Daniel 12 — Comentário Teológico

Daniel 12

O livro de Daniel compõe-se essencialmente de seis histórias e quatro visões. As histórias ocupam os capítulos 1-6, e as visões os capítulos 7-12. Quanto a detalhes sobre esse arranjo, ver a porção intitulada “Ao Leitor” , parágrafos quinto e sexto, apresentados imediatamente antes do começo da exposição de Dan. 1.1. Os capítulos 10-12 contêm, na realidade, apenas uma visão, a quarta. O capítulo 10 age como prólogo; o capítulo 11 apresenta a própria visão, juntamente com a interpretação. E, então, o capítulo 12 dá o epílogo, levando-nos a tempos posteriores aos de Antíoco Epifânio, até a consumação de nossa era. O autor não tinha ideia da grande expansão de tempo que estaria envolvida entre Antíoco e o fim de nossa era. Alguns intérpretes fazem Dan. 11.40-45 referir-se ao futuro anticristo e, assim, saltam muitos séculos para chegar ao fim, que agora é descrito. “Com a morte de Antíoco Epifânio, começa a consumação final e está em vista a iminência do fim, e Miguel, o anjo guardião dos judeus, se agita. A Grande Tribulação torna-se realmente grande, nos espasmos finais de agonia de um mundo moribundo, que são, ao mesmo tempo, as dores de parto do reino messiânico. A questão inteira termina em uma ressurreição geral, a grande separação entre os salvos e os condenados, e a inauguração do Reino dos santos. Nesse ponto, termina a visão (vss. 1-4), e o vidente recebe ordens para selar o livro. Esse é o fim do apocalipse original, mas a isso foram adicionados três suplementos (vss. 5-13): a) Em uma visão, Daniel viu dois anjos à beira de um rio e perguntou-lhes quanto tempo se passaria até o fim. Ele é informado de que a tribulação se prolongaria por mais três anos e meio. Mas quando ele pede por mais explicações, é convidado a partir, b) Outro cálculo da duração da abomina­ção fala em 1.290 dias. c) Um cálculo final transforma isso em 1.335 dias” (Arthur Jeffery, in loc.).

Seja como for, o capítulo 12 passa de coisas temporais para coisas eternas, sendo, assim, uma digna continuação do capítulo 11. Epílogo: Coisas Pertencentes à Consumação das Eras (12.1 -13) Temos aqui duas divisões principais: vss. 1-3 (Israel é libertado) ou vss. 1-4 (fim da tribulação e a ressurreição); e vss. 4-13 (conclusão).

12.1 Nesse tempo se levantará Miguel. Que tempo será esse? O tempo da derrubada de Antíoco Epifânio (interpretação histórica); ou o tempo do fim do anticristo (interpretação sensacionalista e futurista). Ver as notas sobre Dan. 11.40-45, especialmente o vs. 45. O autor sagrado não tinha consciência da grande expansão de tempo que viria em seguida e o separaria da consumação final das coisas da era presente. Provavelmente ele esperava ver as “coisas finais” acontecer em seu próprio período de vida. Também é provável que ele pensasse que Antíoco Epifânio fosse o gatilho para iniciar o período final. Miguel, o guia angelical e protetor de Israel, seria instrumental na proteção da nação de Israel durante a Grande Tribulação, e um elemento de proteção dos israelitas antes que chegasse a temível tribulação. Ver as notas sobre Dan. 10.13 e 20 quanto ao conceito dos anjos guardiães das nações. A Miguel caberia a tarefa de fazer preparativos para o fim. Grandes poderes serão necessários para manter as coisas sob controle, naquela hora crítica. Ver no Dicionário o detalhado artigo chamado Tribulação, a Grande, que contém algum material dúbio que os dispensacionalistas creem fazer parte do cenário do fim. Todo aquele que for achado inscrito no livro. Ver no Dicionário o detalhado artigo intitulado Livro da Vida. Somente aqueles cujos nomes foram escritos no livro serão salvos do poder da Grande Tribulação. Está em pauta a salvação da destruição física. Mas, olhando para os vss. 2-3, devemos supor que também esteja em vista a salvação da alma, e não somente a salvação do corpo. O vs. 1 não pode referir-se à salvação da morte física para Israel em geral, mas fala da preservação da nação de Israel, com sua futura exaltação entre as nações, como a cabeça dos povos, possibilitada por essa salvação. É provável que a maior parte de Israel morrerá, mas o remanescente levará avante a história. ‘Talvez também encontremos aqui a ideia de que os nomes dos fiéis de gerações anteriores foram igualmente registrados, para que esses fiéis igualmente compartilhem da vida abençoada do Reino vindouro” (Arthur Jeffery, in loc.). Cf. isso com Rom. 11.26.

