Tiago 3 — Estudo Comentado

Estudo Comentado de Tiago 3

Escrito por 
J. H. Neyrey

Editado por 
Bergant, Dianne e Karris, Robert J. 



Tiago 3

3:1–12 Controle da língua. Esta longa passagem sobre o controle da língua começa com uma ordem para que haja poucos professores no grupo. Os professores são mencionados como oficiais nas igrejas primitivas (Atos 13:1; 1 Coríntios 12:28; Efésios 4:11). Diferentemente dos profetas, os professores podem ser vistos como pessoas que dão novos insights sobre materiais antigos, como pessoas que guardam e reinterpretam a tradição. Tiago certamente funciona como professor em sua reinterpretação da lei (2:8, 10), em sua reaplicação das Escrituras (1:10; 2:23) e em sua reutilização dos ensinamentos de Jesus (1:5, 17; 4:3). Não está claro por que deveria haver poucos mestres (3:1), pois esse grupo não parece ser particularmente ameaçado por falsos mestres. Tiago apenas diz que os professores enfrentam um julgamento mais rigoroso, um tema que ele repetidamente enfatizou (ver 2:12-13).

A preocupação com o ensino é apenas o prefácio do discurso principal sobre o controle da língua (vv. 2-12). Embora sejamos advertidos de que devemos guardar perfeitamente todos os mandamentos (2:9-11), aqui é admitido que todos ainda somos pecadores, falhando em uma ou outra coisa. No entanto, aquele que controla a língua é uma pessoa “perfeita”, sendo a perfeição a completude ou totalidade de seu crescimento na fé, não simplesmente a impecabilidade. “Perseverança” traz perfeição (1:4); o ouvinte que pratica a fé também é perfeito (1:25); A fé de Abraão foi aperfeiçoada por suas ações fiéis (2:22). Mais uma vez, temos o conjunto ideal diante de nós: um grande valor dado ao discurso cuidadoso. Agora, o controle da língua é um tópico padrão nas exortações morais tradicionais (veja Sir 14:1), que a tradição de Tiago ecoa não apenas em seus conselhos, mas também nas metáforas usadas para dramatizar sua importância. Assim como um freio pode controlar um cavalo poderoso, guardar a língua serve para controlar toda a pessoa (veja Sl 32:9). Da mesma forma, um enorme navio é controlado e guiado por um pequeno leme, assim como nós somos por nossas bocas (veja a contrapartida egípcia disso por Amen-em-Opet: “Não dirija apenas com a sua língua; se a língua de um homem for o leme de um barco, o O Senhor de Tudo é o seu piloto”). Ainda um terceiro exemplo é usado para enfatizar a importância desta virtude: uma faísca pode incendiar uma floresta, então uma pequena língua pode exercer grande poder destrutivo.


Em 3:6 a importância do controle da língua é repetida, nos termos usados anteriormente no versículo 2. A pessoa inteira e todo o corpo dependem deste órgão para sua integridade. Essa ideia se assemelha à descrição do evangelho do olho que é mau escurecendo todo o corpo e vice-versa (Mt 6:22-23). O perigo de uma língua desenfreada talvez seja exagerado quando Tiago a chama de “mundo da malícia” que está sempre nos colocando em perigo desde o nascimento (3:6), mas esta é provavelmente a linguagem tradicional usada para descrever a importância disso. Certamente a caridade (2:8) é mais importante para Tiago. Por mais perigoso e extenso que seja o dano que uma língua desenfreada pode trazer, também é incontrolável (v. 8) e exige atenção constante. A preocupação de Tiago com a língua permeia a exortação: por um lado, ele está preocupado com a fé que é apenas verbal, sem ação (2,15); ele adverte contra o juramento (5:13); ele adverte que falar mal uns dos outros traz julgamento (4:11); e aqui ele enfatiza a necessidade constante de controlar um órgão que potencialmente pode incendiar florestas e matar com veneno. Obviamente, a igreja primitiva valorizava a caridade e a fraternidade, e estava ferozmente em guarda contra a raiva e o facciosismo. Para que ninguém pense que está guardando a lei evitando o assassinato, Jesus lhes disse que xingamentos e calúnias também estão sob essa proibição (Mt 5:22).

Em um argumento final, Tiago sustenta que, como o julgamento pertence a Deus (ver 4:11-12), nosso discurso nunca deve ser maldição, mas apenas bênção. E ele emprega mais uma vez suas metáforas vívidas: bênção e maldição são tão incompatíveis em uma boca quanto encontrar água fresca e suja na mesma fonte, como colher uvas e figos da mesma planta.


3:13–18 Verdadeira e falsa sabedoria. O versículo 13, a introdução a esta apresentação de sabedoria verdadeira e falsa, é a exigência típica de Tiago por uma fé viva e prática que se mostre ativamente em obras. Faz-se um apelo à humildade, que liga os versículos 13–18 aos versículos 1–10, pois o controle da fala significa um comportamento não agressivo que evita o ciúme amargo e a ambição egoísta. O foco comunitário deste conselho é claro no apelo à unidade de coração e fala, que claramente é valorizada contra pretensões arrogantes e falsas de individualismo. Tipicamente, Tiago contrasta a sabedoria verdadeira com a falsa, a sabedoria do alto com a sabedoria terrena. A sabedoria terrena promove o eu (ver v. 14); trata de assuntos terrenos, como riquezas, poder e prestígio; não é espiritual, mas material; é diabólico, assim como a língua desenfreada (veja 3:6). Em 1 Coríntios, Paulo também encontrou uma comunidade dividida em facções, buscando o interesse próprio, cheia de contendas e ciúmes (veja 1:11; 3:3), exatamente como Tiago descreve aqui. Em geral, Tiago está mostrando como a falsa teologia (falsa sabedoria) leva à falsa moral, um argumento típico no mundo antigo para mostrar os males da heresia: leva certamente à divisão e à imoralidade.

Em contraste com a falsa sabedoria está a sabedoria do alto. É puro e impecável, os conceitos favoritos de Tiago (veja 1:27; 3:6). A verdadeira sabedoria é a construção da comunidade: ela faz a paz (Mt 5:9), é tolerante e disposta a ceder aos professores e líderes de grupo. Típico de Tiago, é cheio de misericórdia (2:13) e boas obras (2:18-26), não mostra favoritismo (2:9), nem é pretensioso (2:2-3). Em suma, “sabedoria” para Tiago não é conhecimento esotérico ou segredos gnósticos, mas a noção judaica tradicional de comportamento correto e retidão moral. Mais uma vez, Tiago mostra sua mão em exaltar o viver da fé cristã sobre meramente conhecer seus princípios ou simplesmente confessar seu credo. A sabedoria, como a fé, é prática, ativa e orientada para a comunidade. Ao listar os resultados contrastantes desse valor primordial, Tiago espelha a lista semelhante de Paulo de vícios e virtudes típicos que derivam da verdadeira liberdade em Cristo (ver Gl 5:16-26). Ele conclui sua exortação aqui com outro ditado típico: Como você semeia, você colhe (veja Gl 6:7). Aqui ele enfatiza novamente o caráter moral do universo cristão, assim como fez anteriormente em 2:13. Nossas ações têm consequências e a colheita é o tempo de julgamento de Deus quando colheremos o que plantamos.

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