Estudo sobre Gálatas 6:13-14
Estudo sobre Gálatas 6:13-14
Paulo não se impressiona com a fidelidade à lei ostentada pelos judaístas. Pois nem mesmo aqueles que se deixam circuncidar guardam a lei. Em discursos inflamados exigem dos gálatas que aceitem cumprir o mandamento da circuncisão de conformidade com a lei de Moisés. Contudo, como teólogo formado, Paulo sabe que o sentido da circuncisão não é apenas acolhida de um só preceito, mas da lei toda, um compromisso simbólico para a fidelidade à lei propriamente dita. Por isso ele põe o dedo na moleira de um grande absurdo deles: Confissão à lei sem obediência à lei. Dessa maneira ele nega a esses incansáveis irmãos viajantes a sinceridade espiritual. Seu verdadeiro interesse ele não o vê localizado no serviço a Deus. Onde estaria, então? Inflexivelmente o apóstolo prossegue: antes, querem que vos circuncideis, para se gloriarem na vossa carne (o prepúcio), a saber, perante o judaísmo de Jerusalém. Obviamente, Paulo não está se arrogando com essa frase o direito de reproduzir a versão pessoal deles sobre os seus motivos. Tampouco declara que esse objetivo fosse flagrante neles, visível para cada um. Contudo, tem a coragem de chamar as coisas pelo nome, sem rodeios e secamente. Por que se encontram tão incansáveis a caminho, gritando “Circuncisão! Circuncisão!”? Para, chegados em casa, poderem exibir orgulhosamente prepúcios, como o índio exibe seus escalpos na cintura, a fim de trazerem satisfação a seus mandantes. Contudo, será que isso justifica o esforço deles e as tensões graves nas igrejas, e será que os anjos do céu realmente se alegrarão com esses sucessos? Não seria isso uma “jactância maligna” (cf. Tg 4.16)?
Paulo contrapõe a esse “gloriar-se maligno” dos judaístas o gloriar-se cristão. Mas longe esteja de mim gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo. Como em Gl 2.20, ele fala novamente de forma individual para a sua pessoa, mas tem consciência do caráter exemplar de sua conduta. O que ele diz sobre si pode e deve tornar-se também a declaração dos seus leitores sobre si mesmos.
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O “gloriar-se” pertence ao âmbito da pose do vencedor. Conhecemos poses de vencedores, p. ex., depois de uma eleição política ou uma competição esportiva. Ou abrem-se as portas de um tribunal e a pessoa declarada inocente se apresenta à imprensa que esperava. A pessoa está radiante, ergue o braço, faz o sinal de vitória. Os que estão em redor são convidados: Parabenizem-me! Em contraposição, o que foi vencido nada mais quer que esconder-se. Abatido e envergonhado, ele fica à margem. Abana a cabeça sobre si próprio e ainda tem de tolerar a zombaria das pessoas. Essa é, aproximadamente, a situação que está na base do gloriar-se na Bíblia. Pressupõe-se uma pessoa para a qual a luta era pelo ser ou não ser, e que foi vitoriosa. No presente texto Paulo faz seu gesto significativo de triunfo: Coloca a mão sobre a cruz de Cristo. Por que o faz de maneira tão decidida sobre essa cruz? Na cruz a supremacia de Deus interferiu em nossa existência ameaçada de poderes de perdição (Rm 1.16; 1Co 1.18). Ali Paulo ganhou o Deus-por-mim e com isso, tudo (Rm 8.31,32). Disso ele não quer mais abrir mão por nada no mundo. Por essa razão, a cruz constitui para ele um ponto indiscutível que não lhe permite ter considerações políticas como fazem os judaístas.
14b Paulo desenvolve o que a cruz de Cristo significa para o seu relacionamento com o resto do mundo, sendo que “mundo” abrange tudo o que está fora da ordem e da lógica de Cristo e, em decorrência, também a lei e a circuncisão. Pela qual (pela cruz) o mundo está crucificado para mim, e eu, para o mundo. Com auxílio da forma passiva “está crucificado para mim” Paulo aponta para uma atuação do Deus onipotente. Na Sexta-Feira da Paixão Deus inverteu a situação de tal maneira que para Paulo o mundo aparece como acusado, refutado, condenado e executado. Com isso, no entanto, também caducaram os direitos do mundo sobre Paulo. Ele não tem mais nada a comandá-lo, e Paulo não está mais comprometido com nenhum de seus conceitos, critérios, normas e demandas. Como comparação: Quando uma parte de um país é desmembrada de um território, toda uma rede de dependências se torna obsoleta. Assim Paulo foi desconectado, por meio da cruz de Cristo, da rede de relações anterior e transferido para uma nova rede, na esfera do poder e da bênção de Cristo (Cl 1.13). É de acordo com Cristo que ele agora se porta. Naturalmente, o lado oposto não reconheceu essa realidade. No contrafluxo, o mundo o declarou deserdado: e eu, para o mundo. O mundo o persegue (v. 17; cf. Gl 4.29; 5.11). O sentido do v. 14b, portanto, reside na referência a um desenlace legal recíproco (cf. o exposto sobre Gl 2.19). O mundo não foi executado e morto, p. ex., no sentido de que ele não existisse mais para Paulo. Contudo, a relação e por isso também a atitude entre ambos é fundamentalmente diferente.
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