Estudo sobre Apocalipse 9:20
Estudo sobre Apocalipse 9:20
Apocalipse 9:20
Os outros homens, aqueles que não foram mortos por esses flagelos, não se safaram mais uma vez porque eventualmente fossem melhores, mas para que se arrependessem. De forma idêntica, as pessoas mortas eram pecadores selecionados. Os sobreviventes, porém, não se arrependeram. “Tudo desaba em ruínas, menos o coração humano” (Kohlbrügge). “Busca incessantemente o descaminho”, declara Deus arrasado (Sl 95.10). O mesmo refrão chocante perpassa também Am 4 (v. 6,8-11). Recordemos também o coração cada vez mais endurecido de Faraó.
Eles não se afastam das obras das suas mãos. Na presente passagem o arrependimento é entendido de maneira negativa, como afastar-se da idolatria. A dimensão positiva que faz parte dele encontra-se no texto paralelo de Ap 16.9: “e dar glória a Deus”. Arrependimento é bandear-se da idolatria para o serviço a Deus, erguer-se da prostração diante dos ídolos e ajoelhar-se novamente perante Deus, deixando de adorar os demônios e os ídolos (cf. o comentário a Ap 2.14,20), de ouro, de prata, de cobre, de pedra e de pau, que nem podem ver, nem ouvir, nem andar. O objetivo dessa enumeração dos materiais com que são confeccionados as imagens dos ídolos (freqüente também no AT, p. ex., Dn 5.4), é despertar vigorosamente para a sobriedade: “Afinal, conscientizem-se de uma vez diante do que vocês estão ajoelhados!”
Retornamos agora ao conceito dos demônios, deixado de lado até aqui. O termo grego deveria ser traduzido por “o divino” (adjetivo do neutro, 63 vezes no NT), sendo usado entre os gregos para as divindades inferiores. O NT não designa com ele deuses autônomos, nem mesmo os de escalão inferior, mas serviçais de Satanás. São corporificações do satânico. Preservemos a forma neutra, no sentido de “algo demoníaco”.
Portanto, por um lado as pessoas se prostram diante de nulidades insignificantes, as imagens, e por outro, diante dos demônios, que para o NT de forma alguma são insignificantes. Como isso se coaduna?
Se a adoração dos gentios apenas tivesse acontecido diante de pau, pedra e bronze inofensivo, os profetas apenas teriam visto nela algo ridículo. De fato eles também se pronunciaram de maneira muito cômica sobre essa atitude (cf. vol. i, pág. 69-70). Contudo, não a ridicularizaram apenas. Pois, como pode acontecer que pessoas dotadas de razão tornam-se cativas desses ídolos? A impotência desses materiais forma uma terrível contradição com o poder desses cultos, e o aspecto ridículo do gesto entra em contradição com a seriedade bestial com que ele é praticado, obstinada e incorrigivelmente, sob os maiores sacrifícios de tempo, dinheiro, honra e saúde. É por isso que os profetas do AT não falam dessa prática em tom de alegre divertimento, mas com a mais acerba ironia. Essa ilusão persiste ao arrepio de todos os esclarecimentos, porque há forças satânicas, a saber, demônios.
A Bíblia considera de forma bem secular as coisas do presente mundo, ou seja, inclusive ídolos talhados ou fundidos, tendo-se tornado nisso uma das raízes do Iluminismo. Depois, porém, ela se separa do mero Iluminismo. Ela tem ciência de um fundo mental dessa veneração de imagens, ao qual não se pode dominar somente com a razão. Pelo contrário, essas realidades satânicas são capazes de manter em seu poder uma humanidade que de resto é tão esclarecida.
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Apocalipse 9:20