Estudo sobre 1 Coríntios 11:31-34
1 Coríntios 11:31-34
Eles mesmos têm diante dos olhos que o “juízo” que eles comem e bebem para si não é mera palavra ou até mera ameaça do apóstolo. Não, esse juízo está sendo executado: “Eis a razão por que há entre vós muitos fracos e doentes e não poucos que dormem.” Pelo fato de que na celebração indigna da ceia se trata de comer e beber, a culpa também tem um efeito físico, em fraqueza e enfermidade, sim, ela até leva a falecimentos. Mais uma vez fica claro todo o realismo na compreensão paulina da santa ceia.
Será que agora os membros da igreja em Corinto estão assustados? Será que buscam o que poderão fazer? Paulo tem para eles uma resposta clara: “Se nos julgássemos a nós mesmos (corretamente), não seríamos julgados.” Deus age segundo a misericordiosa regra de que ele não realiza mais o seu julgamento quando uma pessoa sinceramente tenta obter clareza sobre si mesma e profere a sentença contra si mesma.
Entretanto, há mais a dizer. Novamente constatamos em Paulo aquela peculiar guinada para o positivo, oriunda do fato de estar compenetrado do evangelho. Até mesmo aqueles em quem já se realizou um juízo, sobretudo aqueles “fracos e enfermos”, não precisam desesperar, porém podem ter a certeza: “Julgados, porém, pelo Senhor, somos disciplinados, para não sermos condenados junto com o mundo” [tradução do autor]. O sentido da frase não muda substancialmente quando combinamos as palavras “pelo Senhor” com “julgados” ou com “somos disciplinados”. O importante é que os juízos sobre o crente visam ser um auxílio genuíno, a fim de que escape do juízo sobre o mundo. Paulo sempre considerou esse juízo como terrivelmente sério, cf. Rm 2.5; 5.9; 1Ts 1.10. Nesse juízo sobre o mundo prevalece a ira. Se os juízos disciplinadores de Deus preservam o crente de “ser condenado junto com o mundo”, então ele poderá aceitar com grata submissão esses juízos disciplinadores.
Paulo conclui: “Assim, pois, irmãos meus, quando vos reunis para comer, esperai uns pelos outros.” Está claro que a pergunta incisiva do v. 22 não visa acabar com toda a maneira antiga de celebrar a ceia! Com certeza teria sido completamente inconcebível para Paulo e para uma igreja daquele tempo realizar a ceia do Senhor sem uma refeição conjunta! Tomar e partir o pão simplesmente fazia parte do começo de uma refeição. E somente “depois de comer” era possível oferecer o copo, de acordo com o exemplo de Jesus. No entanto, era possível evitar a pior degradação da ceia se pelo menos todos “esperassem uns pelos outros”. Era provável que a partilha equânime de alimentos acontecesse por si mesma se o abastado não estivesse pronto com sua refeição abundante quando o pobre chegava, já tarde, à reunião, após sua dura jornada de trabalho. No entanto, esperar não se torna problemático “quando alguém tem fome”? Pois bem, se essa for uma situação tão grave, que alguém não seja capaz de esperar, então “coma em casa, a fim de não vos reunirdes para a condenação”. Novamente ouve-se a dura palavra de juízo “condenação”, que paira sobre todo o trecho e que a rigor já estava sendo sugerida na frase introdutória, de que o encontro dos coríntios “não leva a favorecer, mas a prejudicar”. E mais uma vez Paulo aponta para o absurdo arrasador, de que o encontro de uma igreja de Jesus como tal, e ainda mais seu encontro para receber o corpo e sangue entregue para sua salvação, levam à sua condenação e perdição.
Índice:
Havia ainda muitos detalhes a regulamentar. Mas Paulo não quer fazê-lo por carta, à distância. Perguntas e dificuldades concretas precisam ser debatidas e decididas no local. “Quanto às demais coisas, eu as ordenarei quando for ter convosco.” Na forma grega da conjunção da frase reside uma certa indefinição. Paulo ainda não consegue prometer com certeza sua vinda próxima. No encerramento da carta ele informa mais detalhes a respeito (1Co 16.5-9).
No presente trecho sobre a celebração da santa ceia dois aspectos chamam nossa atenção. Até mesmo aqui na administração dos sacramentos falta o “ministério”. Paulo não dirige ao ou aos “ministros” a solicitação de tomar providências para acabar com os abusos e observar a ordem apropriada. Dirige-se à igreja como um todo, porque ela mesma, como um todo, realiza a celebração. Ao que parece não existe uma “liturgia” definida, com a recitação das palavras da instituição como centro. Do contrário o apóstolo não teria tido a necessidade de anotar em detalhe a instituição da ceia, mas teria bastado lembrar a igreja de seu cabedal litúrgico diariamente repetido.
Não podemos elaborar aqui o que todo esse trecho significa para a igreja de hoje e para sua celebração da ceia do Senhor. Há, obviamente, uma certeza, de que a celebração eclesiástica do “sacramento do altar”, que somente pode ser distribuída por ministros ordenados ou consagrados, não é a única maneira possível ou válida de celebrar a ceia de forma condizente com sua instituição. Cabe perguntar seriamente se não nos afastamos demais daquilo que na presente passagem Paulo afirma sobre a ceia do Senhor e sua realização correta. Contudo, a celebração da santa ceia está indissoluvelmente ligada com toda forma da atual “vida eclesial”. Não é possível empreender um retorno ao Novo Testamento num ponto isolado. Se pelas enormes mudanças da época Deus fizer com que a igreja de Jesus torne a ser como no primeiro cristianismo, sua celebração da ceia por si mesma também se aproximará do quadro do Novo Testamento. Foi isso que Lutero já pensou no famoso prefácio à “missa alemã”. Na multidão daqueles “que com seriedade desejam ser cristãos” existiria, em lugar de “muita cantoria”, “uma bela maneira sucinta de celebrar o sacramento”. O “sacramento do altar” tornaria a ser a refeição da igreja na presença de seu Senhor, na qual todos anunciam a morte do Senhor, até que ele venha.