Daniel 8 — Comentário Teológico
Daniel 8 — Comentário Teológico
Capítulo Oito
Capítulo Oito
“O carneiro com dois chifres era o império medo-persa (vs. 20), sendo que
o avanço dos persas foi irresistível. O bode (Dan. 5.7) vindo do Ocidente
era Alexandre, o Grande (vs. 21), que derrubou o império persa. Após a morte de
Alexandre, o império foi dividido entre quatro líderes conspícuos:
Cassandro,
Lísímaco, Seleuco e Ptolomeu (vs. 8). Foi da família dos selêucidas que surgiu
Antíoco Epifânio, o qual, em 167 A. C., conquistou a Palestina (vss. 8-14). Ele
violou o santuário e proibiu que os judeus adorassem ali (vss, 23-25)” (Oxford
Annotated Bible, na introdução ao presente
capítulo).
O capítulo 8, assim sendo, elabora certos assuntos que figuram no capítulo anterior. A Babilônia não está mais em foco, e até os medos-persas foram mencionados para introduzir o monstro macedônio, Alexandre. Mas a ênfase real recai sobre o pequeno chifre, Antíoco Epifânio. “O propósito
deste capítulo é, por um lado, tornar claras algumas questões que haviam sido tratadas de maneira um tanto críptica no capítulo 7; e, por outro,
renovar a certeza de que o fim estava próximo. O cálice da iniquidade de Antíoco
estava quase cheio. Esse é o episódio final na grande tribulação que precederá
o fim. Deus interviria e o homem do pecado seria destruído. Neste capítulo voltamos ao idioma hebreu, deixando de lado o aramaico” (Arthur Jeffery, in loc.). Os eruditos dispensacionalistas
aceitam Antíoco Epifânio como se fosse o anticristo, pelo que parte do capítulo foi colocada dentro de um
ambiente escatológico.
Este capítulo naturalmente divide-se em três seções principais: vss. 1-2;
vss. 3-25; e vss. 26-27. Há certo número de claras subdivisões. Em cada seção
e subseção dou um título que projeta a essência do que se segue.
Segunda Visão: O Carneiro e o Bode (8.1-27)
Prólogo (8.1-2)
8.1
Este versículo data a visão exatamente um ano após a visão do capítulo 7. Cf. Dan. 7.1. Este capítulo desenvolve certas partes do capítulo 7, o que
explica as datas vinculadas entre si. Toques concernentes a datas e lugares
tendem a assegurar aos leitores a historicidade do relato. Cf. Dan. 10.4; Eze.
1.1; 8.1-3; 11.1 e Atos 10.9 ss. As palavras “depois daquela que eu tivera a
princípio” aludem ao capítulo 7 e poderiam ser mais bem traduzidas por “previamente”. A
história da revelação prossegue. Ver as notas em Dan. 7.28. A verdade nunca fica
estagnada. Trata-se de uma aventura contínua.
8.2
Quando a visão me veio. Esta foi a segunda
visão,
depois da primeira apresentada no capítulo 7. A segunda visão foi recebida em Susã, capital
de inverno dos reis persas. Quanto a detalhes, ver o detalhado artigo sobre
esse lugar no Dicionário. A cidade ficava na província do Elão
(ver a
respeito no Dicionário).
O local
específico onde a visão foi dada foram as margens do rio Ulai (ver
esse artigo no Dicionário).
A Visão
Geral (8.3-25)
8.3
Então levantei os olhos, e vi. A interpretação da visão aparece nos vss.
15-25, que seguem o mesmo plano que já havia aparecido no livro, onde as
declarações das visão foram dadas, seguindo-se então a interpretação. Dou aqui
as interpretações juntamente com as declarações, e adiciono algum detalhe
nos versículos interpretativos.
8.4
Vi que o carneiro dava marradas para o ocidente, e para o norte e para o sul. Perto do rio Ulai estava o carneiro com dois chifres, o que fala
da união entre os medos e os persas (vs. 20). Um desses chifres era mais alto
(mais forte) que o outro. De fato, o poder persa que apareceu mais tarde derrotou e
tomou conta dos medos, do que resultou uma espécie de reino com dois povos
unidos. A fera de dois chifres, em seus
dias, foi invencível. Ele arremetia e
chifrava o mundo inteiro ao redor, nos seus dias. Todas as direções da bússola são dadas,
exceto a direção do oriente,
mas a história tem demonstrado que a Pérsia
também fez conquistas nessa direção. De fato, eles chegaram à Índia. O fato, porém,
não
interessava ao autor sagrado. Esse carneiro foi uma fera terrível, mas
nada em comparação ao bode ameaçador (vs. 5). Ver as notas expositivas adicionais
no vs. 20.
