Estudo sobre Colossenses 4:14-17
Estudo sobre Colossenses 4:14-17
Todos nós conhecemos Lucas, autor do terceiro evangelho e de Atos dos Apóstolos, cujos trechos escritos na primeira pessoa do plural já evidenciam sua estreita ligação com Paulo. Isso é confirmado nesta missiva. Lucas é mencionado em 2Tm 4.11 como alguém que restou sozinho ao lado de Paulo, e brevemente em Fm 24 como “colaborador”. O presente versículo nos diz que ele era médico. Isso não deixa de ser importante. Paulo, portanto, tinha um médico em seu grupo mais próximo e entre seus colaboradores, e obviamente não defendia que Lucas tivesse de abandonar a profissão como pessoa realmente crente. Isso se reveste de relevância para a questão da atitude do cristão frente ao médico. Paulo acrescenta à designação “Lucas, o médico” ainda um cordial “o amado”.
“E Demas.” Paulo não diz nenhuma palavra adicional sobre ele, o que é digno de nota neste contexto em que todos os nomes recebem, de certa forma, alguma especificação. Será que naquela ocasião Paulo já estava um pouco insatisfeito com Demas? Será por isso que não podia, a bem da verdade, acrescentar algo mais amistoso? Em 2Tm 4.10 nos é dito que Demas não suportou ficar junto de Paulo. De forma alguma poderemos falar de “apostasia”. Afinal, Paulo sabe para onde Demas viajou: para Tessalônica, i. é, certamente foi para a igreja de lá. No entanto, ficar ao lado de Paulo parece perigoso demais para ele, está apegado à existência terrena. É precisamente esse o sentido da expressão: “passou a amar a era presente”.
Na sequência Paulo ainda encomenda saudações pessoais. Os laodicenses na verdade receberiam uma carta própria, mas as duas cidades ficavam tão próximas que deve ter ocorrido um intenso intercâmbio também entre as igrejas. É esse intercâmbio que Paulo visa fomentar, incumbindo-os de saudações uns aos outros. Essas saudações são endereçadas de maneira mais específica a uma pessoa, que reuniu sua família e sua igreja em uma comunidade caseira, de maneira análoga ao que fez Filemom em Colossos.
Paulo entregou várias cartas a Tíquico, que na verdade deveria visitar diversas igrejas na Ásia Menor. As cidades vizinhas Colossos e Laodiceia deverão trocar suas cartas entre si. Observamos aqui um pouco da forma como surgiu o “Novo Testamento”. Desde o começo as “Sagradas Escrituras”, isto é, o “AT”, haviam sido lidas na reunião da igreja para o culto, segundo o costume da sinagoga. Agora também um escrito apostólico que chega é lido oficialmente perante a igreja, e com certeza não apenas uma vez. Contudo, havia um interesse em ouvir também epístolas de Paulo que haviam sido dirigidas a igrejas vizinhas, e a carta dirigida à própria igreja era passada adiante de bom grado. As cartas emprestadas eram copiadas, de modo que estivessem sempre à mão. Aos poucos a leitura pública de trechos das cartas tornou-se costume nos cultos da igreja. Para isso as cartas eram colecionadas, e dentre elas escolhia-se determinado número que era usado concordemente por todas as igrejas. Assim o “Novo Testamento” tornou-se “Escritura” normativa para as igrejas ao lado do “Antigo Testamento”. O próprio Paulo tinha interesse em que inicialmente pelo menos igrejas próximas também fizessem uso da oportunidade de participar daquilo que ele havia apresentado a toda a comunidade cristã em uma missiva. Na realidade não havia uma “igreja” abrangente organizada. Apesar disso Paulo reconhecia em cada congregação local a igreja de Jesus, razão pela qual considerava as igrejas locais obviamente como uma unidade, como o “corpo do Cristo”. Expressou isso claramente sempre que endereçava uma carta. Por isso, em uma época que ainda não conhecia a imprensa, ele tenta fomentar a unidade e comunhão das igrejas por meio do intercâmbio das epístolas dirigidas às igrejas.
“E dizei a Arquipo…” Parece que a igreja em Colossos é numericamente tão pequena que ela pode dizer algo a Arquipo como um todo. Não sabemos mais nada sobre Arquipo. Ele também é mencionado em Fm 2. A partir da forma como ele é mencionado naquele texto, vários intérpretes tentaram concluir que ele era um filho de Filemom. Assumiu um “serviço” na igreja. Embora fosse tarefa de todos os membros da igreja “ensinar” e “exortar” (Cf. o comentário a Cl 3.16), toda a comunhão precisa, em longo prazo, de determinadas funções que precisam ser firmemente assumidas por algumas pessoas. Não é dito que incumbência Arquipo tinha. Mas deve ter sido uma função importante, talvez a de liderar no lugar de Epafras, que estava junto de Paulo (e conforme Fm 23 até mesmo estava preso com ele). Recebera essa função “no Senhor”. Já constatamos que a igreja é uma “equipe com um cabeça”. É o próprio cabeça que distribui os “serviços” em seu corpo, que são assumidos nele. Isso, porém, não exclui o engajamento de toda a vontade, a entrega pessoal e a responsabilidade própria, muito pelo contrário. O serviço deve e pode ser realizado plena e integralmente. É essa a exortação. Uma exortação assim não precisa nos levar a imaginar que Paulo tivesse recebido notícias negativas a respeito do trabalho de Arquipo. Quando um serviço demandava o constante empenho de toda a atenção e energia, ele não se realizava com facilidade e por si só. Não é vergonha nem sinal de insatisfação que a irmandade exorta o detentor do serviço de forma repetida, assim como Paulo também considerava necessária a constante admoestação em uma igreja desperta e viva, não tendo cessado, em Éfeso, “de exortar cada um sob lágrimas” (At 20.31). Neste momento Paulo não exerce a exortação pessoal e diretamente, mas remete-a com delicado tato à irmandade.
Até aqui Paulo ditou a carta. Agora ele assina de próprio punho com uma saudação (cf. 1Co 16.21; Gl 6.11; 2Ts 3.17; Fm 19). É a saudação do mártir, que, por causa de sua situação, ordenada pelo Senhor, sim, mas mesmo assim difícil, está muito preocupado em permanecer na comunhão e na intercessão da igreja: “Lembrai-vos das minhas algemas.” – Trata-se do breve desejo que engloba tudo, porque a graça do grande Jesus abarca tudo de que a igreja precisa: sabedoria, redenção, santificação, consumação. Foi exatamente isso que a carta evidenciou. Por isso: “A graça convosco!”