12.2 Muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão. Esta é uma das poucas claras referências, no Antigo Testamento, à vida além-túmulo. Essa vida será mediada pela ressurreição. Coisa alguma é dita claramente sobre a alma eterna, que sobreviverá à morte biológica. Portanto, não sabemos dizer se o autor acreditava ou não nessa doutrina, embora ela possa ser subentendida aqui. Entretanto, há algumas claras instâncias dessa doutrina no Antigo Testamento, além de muitas referências a esse ensino no Novo Testamento. No Pentateuco, no entanto, não existe nenhuma afirmação clara sobre a vida para além da morte biológica. Ali, os homens bons não recebem nenhuma promessa de recompensa para depois da vida física, nem os ímpios são ameaçados de sofrimentos em um “pós-vida”. Somente nos Salmos e nos Profetas encontramos referências à alma e à sua sobrevivência ante a morte biológica. Todavia, essa ideia cresceu nos livros apócrifos e pseudepígrafos, e então a noção se desenvolveu no Novo Testamento. Ver no Dicionário o verbete intitulado Alma, e na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia o artigo chamado Imortalidade, onde apresento abundância de material sobre os assuntos, incluindo as pesquisas científicas feitas na área. Ver no Dicionário o artigo intitulado Ressurreição.

Note também o leitor que a ressurreição dos bons e dos maus (não separados aqui, como em Apo. 20.5) produzirá recompensas para os bons e julgamento para os maus. Esta é, praticamente, a única referência veterotestamentária dessa natureza, a qual se tornou comum nos livros apócrifos e pseudepígrafos. As chamas do inferno foram acesas pela primeira vez em I Enoque, como os eruditos sabem. O rio de fogo ali mencionado torna-se o lago do fogo de Apo. 20.14.

O ensino de Daniel sobre o tempo em que essas condições prevalecerão é o ensino comum, dando a entender que ambos os estados — tanto dos bons quanto dos maus — durarão para sempre. É inútil tentar encontrar em Daniel a esperança maior que vemos no Novo Testamento como I Ped. 3.18 - 4.6, de que Cristo teve uma missão misericordiosa no próprio hades, revertendo o estado dos perdidos que ali se voltaram para Ele. Além disso, Daniel não previu a restaura­ção geral que é o tema de Efé. 1.9,10, o Mistério da Vontade de Deus, ou seja, o que Deus fará, finalmente. Portanto, o próprio Daniel, tal como outros autores bíblicos, tinha uma visão preliminar de tais questões. Como se sabe, a revelação modifica as coisas. A revelação é uma ciência crescente. Há grande diferença entre o Antigo e o Novo Testamento; e até mesmo dentro do Novo Testamento um autor pode mostrar-se mais profundo que outros, quanto a certos assuntos. Ver na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia os artigos Descida de Cristo ao Hades e Restauração. Ver também o verbete chamado Mortos, Estado dos, onde acompanho os diversos estágios dessa doutrina.

