Estudo sobre Colossenses 1:28-29

Estudo sobre Colossenses 1:28-29


Paulo era “autorizado” para concretizar esse mistério. Ele fala da graça que lhe foi concedida, “de que seja um sacerdote do Cristo Jesus entre os gentios, no sagrado serviço do evangelho de Deus, para que os gentios se tornem uma oferenda, aprazível, santificada no Espírito Santo” (Rm 15.16). Isso não é diminuído pelo fato de que cronologicamente Pedro foi o primeiro a exercer esse serviço diante dos gentios. Isso já fora previamente ordenado assim por Deus: afinal, como Pedro, líder da igreja em Jerusalém e acostumado ao contexto de Israel, poderia ter reconhecido o trabalho de Paulo na hora crítica se o próprio Deus não o tivesse conduzido para dentro de uma casa gentia, mostrando-lhe ali que “não fazia distinção entre eles e nós” (At 15.9)? No caso de Pedro, porém, o fato se resume a uma ocasião isolada. O mistério não lhe foi desvendado nem entregue para “cumprimento”. Isso era prerrogativa de Paulo. Por meio dele e de seu trabalho missionário de fato a riqueza de glória nesse mistério de Deus se tornou manifesta a “seus santos”. Por isso também sublinha: “o qual nós anunciamos”. Nessa declaração emprega para “anunciar” um termo helenista que designa uma “proclamação oficial”. Cumpre recordar constantemente que nosso “pregar” atual, a mensagem edificante trazida dentro do templo, não corresponde ao que alguém como Paulo entendia por “anunciar”. O que o Deus vivo previu para seres humanos precisa ser solene e publicamente “proclamado” em todo o mundo, bem como perante os poderes celestiais e demoníacos invisíveis.

Ocorre que o trabalho de Paulo e seus companheiros – Paulo escreve “nós” – se dirige a “toda pessoa”. Evidentemente isso não significa que Paulo tenha literalmente dirigido a palavra a todas as pessoas. Constatamos o contrário na trajetória de trabalho de Paulo. Ele atua sob a condução do Espírito Santo, deixando totalmente de lado vastas regiões e fundando igrejas em lugares centrais, para que a partir deles a mensagem seja levada adiante para as terras adjacentes. “A toda pessoa” corresponde ao “a toda criatura” e tem o sentido de um princípio. Diante da admirável realidade “Cristo em vós” desfazem-se todas as diferenças humanas que de resto são tão decisivas. Afinal, a mais profunda diferença, estabelecida pelo próprio Deus, a diferença entre “Israel” e as “nações”, havia desaparecido pela nova ação de Deus ao convocar seu corpo. Agora Paulo podia exortar por princípio a “toda pessoa” e ensinar a “toda pessoa”. Para isso tinha à disposição toda a sabedoria necessária, toda percepção da vontade graciosa de Deus.

