Estudo sobre 1 Coríntios 12:12-13
1 Coríntios 12:12-13
O “porque” no começo do novo bloco mostra que Paulo, em suas explanações sobre a atuação do Espírito e sobre a multiplicidade e unidade dos dons da graça, já visava a igreja e sua vida. Por que existem os muitos serviços diversificados que, não obstante, formam uma sólida unidade entre si no mesmo Espírito e sob o único Senhor? Pelo fato de que a igreja é o corpo uno com os muitos membros diferentes. “Porque, assim como o corpo é um e tem muitos membros, e todos os membros do corpo, sendo muitos, constituem um só corpo, assim também o Cristo.”
Paulo não está fazendo nenhuma afirmação a respeito do “mistério” da igreja, “desde os séculos oculto em Deus, que criou todas as coisas” e “foi revelado aos seus santos apóstolos e profetas, no Espírito” (Ef 3.4,5,9). Contudo, ainda assim o mistério se descortina diante dos coríntios quando ele não conclui a frase da maneira como poderíamos esperar: “assim também a igreja”, mas arrisca uma formulação ousada: “assim também o Cristo”. Ou seja, como “corpo”, a igreja pertence completamente ao Cristo, é parte constitutiva inseparável de Cristo, e sem a igreja “o Cristo” não pode mais ser imaginado. Não vive um Cristo acima das estrelas e uma igreja independente, que se encontra numa determinada relação de fé com esse Cristo, na terra. Cristo tampouco é apenas o “cabeça” de um corpo, ao qual o corpo se opõe de maneira totalmente autônoma. Pelo contrário, o Cristo se corporifica na igreja, pelo Espírito Santo habita nela como em seu santuário. O Cristo não está no mundo apenas como “anunciado” na “palavra”, mas vive fisicamente em sua igreja entre os humanos, fala por intermédio da igreja, ama por seu intermédio, salva por meio dela, auxilia e cura por meio dela. Que grandeza, mas também que responsabilidade está posta, assim, sobre a igreja! É o que precisam reconhecer justamente os coríntios, que em sua busca por liberdade individual “menosprezam a igreja de Deus” (1Co 11.22), fazem perecer irmãos sem muitos escrúpulos (1Co 8.11) e permitem que na construção da igreja entre “madeira, feno, palha, junco”. Também os dons de serviço do Espírito Santo apenas serão corretamente valorizados quando os coríntios tiverem em vista a essência da igreja com toda a sua magnitude.
É fácil comprovar que a figura do “corpo” foi muito usada na Antiguidade para a vida comunitária humana. Porém apesar disso Paulo a usa de uma forma singular. Para ele não continua sendo apenas uma “figura” útil. Pelo contrário, o corpo do Cristo foi reconhecido por Paulo como uma realidade plena, sendo exposto como tal aos coríntios.
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Como na passagem anterior, a preocupação de Paulo diante das tensões e cisões em Corinto é sobretudo a unidade desse corpo. Por isso a frase subsequente não visa responder à pergunta como chegamos a pertencer a esse corpo. Pelo contrário, enfatiza-se e destaca-se a unidade acima de toda a multiplicidade dos seres humanos dos quais a igreja é constituída. Em geral essa diversidade cria profundos contrastes e divisões no mundo. Naquele tempo a separação entre “judeu” e “grego” e “escravo” e “livre” era um obstáculo intransponível. Porém essas diferenças, que até então determinavam a tudo, perderam seu poder de separação quando judeus, gregos, escravos e livres passaram a formar a milagrosa constelação do corpo de Cristo. Em Cristo e em seu Espírito e sua vida judeus e gregos, escravos e livres agora estão mais próximos do que as pessoas jamais podem estar ligadas por quaisquer laços de raça, de nação, de parentesco de sangue, de cultura ou de amizade pessoal. Como isso se concretizou? Não através do esforço e do empenho das pessoas que lutaram por uma unidade dessas. A fim de excluir esse tipo de equívoco, Paulo recorre ao acontecimento do batismo, que unificou pessoas dos mais diferentes tipos unicamente a partir de Deus: “Pois, em um só Espírito, todos nós fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos nós foi dado beber de um só Espírito.” O “ter sido dado beber de um só Espírito” poderia – recordamos 1Co 10.4 – referir-se à ceia do Senhor. No entanto, nesse caso seria estranha a forma do pretérito em “a nós foi dado beber”. Por isso também essa declaração deve fazer parte do olhar lançado sobre o evento batismal. Paulo é tão real no entendimento do batismo como em sua concepção da ceia do Senhor. No batismo de fato acontece algo decisivo. No batismo processa-se uma atuação do Espírito com poder determinante para a vida.290 Dos muitos ela cria o corpo único, que está repleto do único Espírito e considera todos os seus membros como embebidos do mesmo Espírito.291
Índice:
1 Coríntios 12:12-13
Notas:
290 Precisamente por isso ninguém poderá ter a ousadia de aplicar seriamente essas afirmações também às multidões de pessoas batizadas quando bebês, apenas por tradição. Ou pelo menos temos de constatar com os escritos confessionais luteranos que “os batizados agiram contra a consciência, permitiram que os pecados dominassem em suas vidas e, por isso, entristeceram em si mesmos o Espírito Santo e o perderam” (Fórmula de Concórdia SD II, 69). Então, porém, a frase de Paulo igualmente não pode mais ser aplicada a eles.
291 Por sua natureza o Cristo pode possuir somente um único corpo. A unidade da igreja, portanto, não é um alvo que podemos perseguir e que podemos atingir de forma mais ou menos rápida por determinados esforços. A unidade da igreja é consistentemente um mero fato, justamente através do único Espírito do qual todos receberam para beber. Nós, porém, somos questionados se consideramos e reconhecemos esse fato ou não em todo o nosso comportamento. O seguidor de outra denominação pode ainda não ser membro do corpo de Cristo, e então posso ajudá-lo com amor cordial para que venha a sê-lo; ou ele o é de fato, então posso ver nele apenas plena e integralmente o irmão, com o qual estou essencialmente ligado no único corpo. Essa constatação simples e clara é o fundamento saudável do movimento da “Aliança Evangélica”. Nesse sentido a “Aliança” não é amadorismo, porém uma necessidade objetiva para cada cristão.