8.5
Eis que um bode vinha do ocidente. Trata-se de um bode que percorria longas distâncias, vindo do ocidente
(a Grécia, vs. 21). Rapidamente ele avençou sobre toda a terra (conhecida), conquistando e saqueando. Avançava tão
rapidamente que seus pés não tocavam o chão. Em outras palavras, ele avançava voando. Tinha um chifre conspícuo entre os olhos (ou seja, Alexandre). Com velocidade surpreendente, ele conquistou o mundo conhecido de seu tempo.
Sua marcha ocorreu essencialmente entre 334 e 323 A. C., quando ele morreu de
uma febre (malária?) na Babilônia. “A escolha de um bode como símbolo do
império greco-macedônio pode ter-se derivado do fato de que o signo do zodíaco, Capricórnio, esteve em uso como sinal dos selêucidas, na Síria. Judeus religiosos também observavam como, em Eze. 34.17 e Zac. 10.3, é traçado o contraste entre o bode rude e a ovelha débil. O unicórnio não deve ter parecido um
animal estranho naquela época, visto que a arte da época antiga, no Oriente
Próximo e Médio, contava com numerosas representações de animais com um único
chifre, que saía do meio da testa” (Arthur Jeffery, in loc.).
8.6
Dirigiu-se ao carneiro que tinha os dois chifres. A batalha entre o bode
e o carneiro foi desigual. Coisa alguma podia comparar-se com Alexandre, e,
além disso, o propósito de Deus o acompanhava, pois o mundo estava sendo
preparado para o evangelho, mediante o idioma grego, que transportaria a
mensagem de salvação. Alexandre espalhou a cultura e o idioma grego por todo o mundo
conhecido, e o Novo Testamento se espalhou praticamente pelas mesmas regiões
por onde Alexandre havia espalhado a cultura e o idioma grego. Isso posto, o
bode recebeu a sua fúria por inspiração divina. Ele sabia o que faria e como
faria. O mundo já tinha vista o bastante do poder persa. “A admirável rapidez dos
movimentos de Alexandre seria inacreditável se eles não tivessem sido tão bem
confirmados pela história. Da batalha de Brianico à batalha de Arbela
passaram-se somente três anos. Durante esse breve período, o imenso império persa se
desfez em pedaços” (Ellicott, in
loc.). A primeira vitória de Alexandre
sobre Dario ocorreu em 334 A. C.
8.7
Vi-o chegar perto do carneiro. O bode ultrapassou o carneiro quanto às manobras, pois era mais rápido, estava mais enraivecido, mais
determinado, e moveu-se com decisão por estar sendo inspirado pela vontade do Ser
divino, o qual controlava as mudanças de poder que estavam ocorrendo. Os dois
chifres do carneiro foram quebrados, e seu reino unificado (Média-Pérsia) entrou
completamente em colapso, sem tardança. Não houve aliados que pudessem reverter
o acontecimento no último minuto, pelo que a queda se
tornou Irreversível. Cf. isso com a descrição sobre o leopardo, animal de grande velocidade (Dan. 7.6). O leopardo tinha asas. O bode era tão rápido que voava.
8.8
O bode se engrandeceu sobremaneira. O bode foi ficando cada vez mais forte, e suas conquistas formaram o mais extenso de todos os impérios, até sua época da história. Seguiu para o oriente e para o ocidente, como a Itália, a Espanha e a Gália. Quanto à direção sul, tomou parte do Egito e outras partes das costas nortistas da África.
Mas então aconteceu algo surpreendente: o grande chifre que tinha efetuado todas essas conquistas foi quebrado (a morte de Alexandre, aos somente 33 anos de idade — ele morreu em 323 A. C.). Em lugar do chifre grande e único,
apareceram quatro chifres notáveis, a saber, os generais entre os quais
foi dividido o império de Alexandre. Eles se chamavam Cassandro, Lisímaco, Seleuco e Ptolomeu, dentre os quais os dois últimos se tornaram proeminentes nas páginas da história do Antigo Testamento (durante o período intertestamentário). Esses quatro generais ocuparam os quatro pontos cardeais do mundo antigo,
referidos sob o símbolo dos quatro ventos. Ver Dan. 11.4; Jer. 49.36 e Eze. 42.20.
A divisão do terceiro império sob os quatro generais foi a seguinte: 1.
