o último que, na sua ingenuidade, caiu ao chão como que atingido por um raio, ouvindo a acusação de Jesus: “Saulo, Saulo, por que me persegues?”.
E todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele. Em Ap 18.9-19 encontra-se o texto deste “lamento” de forma mais pormenorizada. “E clamaram, prantearam e lamentaram, dizendo: Ai! Ai!” Entre eles encontram-se novamente os “reis da terra” (v. 5). Contudo, junto com eles clamam as nações que os seguiram. De forma alguma este é o tipo de arrependimento com o qual se alegram os anjos no céu. Sem podermos abordar todos os detalhes do juízo divino, com seus altos e baixos, nesta passagem, cabe-nos deixar claro que João não está descrevendo nenhum clima de conversão, nem derramamento da graça nem renovação espiritual. A locução “todas as tribos”, que agora ainda é reforçada pelo acréscimo de “todos os olhos”, faz lembrar as expressões “todos os joelhos” e “toda língua” em Fp 2. Com essa lembrança formamos também a perspectiva correta para o presente versículo: desde o v. 5 unicamente Jesus Cristo e seu caminho estão no centro do campo de visão, como em Fp 2.6-11. Este Senhor da Sexta-Feira da Paixão, da Páscoa e da Ascensão aproxima-se com poder irresistível. Todo o mundo o reverencia, quer com júbilo ou com ranger de dentes, quer com o v. 6 ou com o v. 7, quer hoje, quer amanhã. Contudo, não se pode alterar mais nada na superioridade e invencibilidade do nome de Jesus “pelos séculos dos séculos”. É para isso que a igreja diz “Certamente. Amém!”136
Essa confirmação solene e a simultânea declaração de fidelidade à palavra de Deus anterior por parte da igreja ouvinte já eram praticadas no culto da sinagoga judaica. É importante que o ser humano não engula a palavra de Deus sem nenhum eco, mas que seja iniciado um diálogo, uma comunhão eloqüente entre Deus e a pessoa. A teologia bíblica da palavra não significa que Deus possui um impulso unilateral de falar, que produz palavras ininterruptamente e que incessantemente quer fazer-se ouvir apenas a si mesmo, diante do que o ouvinte pudesse facilmente fazer o papel de peixe morto. Não, ela abrange claramente também a resposta e o Amém do ouvinte. Quando Deus fala ele é, ao mesmo tempo, todo ouvidos, auscultando o interior da comunidade de ouvintes, para saber se alguém lhe responde. Quando se faz ouvir, então, o Amém como voto de confiança e declaração de fidelidade, ele não se cobre de silêncio, mas volta a falar num novo nível. O diálogo agora está em andamento, levando de um Amém ao outro, de graça a graça, de clareza a clareza.
O cristianismo primitivo deu nova compreensão e conteúdo cristão ao Amém da sinagoga. De acordo com ele, a palavra de Deus não somente acontece em Cristo, mas através dele essa palavra obtém também uma resposta por parte das pessoas. Cristo é, ao mesmo tempo, tanto a plenitude das promessas quanto o Amém a todas as promessas de Deus (2Co 1.20a; Ap 3.14). Desta maneira estabelece-se o diálogo e, pela mediação deste Jesus, cada vez mais pessoas podem entrar na comunhão com o Pai e com o Filho (1Jo 1.3). “Por intermédio dele também nós pronunciamos o Amém, para o louvor de Deus” (2Co 1.20b [tradução do autor]). Nosso Amém vive, portanto, do Amém dele. A fidelidade dele (Ap 1.5) nos torna fiéis. A pessoa que ora promete essa fidelidade por meio de seu sim e Amém. Ela quer confiar no que ouviu, apostando tudo nisso. A palavra ouvida não deve permanecer em sua pequena vida apenas como mero sonido, mas tornar-se uma realidade amada, louvada, vivida e que se expande para todo o mundo.
