Estudo sobre Hebreus 13:9-10
Estudo sobre Hebreus 13:9-10
Não vos deixeis envolver por doutrinas várias e estranhas450! Uma importante característica do cristão imaturo, sem firmeza, é a facilidade com que se deixa influenciar por doutrinas errôneas (Ef 4.14). Em Hb o apóstolo transmitiu “alimento sólido” para cristãos amadurecidos. Os membros da igreja devem agora arcar com as consequências da instrução obtida. A pureza e limpidez do relacionamento pessoal com Cristo e a conduta irrepreensível do cristão são importantes, porém a mesma importância tem uma formação bíblica inequívoca, que se orienta exclusivamente pela palavra de Deus. Toda doutrina falsa traz consequências inevitáveis também para a vida pessoal dos que a adotam e divulgam. A palavra do Senhor permanece eternamente a mesma. Contudo, o constante surgimento de pessoas que proclamam doutrinas “várias e estranhas”, i. é, incorretas (At 20.30), faz parte dos fenômenos penosos no âmbito da igreja. Por isto, para todos os cristãos valem as exortações da Bíblia, de perseverarem na palavra de Deus confiável, na sã doutrina. Estas exortações culminam na insistente súplica do apóstolo Paulo: “Tem cuidado da doutrina!” (cf. 1Tm 4.16; 6.3; 2Tm 1.13; Tt 1.9; 2.1)451. Em última análise, os maus poderes intelectuais, que tentam desenvolver toda a sua cativante e convincente força a fim de pressionar os fiéis para longe da “simplicidade em Cristo” (2Co 11.3), arrastando-os à perdição, estão por trás de cada heresia. “O primeiro cristianismo conhece o poder de movimentos intelectuais estranhos, mas adverte a igreja para que não se deixe levar por eles”452. Somente desta maneira podemos compreender corretamente a advertência apostólica: “Se alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis as boas-vindas. Porquanto aquele que lhe dá boas-vindas faz-se cúmplice das suas obras más” (2Jo 10,11). Em vários lugares os hereges devem ter pregado suas novas descobertas e anunciado “mandamentos alimentares” como propiciadores de salvação. Não somente os cristãos hebreus, também as igrejas gentílico-cristãs deparavam-se com o mesmo problema453. É contra isto que o apóstolo se posiciona, com veemência: o que vale é estar o coração confirmado com graça e não com alimentos, pois nunca tiveram proveito os que com isto se preocuparam. A firmeza de fé do coração humano não se adquire pela prática de uma devoção legalista exterior, mas como efeito da graça de Deus.454 Quem deixa sua vida ser enraizada na proclamação de Jesus Cristo também será firmado pela graça de Deus (1Co 1.6). O coração de quem aceita a alegre mensagem da salvação em Jesus Cristo está imerso no invisível e vindouro, na realidade do próprio Deus, de maneira que vive e cresce a partir desta base. Assim é que se forma a solidez da fé, que se apega invariavelmente a Deus (cf. Js 14. 8,9,14).
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Mais uma vez resplandece toda a magnitude e glória da nova aliança. Os povos de Deus da antiga e o da nova aliança possuem uma ordem de culto. Na igreja vigora a nova ordem melhor de sacrifícios. O serviço sacrificial do AT era um serviço terreno. O serviço da igreja tem característica celestial e aponta para o mundo eterno. Assim como o serviço celestial de Jesus se mostra diferente – quase que oposto – do serviço dos sacerdotes na terra (Hb 8.4,5), assim também ocorre com a participação no sacrifício de Jesus. Quem encontrou a salvação em Cristo, não pode mais procurar receber sua redenção pela observação de ordens sacrificiais do at. O tempo de salvação da antiga aliança chegou ao fim, teve início o tempo salutar da nova aliança.
É precisamente o v. 10 que parece fornecer vários elementos para esclarecer a pergunta sobre quem, afinal, poderiam ter sido os destinatários da presente carta. Será que o texto não sugere que pensemos num grupo dentro de uma igreja, possivelmente nos sacerdotes que chegaram à fé em Jerusalém (At 6.7) e que depois da perseguição após o apedrejamento de Estêvão haviam fugido para Antioquia (At 8.1; 11.19)455? Neste contexto seria mais fácil de entender a alusão ao exercício do serviço sacerdotal: Possuímos um altar do qual não têm direito de comer os que ministram no tabernáculo. Neste caso, o grupo de sacerdotes de Jerusalém estaria contraposto à igreja. Contra esta hipótese cumpre alegar o seguinte: é muito provável que Hb tenha sido redigida somente depois da destruição de Jerusalém. Naquele tempo não havia mais culto com sacrifícios. Fora de Jerusalém, já antes da destruição da cidade não existia nenhuma possibilidade de sacrifícios conforme a lei do at. Entretanto, não é por acaso que também no presente versículo o autor não fale do templo, mas da “tenda” do tabernáculo. Ele está pensando, portanto, novamente na ordem sacerdotal original. Em decorrência podemos supor que se trata de um pensamento teológico fundamental na sua asserção, mas que não visa principalmente as circunstâncias de sua época. Ele se serve de uma comparação figurada.
Índice:
Hebreus 13:9-10
Notas:
450 A palavra grega paraphéresthai significa “deixar-se pressionar para longe” e ocorre somente neste versículo em Hb.
451 Bíblia de Berleburg, pág 84 “Por isto, não se deixem desviar por todo tipo de doutrina, que traz uma aparência de sabedoria e verdade. Isto é usado como pretexto, porque tem repercussão quando as pessoas ouvem um ensinamento. Não se deixem envolver, seduzir, e agitar em círculo como que por um vento. O ser humano é muito inconstante e não se volta ao cerne da questão, mas permanece rodeando exteriormente, onde faz muito alarde. E o inimigo procura introduzir toda variedade de ideias, para que haja uma confusão multicor. É assim que acontecia com os hebreus: apareceram muitos, e cada um deles pretendia trazer uma raridade. Como Cristo sabia muito bem disso, declarou em sua despedida que os fiéis não deveriam se deixar dispersar. Isto é singularmente necessário em universidades, onde ocorre uma incessante feira. Quem não se ativer a uma certeza, dificilmente consegue preservar-se firme.”
452 O. Michel, pág 338, nota 3.
453 Cf Cl 2.16-22, e o comentário WStB, Kolosser, pág 234-235. No mesmo sentido deve ser entendida a afirmação do apóstolo Paulo em 1Co 8.8: “Não é a comida que nos tornará agradáveis perante Deus. Não temos desvantagem quando não comemos, nem vantagem quando comemos.”
454 O jejum voluntário, conforme a instrução de Jesus em Mt 6.16-18, é algo totalmente diferente e não está sob o foco desta palavra apostólica; cf. Mateus, CE pág 108-109.
455 Cf qi 2 “Os destinatários” e, sobre isto, a nota 18.