Lisímaco (Trácia); 2. Cassandro (Macedônia); 3. Seleuco (Síria) e 4. Ptolomeu (Egito). Houve potências menores, com reis inferiores, mas esses quatro representavam o império essencial greco-macedônico deixado por Alexandre. Ver o detalhado
artigo sobre Alexandre, o Grande, no Dicionário.
O Pequeno Chifre e Suas Abominações (8.9-12)
8.9
De um dos chifres saiu um chifre
pequeno. A visão agora se afunila para a mensagem principal que queria transmitir. Dentre os quatro chifres, emergiu
um chifre, chamado “pequeno chifre”. Isso não significa que o império foi
unificado sob um líder, dissolvendo o poder dos quatro chifres. Mas significa que, dentro
do império selêucida, surgiu uma grande abominação que teria relação especial (mas negativa) com Israel. Cf. Dan. 7.8, onde encontramos o mesmo símbolo. Para obter poder, esse pequeno chifre precisou desarraigar três outros, que
identifico na passagem paralela. Esse poder desceu ao Egito (o sul) para conquistá-lo. O capítulo 11 dá detalhes sobre essas campanhas sulistas. Cf, I Macabeus 1.18.
Quanto a detalhes, ver sobre Antioco Epifânio no Dicionário. A
referência ao oriente provavelmente diz respeito às conquistas daquele homem selvagem
no último ano de sua vida, conforme se vê nas descrições de I Macabeus 3.31,37; 6.1-4, Ele também deu atenção à terra gloriosa, a Palestina-lsrael, onde
causou grande confusão e perpetuou grandes abominações no tocante à fé judaica. Em Eze. 20.6,15, a Palestina é chamada de “coroa de todas as terras”. Em Enoque 89.40 aparece como “a terra agradável e gloriosa”. Cf. Jer. 3.19 e Mal. 3.12.
Ver o vs. 13 quanto às perseguições efetuadas por Antioco Epifânio.
8.10
Cresceu até atingir o exército dos céus. O poder de Antioco Epifânio
fez-se sentir em uma larga faixa do território próximo da Palestina e na própria Palestina. Ele estava transformando as coisas na terra. Todavia, não se
contentou com isso. Também queria interferir nas “questões celestiais”, a fim de
controlar os assuntos religiosas. I Macabeus 1.41,42 dá-nos alguns detalhes dessa
interferência. Ele interveio no culto de muita gente, e não apenas no culto
judaico, no programa de “unificação religiosa” com o qual ele queria helenizar as religiões,
e não apenas as culturas. Foi assim que ele “lançou por terra” as estrelas
(poderes celestiais) e pisou sobre elas. II Macabeus 9.10 diz algo similar. Ele pensou
que poderia tocar “nas estrelas do céu”. Cf. Apo. 12.4. Ver Dan. 11.36-39 quanto a algumas de suas inovações religiosas. Ali lemos que ele “se engrandecerá” sobre cada deus. O futuro anticrísto (tipificado por Antioco Epifânio) seguirá
essa norma política e até blasfemará dos poderes do alto. Cf. Isa. 14.13,14; Jó 29.6; e Heródoto (Hist. III.64). O simbolismo das estrelas nos faz lembrar da adoração astral que era tão comum no antigo Oriente Próximo e Médio. Cf. Gên. 2.1;
Deu. 4.19; 17.3; II Reis 21.3.
Antioco Epifânio interferiu na adoração às estrelas naquela parte do mundo, tendo perseguido todo o tipo de fé religiosa que não se ajustasse ao seu plano
de helenização. O judaísmo, com seu Deus dos céus, era um alvo natural. Cf, Apo. 12.4
8.11
Sim, engrandeceu-se até ao príncipe do
exército. Príncipe do Exército. Esta expressão significa: 1. Poderes angelicais e, especificamente
quem estivesse preocupado com o bem-estar de Israel, como Gabriel, por exemplo.
2. Ou o Sar (príncipe) pode ser uma teofania especial, interessada no
bem-estar de Israel. Cf. Jos, 5.13-15, onde o visitante celestial é descrito como “príncipe dos
exércitos de Yahweh”. Cf. Dan. 10.13,20 e 12.1, onde a palavra empregada se refere aos príncipes angelicais. 3. Ou a referência poderia ser ao próprio Yahweh,
embora esse fosse um uso singular da palavra hebraica sar, no Antigo
Testamento. 4. Alguns eruditos fazem essa profecia ser essencialmente escatológica, vendo aqui 0 Messias, o príncipe futuro que restaurará a nação de Israel. Nesse
caso, Antioco Epifânio deve simbolizar o anticristo. 5. Ainda outros estudiosos vêem aqui o próprio Antioco, exaltando a si mesmo a ponto de tornar-se o príncipe do
exército. “... chamando a si mesmo de príncipe do exército” (J. Dwight Pentecost, in
loc.). Mas a NIV diz: “Tão grande quanto o Príncipe do Exército”. O vs. 25 e Dan.