Que a morte era um estado de sono no pó (sem a consciência da alma) era uma ideia judaica comum (cf. Enoque 91.10 e 92.3). Gradualmente, os judeus assumiram a posição que já existia entre vários outros povos, ou seja, de que a alma sobrevive à morte biológica. Então, no cristianismo, há a combinação das ideias da ressurreição e da alma. Atualmente, os estudos no campo do psiquismo nos dão maiores informações sobre a alma, e já nos aproximamos da prova científica dessa ideia. Ver na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia o artigo chamado Experiências Perto da Morte, sobre o que está sendo feito no campo científico. Os Atos Estabelecem Diferenças. A separação entre os bons e os maus dependerá do que ambos tiverem praticado. Cf. Apo. 20.12; Enoque 90.20-27; II Baruque 24.1. Esses dois grupos irão para seus estados separados de recompensa ou punição. O céu e o inferno, a essa altura dos acontecimentos, ainda não tinham entrado na corrente do pensamento judaico; mas nos livros pseudepígrafos eles se tomaram doutrina padrão. Naturalmente, houve a doutrina do sheol, que passou por um longo desenvolvimento. A punição dos maus ocorrerá ali, e a recompensa para os bons tornou-se parte da doutrina (conforme vemos em Luc. 16).

12.3 Os que forem sábios, pois, resplandecerão, como o fulgor do firmamento. Os justos resplandecerão para sempre em seu estado esplendoroso. Isso será especialmente verdadeiro no caso daqueles que tiverem desviado a outros do caminho do mal, para seguirem o caminho do bem. Eles salvaram a si mesmos e a seus semelhantes dos caminhos da morte e da apostasia, pelo que merecem uma recompensa especial e conspícua. Cf. Mat. 13.42, que provavelmente repousa sobre este versículo. A luz está associada aos bons, pois Deus é luz, Cristo é luz e o crente é luz. Ver sobre Luz, Metáfora da quanto ao desenvolvimento dessa ideia. “Essa é a consolação oferecida como apoio aos que forem testemunhas da tribulação dos últimos dias” (Ellicott, in loc.).

Sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho
errado, salvará da morte a alma dele, e cobrirá multidão de
pecados.
(Tiago 5.20)

É assim que os sábios agem e receberão a sua recompensa. Em contraste, os insensatos, que se entregam à multidão de pecados, serão condenados. Cf. Dan. 11.33,35, onde os sábios lideram os fiéis. Ver sobre Compreensão em Pro. 5.1, e sobre Sabedoria em Dan. 1.20 e 8.1,27. Quanto à sabedoria como um pai, ver Pro. 8.32, Em seguida, ver no Dicionário o artigo geral intitulado Sabedoria.

12.4 Tu, porém, Daniel, encerra as palavras e sela o livro. Alguns estudiosos supõem que este versículo seja o último do livro de Daniel, e o que se segue seja uma adição posterior. Nesse caso, os vss. 5-13 seriam o verdadeiro Epílogo do livro de Daniel. Foi o arcanjo Miguel (provavelmente; ver o vs. 1) quem ordenou que o livro fosse encerrado. Aconteceriam muitas coisas que não seriam reveladas a Daniel, e muitas das coisas reveladas seriam entendidas apenas parcialmente. No fim dos tempos, quando as coisas começarem a acontecer, o selo será retirado do livro, que só então será compreendido por completo. Tradicionalmente, a profecia é mais bem compreendida quando começam a acontecer os eventos preditos, os quais atuam como intérpretes do que havia sido predito. “O anjo ordenou ao vidente que ocultasse as profecias até que o tempo estivesse maduro para elas serem desvendadas... Essas profecias seriam colocadas à disposição dos fiéis, para que eles entendessem a significação dos eventos em meio aos quais estariam vivendo (cf. II Esd. 14.44 ss.; Enoque 1.2; Apo. 22.10)” (Arthur Jeffery, in loc.). Até ao tempo do fim. Ou seja, o tempo que antecederá, de imediato, o estabelecimento do Reino de Deus, mas que Daniel antecipou como “não muito distante”. Portanto, do ponto de vista de Daniel, o livro não permaneceria selado por longo tempo. Ver no Dicionário o verbete chamado Últimos Dias. Muitos o esquadrinharão. Sir Isaque Newton, ao ler esta declaração do livro de Daniel, predisse que algum dia os homens haveriam de viajar com a estonteante velocidade de 80 km por hora! Voltaire ridicularizou essa afirmação e disse que, se um homem viajasse a tão grande velocidade, morreria sufocado. Mas quem era o tolo? Os intérpretes não sabem como interpretar e patinam entre três posições. 1. Alguns estudiosos supõem que isso se refira à correria para cá e para lá, conforme se dá na guerra e na confusão, e não por meios superiores de locomo­ção. 2. Outros eruditos pensam que a correria para cá e para lá diz respeito aos esforços frenéticos, da parte de alguns, para compreender as profecias. “Muitos examinarão ansiosamente este livro, em busca de conhecimento quanto à maneira como Deus trata com o Seu povo, e daí derivarão consolo e compreensão” (Ellicott, in loc.). 3. Outros vêem a correria como os esforços despendidos na pregação do evangelho, ou seja, as missões modernas (mas isso se afasta muito do alvo). O saber se multiplicará. Esta parte do versículo tem sido popularmente compreendida como uma referência ao grande aumento do conhecimento nos últimos dias. De fato, os últimos cem anos da história do mundo têm testificado descobertas científicas que põem em eclipse todos os séculos anteriores juntos. Mas a principal referência é ao aumento do conhecimento sobre a profecia e sobre os eventos que este livro apresenta.