Ele leva “toda pessoa” ao alvo determinado, a saber, ao torná-la uma pessoa “em Cristo”. “Cristo em vós” é a “esperança da glória” integral e suficiente. Para chegar à glória ninguém precisa de mais nada além de Cristo. Por essa razão tanto Paulo quanto nós podemos “apresentar toda pessoa perfeita em Cristo”. Era o “cristianismo perfeito” que estava em questão em Colossos. Será que dele não faziam parte muitas e diversas coisas, tudo aquilo de que ainda seremos informados no próximo capítulo? É verdade, diz Paulo, também para mim importa que as pessoas não permaneçam inacabadas. Também eu não abandono em meias-verdades as pessoas com quem iniciei o contato. Devem tornar-se algo inteiro e perfeito. Por longo tempo a expressão “perfeito” foi deduzida dos cultos de mistérios daquela época. É verdade que ali teleios = “perfeito” é o termo técnico usado para designar o “iniciado” que passou por todos os ritos de consagração. Mas mesmo que Paulo tivesse adotado o termo deste contexto, utilizando-o na evangelização da população gentia, ele ainda não estaria afirmando nada decisivo. Todo evangelista procede dessa forma, e, não obstante, coloca um conteúdo bem diferente a partir do evangelho no termo-chave adotado. Somos gratos à pesquisa científica, que com grande esmero investigou as relações entre os conceitos do NT e a linguagem do mundo da época. Dessa forma aprendemos a ouvir muitas palavras de maneira completamente nova e mais precisa. No entanto, quando a pesquisa, na alegria por suas descobertas, tenta constatar dependência de conteúdo onde descobriu correlações linguísticas, ela está ultrapassando seus limites. A formação de nossa língua é um processo muito mais complicado e vivo! Um termo técnico como teleios nos mistérios era e continuava sendo concomitantemente uma palavra geral do linguajar cotidiano que Paulo e qualquer outra pessoa podiam usar livremente por iniciativa própria. Muito mais decisivo para ele e seu uso terminológico foi que ele encontrou a palavra “perfeito” em sua Bíblia grega [LXX]! Ali ela já havia incorporado simultaneamente a conotação da justiça ética, da pureza cultual e da sabedoria apocalíptica, como também pode ser depreendido na presente passagem. Contudo, totalidade e perfeição não residem nas múltiplas coisas que se aconselha em Colossos (e também repetidamente na história da igreja de Jesus). Elas residem tão somente nisso: “inteiramente em Cristo”.

E isso não é nenhuma ninharia! Assim como os Colossenses ignoravam a magnitude de Jesus quando perguntavam: “Somente Jesus – será que isso basta?”, assim eles ignoram o que significa “estar em Cristo” quando consideram isso apenas um estágio inicial que precisaria ser superado por uma condição cristã “mais perfeita”. Levar uma pessoa e conservá-la na situação de que de fato pense e fale, aja e repouse “perfeitamente”, integralmente “em Cristo” – quanto trabalho isso custa! Paulo falou da magnitude e glória do “cargo de administrador” que lhe fora dado. Vale para ele e para todos que foram colocados no serviço de Jesus: é maravilhoso levar pessoas até Jesus, notar Cristo vivendo nas pessoas e não precisar conhecer nenhuma limitação e barreira, nenhum “caso insolúvel”. Trata-se de algo maravilhoso poder realizar um trabalho que leve a resultados eternos. Porém: é verdadeiro trabalho, e não uma brincadeira! Não acontece automaticamente e em segundo plano. Custa ardente empenho e demanda pleno engajamento, além de uma luta incansável. Quem de fato se encontra em um trabalho assim com pessoas sabe a que Paulo se refere: “A isso se dirige meu trabalho, que realizo com lutas…”


No entanto, isso não é obra exclusiva do Espírito Santo? Não deve ser eficaz “somente a palavra”? É verdade, Paulo sabe disso também. Diferenciou severa e claramente a “sabedoria” com que trabalha de toda a sabedoria humana. Precisamente na presente passagem ele prossegue de imediato: “… segundo sua eficácia que opera em mim com poder.” Concretizar o mistério de Deus “Cristo em vós”, transformar pessoas de Colossos ou de qualquer outro local em “pessoas perfeitas em Cristo” – nenhum ser humano é capaz disso, nem mesmo alguém como Paulo. Disso somente o próprio Deus é capaz. Mas Paulo ignora totalmente aquela lógica insensata que conclui: Deus o faz, logo não preciso fazer nada, logo não devo fazer nada, a fim de não vir a prejudicar a honra de Deus de alguma forma! Paulo tem a lógica da fé viva: Deus opera com poder, ele atua energicamente em mim, logo devo e posso, logo tenho de atuar também eu com o máximo empenho possível! Ele não possui essa lógica apenas na teoria, sem medo do “sinergismo”. Acima de tudo, ele praticou essa lógica em sua vida sem par, de dedicação e labuta.