Estudo sobre Apocalipse 16:19-21

Apocalipse 16:19-21

Os v. 19-21 descrevem as consequências para o mundo das pessoas. E a grande cidade se dividiu em três partes. Pela imitação da posição das palavras no grego visamos evidenciar que, no sentido aqui subentendido, não existem várias “grandes” cidades. Pois ela é aquela que já aparece em Ap 11.8 como arquiinimiga da cidade de Deus, Jerusalém, a saber, como essência da glória humana sem Deus. É desnecessário citar seu nome. A próxima frase utiliza-o como algo óbvio: Babilônia (quanto à forma do nome, cf. Ap 17.5). Essa cidade, portanto, é dividida em três, por fendas causadas pelo terremoto (para essa expressão de juízo). A subdivisão de um reino noticia que ruiu seu poder (Ez 37.22; Dn 11.4; Mt 12.25).786 As referências numéricas aqui e em Ap 11.13 (um terço e um décimo) não são comparáveis, porque aparecem no contexto de diversas metáforas de juízo. No presente texto aparecem na figura da partição, lá na figura mais frequente da ruína. Essa última metáfora é utilizada de imediato pelo texto seguinte: e caíram (“ruíram”) as cidades das nações. A cultura mundial única, que se condensa na figura da Babilônia, concretiza-se em numerosas cidades da terra. Elas participam do esplendor e da derrocada da Babilônia.787 Na terra inteira a glória humana afunda no nada.

O evento constitui a execução de um juízo. E lembrou-se Deus da grande Babilônia (“Pois foi lembrada Babilônia, a grande cidade, diante de Deus” [tradução do autor]). Esta maneira bíblica de falar, de que Deus se lembra, é percebida a partir da perspectiva humana. Em um momento Deus parece ter-se esquecido de seus fiéis (At 10.31; Lc 1.54,72; 23.42), em outro momento, porém, dos que zombam dele, de sorte que sejam ímpios sem sofrer consequências (como aqui e, p. ex., no Sl 137.7). Lembramo-nos do sentido embutido em Ap 6.10: um caso urgente de juízo espera por condenação, contudo está como que perdido de vista. Finalmente ele entra na ordem do dia. Esse gongo soa para a cidade da Babilônia, para dar-lhe o cálice do vinho do furor da sua ira. Na tríplice forma de expressão reside uma veemência extrema. Agora a ira irrompe de forma irrestrita. Até aqui esse cálice repetidamente passou ao largo da Babilônia. Isso, no entanto, não aconteceu nem por indiferença nem fraqueza divinas perante o pecado (quanto à terminologia, cf. o comentário a Ap 14.8-10).


Todas as ilhas fugiram, e os montes não foram achados. Em Ap 6.14 já era plausível que esse par de conceitos não indicava somente catástrofes da natureza. Autoridades intramundanas que se erigiram contra Deus ou que foram edificadas contra Deus,788 desaparecem,789 “para que se saiba, até ao nascente do sol e até ao poente, que além de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro” (Is 45.6). Num relance, e definitivamente, Deus limpa a terra cheia da glória dos ídolos.

O último versículo do capítulo retorna ao paradigma dos flagelos egípcios. Também desabou do céu sobre os homens grande saraivada, com pedras que pesavam cerca de um talento (“mais de trinta quilos” [blh]). Também Êx 9.24,25 ressaltou o grande peso das pedras do granizo. Aqui elas são “tão pesadas como as pedras que se faziam para as catapultas”.790 Ez 38.22 fala de pedras de granizo que se precipitam como o bombardeio de um cerco militar. É desta maneira que a ira de Deus jorra sobre os “abrigos antiaéreos” da terra, do céu sobre os seres humanos.

Como se responde de baixo? E, por causa do flagelo da chuva de pedras, os homens blasfemaram de Deus, porquanto o seu flagelo (do granizo) era sobremodo grande. Este resultado evoca mais uma vez o refrão da impenitência (cf. o comentário a Ap 16.9,11). Quanto mais severos os juízos, tanto mais duros os corações. Por isso nunca será demasiada a cautela diante da esperança de que os juízos se evidenciariam como segundo caminho de salvação. Existe somente um único caminho de volta para Deus: “ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo 14.6).

Encerra-se, pois, a série das taças com o bombardeio de cima e a gritaria de baixo. Ela ainda não traz o momento em que, conforme Ap 15.4, tudo cai de joelhos e reconhece a soberania exclusiva de Deus. Porém, esta interrupção pouco antes do alvo justifica-se em função dos apêndices seguintes.



Notas:

786 Logo a Babilônia não está sendo poupada do juízo (contra Forck). Ap 14.8 e o cap. 18 anunciam o mesmo juízo mediante a metáfora da queda da Babilônia. – Será que a tripartição também se refere à trindade satânica do v. 13?

787 Diversas vezes o Ap apresenta essas descrições duplas de uma mesma realidade, a saber, sua coesão e imediatamente também suas muitas ramificações: a mulher e a descendência dela (Ap 12.17), a noiva e os convidados ao banquete (Ap 19.7,9).

788 Em Is 40.4 a planície amena constitui a essência da terra como Deus a planejou. Porém tudo o que a interrompe, em forma de depressão ou elevação, é considerado como símbolo da oposição a Deus e sofre o juízo.

789 Ap 6.14 falou do deslocamento dos montes e das ilhas. A presente visão intensifica o impacto: precisam bater em retirada e são como que varridas do mapa (cf. nota 192).

790 A comparação é proveniente de Josefo (citado em Hadorn).