11.36 parecem favorecer a terceira dessas cinco interpretações, aquela que
fala em Yahweh.
Em sua oposição às estrelas e a todas as formas religiosas, que ele quis unificar para adaptar-se_a seu ideal de helenização, ele interferiu nas
oferendas queimadas diárias (ver Êxo. 29.38 ss.; Núm. 28.3 ss.) o ‘olath hattamidh do
resto do Antigo Testamento, mas aqui chamado de tamidh. O templo de Jerusalém
foi contaminado por suas abominações. Ele chegou a sacrificar uma porca sobre o altar. Quanto a uma descrição da conduta de Antioco Epifânio a esse respeito,
ver 1 Macabeus 1.39,45 e 3.45. Na época, o templo não foi destruído, mas sua adoração e culto sim, algo mais ou menos equivalente. Antioco saqueou os
tesouros do templo, outra abominação.
8.12
O exército lhe foi entregue. Essa fera levou homens a desviar-se de
Deus, seja forçando-os a isso, seja por sua influência e exemplo ímpios. Eles fizeram cessar os sacrifícios diários, e “isso foi como lançar a verdade por terra. O
chifre foi bem-sucedido em tudo quanto fez” (NCV). Este versículo dá a entender a apostasia na qual caíram muitos judeus, e não apenas uma conformidade
forçada, que estivesse sendo imposta por Antioco. “E fato conhecido que
alguns judeus escorregaram sob as perseguições de Antioco e se juntaram a seus
ritos idólatras” (Ellicott, in loc). A “verdade”, a Palavra de Deus, dentro da
legislação mosaica, foi lançada por terra e pisada por pés profanos. Ver I Macabeus 1.43-52,56,60. “... a verdade, todo o ritual e religião dos judeus” (Adam Clarke,
in loc.).
E embora fosse tão abominável, o homem prosperou por algum tempo, até que o juízo de Deus, finalmente, o cortou. Ele foi bem-sucedido no programa de universalização sob sua própria forma de idolatria, durante algum tempo. II Macabeus 6.6 diz-nos que ele alcançou tamanho êxito que nem se podia guardar o sábado, nem celebrar as festividades comuns dos judeus. De fato, um homem nem ao menos podia admitir ser judeu, distinguindo-se de outros homens. Foi assim obliterada a distinção que a lei de Moisés determinava entre um judeu e
um pagão (ver Deu. 4.4-8).
A Predição Celestial (8.13-14)
8.13
Depois ouvi um santo que falava. A
pergunta vexatória dos judeus, no tempo das perseguições de Antioco Epifânio, era: Por quanto tempo perdurarão essa perseguições? Isso seria respondido pela revelação angelical. Assim sendo, temos no vs. 13 um anjo falando com outro sobre a questão, e a revelação é dada no vs. 14. Quanto ao “santo” como um anjo, ver Deu. 33.2; Sal. 89.5; Zac. 14.5.
Aquele que respondeu (palmoni) proveu a resposta. As versões grega e
siríaca compreendem essa palavra, palmoni, como um nome próprio. Em resultado,
temos Palmoni como um nome divino nas Constituições Apostólicas VII.35. Por quanto tempo? tornou-se uma expressão escatológica padronizada. Cf. Dan.
12.6; II Esd. 6.59; Apo. 6.10.0 termo já tinha sido usado em contextos
não-apocalípticos, como em Sal. 6.3; 80.4; 90.13; Isa. 6.11 e Hab. 2.6.
8.14
Até duas mil e trezentas tardes e
manhãs. Esta declaração tem sido variegadamente entendida: 1. Poderia significar muitos dias, mais de
seis anos. Nesse caso, 2.300 tardes e manhãs (os tempos normais em que se ofereciam sacrifícios diários) significariam muitos ciclos completos de 24 horas, o que,
em termos, fala do tempo que se passaria antes da purificação do santuário.
