A Doutrina dos Livros Apócrifos
III. A DOUTRINA DOS LIVROS APÓCRIFOS
III.a A doutrina de Deus
À medida que o tempo avança, nota-se uma tendência em toda esta literatura para se frisar a transcendência de Deus. Parece evidente a relutância em mencionar o nome de Deus, para o que se empregam diferentes perífrases. Em 1 Macabeus, por exemplo, nunca se fala de Deus diretamente, mas em regra alude-se ao “Céu”. Vejamos o seguinte passo: “A vitória não depende da multidão dos exércitos, pois a força vem do Céu”. Deste modo compreendemos como é que o escritor judeu Mateus usa constantemente no seu Evangelho a expressão “reino do Céu” em vez de “reino de Deus”, tanto do agrado dos outros evangelistas. Os rabis não raro se referem a Deus, com expressões como esta: “Vais agora prestar contas ao Rei dos reis, o Único Santo, bendito seja Ele” (Pir. Ab. 4.29).
Pelo mesmo motivo se dá relevo à doutrina dos anjos, para evitar a necessidade da intervenção direta de Deus nos destinos do mundo. No Velho Testamento o Senhor é um “guerreiro” que luta ao lado de Israel. Em 2 Macabeus são os anjos que desempenham esse papel. Mas em 1 Macabeus nem Deus nem os anjos. É Judas em pessoa quem leva de vencida os poderosos inimigos, a salientar que não se exige uma intervenção direta de Deus, sobretudo em assuntos deste gênero. Do mesmo modo o contato direto de Deus com a criação no Velho Testamento é substituído por multidões de anjos, que se ocupam de todos os fenômenos da Natureza: da chuva, da neve, da luz, das trevas, etc. Por outro lado, naturalmente evoluiu também a doutrina dos demônios embora as causas sejam diferentes.
Não admira, pois, que se desenvolvesse extraordinariamente a doutrina da soberania de Deus. A consumação não só foi prevista, mas determinada com precisão. Os indivíduos participam deste processo de predestinação, mas sem qualquer prejuízo da sua liberdade. O autor dos Salmos de Salomão acreditava na absoluta soberania de Deus sobre o homem, mas não deixava de exclamar: “As nossas obras estão sujeitas à nossa alternativa e o poder de fazer o bem ou o mal estão nas obras das nossas mãos” (9.7). Do mesmo modo a transcendência de Deus não exclui completamente as Suas relações com os homens, e admite-se com freqüência a Paternidade divina. A frase: “O teu Pai que está no Céu” aparece em Pir. Ab. 5.23. Repare-se ainda nesta outra: “O Senhor alegrar-se-á nos Seus filhos e agradar-se-á dos Seus amados para sempre”. (Test. Levi 18.13 e 4.2; Or. Sib. 3.702; 3Mc 6.28; Pir. Ab. 3.19).
I.b A Lei
A lei é eterna e da máxima importância para o homem. Nos jubileus dizia-se que todos os justos observaram a Lei, tal como os anjos do Céu, de tal sorte que a missão de Moisés no Sinai não era apresentá-la pela primeira vez, mas sim promulgá-la de novo. É a súmula da revelação divina. Para muitos judeus, a Lei (Torah) incluía a tradição oral, que se dizia ter origem em Moisés e se propagou graças aos profetas e aos homens da Grande Sinagoga. Esta tradição admitia uma infinidade de aplicações da Lei a todas as circunstâncias possíveis (o Mishnah) juntamente com outras explicações (o Gemara), formando ambos o Talmude, de que se conhecem duas coleções: a de Jerusalém e a da Babilônia. É bem conhecida a atitude de Jesus Cristo para com estas tradições, mas a observância delas é fundamental para muitos judeus ortodoxos. Tanto os rabis como os autores dos apocalipses, eram unanimes em concordar que a salvação só dependia da obediência aos preceitos da Lei.
