Estudo sobre Apocalipse 3:2-3

Apocalipse 3:2-3

João torna-se, pois, um profeta, mas permanece na terra. Para ele o céu não foi aberto para que entre, porém apenas para que ouça e veja o que há dentro dele. Eu te mostrarei o que tem de acontecer depois destas coisas. Imediatamente, eu me achei em espírito (“Num instante fui dominado pelo Espírito de Deus” [Bíblia na Linguagem de Hoje]). Parece que este “imediatamente” estabelece a concomitância com o ressoar da potente voz. Os fatos que têm de ser relatados um após o outro – a visão e audição de João, o chamado do anjo – são posteriormente sincronizados por João.

Das 60 passagens do NT acerca do trono 47 encontram-se no Apocalipse, das quais nada menos de doze no presente capítulo. Todos os detalhes estão orientados com vistas ao trono: sobre o trono, em redor do trono, a partir do trono, diante do trono ou no meio dele. Amplo e espaçoso, ele “paira” naquele lugar (cf. o exposto sobre Ap 3.21). Um símbolo da soberania inabalável de Deus: e eis armado no céu um trono, e, no trono, alguém Entronizado (“sentado”). Estar sentado constitui no Oriente uma evidência de dignidade máxima, o que fornece um motivo para não traduzirmos literalmente o vocábulo, mas falarmos desde logo do Entronizado. Este “Entronizado” já aparece em Is 6 e Ez 1, porém cada vez complementado por uma especificação maior. No presente texto e também nos v. 3,9,10, a reverência teme acrescentar a mínima palavrinha. Somente os louvores nos v. 8,11 mencionam a “Deus”.

Os versículos subsequentes não acabam com esta reserva. Somente o manto de luz do entronizado torna-se objeto da descrição. Em Ap 5.1 uma mão estende-se para fora do esplendor ofuscante. Porém Deus mesmo não pode ser visto em tamanha luz. Em decorrência, nem mesmo aqui se quebra a afirmação de Jo 1.18: “Ninguém jamais viu a Deus”. Uma percepção, porém, o vidente apreendeu de maneira indelével: Deus é luz de todos os lados, por dentro e por fora (cf. 1Jo 1.5). Ele representa um não eterno à escuridão caótica, bem como um sim eterno à vida e à justiça. Dentre a plenitude de luz três tonalidades de cor fixam-se na memória de João: e o Entronizado (era) semelhante, no aspecto, a pedra de jaspe e de sardônio, e, ao redor do trono, há um (resplendor de) arco-íris semelhante, no aspecto, a esmeralda. A diferença é leve mas significativa se o Entronizado é comparado com as jóias ou apenas com o aspecto de pedras preciosas, ou seja, com sua respectiva aparência no que se refere ao seu efeito de cor. No segundo caso, a comparação é cautelosamente restrita e mantida longe de definições da essência divina (cf. também nota 153).

O jaspe é o nome de uma pedra semipreciosa pouco valiosa, transparente, azulada e esverdeada. Para o Apocalipse, os textos de Ap 21.11,18,19 fornecem referenciais bem diferentes, segundo os quais se trata de uma luz branca reluzente. Nela o jaspe constitui a pedra mais preciosa (Ap 21.19), imagem da glória de luz da nova Jerusalém com uma intensidade notável, translúcida e clara como cristal (Ap 21.18). O sardônio (karneol), denominada segundo Sardes, local em que é encontrada, é imaginada como reluzindo em tons avermelhados, em concordância com sua designação hebraica. Manifestação de Deus e pedra de fogo formam uma unidade (p. ex., Ez 1.27; aqui no v. 5). Estas duas comparações, portanto, descrevem uma plenitude de luz branca e avermelhada. Que contribuição traz a terceira definição?

Será que devemos acompanhar a maioria dos intérpretes e pensar na forma de arco-íris? Neste caso se poderia estabelecer a conexão com Gn 9.13: o Entronizado aparece encimado pelo sinal da misericórdia. Também nos juízos ele visa manter a fidelidade à humanidade. Seu rigor santo, enfim, tem em vista o nosso bem.

Contudo, justamente o vocábulo, com o qual a tradução grega da Bíblia alude em Gn 9.13,14,16 à forma do arco-íris, está sendo evitado no presente versículo, sendo substituído por outro, extra-bíblico, usual na Antiguidade (“íris”). É por isto que se torna recomendável a outra possibilidade, a comparação com o brilho do arco-íris. O branco e vermelho flamejante estão emoldurados por um verde luminoso.252 Também Ap 10.1; Ez 1.28; Eclesiástico [Sirácida] 43.11; 50.7 assinalam a magnitude e beleza do arco-íris.

João, portanto, contemplou o Entronizado numa plenitude de luz descrita posteriormente sob três aspectos. O comentarista não deve destruir a congruência da impressão toda, perdendo-se em comparações isoladas. Tampouco deveria precipitadamente introduzir no arco-íris toda uma teologia da graça, em vez de esperar pelo cap. 5 (cf. abaixo, o retrospecto sobre o cap. 4).