12.5 Então eu, Daniel, olhei, e eis que estavam em pé outros dois. Esses outros dois eram anjos, em adição àquele que falava com Daniel sobre a visão, que seria identificado como Miguel ou Gabriel. Ver Dan. 8.15,16. Eles tinham forma humana, e não forma de animais (como nas visões), mas eram seres sobrenaturais. Ver no Dicionário os verbetes denominados Anjos; Gabriel e Miguel. O ministério angelical continua aqui. Um desses anjos estava em uma das margens do rio Tigre, e o outro estava na outra margem. Quanto ao rio Tigre, ver Dan. 10.4.

Os anjos estavam disponíveis para explicar determinados aspectos das visões sobre o tempo do fim. A experiência humana prova a realidade do ministério dos anjos. O ministério dos anjos é um fato abençoado, embora seja geralmente negligenciado pelos protestantes e evangélicos para evitar os abusos. O artigo chamado Anjos entra em detalhes sobre a questão.

12.6 Um deles disse ao homem vestido de linho. “É evidente que dois anjos ajudavam o mensageiro angelical, que provavelmente era Gabriel (ver os comentários sobre Dan. 10.5). Um dos anjos chamou o outro anjo, que estava de pé ao lado de Gabriel (aquele vestido de linho Dan. 10.5) e perguntou: Quanto tempo se passará até que essas coisas espantosas se cumpram? As “coisas espantosas” provavelmente são aos eventos registrados em Dan. 11.36-45, que pertencem à ocupação final de Israel pela vinda do governante gentílico” (J. Dwight Pentecost, in loc.). “O fim sempre parece estar próximo, mas nunca chega. Por quanto tempo essa situação continuará?” (Ellicott, in loc., com uma observação astuciosa).

12.7 Ouvi o homem vestido de linho. O arcanjo Gabriel, com um juramento solene feito na direção do céu, ou seja, em nome de Yahweh, afirmou a certeza daquilo que ele iria proferir. Ver o levantamento da mão direita por ocasião em que um juramento é feito, em Gên. 14.22; Deu. 32.40; Apo. 10.5. Mas aqui ambas as mãos foram erguidas, para atribuir à questão solenidade ainda maior e certeza do que aconteceria. Um tempo, dois tempos e metade de um tempo. Ou seja, três anos e meio. Cf. Dan. 7.25 e 8.14. Contudo, não dispomos de claras indicações sobre quando esse período começaria. Daniel não entendeu o que o arcanjo disse (vs. 8), e nós mesmos continuamos tentando. Seja como for, o tempo designado deve terminar antes de o culto do templo ser restaurado. Ou seja, Antíoco Epifânio continuaria a agir ainda por breve tempo, e então haveria a restauração e a rededicação do templo. Os futuristas e os dispensacionalistas transferem isso para o fim de nossa era e para o período da Grande Tribulação. Dizem eles que o pacto será quebrado (ver Dan. 9.27) no meio do período de sete anos de tribulação. Presumivelmente os três anos e meio deste versículo pertencem à primeira metade da semana final (o período de sete anos da Grande Tribulação), que será relativamente pacífica. O anticristo já estará presente, mas ainda não terá revelado suas verdadeiras cores. Ver o gráfico em Dan. 9.26,27 para uma ilustração do ponto de vista dispensacionalista. Do ponto de vista histórico, ver os vss. 7 e 11, que falam desse mesmo período de tempo.