Finalmente o prefácio do Apocalipse culmina num versículo, cujo locutor é o próprio Deus (ocasião idêntica apenas em Ap 21.5-8): Eu sou o Alfa e Ômega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-Poderoso.137 Ambas as metades do versículo correm de forma paralela, começando sempre com a chegada poderosa da presença de Deus e desenvolvendo-a no esquema dos dois tempos,138 com o qual já nos ocupamos no v. 4. Em Ap 22.13 ouve-se uma palavra muito semelhante da boca de Jesus. Essa concomitância de Jesus Cristo com Deus o Senhor até nos mais elevados nomes e honras não surpreende João. Cristo representa a Deus de forma cabal. Deus constituiu Cristo como plenipotenciário em todos os aspectos (Jo 3.35). João, portanto, complementa a frase paulina “Deus estava em Cristo” (2Co 5.19): Ele está e estará em Cristo. Quando ouvimos isso e o guardamos num coração singelo e bom, é possível começar a explicação do livro.
Índice: Apocalipse 1:1-3 Apocalipse 1:4-9 Apocalipse 1:10-11 Apocalipse 1:12-16 Apocalipse 1:17-18 Apocalipse 1:19-20
111 Em adesão ao costume (oriental) daquele tempo quanto à redação de cartas, a introdução contém o nome do remetente, do destinatário e a saudação inicial ou o voto de paz (cf. E. Lohse, op. cit., pág. 13).
As seguintes razões depõem a favor:
a. O número sete aparece com grande freqüência no livro, e isso nos mais diversos contextos: sete igrejas, espíritos, anjos, tochas, trovões, trombetas, chifres, olhos, taças, selos, montanhas, reis, pragas, cabeças de dragão (ao todo 54 vezes). É evidente que se trata de um recurso estilístico da exposição, cf. também os três e meio, o 42 e o 1.260. Naquela época, o número sete era freqüentemente usado para estruturar material religioso. O evangelho segundo Mateus ainda permite reconhecer este costume. No Apocalipse o sete é enfatizado de modo incomum (ocorre no restante do nt apenas outras 33 vezes; apenas nos evangelhos sinóticos, em At e Hb). É como se devesse expressar: este livro é santo. Sua mensagem é perfeita. Ai de quem altera, acrescenta ou suprime algo nele (Ap 22.18,19).
b. Igualmente cabe observar que na província da Ásia havia mais de sete igrejas (Mileto, Colossos, Hierápolis, Trôade), que com certeza não estavam excluídas pela citação das sete, mas sim incluídas, ainda mais que a situação delas dificilmente terá sido diferente diante do conflito intelectual daquele tempo.
c. Finalmente, o simbolismo dos números constituía um modelo de pensamento de todo o mundo antigo. O exegeta comete um equívoco quando não entende os números em textos antigos a partir da época em que foram escritos. Naquele tempo, era mais comum do que hoje expressar sabedorias gerais e interpretar correlações por meio de um número. Isso ocorre acima de tudo com o número sete. São incontáveis as provas deste uso entre gregos, egípcios, babilônios e sobretudo no apocalipsismo judaico (Introdução, a partir da qi 24).
113 Em alguns idiomas semíticos antigos, “sete” é ao mesmo tempo o termo usado para “plenitude”. Verificando-se, porém, as passagens no nt, nota-se que ali nem sempre se tem em mente a plenitude santa. Ainda cabe comprovar a acepção de “número do reino”, segundo a qual as sete igrejas seriam comunidades judaico-cristãs.
114 A combinação peculiar da saudação grega com a saudação judaica foi explicada em WStB, Philipper e Kolosser, pág. 39.
115 A tradução imita a expressão gramaticalmente incomum: a designação de Deus não sofre declinação. Deste modo, manter santa a designação de Deus é algo que se preserva até na gramática. Em Ap 4.8 antepõe-se, por isso, à expressão um tríplice “santo!”. – Algo análogo ocorre também no at com o nome de Deus “Iahweh” (cf. Is 6.3 [bj]).
117 Não deve causar espécie que se esteja falando aqui do único Espírito no plural. Plural com significado de singular ocorre no at, p. ex., a palavra “Deus” e, em Pv 9.1, a “sabedoria”. Acerca de “espíritos” que procedem de Deus lemos também em 1Jo 4.1 e Ap 22.6 (cf. também Is 11.2, onde o Espírito de Deus se manifesta numa diversidade de efeitos do Espírito). Quanto a Laodicéia, cf. Ap 3.22!