I.c A Sabedoria
Os atributos da Sabedoria, como os apresentam os Pv 8.22-31, eram bastante divulgados nesta época, tanto mais que a filosofia grega já fazia sentir no judaísmo a sua influência. Uma das mais belas referências à Sabedoria encontra-se na Sabedoria de Salomão (7.22-8.1), onde se diz ser o “espírito do poder de Deus, a emanação do Altíssimo, a irradiação da luz eterna, o espelho imaculado da obra de Deus, a imagem da divindade benéfica”.
Cf. Cristologia: Estudo sobre Jesus Cristo
Cf. Teologia Bíblica e o Cânon
Cf. Literatura no Judaísmo
Cf. Tradição Apocalíptica
Ao mesmo tempo aumentou a especulação do conceito da “Palavra de Deus”, desenvolvida sobretudo na Sabedoria 18.15-16: “Toda a Tua palavra poderosa saiu do trono real como um soldado valoroso, que, no meio da terra condenada, empunha a espada dos Teus mandamentos, fere de morte tudo o que encontra e, enquanto aponta o céu, o seu lugar é a terra”. Trata-se duma alusão à mortandade dos primogênitos no Egito. No mesmo livro a "Palavra" é identificada com a “Sabedoria”: “Ó Deus dos nossos antepassados, que pela palavra tudo criastes, e pela sabedoria formastes o homem...” (9.1-2).
Em face desta doutrina, podemos chegar à conclusão de que Lei e Sabedoria são uma e a mesma coisa. Reconhece-mo-lo facilmente em todos os livros, em especial no Eclesiástico e no Pirke Aboth. É o caso de Ben Sira com a sua pormenorizada descrição da Sabedoria no capítulo 24, dizendo: “Tudo isto compõe o livro da aliança do Deus Altíssimo, a Lei que Moisés nos confiou...” (Eclesiástico 24.23). O mesmo se passa com a Lei e a Palavra em Pir. Ab. 3.19: “Bem-aventurado é Israel, a quem foi confiado o instrumento que serviu para criar os mundos...”. Quem se dedica ao estudo do Novo Testamento não deixará de reconhecer a importância destes conceitos, que serviram de fundo ao Quarto Evangelho. E assim a Sabedoria, a Palavra e a Lei dos judeus cumpriram-se, segundo João, em Jesus encarnado.
I.d O pecado
Foi muito discutida a origem do pecado, tendo sido apresentadas várias soluções, em especial no que se refere ao grande desastre do Éden. Em alguns casos a culpa é atribuída a Eva (Eclesiástico 25.24), em outros a Adão (2Ed 7.118), ainda noutros ao Demônio (Sabedoria 2.24), e finalmente aos Anjos Maus (1 Enoque 10.7-8). Por outro lado, o autor de 2 Baruque não concorda com a atribuição da culpa aos nossos antepassados: “Embora Adão fosse o primeiro a pecar, por ele a morte se transmitisse a todos os seus descendentes, cada um de nós preparou no seu íntimo tal acontecimento... Adão é, pois, apenas o responsável pelo seu pecado, enquanto cada um de nós responde pelo seu, por sermos cada um o seu Adão em espírito” (2 Baruque 54.15 e 19).
Quanto à expiação por esse pecado, recorre-se aos sacrifícios, tal como no Velho Testamento. Mas não se dispensam as obras: “Aquele que honra o pai fará sacrifícios pelos pecados” (Eclesiástico 3.3); “A esmola livra da morte e purifica do pecado” (Tobias 12.9). É contra estas teorias que Paulo se insurge veementemente.
Recorre-se, ainda, aos méritos dos santos (2Ed 8.28-29), e o martírio dos confessores fiéis pode vir a expiar os pecados (4Mc 6.28-29).
