Ἀαρών [Aarōn]: “Aarão” – Dicionário Teológico Grego do Novo Testamento

Aarão em grego

 Ἀαρών [Aarōn]

No contexto da Epístola aos Hebreus (Hb 5:1–9), a figura de Aarão surge como contraponto necessário à exposição cristológica do autor, sendo Cristo apresentado como Sumo Sacerdote. Essa associação, no entanto, não visa uma identificação plena, mas uma superação teológica e tipológica. A comparação com o sacerdócio aarônico é estabelecida com clareza, destacando que Aarão não assumiu seu ofício por iniciativa própria ou eleição humana, mas sim mediante vocação divina (Hb 5:4), conforme a tradição mosaica atestada em Êxodo 28:1 e Números 18:1. Esse conceito de chamado divino encontra eco também nas tradições midráshicas (Tanch. חר 218a; Midr. Salmos ק 2 § 3 [13a]), bem como em Flávio Josefo, que afirma: “ὁ θεὸς Ἀαρῶνα τῆς τιμῆς ἄξιον ἔκρινε καὶ τοῦτον ᾕρηται ἱερέα” (Ant. 3.190), isto é, “Deus julgou Aarão digno da honra e o escolheu como sacerdote”.

Contudo, mesmo esse alto chamado não elimina a fragilidade humana de Aarão e seus descendentes. O texto de Hebreus 5:2 descreve que o sumo sacerdote da ordem aarônica pode “μετριοπαθεῖν τοῖς ἀγνοοῦσιν καὶ πλανωμένοις, ἐπεὶ καὶ αὐτὸς περίκειται ἀσθένειαν”, ou seja, pode compadecer-se dos ignorantes e desviados, justamente porque também está cercado de fraqueza. Essa empatia sacerdotal, no entanto, é reinterpretada cristologicamente pelo autor de Hebreus, pois em Cristo tal compaixão emerge não da fraqueza, mas da obediência perfeita (Hb 5:8–9). Assim, o sacerdócio de Cristo é superior ao de Aarão, sendo eterno e não transitório (Hb 7:23ss), e não requer sacrifícios contínuos por seus próprios pecados, como o fazia o sumo sacerdote aarônico (Hb 7:27). A distinção essencial, portanto, está no fato de que o sacerdócio de Cristo não é “κατὰ τὴν τάξιν Ἀαρών”, mas “κατὰ τὴν τάξιν Μελχισέδεκ” (Hb 7:11; cf. Sl 109:4). Essa designação expressa não apenas uma genealogia alternativa, mas uma natureza radicalmente diferente da função sacerdotal messiânica.

A figura de Aarão reaparece também em Hebreus 9:4, onde se menciona o seu bordão — que floresceu milagrosamente segundo Números 17:16–26 — como um dos objetos associados à arca da aliança, juntamente com o vaso de maná e as tábuas da Lei. O texto hebreu de Números 17:25 (תוֹדֵעָה יֵנְפִל) indica que o bordão foi “colocado diante do testemunho”, ou seja, na presença da arca, no Santo dos Santos. Essa leitura foi também preservada na tradição judaica, conforme Tosefta Yoma 3:7 e Strack-Billerbeck, Kommentar zum NT aus Talmud und Midrasch, III, p. 739. No entanto, a descrição rabínica mais precisa dos conteúdos da arca, como se encontra em b.Baba Batra 14a/b, menciona apenas as tábuas da Lei e o rolo da Torá, sem qualquer referência ao bordão de Aarão ou ao vaso de maná. Com base nisso, é possível afirmar com segurança que, segundo a opinião rabínica clássica, esses objetos não estavam dentro da arca. A discussão sobre essa presença só emerge com os rabinos medievais, entre os quais se destaca Levi ben Gerson (séc. XIII), que em seu comentário sobre 1 Reis 8:9 argumenta em favor da inclusão desses elementos na arca, como atestado nas Bíblias rabínicas. A Tosefta Sota 13:1 (cf. b. Yoma 52bb. Horayot 12a; Avot de Rabbi Nathan § 41) tampouco afirma que o bordão estivesse dentro ou ao lado da arca. Ver também Delitzsch, Kommentar zum Briefe an die Hebräer (1857), p. 361, e Rgg. Hebräerbrief, p. 246, n. 85, para um levantamento adicional das fontes.

A menção a Aarão ocorre ainda em Lucas 1:5, onde Isabel é descrita como “ἐκ τῶν θυγατέρων Ἀαρών”, expressão que indica descendência sacerdotal. Essa forma linguística tem paralelos com o hebraico bíblico ןֹרֲהאַ יֵנְבּ (“filhos de Aarão”), como em Levítico 1:5 e passim, mas é curiosamente inédita tanto no Antigo Testamento como em escritos de Filon, Josefo ou da literatura rabínica. Assim, não representa uma forma consagrada de uso judaico. A literatura rabínica emprega, de modo mais comum, expressões como ןֵחֹכּ תַבּ (“filha de sacerdote”), como em Terumot 7:2 (cf. Lv 21:9), ou תֶנֶהוֹכּ (“sacerdotisa”), como em Sota 3:7. De maneira similar, Fílon em De Specialibus Legibus I, 111 utiliza “ἱερέων θυγατέρες” ao lado de “ἱέρεια” (v. 110), preservando a forma helenística clássica. A expressão encontrada em b. Eruvin 53b, תינורהא (“Aaronidin”), não deve ser aplicada ao caso de Lucas, pois trata-se de um jogo de palavras específico daquele contexto.

Finalmente, convém observar que o nome próprio Ἀαρών é indeclinável tanto na LXX quanto no Novo Testamento (Blass-Debrunner, Grammatik des neutestamentlichen Griechisch, § 53.1; Helbing, Grammatik, p. 58).

Bibliografia:

BLASS, F. – Debrunner, A. Grammatik des neutestamentlichen Griechisch. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1961.
DELITZSCH, F. Commentar zum Briefe an die Hebräer. Leipzig: Dörffling und Franke, 1857.
HELBING, R. Grammatik des neutestamentlichen Sprachgebrauchs. Leipzig: Quelle & Meyer, 1928.
FLAVIUS, Josephus. Jewish Antiquities. Book III, § 190.
KITTEL, Gerhard; FRIEDRICH, Gerhard (Ed.). Theological Dictionary of the New Testament. Tradução de Geoffrey W. Bromiley. Vol. 1. Grand Rapids: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1964.