118 No presente texto e em cerca de trinta outras passagens do livro destaca-se o sentido original e concreto da preposição grega “perante”, utilizada aqui: “na face de”. Constitui graça e eleição ser admitido junto a alguém entronizado, poder comparecer sob os seus olhares e encontrar-se agora “na face” deste soberano, e assim, ser um servo. “Perante o trono” é, portanto, além da definição de lugar, uma indicação acerca da condição. Isso deverá ser considerado especialmente nos comentários a Ap 7.9,15. – No Apocalipse, o trono de Deus possui uma importância extraordinária, cf. o comentário aos cap. 4 e 5.
120 A novidade da interpretação de mártys como testemunha de sangue ou mártir torna-se clara se traduzirmos, naturalmente não no sentido correspondente, At 1.8: “Sereis meus mártires.” Em At este significado ainda estava afastado. Porém em todas as cinco passagens do Apocalipse que falam de “testemunhas” seria possível inserir de forma acertada “mártires”: Ap 1.5; 2.13; 3.14; 11.3; 17.6; cf. Ap 6.9; 22.20. Este dado, porém, não é necessariamente o mesmo em relação às palavras “testemunho” ou “testemunhar”!
São bem conhecidas as versões mais populares, como a tradução de Lutero e a de Elberfeld: “Que nos lavou pelo seu sangue”. A diferença entre “lavar” e “remir” resulta no texto grego a partir de uma letra: remir = lýo; lavar = loýo. Com bons argumentos todas as traduções mais recentes decidem-se pela versão “remir”:
a. Está comprovada em manuscritos melhores.
b. A palavra que aparece para “lavar” não ocorre em outros textos do Apocalipse. O “lavar” em Ap 7.14; 22.14 tem como base um outro vocábulo grego, que somente pode referir-se ao lavar de objetos (plýno), não de pessoas (loýo).
c. O sangue é usado na Bíblia para aspergir, pincelar e derramar, nunca, porém, para banhar o corpo. (Única exceção é 1Rs 22.38.) O meio para lavar-se era a água, como é dito expressamente em Ef 5.26; Hb 10.22; etc. Em Gn 49.11 acontece uma ablução com vinho.
d. A passagem do Sl 130.8, que provavelmente está sendo referida aqui, também traz “remir”.
125 Da “compra” fala o texto paralelo em Ap 5.9, uma formulação que introduz padrões jurídicos no discurso do evento da salvação que têm maior nitidez para os nossos ouvidos que “redenção”. Porém todo o nt fala assim. Sobretudo Paulo utiliza com grande ênfase, ao lado de expressões da esfera puramente pessoal, conceitos jurídicos para a obra de Cristo. O pensamento moderno tem dificuldades com essa idéia. A salvação como graça, paz, amor, fidelidade ou perdão parece ser possível de compreender, porém salvação como justificação, expiação, alforria ou resgate causa espécie. Nossos pensamentos e sentimentos de modo geral foram estreitados em termos personalistas. Enfocamos o pecado unilateralmente como um acontecimento entre pessoas, entre a pessoa e Deus ou entre a pessoa e seu próximo. Contudo, pecado contra Deus é ao mesmo tempo pecado contra o Criador e a sua criação no que se refere a toda sua concatenação de coisas, ordens e situações. Em decorrência, o pecado gera não somente fatos no âmbito pessoal, como ressentimento, inimizade, ira, mas também no âmbito institucional e no mundo material, a saber, destruição, confusão, distorção, atrito e decadência. O pecador constata que está prensado por circunstâncias nefastas, condicionamentos objetivos e ônus que ajudam a determinar de modo fatal o seu destino futuro. Agora o homem não apenas se mata trabalhando sob um Deus irado, mas também sobre um chão maldito. É a essa situação abrangente que corresponde a salvação em Cristo. Por um lado ela atinge o ser humano de maneira bem pessoal, reconciliando-o com Deus e regenerando-o. Por outro lado, porém, ela intervém com plenos poderes naquelas correlações objetivas, soltando-as. Sob este enfoque, deveríamos refletir de modo novo sobre as expressões jurídicas acima citadas. Muitas premências atuais podem ser causadas pelo fato de que a salvação em Cristo é pregada de maneira tão desconexa, restrita a uma relação mística entre as pessoas, a uma existência fora da história.