I.e A Moral
A principal finalidade do homem é compreender e cumprir a Lei. Como disse um rabi: “Se praticares muito a Torah, não confies em ti, pois para isso foste criado” (Pir. Ab. 2.9). Numa época em que se considerava a Lei como a súmula da Revelação Divina, não admira que fosse geral essa maneira de pensar. Infelizmente, foram desastrosas as conseqüências desta doutrina da salvação pelas obras. É de ver como certo rabi chega a comparar Deus a um comerciante que dá crédito aos que guardam a Lei, e exige o pagamento das dívidas aos que não a guardam (Pir. Ab. 3.20). Há a frisar, todavia, um certo progresso relativamente à literatura moral do Velho Testamento. Várias vezes nos Testamentos dos doze patriarcas se faz a seguinte afirmação: “Ama o Senhor e o teu próximo” (por exemplo, no Test. de Issacar 5.2), antecipando-se assim à doutrina básica de Jesus.
Sobre o perdão das ofensas leia-se no mesmo livro o Test. de Gade 6.3-7: “Amai-vos uns aos outros de coração; e se alguém pecar contra vós, falai-lhe brandamente, não guardando contra ele rancor, e perdoando-lhe, se se arrepender e se confessar. Se o não fizer, porém não vos exalteis nem blasfemeis, para não pecardes também. Nem o censureis, porque pode ainda vir a reconciliar-se convosco. E mesmo que seja persistente no erro, perdoai-lhe de coração e deixai a vingança nas mãos de Deus”.
Textos deste teor são tão semelhantes à doutrina de Jesus, que há quem avente a hipótese de que o divino Mestre tenha conhecimento desses Testamentos. Nada de concreto, todavia. As máximas que versavam temas de moral não eram privilégio deste ou daquele rabi, sobretudo numa época em que era corrente a pregação.
I.f A Escatologia
É neste capítulo que mais se nota o desenvolvimento da doutrina da literatura apócrifa, em especial no que se refere à imortalidade pessoal, ao reino de Deus e ao Messias.
1) A IMORTALIDADE PESSOAL. Segundo o que podemos apurar, foi sempre corrente entre os israelitas a crença na vida além-túmulo. Tratava-se duma existência vaga, onde teriam acesso as almas, mas sem esperança de gozar da amizade de Deus. O Sl 88 é claro a este respeito, representando o Além como a “terra do esquecimento”, zona de “trevas” onde os mortos não gozam da amizade de Deus, porque foram “excluídos da mão divina”. Com tal conceito da outra vida, aquela existência não tem razão de ser: “Poupa-me, até que tome alento, antes que me vá, e não seja mais” (Sl 39.13). Atingiu-se, porém, uma noção mais clara desta doutrina, quando os santos de Deus refletiram mais a fundo na sua amizade com Deus e na experiência que alcançaram acerca da vinda do reino de Deus. Jó acredita por isso que depois da morte verá vingada a sua inocência (Jó 19.25-27) e o autor do Sl 139.8 afirma que se “fizer a sua cama no Seol”, ali encontrará Deus. Asafe no Sl 73.24-25, referindo-se à amizade de Deus, deseja-a não só no outro mundo, mas também neste. Tal doutrina, porém, não era geral. O saduceu Bem Sira, por exemplo, escreveu: “Dez, cem, mil anos, nada são comparados com o Seol, onde não há esperança de vida” (Eclesiástico 41.4). Segundo este texto não restam dúvidas que após a morte Deus se esquece das almas. Foram os antepassados dos fariseus que desenvolveram a doutrina dos filhos mais espirituais de Israel. Compare-se a doutrina de Cristo com 4 Macabeus 7.18-19: “Todos aqueles que de coração fazem da justiça o seu primeiro pensamento estão aptos a dominar a fraqueza da carne, podendo crer que não morrerão em Deus, como os nossos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó, que não morreram mas viveram para Deus”. Voltemo-nos agora para a opinião oposta expressa por um rabi no Pir. Ab. 4.21: “Este mundo é como um pórtico diante do outro mundo que há de vir. Preparemo-nos para ultrapassar esse pórtico e entrar na sala do festim”.
Tais são as teorias dos apocalipses largamente espalhadas entre os judeus, mesmo no tempo de Cristo.