2. Ou estão em foco 2.300 sacrifícios, dois a cada dia, dando-nos o total de 1.150
dias. Isso equivaleria a alguns poucos meses menos do que os três anos e meio de Dan. 7.25 e 12.7. Talvez o ponto de partida seja diferente, mas o fim seria o mesmo. Nesse caso, os 2.300 sacrifícios ocupariam o mesmo tempo que os três anos e meio. Historicamente falando, estaria em vista o tempo da contaminação do templo por parte de Antioco Epifânio, a 16 de dezembro de 167 A. C., até que o templo foi purificado e rededicado por Judas Macabeu, nos fins de 164 A. C.,
já entrando no ano de 163 A. C., quando todos os rituais judeus foram
completamente restaurados e os judeus obtiveram um período de independência da
dominação estrangeira. 3. Os dispensacionalistas transferem então esse período
para os últimos dias, vendo o anticristo em ação conforme fez Antioco
Epifânio, e o período de tempo em foco seria parte da Grande Tribulação. O
Príncipe dos príncipes, ou Príncipe do Exército (vs. 11), nesse caso, faria parte de uma
profecia messiânica. Ver no Dicionário o verbete chamado Anticristo.
A interpretação da Visão (8.15-20)
8.15
Havendo eu, Daniel, tido a visão,
procurei entendê-la. Ao longo do caminho, já dei as interpretações, pelo
que aqui só adiciono alguns detalhes. O padrão do livro: a declaração da visão, e então sua interpretação. Cf.
com Dan. 7.2-14 (a visão), e então Dan. 7.17-27 (a interpretação).
Novamente, Daniel caiu perplexo e com o espírito conturbado. Ele recebera a visão, mas não a compreendera. Havia um ser parecido com um homem, de pé perto dele, que era o revelador. A interpretação tinha de vir por intervenção
divina. Daniel não poderia ser o próprio intérprete. Esse ser celeste parecia ser um homem, mas não era; e esse é um acontecimento apocalíptico comum. Temos as histórias de Jacó (Gên. 32.24-32), de Manoá e sua esposa (Juí. 6.11 ss.), além
de outros em que o mesmo tipo de manifestação é mencionado. O anjo se chamava Gabriel, no vs. 16.
8.16
E ouvi uma voz de homem de entre as
margens do Ulai. Então foi ouvida a voz de uma pessoa misteriosa, sem dúvida um anjo, que clamou a Gabriel e
lhe ordenou que interpretasse para Daniel a visão. Isso ocorreu às margens do rio Ulai, no mesmo lugar onde a visão fora recebida (ver Dan. 8.2) e provavelmente pouco tempo depois disso. Portanto, aprendemos a importante verdade de que Deus tem por tarefa revelar e esclarecer. Somos instruídos no sentido de que,
se a algum homem falta sabedoria, tudo quanto ele precisa fazer é pedi-la a Deus, que a receberá (ver Tia. 1.5). Muitos mistérios continuarão existindo, mas
compreenderemos grandes verdades e obteremos direção para nossa vida. Ademais, haverá crescimento espiritual quando o Espírito do Senhor se aproximar de nós.
Ver no Dicionário o artigo Desenvolvimento Espiritual, Meios do. O
toque místico é um desses meios. Que teria acontecido à missão de Daniel se ele não contasse com o toque místico? Ver no Dicionário o verbete chamado Misticismo. Gabriel. Dou um artigo
detalhado com esse título, no Dicionário, pelo que não repito aqui o material.
8.17
Veio, pois, para perto donde eu estava.
Quando Gabriel se aproxima de nós, caímos tremendo, de rosto em terra, e foi isso que aconteceu a Daniel. Ele
é um grande Ser de Luz, um dos poderosos arcanjos. Ver o artigo do Dicionário chamado Anjos. Ver também sobre Gabriel e Rafael, onde
dou uma lista dos sete arcanjos tradicionais. Eles são pintados como generais dos exércitos
celestiais. A Gabriel são atribuídas tarefas especiais em favor de Israel. A compreensão que deveria ser comunicada a Daniel é que a visão estava ligada ao “tempo do fim’ . Cf. Hab. 2.3: “Porque a visão ainda está para cumprir-se no tempo determinado”. Alguns intérpretes, por essa razão, insistem em que a visão tem um sentido escatológico, e os eventos futuros culminarão na inauguração do Reino de
Deus.
Mas outros limitam a questão ao “fim das coisas”, quando Antíoco Epifânio fosse descartado e iniciasse um novo dia para Judá. Se haveria um fim relativo a Antíoco Epifânio, também haveria um fim para a figura temível que ele
representava, o anticristo. Cf. este versículo com o vs. 19, logo abaixo; Dan. 11.35 e 12.4,9,13. As outras referências quase certamente olham para o fim dos tempos, dando uma dimensão escatológica ao livro de Daniel, pelo que é provável que este
versículo deva ser visto como incluindo essa ideia. O atual sistema de coisas será
destruído para dar lugar a uma nova ordem, pois o novo dia será trazido pelo alvorecer divino. Um reino eterno está aproximando-se de nós (ver Dan. 7.14,18,22,27),
que raiará nos últimos dias. “É difícil resistir à sensação de que a expressão ‘tempo
do fim’ significa o fim dos tempos e o começo da eternidade” (Arthur Jeffery, in
loc.). Cf. Baruque 29.8 e 59.4, onde esse sentido, como é óbvio, está presente. A escatologia judaica estava em desenvolvimento. Ver no Dicionário o
artigo chamado Escatologia.