127 Temos a convicção de que este “por nós, pelos nossos pecados” de Is 53, que perpassa como um fio vermelho todo o nt (Mc 10.45; 14.25 e par., Rm 4.25; 8.32; 1Co 15.3; 2Co 5.21; Gl 1.4; 2.20; 3.14; Ef 5.2,25; 1Tm 2.6; Tt 2.14; 1Pe 2.24; 3.18; 1Jo 2.2; Hb 9.28; etc.), é insubstituível para a igreja cristã e de que, por isso, também em última análise não se pode abrir mão da linguagem sacrificial. Isso não exclui que neste ponto tenhamos de explicar algo a pessoas modernas. Quando a partir da base do at se fala do sacrifício, menciona-se também de imediato o sangue, pois o sacrifício não culminava na morte, e sim na utilização propiciatória do sangue. Era através disso que o sacrifício passava a vigorar. O sacrifício passava a ser eloqüente no sangue: o sangue “falou” (Hb 12.24), formulou a intercessão que Deus atendeu por causa de sua liberdade e fidelidade, respondendo-lhe com a renovação da aliança. Era por isso que o sacerdote estava de prontidão, na execução do animal sacrificial, ao ser cortada a artéria jugular, para captar numa bacia o sangue que jorrava. Ele necessitava dele em estado fresco, a fim de poder aspergi-lo e derramá-lo. – Que significam, agora, as declarações sobre a aspersão e o derramamento do sangue, da purificação ou ablução (cf. nota 123!) pelo sangue de Cristo? O nt não deixa dúvidas de que a fala do sangue de Cristo não faz parte da descrição de sua morte, mas sim da interpretação dela. De acordo com relatos de testemunhas oculares, o Senhor não se esvaiu em sangue. Seu sangue não foi captado, aspergido ou derramado. Ele sofreu uma modalidade de suplício relativamente não sangrenta. Quando Jesus foi açoitado, correu mais sangue que na cruz! De qualquer modo, ele não morreu como uma forma exterior de ato sacrificial, nem no recinto do templo, nem junto do altar. Ele morreu do lado de fora do acampamento (Hb 13.13), num local cultualmente impuro por ocasião de uma execução coletiva. Não obstante, a respeito deste evento sobre o lugar do Calvário a igreja testemunha que ele é o sacrifício mais sagrado, mais agradável a Deus, eterno e sem par. Ele constitui o acontecimento vicário que nos salva, a grande ação de interveniência em favor de muitos” (cf. Mc 14.24), i. é., em favor do mundo inteiro. – Deste modo, pois, relacionam-se no nt o relato e a interpretação produzida pelo Espírito Santo de acordo com a Escritura (1Co 15.3). Isso é diretriz. Não podemos nem distorcer o relato pela interpretação, como se Jesus se tivesse esvaído em sangue e morrido de forma diferente do que aconteceu realmente nem ficar parados no relato e evidenciando efeitos morais colaterais (apelo à negação de si próprio e à entrega), deixando de comunicar a mensagem da redenção.
128 Constitui novamente uma característica de João que ele tem receio de falar de Deus como sendo nosso Pai. No Apocalipse, o título de Pai para Deus sempre permanece rigorosamente relacionado com o Filho Jesus Cristo: Ap 1.6; 2.28; 3.2,5,21; 14.1. Unicamente Ap 21.7 representa uma exceção e forma um ponto alto isolado, no qual Deus se confessa como o Pai de humanos. A essa constelação corresponde no evangelho de João, como ponto alto, Jo 20.17. Com freqüência maior, porém, mas também só em passagens importantes, fala-se no Apocalipse de “nosso Deus” (Ap 7.10; 12.10; 19.1) ou “nosso Senhor” (11.15).
129 Aqui como também em Ap 5.10 deve-se preferir a versão “reino” (contra o texto revisado de Lutero). – Os membros da igreja atual nunca são chamados de “reis” no nt, nem tampouco se fala de seu “governo real”. O verbo “governar como rei” na verdade é relacionado com eles na forma futura (Ap 5.10; 22.5; 1Co 4.8; Rm 5.17), contudo nem mesmo então eles serão reis no sentido absoluto, mas apenas co-regentes de Deus e do Cordeiro, como demonstram Ap 3.21; 20.4-6; 2Tm 2.12. Deveria desaparecer entre cristãos um certo linguajar elevado de que “reinarão”. Eles são sacerdotes e devem continuar sendo os mesmos até a data de Ap 22.3.