12.8 Eu ouvi, porém não entendi. Embora o profeta tenha mediado a mensagem, Daniel não a compreendeu. Portanto, o vs. 11 torna-se a explicação do vs. 7, e não uma unidade separada de tempo. Mas alguns fazem este versículo indagar sobre o que aconteceria “para além do período atribulado”, ou seja, quais seriam os eventos resultantes do período de grande tribulação. Os intérpretes históricos pensam que talvez a primeira designação de tempo (vs. 7) tenha começado na missão de Apolônio, em 168 A. C., e a segunda (vs. 11) tenha iniciado no tempo em que os sacrifícios diários foram suspensos, em 167 A. C. Nesse caso, o segundo cálculo poderia ter sido dado porque o primeiro não se mostrara exato. De acordo com essa teoria, a segunda designação foi dada para corrigir a primeira. E então a terceira (vs. 12) poderia ter sido outra estimativa que corrigia a segunda. Esse tipo de manipula­ção atribuído aos anjos é inconcebível para a mente dos eruditos conservadores, pelo que é rejeitado por todos os estudiosos, exceto pelos críticos-liberais.

12.9 Vai, Daniel, porque estas palavras estão encerradas. A sede de Daniel para saber mais foi cortada por outra ordem para selar a profecia, conforme já vimos no vs. 4, que alguns eruditos pensam ser o fim original do livro, antes que houvesse adições subsequentes. Mas o vs. 10 nos fornece alguma informação. Presumivelmente, revelações adicionais não seriam entendidas por aqueles que se levantassem “cedo demais”. A revelação tem de esperar o tempo próprio para ser desvendada.

12.10 Muitos serão purificados, embranquecidos e provados. As severas perseguições sob Antíoco Epifânio (ou sob o anticristo) servirão para purificar os crentes. Eles se tornarão brancos como o mais fino linho. O vs. 1 fala sobre c aumento da iniquidade que deve ser esperado nos últimos dias: e Dan. 11.35 mostra que os sábios precisam ser refinados. Essas ideias se repetem aqui. Também devemos entender que haverá grande abismo fixado entre as duas classes de seres humanos, antecipando que uma das classes se dirigirá ao julgamento, após esta vida terrena, enquanto a outra recolherá recompensas no pós-vida, brilhando como as estrelas no céu (vs. 3). Homens ímpios e desvairados passarão pelos sofrimentos e nem ao menos saberão a “razão” dessas coisas. Mas os sábios compreenderão por que esses acontecimentos momentosos estarão ocorrendo. Quanto aos sábios, cf. Dan. 11.33,35 e 12.3. Os sábios são aqueles que entendem os caminhos de Deus. Cf. esse pensamento com II Crô. 30.22; Pro. 15.24; Amós 5.13. Em II Esd. 14.46, certas revelações reservadas serão feitas aos sábios, mas não aos insensatos. As pessoas malignas estão intelectualmente escravizadas, desprovidas do bom senso espiritual. Os bons, no verdadeiro sentido, naturalmente receberão maior compreensão quanto à mente divina. Sobre esse pensamento, ver I Cor. 2.16.