8.18
Falava ele comigo quando caí sem
sentido. O efeito da fala de Gabriel sobre o profeta foi tão poderoso que Daniel desmaiou e caiu no chão, entrando em um estado de sono profundo. O pobre homem teve um passamento, Cf. Dan. 10.9. Somente quando o arcanjo tocou em Daniel é que ele voltou a si. Ele tinha caído em um sono profundo, o nirdam da noite. Cf. Juí. 4.21; Jon. 1.5;
Pro. 10.5.
Em Sal. 76.6 está em pauta o sono da morte, quando essa palavra hebraica é usada. O arcanjo reanimou o profeta com seu toque e o pôs de volta sobre os pés, pelo que o ministério angelical estava realizando tudo quanto era
necessário para que a interpretação da visão chegasse a bom êxito. Não era estético que Daniel continuasse a dormir ali, para ouvir a mensagem. Ele precisava estar de pé, uma posição mais digna.
8.19
Eis que te farei saber o que há de
acontecer. Este versículo amplia o vs. 17. A visão dizia respeito ao fim, o tempo da ira. No hebraico temos a
palavra za’am, “ira”, “cólera”. Cf. Dan. 11.36. Está em foco o fim da opressão
de Antíoco. A ira de Deus se manifestaria contra aquele homem iracundo e desfaria tudo quanto ele fizera, levando Antíoco a seu fim. Excetuando Osé. 7.16, a palavra aqui usada é empregada para indicar a ira de Deus, pelo que o julgamento divino está em vista. A expressão finalmente tornou-se um termo técnico para indicar
os julgamentos de Deus, mormente Seu julgamento final. Ver no Dicionário o
verbete denominado Ira de Deus, quanto a detalhes. Cf. este versículo com Isa.
10.25. A taça da indignação de Deus contra Antíoco estava quase cheia e em breve começaria a derramar-se. Antíoco já havia prosperado (vs. 12) por tempo suficiente.
Esta visão se refere ao tempo
determinado do fim. Ver a discussão sobre o tempo do fim, no vs. 17. Este versículo quase certamente faz o escopo
desta profecia incluir o elemento escatológico, e não meramente os dias de Antíoco. A expressão (no hebraico, mo’edh) volta a aparecer em Dan. 11.27,29 e 35,
o que reforça a interpretação escatológica.
8.20
Aquele carneiro que viste, com dois chifres. Este versículo interpreta
os vss. 3 e 4, onde comento sobre a interpretação. Cf. Dan. 7.3. Os reis
representam reinos, e não somente o reino pessoal de um rei. Dan. 7.17 chama os quatro impérios de quatro reis. A Média se levantou alguns séculos antes da Pérsia, a qual veio a tornar-se potência mundial em cerca de 559 A. C. As duas nações tornaram-se associadas, mas a Pérsia finalmente ultrapassou a Média. Portanto, o segundo chifre era maior (mais forte) do que o primeiro. A Pérsia tinha mais
de dois milhões de homens e estendeu seu poder para o ocidente, para o norte e para o sul. Quanto a plenas informações, ver os artigos chamados Média
(Medos) e Pérsia.
8.21
Mas o bode peludo é o rei da Grécia. O bode peludo é o rei da Grécia, ou seja, o reino que Alexandre estabeleceu e lançou a uma conquista mundial. Entre suas vítimas estavam os persas. Isso já foi visto e comentado nos vss. 5-13,
pelo que não repito o material aqui. Cf. Dan. 10.20 e 11.2. A Septuaginta e a
Vulgata Latina apresentam o mesmo texto do vs. 5, e isso pode significar que o texto massorético seja uma glosa. Ver no Dicionário o verbete Massora
(Massorah); Texto Massorético. Algumas vezes as versões são corretas contra o texto
hebraico padronizado (o texto massorético). Devemos lembrar que as versões traduzidas do original hebraico usaram manuscritos mais antigos que o texto padronizado.