320 Para evitar mal-entendidos, recomenda-se falar a respeito da igreja não como novo Israel, e sim como Israel renovado. Desta maneira elimina-se a idéia de um segundo povo de Deus. O povo de Deus único e singular havia passado por uma decadência, que o reduziu a um tronco básico, “como terebinto e como carvalho, dos quais, depois de derribados, ainda fica o toco” (Is 6.13). Este “toco” é, em última análise, Cristo (cf. o exposto sobre Ap 1.4,6). “Assim a santa semente é o seu toco.” Dá-se a transição da figura do toco para a da semeadura, da forma como o próprio Jesus a retomará (Jo 12.24). O crucificado traz muito fruto, o exaltado atrai para junto de si judeus e gentios (Jo 10.16; 12.32). Em Rm 11 Paulo fala do enxerto dos gentios no tronco básico de Israel. Por estarem em Cristo Jesus vivem em Israel como co-herdeiros, corpo unificado, concidadãos e membros da família (Ef 2.19; 3.6). Precisamente a carta aos Efésios constitui-se num único apelo de não separar o povo de Israel unificado pelo sangue de Jesus novamente entre judeus e gentios. A antiga rachadura repetidamente tenta manifestar-se, e Paulo fixa em capítulo após capítulo a marca de Cristo: uma só igreja!
131 A palavra grega dóxa, que Lutero traduziu para o alemão com termos como honra, glória, claridade, louvor, exaltação, fama ou majestade, constitui a raiz de doxologia. Quando o at foi traduzido para o grego, dóxa assumiu o lugar da palavra hebraica kabod: o impactante, impressionante, sobretudo o esplendor glorioso e anestesiante e a glória da luz de Deus, que um dia arrasará toda a resistência e voltará a ocupar toda a criação (Sl 72.19; 57.5,11; Is 40.5; também de acordo com Ap 21.24 dóxa tem a ver com uma manifestação de luz). No tocante ao livro em estudo, este constitui um tema principal. Ap fala 17 vezes da dóxa. – No mais, a doxologia de Ap 1.6 aparece literalmente em 1Pe 4.11, o que é um indício de que era de uso generalizado nos cultos. Talvez seja a resposta da fé a Is 53.2: “Ele não tinha dóxa” (lxx).
132 O nt nunca relaciona este termo com pessoas. Em Hb 2.14 é o diabo que tem este “poder”, onze vezes ele é atribuído a Deus, com especial freqüência em doxologias. Ele significa força sobrenatural, superior, que no caso de Deus realiza a vitória derradeira. No presente contexto cabe mencionar também a expressão “Todo-Poderoso” (nove vezes, das quais oito vezes no Apocalipse e uma vez em 2Co 6.18, cf. nota 137).
133 A palavra que aqui reproduzimos com “século” e “épocas”, muitas vezes vertida para “eternidades”, designa no singular o “tempo mais longínquo” estendido para frente e para trás, ou seja, a época muito antiga ou o futuro distante. Ela pode, mas não precisa necessariamente, perder-se no infinito, i. é, em cada situação é o contexto que decide se o termo adquire a conotação de eternidade (tempo interminável) ou não. O plural muitas vezes ocorre como plural potenciador no linguajar efusivo das doxologias. Isso vale quase sempre a respeito da intensificação máxima possível em forma do plural duplicado (além de Ap 1.6 ainda em 11 referências nas doxologias do Apocalipse): “até os mais distantes tempos dos tempos mais distantes”, como consta na lxx (p. ex., Sl 41.13; 90.2; 103.17; 106.48; 1Cr 16.36; 29.10), em escritos apocalípticos (p. ex., Enoque 103.4; 104.5), em autores do nt (p. ex., 1Tm 1.17; Hb 1.8; 1Pe 4.11; 5.11). Essa formulação obviamente era usada e entendida como paráfrase poética da infinitude de Deus e de sua glória que dura além de todos os tempos. Foram somente pessoas da Modernidade que tiveram a idéia de que aqui haveria uma limitação a determinados prazos de tempo no plano de Deus. Um exegeta ensina que “tempos dos tempos” seria uma designação para duas de cinco etapas que se poderia comprovar na Bíblia, a saber, para o atual éon maligno e o éon subseqüente da soberania de Cristo, que termina com a entrega do reino ao Pai. Outras passagens da Escritura apontam com certeza para um decurso de éons que podem ser distinguidos um do outro. A expressão que estamos comentando aqui, porém, destaca uma ausência de diferenças: por todas as evoluções futuras perdura a glória de Jesus.
