Daniel 2 — Comentário Teológico

Daniel 2 — Comentário Teológico
Daniel 2 — Comentário Teológico



Capítulo Dois


O livro de Daniel compõe-se essencialmente de seis histórias e quatro visões. As histórias ocupam os capítulos 1-6, e as visões os capítulos 7-12. Quanto a detalhes a respeito, ver a seção “Ao Leitor”, quinto e sexto parágrafo, antes da exposição a Dan. 1.1. Agora movemo-nos para a segunda história: O sonho de Nabucodonosor. Este longo capítulo, como é natural, divide-se em duas grandes parles: vss. 1-13, prólogo; e vss. 14-45, Daniel como intérprete de sonhos. Os vss. 46-49 contêm o epílogo.



“O Sonho de Nabucodonosor. Esta história ensina a debilidade da sabedoria humana, em comparação com a sabedoria conferida por Deus” (Oxford Annotated Bible, na Introdução ao capítulo). A história é um paralelo da experiência de José, em Gên. 41. Há uma correspondência na fraseologia, o que provavelmente mostra que o autor sacro tinha aquela história na mente, quando escreveu o relato presente. Os temas principais são: Toda a sabedoria humana é destituída de valor quando confrontada com a sabedoria conferida por Deus; uma filosofia da história; as eras deste mundo são guiadas pelo decreto divino; Deus humilha os orgulhosos e eventualmente faz com que eles O reconheçam. Ver como o teísmo domina o relato. O Criador continua presente em toda a Sua criação — intervindo, recompensando e punindo. Ver sobre esse tema no Dicionário. Contrastar isso com o
deísmo, que ensina que a força criadora (pessoal ou impessoal) abandonou o seu universo aos cuidados das leis naturais.

Segunda História: O Sonho de Nabucodonosor (2.1-49)
Prólogo (2.1-13)

Esta história é datada no segundo ano do reinado de Nabucodonosor. “Desde os dias de Josefo, tem sido exercida grande engenhosidade para explicar como Daniel pôde ter estado ativo em alguma capacidade oficial, no segundo ano do rei, quando se declarou que somente após três anos de treinamento é que Daniel foi introduzido à presença de Nabucodonosor. Mas a data precisa é apenas um artificio literário que pertence ao arcabouço histórico, e a incoerência que nos impressiona nada teria significado para o escritor sacro e seus contemporâneos” (Arthur Jeffery, in loc.).

2.1
No segundo ano do reinado de Nabucodonosor. Ao rei foram dados por Deus alguns sonhos inspirados — esse é o sentido óbvio do versículo. Ele ficou perturbado e foi forçado a apelar para a ajuda de Daniel a fim de compreender esses sonhos. Ver no Dicionário o verbete chamado Sonhos. Se a maioria dos sonhos é inspirada pelo cumprimento dos desejos, existem sonhos espirituais e psíquicos que vão além desses limites. Assim sendo, os homens idosos sonham, e os jovens vêem visões (Joel 2.28), por divina direção e inspiração.

Nabucodonosor, sendo um grande rei, naturalmente sonharia com coisas seculares. E também não precisava ser um judeu para ser guiado pelo Espírito Santo.

2.2
Então o rei mandou chamar os magos... A maior parle dos povos antigos levava a sério os sonhos. Certamente isso se dava com os hebreus. Aqui e ali na Bíblia encontramos sonhos espirituais que são quase visões. Em minha própria experiência, tenho tido sonhos que definitivamente não podem ser classificados como sonhos comuns e profanos. Sonhar é, de modo geral, uma herança espiritual, e ocasionalmente uma pessoa atinge o outro mundo e traz dali algo de especial. Cf. este versículo com Dan. 1.17,21. Daniel tinha habilidades especiais como intérprete. Dos sábios da Babilônia, esperava-se que tivessem discernimento profético. Portanto, foi apenas natural que o rei os convocasse para testar suas habilidades. O termo “caldeus” fala da casta coletiva dos sábios. Os sonhos e as visões são a mesma coisa e originam-se da alma e da psique humana. Fazem parte do estoque inerente de conhecimentos dos homens. Algumas vezes, porém, um bom intérprete pode ter discernimentos que ultrapassam suas próprias habilidades, e podemos com razão supor que, vez por outra, nossos anjos guardiães nos ajudam em nossos sonhos, concedendo-nos entendimento. Talvez o Espírito Santo ocasionalmente condescenda em intervir pessoalmente na questão. Freud escreveu o primeiro estudo científico sobre os sonhos, com consideráveis habilidades de interpretação, embora tenha exagerado nas questões sexuais. Atualmente, grande riqueza de literatura ajuda-nos a compreender melhor os sonhos.

“Parece que Daniel ultrapassava (ver 1.17) todas as classes da erudição mágica, sem importar se isso requeria conhecimento, sabedoria ou sonhos” (Ellicott, in loc.).


À lista de especialistas dada em Dan. 1.20, são adicionados aqui os ‘feiticeiros”. A palavra hebraica é rrekhashashephim, ou seja, alguém que sussurrava encantamentos. A palavra, de origem mesopotâmica, também é usada em Êxo. 7.11. O kesheph, de Isa. 47.9,12, e o kashshaph, de Jer. 27.9, eram equivalentes aos termos acádicos kispu e kassapu. Talvez o termo seja técnico, indicando uma classe de sábios que estavam envolvidos nas artes psíquicas.

