Apocalipse 13 — Comentário Bíblico Online
Apocalipse 13 — Comentário Bíblico Online
Apocalipse 13
3. A Besta Subiu do Mar (13.1-10)
João' viu subir do mar uma besta (1). Swete escreve: “O mar é um símbolo apropriado da superfície agitada da humanidade não regenerada (cf. Is 57.20), e especialmente do caldeirão fervente da vida nacional e social, da qual surgiram os grandes movimentos históricos do mundo”.”
A conexão desse capítulo com o anterior (veja nota de rodapé 114) é descrita por Charles da seguinte maneira: “O dragão frustrado em sua tentativa de destruir o Messias e sua Comunidade, segue para a beira do mar e de lá convoca a besta (i.e., o Império Romano) para armá-lo com seu próprio poder”.116
A besta tinha sete cabeças e dez chifres. A mesma descrição é dada à “besta de cor escarlate” em 17.3. O significado desses itens é explicado em 17.9-12 (veja comentários lá). Sobre os chifres havia dez diademas (diadema, coroa real).
O vidente percebeu sobre as cabeças, um nome de blasfêmia. A primeira aplicação disso, a interpretação preterista (veja Int., “Interpretação”), seria para os títulos blasfemos assumidos pelos imperadores romanos dos dois primeiros séculos. Uma documentação abundante para isso foi achada nas cartas imperiais encontradas entre as inscrições em Éfeso. Diversas vezes, “filho de Deus” aparece com um nome de um imperador, enquanto se chamavam simplesmente de “Deus”. Nas suas moedas, Nero se chamava de “O Salvador do Mundo”. Podemos imaginar o choque que isso foi para os cristãos antigos, que admitiam esses títulos somente para Cristo. Diz-se que Domiciano, que era o imperador quando João escreveu o livro de Apocalipse, insistiu em ser chamado de “nosso Senhor e Deus”.117 Para os cristãos essa era uma blasfêmia dupla.
Barnes, representando a interpretação historicista, cita afirmações blasfemas feitas pelos papas.'“ Os futuristas entendem que o Anticristo vai conferir para si mesmo autoridade divina.
A besta que João viu era semelhante ao leopardo, e os seus pés, como os de urso, e a sua boca, como a de leão (2). A imagem é tirada de Daniel 7.3-7. Na visão de Daniel, quatro animais grandes subiam do mar. O primeiro era como um leão, o segundo era semelhante a um urso, o terceiro era semelhante a um leopardo, e o quarto era “terrível e espantoso e muito forte”.
A besta de Apocalipse une os traços dos três primeiros animais de Daniel em ordem inversa. Semelhantemente ao quarto animal, ela tem “dez pontas”. Os quatro animais de Daniel representam respectivamente O Império Babilônico, Medo-Persa, Grego e Romano. Parece que a besta de Apocalipse representa em primeiro lugar o Império Romano, que tinha as características dos três impérios anteriores, mas era mais “terrível e espantoso”. Não pode haver dúvida que para os primeiros leitores de João essa era a interpretação dada a essa passagem. Os imperadores perseguidores eram motivados por Satanás: e o dragão deu-lhe o seu poder, e o seu trono (thronon), e grande poderio.
O cenário histórico do primeiro século dessa passagem aparece de maneira mais impressionante no próximo versículo: E vi uma de suas cabeças como ferida de morte, e a sua chaga mortal foi curada; e toda a terra se maravilhou após a besta (3). Essa parece uma clara alusão ao chamado Nero redivivus (ressuscitado). Essa história é relatada por Swete:
Em junho de 68, Nero, perseguido pelos emissários do Senado, infligiu sobre si uma ferida, que foi a causa da sua morte. Seus restos mortais receberam um funeral público e foram mais tarde colocados no mausoléu de Augusto. Todavia, crescia nas províncias orientais do Império um rumor de que ele continuava vivo e estava escondido em algum lugar. Embusteiros, que afirmavam ser Nero, surgiram em 69 e 79 e mesmo em 88 ou 89 [...] A lenda da sobrevivência ou ressurreição de Nero formou-se na imaginação popular, e Dion Chrysostom [...] no fim do século escarnece disso como uma das loucuras da época. Entrementes, a ideia do retorno de Nero começou a tomar forma na imaginação de judeus e cristãos [...] A lenda foi usada por São João para representar o renascimento da política de perseguição de Nero por Domiciano.”
Isso, é claro, não descarta uma aplicação ao Anticristo no fim dos tempos. Mas, a primeira regra em interpretar qualquer profecia é observar o fundo histórico da sua época.
Todo o mundo adorava o dragão que deu à besta o seu poder (gr., “autoridade”; v. 4). Usando uma linguagem própria em relação a Deus (cf. Êx 15.11), o povo clamou: Quem é semelhante à besta? Quem poderá batalhar contra ela? Swete observa: “Não era a grandeza moral, mas a força bruta que ditava o respeito das províncias”.'