Os Papiros do Mar Morto comprovam que as versões algumas vezes se mostram corretas, em lugar do texto hebraico padronizado. Ver no Dicionário o
verbete intitulado Manuscritos Antigos do Antigo Testamento, o qual presta
informações sobre como os textos são escolhidos quando surgem variantes. Como é óbvio, usualmente o texto hebraico massorético e as versões concordam entre si. Mas quando não concordam, talvez as versões estejam corretas em 5% do volume total. Isso significa que o texto hebraico padronizado perdeu o texto original
nessa proporção.
8.22
O ter sido quebrado,
levantando-se quatro em lugar dele. Este versículo interpreta o vs. 8, onde ofereço as explanações. Temos aqui um comentário adicional: “mas não com força igual à que ele tinha”. Como é claro, Alexandre
era mais poderoso e maior conquistador que os seus sucessores. Seu império não manteve a unidade, mas foi dividido em quatro reinos vassalos, geralmente em competição mútua. Os ideais universalistas de Alexandre foram esquecidos,
conforme a história avançou. Cf. Dan. 11.4.
8.23
Mas, no fim do seu reinado. Nos tempos finais do
reino selêucida, Antíoco Epifânio se ergueria. Os vss. 23-25 interpretam a profecia do pequeno chifre
que aparece nos vss. 9-13. Talvez os prevaricadores sejam aqueles reis que
continuariam reinando, depois que o cálice da iniquidade se enchesse, e só mais
tarde seriam removidos. Mas alguns estudiosos vêem aqui os judeus helenizados, que caíram na apostasia e precisavam ser purificados pelo fogo das perseguições pagãs. Parte dessa purificação ocorreu por meio do castigo do pequeno
chifre.
Esse rei era homem de rosto duro e atos irracionais e
destruidores. Altamente inteligente e capaz de resolver qualquer tipo de quebra-cabeça, usaria seu brilhantismo para promover a miséria.”... um rei ousado e cruel surgirá. Esse
rei dirá mentiras. Isso acontecerá quando muita gente tiver se voltado contra Deus” (NCV). Talvez, conforme dizem alguns eruditos, o futuro anticristo seja
tipificado por esse homem vil e poderoso, Antíoco Epifânio. “Antíoco tornou-se o senhor do Egito e de Jerusalém, sucessivamente, mediante sua astúcia (I Macabeus 1.30; II Macabeus 5.24)” (Fausset, in
loc.). “Antíoco era adepto da conversa dúbia (I Macabeus 1.30), e assim, sendo
um especialista na linguagem ambigua (cf. Dan. 11.27,32), é bem descrito como
um mestre da intriga... era um adepto dos truques, vs. 25” (Arthur Jeffery, in loc.). Antíoco Epifânio reinou por
pouco mais de doze anos, pelo que teve tempo de espalhar muita confusão.
8.24
Grande é o seu poder. A essência
dos vss. 9-13 continua em vista, falando dos atos do abominável pequeno chifre. Ele tinha grande poder, que usava para destruir, pois se tornara um especialista na destruição. Ele obtinha
sucesso em tudo em que punha as mãos: “Ele agia e prosperava” (Revised Standard Version), diz o vs. 12. Ele conseguiu aniquilar exércitos poderosos e perseguiu e destruiu o povo judeu. “ Temíveis destruições foram causadas
por seus exércitos, não somente durante o massacre em Jerusalém (ver I Macabeus 1.24,31; II Macabeus 5.11-14), mas também no decurso das
campanhas por toda a terra. Os feitos de Antíoco são chamados de “maravilhas” (ver Dan. 12.6)... destruirá
homens poderosos e o povo dos santos, seus adversários políticos e os judeus. Outros pensam que os primeiros apontam para as classes superiores... que os santos... são os judeus, e que o fato de ele tê-los destruído é paralelo ao fato de que os magoará (Dan. 7.25,27)” (Arthur Jeffery, in loc.). Essas coisas “serão plenamente
cumpridas pelo anticristo, o qual operará pelo poder de Satanás. Ele terá licença
irrestrita para isso. Ver Apo. 17.13 e II
Tes. 2.9-12” (Fausset, in
loc.).
Mas não por sua própria força. Assim
diz o texto em alguns manuscritos hebraicos, que parece ter invadido o texto com base no vs. 22. Muitos manuscritos
antigos da tradição hebraica, bem como os melhores manuscritos da Septuaginta, omitem essas palavras. Se elas forem genuínas, devemos supor que Antíoco operava através do poder de Satanás, ou então Yahweh, para punir os povos que esse rei destruiu, foi o poder por trás de suas campanhas, tal como
foi dito sobre as destruições provocadas por Nabucodonosor.