12.11 Depois do tempo em que o costumado sacrifício for tirado. O Segundo Cálculo. Para alguns intérpretes históricos, os três cálculos — vss. 7,11 e 12 — falam todos do mesmo período em geral. Quanto tempo se passaria antes da restauração do templo e seu culto? 1. Um tempo, dois tempos e metade de um tempo (três anos e meio) depois da missão de Apolônio, em 168 A. C. 2. Ou, então, falhando esse cálculo, o tempo da purificação se prolongaria por mais um ano - 1.290 dias — mais ou menos o equivalente a três anos e meio, mas agora datado do tempo em que Antíoco Epifânio interrompeu os sacrifícios diários, o que ocorreu em 167 A. C. Portanto, haveria uma espécie de período de graça, dando maior prazo para o cumprimento das profecias. 3. Então, ao segundo período, outros 45 dias de graça seriam adicionados, se as circunstâncias assim requeressem. Esse é o terceiro cálculo do texto. Os eruditos conservadores, porém, não toleram toda essa manipulação por parte dos anjos, somente para permitir que as profecias se cumpram. Assim, o ponto de vista daí emergente é que o primeiro período representa a primeira metade dos sete anos de tribulação. E a segunda metade seria representada pelos 1,290 dias, O primeiro período, nesse caso, torna-se paralelo a Apo. 11.3, versículo que sem dúvida repousa sobre o texto presente. O autor neotestamentário reduziu os 1.290 dias a 1.260, a fim de ajustar o cálculo ao ano lunar de 360 dias. (Três anos e meio equivale a 1.260 dias.) O segundo período torna-se paralelo aos 42 meses referidos em Apo. 11.2 e 13.5. Para os críticos liberais, isso é uma poderosa manipulação, refletindo a “fantasia profética” inventada pela mente daqueles que gostam de interpretar as coisas literalmente e têm de ver as coisas “distantes” com extrema precisão.

12.12 Bem-aventurado o que espera e chega... Temos neste versículo o terceiro cálculo, que incluo nas notas expositivas sobre o vs. 11. Os estudiosos conservadores-literalistas tentam encontrar espaço para esses 45 dias extras. Alguns o encontram nas descrições de Apo. 16.14 e 19.21. Os escombros do período de tribulação precisarão ser retirados, e esse tempo será necessário para o trabalho de limpeza. Outros encontram todos os cálculos na história relativa à igreja. Mas meras conjecturas estão ativas em todos esses cálculos. “Todas essas conjecturas estão fundamentadas sobre as trevas” (Adam Clarke, in loc.)

12.13 Tu, porém, segue o teu caminho até ao fim. Este versículo parece deixar entendido (embora não o diga dogmaticamente) que Daniel viveria e veria o fim, Isso seria possível se a consumação ocorresse imediatamente após a carreira de Antíoco Epifânio, Mas a palavra “descansarás”, aqui usada, provavelmente é um eufemismo para indicar a morte. Cf. o sono referido no vs. 2. O profeta descansaria até a ressurreição. Nenhuma alma imortal, separada do corpo, é antecipada neste livro. Essa doutrina começou a aparecer nos Salmos e nos Profetas. Os livros apócrifos e pseudepígrafos desenvolveram o tema da alma e sua sobrevivência diante da morte biológica, conjecturando sobre as recompensas e as puni­ções do pós-vida. O Novo Testamento levou o tema avante, à luz da missão de Cristo. Fosse como fosse, Daniel, o homem fiel, participaria da ressurreição, e grande seria o seu galardão. Ele estaria entre aqueles que brilhariam como estrelas nos céus. Ele participaria da glória, da paz, do poder e da majestade do dia eterno. Quanto à sorte ou herança espiritual, cf. Sal. 16.5; 125.3; Pro. 1.14; Jer. 13.25; Atos 26.18 e Col. 1.12. “O reino de Deus durará para sempre, e os seus cidadãos leais terão ali seu lugar de honra” (Gerald Kennedy, in loc.). Ver no Dicionário os artigos chamados Salvação e Alma. E ver na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia o artigo Imortalidade, com seus vários verbetes. Descansarás. Sobre os santos é dito que eles descansam em seus sepulcros, conforme se lê em Isa. 57.2, ou no sheol, conforme se lê em Jó 3.17. Cf. também Sabedoria de Salomão 4.7; Apo. 14.13; II Esd. 7.95. A Septuaginta inseriu aqui uma glosa que assegurou ao vidente que ele continuaria vivendo fisicamente até a inauguração do Reino de Deus. Assim como a terra de Canaã foi dividida em pequenos lotes, de modo que cada família tivesse sua possessão, o mesmo acontecerá no reino celeste. Cada servo fiel obterá sua própria herança. Mas cada qual terá de seguir seu curso sem se desviar para o paganismo. Ver Col. 1.12, onde temos a esperança cristã expressa mediante a mesma linguagem figurada.

