Estudo sobre Atos 1:11-12

Estudo sobre Atos 1:11-12


Esses mensageiros do mundo celestial conhecem os apóstolos como “galileus”. Portanto, também os anjos não estão a distâncias siderais de nós, mas estão tão próximos que podem nos ver e ouvir. Podem ter parte conosco e com nossa vida. Consequentemente, também compreendem que os discípulos ficam olhando, em parte maravilhados, em parte sofridos, em parte alegres, na direção para a qual o Senhor amado foi. Contudo, o mundo da Bíblia é completamente não-sentimental. O amor de Deus não tolera que nos detenhamos em nós mesmos e em nossos sentimentos.21 Não há tempo para ficar parados e seguir o Senhor com o olhar. Por isso os anjos corrigem os discípulos e voltam-nos em direção do tempo presente, testemunhando-lhes o futuro: Jesus voltará! Não é uma despedida para sempre. Da mesma maneira que Jesus agora “saiu” do âmbito terreno para o mundo divino completamente diferente, assim Ele retornará, ingressando novamente na esfera da atuação visível sobre esta terra. É por isso que o NT fala da “parusia”, da nova “presença” de Jesus, ou de sua nova “revelação”.22 Também dessa forma todas as concepções “místicas” são refutadas.

Da palavra dos anjos, Lucas salientou singularmente o “assim, do mesmo modo”. O que isso significa? Nos dias da Páscoa a glória de Jesus ainda estava oculta de modo peculiar. Ele nem mesmo foi reconhecido imediatamente, logo não andava pela região com magnitude esplendorosa. Mas agora, na ascensão, é “exaltado”, liberto dos limites terrenais, e dotado da glória de Deus. E da mesma maneira “todos os povos da terra… verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória” (Mt 24.30; Lc 21.27). Isso acontecerá da mesma maneira real e visível como sua saída para o céu.

O fato de Lucas libertar a igreja de uma falsa “expectativa imediata” da parusia e dirigi-la para sua incumbência neste tempo e neste mundo foi classificado como realização teológica e eclesial peculiar de Lucas. Nisso há algo correto. Na palavra dos anjos falta qualquer referência cronológica sobre a nova revelação do Senhor Jesus, qualquer data exata. Contudo, diante disso não se deve esquecer o seguinte: Lucas não quis colocar a expectativa da primeira igreja pelo Senhor vindouro de lado. Com toda a força do impacto de uma mensagem da boca de emissários celestiais, Lucas principia seu livro com Maran atha, nosso Senhor vem! É para essa verdade que tudo o que agora precisa ser feito pela igreja, por meio de seus apóstolos, em Jerusalém e até os confins da terra, continua direcionado.


A palavra dos anjos faz parte da instrução que os apóstolos receberam do próprio Jesus diretamente antes de sua despedida. Os apóstolos compreendem a situação! Compreendem o que Jesus sintetizou na sucinta palavra: “Negociai até que eu volte!” (Lc 19.13). Não é hora de ficar olhando com saudades ou admiração enquanto Jesus se afasta. Tão logo vier o Espírito, começará o grande trabalho em Jerusalém. Nesse trabalho eles sentirão que o Senhor invisível age com poder (At 2.47). Todo o trabalho, porém, está debaixo da responsabilidade do Senhor, que no Seu dia novamente estará “presente” e “visível” e examinará nossa obra pelo fogo (2Co 5.10; 3.11ss). É por isso que, obedientes, eles tiram as conclusões corretas. Não solicitam aos anjos mais esclarecimentos escatológicos, mas “voltaram para Jerusalém”.

Agora também é mencionado o local da ascensão: o monte que traz o nome de “Jardim das Oliveiras” ou “Horto das Oliveiras” e que conhecemos como “Monte das Oliveiras”. Bem diante deles, “distante como a jornada de um sábado”,23 está a cidade, à qual retornam, rumo à emocionante história de sua vida, com seus altos e baixos, com os acontecimentos esperados e inesperados que Lucas deseja relatar.

Notas:
21 Cf. Êx 14.15; 1Rs 9.5,7; 19.13-15; Fp 1.12; At 14.19-21; 1Ts 2.2.

22 Enquanto em geral empregamos a palavra “retorno”, que praticamente não ocorre no NT – mesmo na presente passagem consta simplesmente “vir” e não “retornar” – o termo “parusia” ocorre em 1Co 15.23; 1Ts 2.19; 3.13; 5.23; 2Ts 2.1,8; Tg 5.7. É significativo que Paulo é capaz de falar também de uma “parusia” do anticristo: o anticristo, porém, não “volta”, mas está misteriosamente presente e começa sua atuação no mundo. A expressão “revelação” encontra-se em 1Co 1.7; 2Ts 1.7; 1Pe 1.7,13; 4.13; Lc 17.30; e o termo “aparecer” em Cl 3.4; Hb 9.26; 1Pe 5.4.

23 A “jornada de um sábado” é a distância que era permitido percorrer no sábado sem descumprir o mandamento de Êx 16.29. Essa distância foi fixada pelos escribas em dois mil côvados, isto é, 1 km. Quando Lucas 24.50 cita Betânia, que se situa a leste do Monte das Oliveiras, a 2,5 km de Jerusalém, não podemos formar a noção de que a ascensão de Jesus aconteceu no local mencionado. Indica-se a direção do caminho: “Na direção de Betânia”. Esse, porém, era o caminho para o Monte das Oliveiras.