Estudo sobre 1 Coríntios 12:3-4

1 Coríntios 12:3-4

Entretanto, será que o judaísmo não era algo bem diferente? Nele não havia um Deus vivo que falava e, por isso, também um conhecimento claro e uma ordem consciente da vida? Diversos membros da igreja provavelmente já olhavam com atenção para o judaísmo no tempo em que eram gentios. Agora em muitas igrejas perguntava-se se não teriam de pertencer a Israel para poderem pertencer corretamente a Jesus, o Messias de Israel. Justamente pelo fato de que para os antigos “gentios” era difícil opinar nesse ponto, “por isso vos faço compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus afirma: ‘Maldição sobre Jesus’.” Também na sinagoga de Corinto ocorreram “blasfêmias” por ocasião da pregação de Paulo (At 18.6). Naquele tempo as exclamações “maldição sobre Jesus” ecoavam no recinto quando Paulo falava de Jesus. E também agora a sentença sobre Jesus está estabelecida em todas as sinagogas: Jesus é o blasfemador executado com razão no madeiro maldito. Isso, porém, constitui a evidência segura de que aqui não se pode encontrar o Espírito de Deus.272


Porque a atuação do Espírito leva exatamente no sentido oposto, conduzindo ao testemunho: “Senhor é Jesus.” Sim, “ninguém pode dizer: ‘Senhor é Jesus’, senão pelo Espírito Santo”. Durante muito tempo, ao longo dos séculos de tradição cristã, isso obviamente parecia não estar correto. Contudo justamente na atualidade começamos a compreendê-lo novamente. Nenhuma “pessoa sensata” é capaz de reconhecer que um artesão judaico, que acabou indefeso na cruz, insultado pelas pessoas e abandonado por Deus, deva ser o kyrios,273 o Senhor do universo, o Juiz de todos os bilhões de pessoas. “Senhor é Jesus” – naquele que afirma isso com absoluta convicção atua o Espírito Santo.274 Porque precisamente essa é, conforme Jo 16.14, a obra mais própria e precípua do Espírito: glorificar a Jesus, mostrar Jesus com toda a sua glória. Por intermédio do Espírito Santo formula-se a confissão básica do cristianismo: “Senhor é Jesus.” Todas as demais “confissões” e “escritos confessionais” no cristianismo são apenas elaborações mais detalhadas e explicações dessa confissão fundamental. Ao mesmo tempo, porém, toda pessoa que for capaz de proferir essa confissão e ver no ser humano Jesus o kyrios tem o privilégio de, com gratidão e alegria, ter certeza de que o Espírito habita e atua em seu coração. E a igreja que vive nessa confissão é o lugar da presença do Espírito Santo (1Co 3.16).275

Mas esse reconhecimento de Jesus como o kyrios não é o único efeito do Espírito. Também nessa questão não é correto estagnar no mero “reconhecer”, na mera teologia.276 Paulo sempre tem em vista a igreja e sua edificação. Em toda a carta sua preocupação não são pensamentos corretos por parte de cristãos isolados e solitários, mas a vida apropriada da igreja de Deus. Essa vida, porém, com toda a sua multiformidade e sua riqueza, é efeito e presente do Espírito.


Notas:
272 No tempo em que a teologia considerava unilateralmente o helenismo como contexto eficaz do primeiro cristianismo, pensava-se que era preciso entender a frase de Paulo como se na própria igreja pessoas tivessem exclamado “maldição sobre Jesus” durante o êxtase; agora Paulo estaria esclarecendo às igrejas que uma coisa assim não seria proveniente do Espírito Santo. Contudo, será que os próprios coríntios não sabiam disso? E será que alguém como Paulo, que por sua vez proferia a maldição sobre todos que não amavam a Jesus (1Co 16.22), não teria nada mais a dizer perante um desvio tão terrível na igreja do que uma serena frase explicativa? Além disso, uma “maldição” dessas, um “anátema”, é algo tão tipicamente judaico que nem sequer podia ser lembrado pelos gentios. Membros extáticos da igreja provenientes dos gentios podiam gritar de tudo, porém com toda a certeza não exclamariam “anátema Jesus”.

273 A esse respeito, cf. nota 190.

274 É por isso que concordávamos acima, p. 123, com Paulo que o evangelho como tal não pode ser “aprendido”.

275 Nesse ponto torna-se explícito que possuir o Espírito Santo não é um privilégio de alguns “grandes” no cristianismo, mas uma necessidade imprescindível para todo cristão comum. Unicamente por intermédio do Espírito Santo podemos ser realmente cristãos. Fazem parte da igreja de Jesus somente pessoas com o Espírito Santo, capazes de proferir verdadeiramente a inusitada confissão “Senhor é Jesus”.

276 Cf. acima, p. 29, o que foi exposto bem no começo da carta a respeito do termo “apóstolo”.