2) O REINO DE DEUS. No Velho Testamento é antecipado o Reino de Deus, passando a ser consumado nesta terra. É característica a famosa profecia messiânica de Is 11.1-9. Os autores de apocalipses anteriores desenvolveram indefinidamente esses textos e conceberam narrações fantásticas. Em 1 Enoque 10.17 e segs. diz-se que os justos terão uma velhice feliz e gerarão milhares de filhos. As sementes produzirão mil por um, etc., etc. Recorde-se a descrição do milênio de Papias baseado nesta fonte.
Em Is 65.17-22 fala-se duma renovação do céu e da terra, mas não nos é indicado o sentido dessa renovação, quer sob o ponto de vista físico, quer moral. Alguns autores de apocalipses do século I A. C. e do século I da nossa era supõem que o reino messiânico, embora estabelecido na terra, é de pouca duração e dará lugar ao reino eterno dos céus.
Em 2 Enoque diz-se que a história do mundo durará 7.000 anos, sendo os últimos mil o reino milenário, depois dos quais começará o reino eterno com uma nova criação (2 Enoque 32.2-33.2). Para este escritor é de grande importância o reino temporário. Mas em 2 Esdras já é menor essa importância, devido ao pessimismo do autor a respeito deste mundo; por isso restringe-o a 400 anos, no fim dos quais o Messias e todos os seres vivos morrerão (2 Esdras 7.26 e segs.).
Em presença deste último desenvolvimento, não admira que alguns autores tivessem abandonado a idéia do reino temporário messiânico e pensassem apenas no reino eterno dos novos Céus. O autor de 2 Baruque achou que esta terra era indigna do Reino de Deus: “O que agora existe nada é; o que há de vir, sim, é algo de grande valor. Porque tudo o que é corruptível terá um fim, e tudo o que morre desaparecerá, sendo esquecido todo o presente, de que não ficará qualquer lembrança, porque nele só há maldade” (2 Baruque 44 e segs.).
Em qualquer teoria que venha a ser adotada e relacionada com a natureza do reino, a vinda deste reino é geralmente considerada “catastrófica”, como no sonho de Nabucodonosor (Dn 2). Em alguns livros, todavia, a idéia geral é de que o reino atingiria a sua plenitude gradualmente (cfr. Jub 33 e 2 Baruque 73-74). No livro dos Jubileus, por exemplo, o Reino é concebido em moldes que levam à conclusão que a sua plenitude aumentará à medida que se conhecer e cumprir a Lei.
Do mesmo modo todos os autores de apocalipses esperam que o Rei apareça em breve, porque o fim está próximo. Em vários livros afirma-se mesmo que o grande dia será antecipado pelo arrependimento: “No dia em que Israel se arrepender, terá fim o reino do inimigo” (Test. Daniel 6.4). Por isso na Assunção de Moisés 1.18 o último dia é considerado “o dia do arrependimento, dia da visita do Senhor no fim dos tempos”.
Estes diferentes aspectos do Reino de Deus, como não podia deixar de ser, vieram afetar muito a teoria da imortalidade. Já que Deus pretendia estabelecer o Seu reinado, que abrangia não só a geração dos últimos dias mas também as de todos os tempos, veio a lume outra doutrina: a da ressurreição, já em vislumbre no Velho Testamento (cf. Is 26.19 e Dn 12.2-3). Surgiram depois as modificações. Se a ressurreição antecipada é para um reino de glória terrestre, naturalmente o corpo da ressurreição é da mesma natureza que o corpo atual. É assim que lemos nos Or. Sib. 3.179-192: “Deus reunirá os ossos e as cinzas dos homens e pela ressurreição torná-los-á como dantes”. Este fenômeno terá lugar no começo do reino; mas se se estivesse à espera do reino temporário, a ressurreição só poderia verificar-se no fim do mesmo. Tal é o caso do livro dos Segredos de Enoque, onde Deus diz a Adão que o levará da terra quando da “Sua segunda vinda” (32.1), isto é, ao cabo de 7.000 anos de história do mundo. Este autor parece que supunha a ressurreição como sendo espiritual e não meramente material. Ouçamo-lo: “O Senhor disse a Miguel: -Vai e despe Enoque dos seus vestidos terrenos, unge-o com o meu óleo suave e impõe-lhe o vestuário da minha glória” (22.8). Assim o autor da Sabedoria de Salomão, que não aguardava a realização terrena do reino, ocasionalmente supunha a ressurreição logo a seguir à morte. Não se tratava, porém, de teoria normalmente aceita entre os judeus da Palestina.