8.25
Por sua astúcia nos seus em preendimentos. O pequeno chifre operaria através da astúcia, uma espécie de inteligência maligna, diabólica. Ele
não foi um ser humano ordinário. Praticava o ludíbrio para obter o que queria, não
tendo código moral exceto o que o levava a servir a si mesmo e a seus desígnios maliciosos. Em Miq. 6.11, essa palavra, aqui traduzida por “astúcia”, é usada
para indicar pesos falsos. Cf. também Gên. 27.35 que fala da “astúcia” de Jacó.
Encontramos uma afirmação similar em Dan. 11.23. Na forma moderna de falar,
usamos a expressão “negócios dissimulados”. “Em seu coração ele pensará grandiosamente”,
tradução literal para “se engrandecerá”. “Ele se considerará muito importante”
(NCV). Ferirá e matará subitamente, sem nenhuma advertência ou razão.
Ele será imprevisível e traiçoeiro. Apolônio, seu principal coletor de
impostos, foi a Jerusalém e falou pacificamente, aquietando as apreensões. Mas quando os judeus
estavam relaxados e nele confiavam, de súbito ele ordenou grande matança (I Macabeus 1.29,30; II Macabeus 5.23-26).
Antíoco Epifânio chegou mesmo a levantar-se contra o Príncipe dos príncipes,
título paralelo a “príncipe dos exércitos” usado no vs. 11, onde dou
comentários. Ele chegaria a atacar Yahweh (a interpretação mais provável), através de suas perseguições religiosas aos judeus, povo de Deus. Ou, escatologicamente falando, ele guerrearia contra o Messias e Seu povo. Esse será o ponto
culminante de seus atos audaciosos. Devemos compreender aqui que Antíoco
Epifânio se endeusaria e atacaria tudo quanto é sagrado.
Será quebrado sem esforço de mãos humanas. Ou seja, Antíoco Epifânio (e seu antítipo, o anticristo) seria morto por algum tipo de
intervenção divina, como um acidente, uma enfermidade etc., usada por Deus para pôr fim àquele homem abominável. Cf. Dan. 2.34. Existem várias tradições sobre como Antíoco Epifânio teria morrido. Uma delas diz que ele foi atacado por vermes e úlceras, quando estava a caminho da Judeia para tomar vingança contra os judeus que, sob as ordens dos Macabeus, tinham derrotado seu exército (ver II Macabeus 9.5; Josefo, Antiq. XII.9.). Mas Políbio (Hist.
XXXI.9) diz que ele morreu de súbito, de insanidade, em Tabae, na Pérsia, em 164 A. C., poucos meses depois de os macabeus terem rededicado e purificado o templo de Jerusalém. I Macabeus 6.8 ss. conta uma história similar. Algum ato divino aterrorizante, alguma intervenção sobrenatural, também porá fim à vida do anticristo (ver II Tes. 2.8).
Epílogo (8.26-27)
8.26
A visão da tarde e da manhã. Aqui
é afirmada a verdade da designação temporal dos 2.300 dias (vs. 14). O santuário será limpo e purificado, e o
tempo da perseguição terminará, para que Deus possa continuar com Seus planos
relativos ao povo de Israel, sem assédio por parte de estrangeiros. Mas isso
não acontecerá imediatamente. Por isso a visão foi “selada”, ou seja, não foi
concluída. Este versículo não indica que a profecia deveria permanecer em segredo,
mas que ela não teria cumprimento por algum tempo. Em alguma “era distante”, porém,
ocorreria seu cumprimento. Ver Eze. 12.27. Cf. o “tempo do fim”, nos vss. 17 e 18, e em Dan. 10.14 e 12.9. Quanto à ideia de que algumas revelações se destinam às gerações futuras e estão sendo guardadas para os tempos
apropriados, ver Enoque 1.2; II Enoque 33.911; 35.3 e II Esd. 14.16.
8.27
Eu, Daniel, enfraqueci. A
combinação da natureza avassaladora de suas experiências místicas com as coisas terríveis que Daniel viu acontecer ao povo
de Deus, fizeram o profeta adoecer por alguns dias. Depois ele se levantou e se ocupou das questões do rei, mas estava perplexo diante do que havia
visto; e, a despeito da ajuda do anjo intérprete, Gabriel (vss. 16 e 17), ainda restavam muitos mistérios que a mente de Daniel não conseguia resolver. “Doente, por causa da tristeza diante das calamidades que atingiriam seu povo... Sal.
102.14, Teus servos têm prazer em suas pedras e favorecem a sua poeira’” (Fausset, in loc.). Ou seja, tudo quanto havia na cidade dava prazer a seus “filhos”,
pelo que também tudo quanto lhe acontecia de ruim provocava grande dor.
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