134 Em Ap 14.14 este significado é ressaltado com mais intensidade pela indicação da cor “nuvem branca” (a cor do soberano e vitorioso). Em outras passagens da Bíblia a nuvem aparece como encobrimento ou também como “carro” (Is 19.1; Sl 104.3; 2Rs 2.11). Essa conotação está afastada no presente versículo.
O versículo muitas vezes é interpretado em direção a uma conversão de Israel, embora o trespassamento tivesse sido feito por um gentio. Contudo, estes intérpretes chamam a atenção de que a passagem de Zacarias que ecoa de forma suave neste texto fala de um arrependimento de Israel em vista do trespassado. Contudo, João não anunciou nenhuma citação de Zacarias, como também de fato não se segue nenhuma citação. O que lemos em seguida neste versículo são fragmentos de quatro versículos do at com ingredientes próprios de João (de Dn 7.13: “eis que vinha com as nuvens”; de Zc 12.10: “olharão para aquele” e “pranteá-lo-ão”; do v. 12: “a terra”; e do v. 14: “todas as mais famílias”). Diante destes fatos não é apropriado depreender simplesmente o sentido em Zacarias e pensar que com isso já esteja explicado também Ap 1.7. Nosso versículo precisa ser interpretado a partir de si próprio e de seu contexto mais próximo. Formam-se, p. ex., as seguintes diferenças em relação a Zacarias:
a. Zc 12.10 fala (com especial clareza na tradução oferecida pela lxx) de um trespassamento simbólico no sentido do escárnio. João, porém, diferente do at grego, usa um termo referente ao trespassamento real (tanto aqui quanto em Jo 19.37). Ele pensa no golpe de lança que perfurou o cadáver, ou seja, num procedimento totalmente diferente do que o imaginado por Zacarias.
b. “Ver” para Zacarias significa levantar o olhar como um gesto de aprovação, de confiança, quase de súplica; é o que novamente se torna muito evidente na lxx. João troca de vocábulo e também de sentido, como mostra todo o contexto (cf. o comentário). Ap 11.12 fala expressamente de que os “inimigos” vêem.
c. Ao falar de “todas as mais famílias”, Zacarias refere-se às tribos de Israel na Palestina, na terra da promissão (= a “terra”). Ambos os conceitos, gerações e terra, foram generalizados no Apocalipse e também em Lc 11.31 para significarem “pessoas” e “orbe terrestre”.
d. “Lamento”, “lamentar-se” sem dúvida ainda constitui um conceito positivo em Zacarias, porém não mais no nt. Quando no caminho rumo ao Calvário se levantou um “lamento” por Jesus, ele se voltou e disse: “não choreis por mim” [Lc 23.28]. Também em Mt 24.30 os que “lamentam” ao aparecer o Filho do Homem não são os “eleitos” do v. 31.
136 Também essa duplicação (fórmula de confirmação grega e hebraica) retorna na parte final, ainda que de forma dilatada (Ap 22.20).
137 Na lxx, “Todo-Poderoso” é palavra que substitui o antigo e recorrente título de Deus “Senhor dos exércitos” (279 vezes no at). Era assim que Israel chamava seu Senhor quando tinha em vista a destruição dos deuses contrários e, sobretudo, a vitória final. Cf. também a nota 132.
138 O uso da primeira e última letra do alfabeto grego para expressar início e fim ainda não é conhecido da lxx, mas sim do contexto de João. Contudo, há somente um pequeno passo do simbolismo numérico ao simbolismo das letras, visto que as letras eram usadas como sinais numéricos.