Estudo sobre Romanos 11:11
Romanos 11:11
A pergunta do v. 1 continua martelando. Qual é, portanto, a situação da parte endurecida de Israel, sobre a qual Paulo teve de falar de maneira tão deprimente nos v. 7-10, os quais terminaram com a expressão “para sempre”? Ou seja, rejeição como estado permanente? Pergunto, pois: porventura, tropeçaram (cf Rm 9.32,33) para que caíssem? Como em Rm 14.4, “cair” é aqui metáfora para banimento no juízo final, ao contrário de “estar de pé”. Contudo, esse “cair” de Israel jamais é a intenção de Deus: De modo nenhum, pois nesse caso também sua palavra “falharia” (Rm 9.6). Ele não entregou seu povo cambaleante à queda livre, mas segurou-o na mão como seu instrumento. Ele continua agindo com bênçãos por intermédio desses endurecidos, porém eleitos, sim por intermédio desses inimigos, mas amados (v. 28)! Como haveremos de entender isso? Já em Rm 9.23 Paulo testemunhou de forma genérica que Deus é capaz de manifestar sua glória em pessoas perdidas. Agora isso chega ao nível prático.
O “não” de Israel causou uma grande bênção: pela sua transgressão, veio a salvação aos gentios. Numa ilustração: A água de um rio represado corre para um leito diferente, irrigando dessa maneira outras áreas de terra. Ou, conforme Mc 7.28: As migalhas que caem da mesa das criancinhas beneficiam os cachorrinhos debaixo da mesa. A passagem do evangelho para os gentios, depois que foi dirigido primeiramente só a Israel (At 11.19), sendo, porém, barrado por esse povo, constituiu repetidamente uma experiência prática dos missionários cristãos no primeiro século e finalmente convenceu-os por sua regularidade como sendo desígnio superior. O fracasso dos judeus trouxe salvação aos gentios. Este, porém, não foi somente uma experiência histórica inicial há mil e novecentos anos, mas ainda hoje é palpável, p. ex. em cada exemplar do AT que temos em mãos. Se o víssemos com olhos abertos, ficaríamos sumamente maravilhados pelo fato de essa coletânea de Escrituras judaicas estar entre nós. A literatura de outros povos da Antiguidade pode ser achada apenas nas bibliotecas especializadas dos eruditos, mas essa Bíblia judaica nos abençoa no cotidiano, preserva o caráter cristão de nossas igrejas. Nela volta todos os dias à nossa presença o papel de Israel, mesmo empedernido, para a história da salvação. Em relação ao seu conteúdo, K. Haacker escreve com razão: “Conhecemos o Deus vivo e verdadeiro somente a partir das experiências que pessoas do povo de Israel tiveram com ele… O reconhecimento de Deus em Israel constitui também a base do nosso reconhecimento de Deus. Precisamente por isso as Escrituras Sagradas de Israel tornaram-se Bíblia da igreja, apenas complementadas – não substituídas! – pelo NT. O Deus no qual nós cristãos cremos distingue-se dos deuses gentílicos, assim como das concepções de Deus na filosofia, como ‘o Deus de Israel’”.
Contudo, este é apenas um lado. Missão aos gentios não se esgota na conquista de gentios. Na verdade, Deus usou inicialmente a desobediência de Israel para canalizar o evangelho às nações, porém agiu assim para pô-los (também os próprios judeus) em ciúmes (impelindo-os a imitá-las). Esse aspecto provocativo, que conforme Rm 10.19 Paulo deduziu do cântico de Moisés de Dt 32.21 e que ele repete aqui e no v. 14, tornou-se norteador para ele. Ele entende essa provocação pelo lado positivo, como um esforço ansioso de conquistar emulação: “Provai e vede que o Senhor é bom” (Sl 34.8)! Essa atração também se concretiza em Rm 10.21, em que Deus estende as mãos ao seu povo “todo o dia”. Sem dúvida a redenção dos gentios também provoca os judeus à irritação e à raiva. Um exemplo é Jonas, quando experimentou a misericórdia de Deus pela Nínive gentílica: “Com isso, desgostou-se Jonas extremamente e ficou irado” (Jn 4.1). De forma similar, o irmão mais velho se enraiveceu contra seu pai na parábola, quando este teve compaixão do irmão perdido (Lc 15.28). Contudo, ambas as passagens da Bíblia terminam com um esforço enorme de conquistar o irado e envolvê-lo na compaixão e no compartilhamento da misericórdia de Deus. Entretanto, é significativo como isso se deu. Deus não confrontou Jonas, p. ex., com o estado gratificante da devoção dos ninivitas, assim como o pai em Lc 15 tampouco tentou de forma alguma convidar à festa o filho mais velho com base no novo bom comportamento do filho que retornou. Da mesma forma Paulo não destacou diante de seus compatriotas as qualidades morais das igrejas gentílico-cristãs. Muito antes enalteceu a graça que se empenha pelos descrentes (Rm 5.6). É a partir dela que ele tentou conduzir seus irmãos para fora da resignação que se arraigou profundamente neles (Rm 7.24; Mt 11.28), uma resignação que certamente impede mais que qualquer outra coisa a conversão: Se Deus aceitou essas pessoas, também o povo infiel de Israel pode ter esperança. Sob esse aspecto Paulo reconheceu uma maravilhosa interação entre missão aos gentios e missão a Israel, “para que concordemente e a uma voz glorifiqueis ao Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo” (Rm 15.6). Essa esperança também comprova que Paulo, quando fala do endurecimento de seu povo por Deus, não está prestando tributo à doutrina mecanicista da predestinação. Israel não foi transferido para um estado imutável de imobilidade, mas é rodeado por uma abundância de bondade, paciência e longanimidade de Deus, à qual é capaz de responder.
Os versículos subsequentes comunicam uma ideia a respeito de como Deus procura atrair. Paulo deixa transparecer como ele engrandeceria a graça diante de seus irmãos judaicos. Ora, se a transgressão deles redundou em riqueza para o mundo, e o seu abatimento, em riqueza para os gentios… Inicialmente ele retoma mais uma vez a expressão “transgressão” do v. 11, qualificando-a, porém, num acréscimo, como seu fracasso. Afastando-se do Messias, Israel prejudicou sua própria natureza messiânica, o que foi quitado, conforme o v. 15, com a “rejeição” desse povo. Apesar disso, Deus fez o fracasso resultar em riqueza espiritual dos gentios. Disso se conclui: Se Deus já provoca tamanha riqueza por meio do Israel que fracassou, então ele com certeza não se mostrará pobre diante de um Israel que reencontra a sua verdadeira substância. É preciso concluir o contrário: quanto mais a sua (i. é, de Israel) plenitude! Um “Israel plenificado”, nesse contexto, obviamente não é um Israel completado numericamente, uma vez que a palavra “plenitude”, que em si abriga muitos sentidos, obtém um perfil claro no presente versículo pelo seu oposto, a saber, sendo o contrário de “fracasso”. Paulo vislumbra um Israel que se encontra na plenitude de seu envio messiânico. Como tal, esse povo será portador de bênçãos para o mundo em proporção muito maior do que quando estava endurecido.
Continuação...
Romanos 11:11