Comentário de João Calvino: João 1:6

Havia um homem. O Evangelista agora inicia seu discurso sobre a maneira em que o Filho de Deus foi manifestado na carne; e para que ninguém possa duvidar de que Cristo é o Filho eterno de Deus, ele relata que Cristo foi anunciado por João, o Batista, como seu arauto. Pois não apenas Cristo se mostrou à vista dos homens, mas ele escolheu ser feito manifesto pelo testemunho de doutrina de João; ou, antes, Deus o Pai enviou essa testemunha diante de Cristo, para que eles pudessem mais abertamente receber a salvação oferecida por ele.

Mas isso pode, à primeira vista, parece ridículo que Cristo devesse receber o testemunho de uma outra pessoa, como se ele precisasse disso; enquanto que, pelo contrário, ele declarou que ele não buscava o testemunho de homens, (João 5:34.) A resposta é fácil e óbvia, que essa testemunha foi designada, não por causa de Cristo, mas por nossa causa. Se fosse objetado que o testemunho de homem é fraco de mais para provar que Cristo é o Filho de Deus, é fácil também da mesma forma replicar que o Batista não é apresentado como uma testemunha particular, mas como alguém que, tendo recebido autoridade de Deus, sustentou o caráter antes de um anjo, do que de um homem. Concordemente, ele recebeu elogios não de suas próprias virtudes, mas por essa circunstância singular, de que ele era um embaixador de Deus. Nem é isso uma variação do fato de que a pregação do evangelho foi concedida a Cristo, para que ele pudesse ser uma testemunha para si mesmo; pois o desígno contemplado pela pregação de João era que os homens pudessem dar atenção a doutrina e a pregação de Cristo

Enviado por Deus. Ele não diz isso com o propósito de confirmar o batismo de João, mas faz apenas uma menção. Essas circunstâncias não são suficientes para produzir certeza, visto que muitos atuam de seus próprios relatos e se gabam que Deus o enviou; mas o Evangelista, pretendendo mais tarde falar mais plenamente sobre essa testemunha, considera como o suficiente, por enquanto, dizer em uma só palavra que João veio pela ordem de Deus. Nós veremos depois como ele mesmo afirma que Deus é o autor de seu ministério. Nós devemos agora juntar – o que eu notei à princípio – aquilo que é afirmado sobre João é exigido de todos os introdutores da Igreja, de que eles devem ser chamados por Deus; de forma que a autoridade de ensinar não possa se fundada em nenhum outro a não ser apenas em Deus.

Cujo nome era João. Ele afirma o nome, não apenas com o proposto de apontar o homem, mas porque foi dado a ele de acordo com o que ele realmente era. Não há razão alguma para duvidar que o Senhor se referia ao seu ofício do qual ele designou João, quando foi dito pelo anjo de que ele devia ser chamado assim, para que por esses meios todos pudessem reconhecê-lo como sendo o arauto da graça divina.[1]Pois o nome יהוחנן (Hebr.: Jehohannan) pode ser tomado no significado passivo, e pode, portanto, se referir a pessoa, como denotando que João era aceitável a Deus, ainda assim, da minha parte, eu voluntariamente estendo ao benefício que o outros iriam derivar dele.[2]


Fonte: Comentário do Evangelho de João, por João Calvino
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Notas:
[1] “Heraut et ambassade de la grace de Dieu;” — “Arauto e embaixador da graça de Deus.”
[2] Pois o significado de João, derivado do hebraico Jehohannan, o leitor pode consultar o Commentary on the Harmony of the Three Evangelists, vol. i. page 15, de nosso autor — Ed.