Eclesiastes 3 — Análise Bíblica

Análise Bíblica de Eclesiastes 3





Eclesiastes 3

3:1—5:20 Explorando os bastidores
O Pregador continua a amontoar evidências para comprovar seu argumento. Inicia essa seção afirmando: Tudo tem seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu (3:1). As quatorze linhas poéticas em 3:2-8 abrangem vinte e oito eventos abarcando o âmbito de ação das atividades humanas, tanto pessoais quanto coletivas. O escritor menciona os pares opostos de nascer e morrer, plantar e arrancar, matar e curar, derribar e edificar, chorar e rir, prantear e saltar de alegria, espalhar pedras e ajuntar pedras, abraçar e afastar-se de abraçar, buscar e perder, guardar e deitar fora, rasgar e coser, estar calado e falar, amar e aborrecer, guerrear e ter paz. Alguns poderiam argumentar que esses tempos são de tal forma predeterminados por Deus que isso suprime a liberdade humana, mas essa não é a maneira pela qual o Pregador o percebe. Ao contrário, ele apresenta uma bela descrição do absoluto controle de Deus sobre os eventos “debaixo do céu”. Apesar do belo plano de Deus que acaba de ser descrito, o escritor retoma à sua pergunta familiar: Que proveito tem o trabalhador naquilo com que se afadiga? (3:9; cf. 1:3; 2:22). Ele vê labuta e frustração trabalhando sem que haja progresso como o trabalho que Deus impôs sobre os homens (3:10; cf. tb. 1:13). Ainda mais frustrante é o fato de que tudo fez Deus formoso no seu devido tempo (3:11a), embora esse tempo seja limitado. Os seres humanos aspiram à eternidade, mas não podem descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até o fim (3:11c), porque são finitos. Podemos sentir-nos intrigados sobre a maneira pela qual cada evento que Deus permite acontecer em seu próprio tempo e lugar pode ser apresentado como “formoso” (3:11a) — de que forma guerra, lamento, morte (e todas as outras coisas desagradáveis mencionadas em 3:2-8) podem ser fontes de prazer? Podemos não compreender, mas não é nisso que o apóstolo Pedro está pensando quando aconselha os crentes a regozijar-se em seu sofrimento (cf. IPe 4:12-16)? Podemos também sentir-nos confusos quanto ao sentido exato da frase: Também pôs a eternidade no coração do homem (3:11b). Eaton sugere que “eternidade” aqui deveria ser tomada em conjunto com eternamente em 3:14, e prossegue afirmando que “a eternidade das tratativas de Deus com a humanidade corresponde a algo dentro de nós: temos uma capacidade ou aptidão para as coisas eternas, preocupamo-nos com o futuro, desejamos compreender as coisas ‘do princípio até o fim’ e temos um senso de algo que transcende nossa situação imediata” (TOT). Wright comenta que esse senso de transcendência explica toda a procura humana por conhecimento, assim como toda a ciência, filosofia e teologia (EBC). Esse senso de eternidade em nosso coração também pode ter dado origem ao conceito de mortos que vivem, presente na maioria das tradições africanas. A verdade, entretanto, é que a única maneira possível de conhecer a eternidade é por meio de um relacionamento pessoal com o Deus eterno. Finalmente, a expressão “mesmo assim” (NVI) declara que os humanos não podem descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até o fim (3:11c). Isso é parte da frustração que apenas os seres humanos confinados à vida “debaixo do sol” experimentam. De acordo com Eaton: “Isso é o mais próximo que (o Pregador) chega da máxima de Agostinho: ‘Tu nos fizeste para ti mesmo, e nosso coração não descansa, enquanto não descansar em ti’” (TOT). Aqueles que se submetem a Deus são capazes de caminhar pela vida, um dia após o outro, e apreciá-la (3:12), embora não possam conhecer os planos de Deus “desde o principio até o fim”. A solução do Pregador para o fardo carregado pela humanidade autônoma é voltar-se para Deus e receber a satisfação da vida como uma dádiva que dele provém (3:12-13; 3:22; 5:18-20). Nada pode ser adicionado ao ou subtraído do que Deus fez (3:14-15); e o propósito de Deus naquilo que faz é para que os homens temam diante dele (3:14). A reverência ou temor a Deus reaparece em pontos cruciais no desenvolvimento do tema do Pregador (cf. 5:7; 7:18; 8:12-13; 12:13). Em 3:16 a 4:16, o escritor cita vários incidentes que parecem contradizer a ideia de que Deus tem um plano admirável e universal. Temos o que parece ser uma chocante reversão do modo divino de fazer as coisas — maldade remando no lugar do juízo e da justiça (3:16). Outro provérbio tigrínio da Eritréia descreve vividamente essa reversão quando afirma: Zehen grimbitosh mai n‘aqeb [“No tempo da inversão, as águas correm morro acima”, isto é, durante o tempo de calamidade, quando a verdadeira justi­ça é pervertida, tudo é virado de cabeça para baixo]. Mas, no devido tempo, esse mal será reparado pelo julgamento de Deus (3:17). Como as coisas se apresentam agora, Deus está dizendo aos seres humanos que, enquanto nos tiranizarmos uns aos outros, a morte demonstrará claramente que não somos melhores que os animais que perecem no pó (3:18-21). Esse é o resultado lógico de uma vida vivida unicamente “debaixo do sol”. Os debates se avolumam em tomo do argumento exato que o Pregador estaria apresentando nessa passagem. Ele não está afirmando que essa é a maneira em que Deus criou os humanos, nem que esse é o propósito eterno de Deus para a humanidade. Fomos criados à imagem de Deus (Gn 1:26-27). A singularidade humana está clara a partir da afirmação de que “formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente” (Gn 2:7), o que estabelece para sempre uma distinção entre humanos e animais. Eclesiastes concorda com o relato da criação, quando diz que o propósito eterno de Deus para a humanidade é singular: “E o pó volte à terra como era, e o espírito volte a Deus, que o deu” (12:7). Os humanos são como os animais (3:18); eles compartilham o mesmo destino dos animais porque todos têm o mesmo fôlego de vida, e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais (3:19), apenas porque se tomaram terrenos — esquecidos de que o controle e a posse de sua vida pertencem a Deus, assim como o propósito que ele tem para cada um deles. As declarações nos versículos 20-21 não brotam da crença, mas da descrença, a qual é resultado de uma vida vivida sem Deus. Para aqueles que creem, a resposta à pergunta Quem sabe? (3:21) é que aqueles que creem na revelação de Deus nas Escrituras sabem. Para aqueles que temem a Deus, embora sejam semelhantes aos animais, no sentido de que seu corpo retoma ao pó, seu destino final será com Deus (cf. 12:7; tb. Jo 14:23)

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