3) O MESSIAS. É curioso como alguns dos profetas do Velho Testamento não fazem qualquer alusão ao Messias (por exemplo, Amós, Sofonias, Naum, Habacuque, Joel). O mesmo sucede com alguns livros apócrifos, nomeadamente os 4 livros dos Macabeus, Judite, Tobias, 1 Baruque, Sabedoria, Assunção de Moisés e 2 Enoque. Segue-se na opinião de R. H. Charles, que nos livros proféticos e apocalípticos dos judeus, o Messias não era um fator fundamental no reino. Assim podia ser, embora não se admita em todos os casos mencionados que o silêncio dos autores supõe, necessariamente, que não esperem a vinda do Messias. A grande diferença entre a escatologia do Velho e do Novo Testamento é a relativa importância do Messias. Neste último, a escatologia anda inteiramente ligada à Pessoa e à obra de Cristo.
Nos textos do Velho Testamento em que o Messias desempenha um papel preponderante no reino, Ele só entra em atividade depois deste estabelecido, pois nem sequer é Ele quem o inicia. O Sl 110.1 resume perfeitamente essa posição: “Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à Minha mão direita, até que ponha os Teus inimigos por escabelo dos Teus pés”. Assim, em muitos dos apocalipses o Messias não inicia a Sua atividade, enquanto o reino não estiver fundado. Apenas o livro de Enoque faz exceção a esta regra.
Cf. O Tema Principal da Epístola aos Hebreus
Cf. O Perigo da Incredualidade
Cf. Qualificação e Obra de Jesus como Sumo Sacerdote
Cf. O Ministério de João Batista
Quanto à origem do Messias segue-se a doutrina geral do Velho Testamento, fazendo-O descender da casa de Davi. Só os Testamentos dos doze patriarcas afirmam que a salvação provém de Levi e de Judá, e não apenas de Judá. Muitos comentadores apóiam a primeira opinião, tal como o Test. Rúben 6.7-12. Se bem que no Test. Judá 22 e 24 se insista em que o Messias nasce de Judá, os Testamentos dão a entender geralmente que a salvação vai surgir de Levi e Judá, e não apenas duma só tribo. A única interpretação satisfatória parece ser a que leva o autor a esperar dois Messias, e não um só. Baseia-se esta afirmação na narração pormenorizada das façanhas dos macabeus, que pertenciam à tribo de Levi, e também na importância ligada ao sacerdócio: “A mim deu-me o Senhor o reino e a ele (Levi) o sacerdócio, submetendo aquele a este... Assim como o céu é superior à terra, assim o sacerdócio de Deus é mais elevado que o domínio terrestre...” (Test. Judá 21.1 e segs.). A importância deste comentário, tão relacionado com o nascimento de Cristo, deve ter favorecido muito a pregação do Messias entre os judeus.
Quem mais se afasta, porém, da doutrina tradicional sobre o Messias é o autor das Comparações de Enoque (1 Enoque 37-71). O Messias já não é uma simples figura humana; é um ser transcendente, preexistente e superior a todas as criaturas, que surgirá no fim dos tempos para estabelecer um reinado. Aqui pela primeira vez se ouve falar de Cristo, do Justo, do Eleito, do Filho do Homem (cf. 1 Enoque 52.4; 38.2; 45.3; 46.1-6), atributos tão freqüentes nos livros do Novo Testamento.
Muitos foram os meios utilizados por Deus para preparar os caminhos do Senhor e atingir aquela “plenitude dos tempos” para a vinda do Seu Filho, conforme dizem as Escrituras. Neste sentido tais obras, referindo-se a esse Libertador, tiveram certa importância, porque contribuíram para explicar o grandioso plano de Deus.