A besta continuou proferindo grandes coisas e blasfêmias (5). Em relação aos imperadores romanos, Swete diz: “A presunção de colocar nomes divinos em documentos públicos e inscrições era uma blasfêmia crescente e estabelecida”.'
A afirmação de que a besta continuava no poder por quarenta e dois meses equivalente a três anos e meio ou a mil duzentos e sessenta dias — é difícil de encaixar no período do Império Romano. Barnes, usando o princípio dia-ano, aplica isso aos mil duzentos e sessenta anos da supremacia papal (veja comentário em 11.2-3). Mas o cumprimento final da predição ocorrerá nos três anos e meio da Grande Tribulação.
A linguagem dos próximos dois versículos parece ir além do passado e presente, envolvendo também o futuro. No sentido mais completo, somente o Anticristo abrirá a boca em blasfêmias contra Deus, para blasfemar do seu nome, e do seu tabernáculo, e dos que habitam no céu (6). Ele particularmente terá poder (autoridade) sobre toda tribo, e língua, e nação (7). Somente dele podia se dizer: E adoraram-na todos os que habitam sobre a terra, esses cujos nomes não estão escritos no livro da vida do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo (8).
Se alguém tem ouvidos, ouça (9) é uma repetição de 2.7, 11, 17 (veja comentários ali). É uma exortação para tomar cuidado com a advertência que segue.
O versículo 10 contém uma afirmação epigramática obscura: Se alguém leva em cativeiro, em cativeiro irá (“Se alguém há de ir para o cativeiro, para o cativeiro irá”, NVI); se alguém matar à espada, necessário é que à espada seja morto. Swete sugere: “Encontramos aqui uma advertência contra qualquer tentativa por parte da Igreja de resistir aos seus perseguidores. Se um cristão é condenado ao exílio, como fora o caso de João, ele deve considerar o exílio como sua porção devida, e deve ir prontamente; se for sentenciado à morte, ele não deve erguer sua mão contra o tirano; ao fazê-lo será o mesmo que merecer o seu castigo”.' Dessa forma, os cristãos, mesmo debaixo de perseguição, podiam mostrar a paciência e a fé dos santos. Cf. Weymouth: “Aqui há uma oportunidade para os santos exercerem perseverança e exercitarem fé”.
4. A Besta na Terra (13.11-18)
João nos relata que viu subir da terra outra besta (11). Essa tinha dois chifres semelhantes aos de uni cordeiro. Assim, ela era menos assustadora em aparência do que a primeira besta. Carpenter faz esta aplicação geral: “Todos os que usam seu conhecimento, sua cultura, sua sabedoria, para ensinar as pessoas de que não há nada digno de adoração, salvo o que podem ver, tocar e provar, estão agindo de acordo com a segunda besta”.'
Mas embora se parecesse com um cordeiro, ela rugia como o dragão. Simcox diz: “Sem dúvida, a visão óbvia está certa. Essa besta se parece com Cristo, mas age como Satanás”.' Essa segunda besta parece que pode claramente ser identificada com o falso profeta (16.13; 19.20; 20.10).
E exerce todo o poder (autoridade) da primeira besta na sua presença e faz que a terra e os que nela habitam adorem a primeira besta (12). Ela faz grandes sinais, de maneira que até fogo faz descer do céu à terra, à vista dos homens (13), como foi o caso de Elias (1 Rs 18.38). E engana os que habitam na terra com sinais que lhe foi permitido que fizesse em presença da besta (14). Os israelitas foram advertidos a não aceitarem os falsos profetas que procurariam enganá-los ao realizar milagres (Dt 13.1-3). Ela instruiu os habitantes da terra que fizessem uma imagem à besta. Além do mais, foi-lhe concedido que desse espírito à imagem da besta, para que também a imagem da besta falasse e fizesse que fossem mortos todos os que não adorassem a imagem da besta (15). Somos lembrados da antiga ordem de adorar a imagem de ouro de Nabucodonosor (Dn 3.1-6).
Pessoas de todas as classes são obrigadas a receber um sinal na mão direita ou na testa (16). Isso é popularmente conhecido como “a marca da besta”. Toda tentativa de identificar isso com símbolos ou nomes atuais não passa de mera especulação que desonra a Palavra de Deus.
Com referência à palavra sinal (charagma), Simcox escreve que é “a marca de fogo colocada nos escravos para identificá-los; devotos pagãos às vezes recebiam esse tipo de sinal, marcando-os como a propriedade do seu deus”.1” Rist diz que esse sinal era “o termo técnico para o carimbo imperial em documentos oficiais”.1”
Essa “marca da besta” é o oposto do que lemos em 7.1. Ali “os servos do nosso Deus” são selados em suas testas, protegendo-os dos julgamentos divinos prestes a ser derramados sobre a terra.