... dando graças ao Pai que vos fez idôneos à parte que vos
cabe de herança dos santos na luz.
(Colossenses 1.12)

Algumas Observações sobre as Profecias:

1. Ao tratar com as profecias, uma pessoa nunca deve ser dogmática demais sobre o que pensa saber. Se forem marcadas datas, então tal pessoa fatal­ 2. Os profetas falam sobre “o fim” como se ele tivesse de ocorrer imediatamente mente falhará. depois de seus dias, ou mesmo quando esses dias terminarem. Eles não viam a grande expansão de tempo que os separava dos últimos dias. A profecia pode ser algo intrincado, que foi simplificado pelos profetas, pelo que os detalhes usados podem ser entendidos erroneamente ou permanecerem um enigma. Ao tentar interpretar as indicações temporais dos vss. 11-13, devemos reivindicar não sabermos muita coisa.

3. Os intérpretes dispensacionalistas estão sempre ansiosos por determinar esquemas que projetam mais do que realmente deveriam. Tornou-se doutrina padronizada nas igrejas evangélicas que a história da humanidade perduraria por 7.000 anos, em imitação aos dias da criação. Desde Adão até o segundo advento de Cristo, presumivelmente 6.000 anos se passariam, e então outros 1.000 anos (o milênio) arredondariam esse total para 7.000. Presumivelmente, a Grande Tribulação ocorreria no fim do período de 6.000 anos. Os eruditos dispensacionalistas determinavam precisamente esse período como 7.000 anos. De acordo com esses cálculos, o período da Tribulação ocorreria por volta de 1993, e o anticristo já deveria ter feito sua aparição alguns anos antes disso. Estou escrevendo perto do fim do ano de 1997, mas nada disso aconteceu até agora. A limpeza dessa profecia foi perturbada, e antecipo que muitas outras perturbações ocorrerão para aqueles que pensam saber mais do que realmente sabem.

4. A profecia sobre o Mercado Comum Europeu, que, segundo muitos criam, chegaria a ter dez membros, tornando-se o grande instrumento usado pelo anticristo, também fracassou. Atualmente há mais de dez membros no Mercado Comum Europeu, e novos membros certamente serão admitidos. (Ver Apo. 12.3 e 17.3 quanto à alegada base bíblica sobre essa profecia.) Outra profecia que parecia limpa falhou, e outra asserção dogmática não se sustentou diante da prova do tempo.

5. Além disso, presumia-se que os Estados Unidos da América perderiam sua posição de liderança, tornando-se apenas mais uma daquelas dez nações, ou seria um aliado delas, uma parte do esquema de coisas usado pelo anticristo, embora não fosse a nação líder. Um elemento dessa profecia era a idéia de que haveria grande confronto entre a federação encabeçada pelo anticristo e o comunismo. Mas o comunismo entrou em colapso e surpreendeu a todos os profetas (exceto os de Fátima, que tinham predito exatamente isso). E, então, em vez de debilitar-se, os Estados Unidos da América estão ficando cada vez mais fortes e, no momento, são a única superpotência mundial econômica e militar. Algo de verdadeiramente radical terá de ocorrer para que haja uma guerra nos últimos dias do nosso século XX. Há enorme desequilíbrio de poder para que isso aconteça.

6. Talvez a nossa época seja o tempo do fim, mas erramos por mostrar-nos precisos demais sobre a questão. Devemos admitir que também erramos de muitas outras maneiras ao cuidar das profecias. Talvez nossos dias não sejam os últimos, conforme supomos. Ou talvez as coisas se tenham demorado, mas continuamos na trilha certa. Jonas pregou a Nínive, requerendo que seus habitantes se arrependessem. Para sua surpresa e consternação, eles se arrependeram e mais 150 anos foram adicionados à vida nacional da Assíria. Finalmente, a coligação entre os medos e os babilônios pôs fim à Assíria, mas não quando Jonas disse que isso sucederia.

7. Nossas brincadeiras com as profecias bíblicas, com seus acertos e erros. não têm nada que ver com o fenômeno da inspiração, nem é a precisão de todas as profecias uma parte necessária de qualquer teoria sã da revelação.

Nossos pequenos sistemas têm a sua época,
Eles têm seus dias e logo passam.
São como lamparinas bruxuleantes ao lado
Da Tua Luz. ó Senhor.
(Russell Champlin)


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