Em 3 Macabeus 2.29, lemos que Ptolomeu Filopater (217 a.C.) ordenou que os judeus de Alexandria fossem marcados com a insígnia da folha da hera do deus Dionísio. Isso forma um paralelo impressionante.
Ninguém podia comprar ou vender, a não ser que tivesse o sinal, ou o nome da besta, ou o número do seu nome (17). Provavelmente, Swete está certo ao dizer que as duas últimas frases estão em aposição com o sinal. Da relação enigmática de nome e número, ele escreve: “Onde o provinciano pagão via somente o nome do imperador reinante, o cristão detectava um número místico com suas associações de maldade e crueldade”.'
Deve ser lembrado que no hebraico, grego e latim, cada letra do alfabeto tem um equivalente numérico. Assim, todos os nomes nessas três línguas representam números exatos. Então vem um dizer enigmático: Aqui há sabedoria (18). Esta e a expressão seguinte: Aquele que tem entendimento (lit.: “tendo uma mente”) são bastante parecidas com 17.9: “Aqui há sentido, que tem sabedoria”. Talvez essas expressões façam eco do que lemos em Daniel 12.10: “e nenhum dos ímpios entenderá, mas os sábios entenderão”. Um outro paralelo está em Efésios 1.17: “o espírito de sabedoria e de revelação”. Aqueles que tinham esse Espírito entenderiam o que João estava dizendo.
O número da besta [...] é número de homem — isto é: um número humano, ou um que “é calculado simplesmente por um método humano comum”, 128 designando valores numéricos às letras do nome.
O número 6661” tem recebido incontáveis explicações. Desconsiderando as fantasiosas, podemos dizer que provavelmente a referência originária foi a Nero. Na forma latina, as letras de Nerom totalizam 666. Sem a última letra, o número seria 616, que pode ser o motivo de alguns manuscritos apresentarem esse número menor (veja nota de rodapé 129). Uma terceira maneira de calcular a equivalência numérica de Nero é escrever Nero César com letras hebraicas — o hebraico tem apenas consoantes, não vogais. O valor total das letras hebraicas é 666.
Irineu (século II) achava que esse número significava “Teitan” e, dessa forma, representava um poder titânico. Ele também chamou atenção para o fato de o número se igualar a Lateinos nas letras gregas e dessa forma poderia representar o Império Romano (“Eles sendo latinos que agora reinam”).
Nos tempos modernos, o número tem sido calculado de forma variável para representar Maomé, Lutero, o papa Benedito IX, Napoleão, o imperador Guilherme (na Primeira Guerra Mundial), Hitler (na Segunda Guerra Mundial) e Mussolini (entre as duas guerras). Estudiosos mais sensatos da Bíblia o referem ao Anticristo, sem tentar identificar o arquiinimigo de Cristo com qualquer pessoa.
Queremos resumir as principais interpretações acerca das duas bestas desse capítulo. Os preteristas (veja Int., “Interpretação”) dizem que elas representam respectivamente o poder civil romano (o império) e o poder religioso romano (o sacerdócio pagão apoiando a adoração ao imperador, particularmente na província da Ásia). Os historicistas entendem tratar-se do Império Romano e a igreja católica romana (ou o papado), em que a igreja católica procura exercer toda a autoridade do império (cf. v. 12). Os futuristas identificam a primeira besta como o Anticristo, e a segunda como o falso profeta. Todas essas interpretações são importantes. Parece sábio não insistir que apenas uma interpretação seja válida, e que as outras estão erradas. Em certo sentido, todo o Apocalipse (exceto os capítulos 19-22) se aplica ao passado, presente e futuro.
Muitas vezes tem-se falado que o número 6 representa o homem como imperfeito, incompleto, em contraste com Cristo, que é representado pelo número 7, significando inteireza ou perfeição. O número 666 simplesmente multiplica triplamente essa ideia de que o homem é imperfeito.
À luz disso, a adoração à besta, cujo número é 666, adquire um significado adicional. Esta era terminará com a adoração ao homem, em vez da adoração a Deus. Essa corrente já está recebendo um grande apoio. No início do século 20, a teologia humanista, que nega a divindade de Jesus e elimina o sobrenatural da Bíblia, infestou a Alemanha e a Grã-Bretanha, chegando até os Estados Unidos. Duas Guerras Mundiais, que apresentaram todas as evidências de serem um julgamento apocalíptico, encontraram uma reação na forma da neo-ortodoxia. Mas ela tem sido amplamente substituída pelo neoliberalismo. O fruto final de tudo isso é o movimento chamado “Deus está morto”, que emergiu em 1965. Tendo rejeitado Deus do seu universo, o homem está agora adorando a si mesmo. O cenário está preparado para a adoração da besta.
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