2.3
Disse-lhes o rei: Tive um sonho. O rei transmitiu aos sábios de várias classes e habilidades o(s) sonho(s) que o mantinha(m) em estado de apreensão e ansiedade, Seu espírito estava perturbado, e ele sabia que não se tratava de um sonho comum. Usualmente, os sonhos psíquicos e espirituais chegam com cores extravívidas, bela música, notáveis simbolismos e grande impacto emocional. Quando alguém anda com o Espírito, mesmo que apenas por um pouco, então, ao dormir, tem conhecimento disso. Durante um período de três anos, registrei cuidadosamente os meus sonhos.

Mais de cinquenta deles foram claramente precognitivos. Tive alguns sonhos espirituais muito significativos que me ensinaram coisas que eu precisava saber. Eram sonhos totalmente diferentes do restante dos meus sonhos, e me deixaram perplexo. Vez por outra tenho tido uma enxurrada desses sonhos. Mas, de outras vezes, eles ocorrem apenas no intervalo de uma vez por ano. O certo é que tanto o espírito quanto o Espírito Santo podem fazer-se presentes nos sonhos. Deveríamos cultivar isso muito mais, por ser várias vezes uma possível fonte de informação necessária.

2.4
Os caldeus disseram ao rei em aramaico: Ó rei. Os especialistas convocados estavam ansiosos por ouvir o sonho, confiando que a interpretação não estaria fora do alcance de sua habilidade. O texto diz que aqueles homens faiaram em aramaico. Isso pode subentender que, a partir deste ponto, o texto original do livro foi escrito nesse idioma. Alguns estudiosos supõem que o livro inteiro tenha sido escrito nessa língua, depois traduzida para o hebraico. A seção de Dan. 2.4-7.28 está escrita em aramaico, no livro de Daniel, até os dias de hoje. O restante do livro está escrito em hebraico, mas pode ter sido traduzido do original aramaico. Não pode haver dúvida de que aqueles homens eram bons na interpretação dos sonhos. A maioria das pessoas, prestando atenção e usando de diligência, pode tomar-se fazer boas interpretações dos sonhos. Mas existem sonhos que nos chegam, por assim dizer, de uma estação de rádio estrangeira, e nos deixam perplexos, e foi isso o que aconteceu aos sábios e feiticeiros da Babilônia. Tornava-se necessária a ajuda divina, por meio de Seu profeta, para solver os enigmas do sonho de Nabucodonosor.

Caldeus. Neste ponto, a palavra é usada para falar sobre as várias classes de sábios, referidos em Dan. 1.21 e 2.2. A expressão de tratamento “Ó rei, vive eternamente” era comum entre eles. Demonstrava respeito, bem como uma solicitação pelo bem-estar do monarca. Também enfatizava o seu valor como líder. Ele seria homem tão bom que não deveria nunca morrer, mas, sim, continuar governando indefinidamente. Cf. Dan. 3.9; 5.10; 6.6,21; I Reis 1.31 e Nee. 2.3.

Daremos a interpretação. “Interpretação” vem da palavra hebraica pishra, que fala do desatar de fios com nós. Na verdade, interpretar alguns sonhos é semelhante a isso, ao passo que o significado de outros sonhos está na superfí­cie. A interpretação de sonhos tornou-se uma ciência elaborada, entre alguns antigos, pois, nos sonhos, os deuses falavam. “Porções dos livros sobre os sonhos, registradas em escrita cuneiforme, ainda sobrevivem, dando instruções detalhadas sobre como os vários elementos de um sonho deveriam ser interpretados (ver S. H. Langdon, ‘A Babylonian Tablet on the Interpretation of Dreams’, Museum Journal, VII (1917), (págs. 115-122)” (Arthur Jeffery, in loc.).

2.5
Respondeu o rei, e disse aos caldeus. O rei levou a coisa muito a sério, e ameaçou os sábios com morte por mutilação (“sereis despedaçados”), caso eles deixassem de prover uma interpretação satisfatória. Conjecturo que Nabucodonosor ameaçou lançá-los aos leões. Este versículo mostra o importante lugar que a interpretação de sonhos ocupava na sociedade babilônica. O rei havia esquecido o sonho, pelo que em nada pôde ajudar os magos. Eles teriam de revelar qual fora o sonho e então interpretá-lo, tarefa dupla que, segundo eles disseram, somente os deuses seriam capazes de realizar (vs. 11). Daniel, porém, com a ajuda de Deus, foi capaz de revelar o sonho e interpretá-lo. A lição principal do capítulo começou a emergir: a sabedoria humana é débil quando comparada à variedade de sabedoria dada pelo Espírito. É a sabedoria de Deus que guia o destino do mundo, das nações e dos indivíduos. Os homens são capazes de aprender algo a esse respeito, se forem dignos disso. As casas e famílias dos sábios muito teriam a perder, pois haveria execuções e destruição, e casas boas seriam transformadas em monturos, caso os magos da Babilônia falhassem. Essas ameaças devem ter abalado o subconsciente daqueles homens. Mas coisa alguma funcionou. A forma de sabedoria dos magos fracassou na hora do teste. Heródoto fala sobre a “destruição das casas”, no tocante aos castigos antigos. Quando um homem caía, caía também a sua casa (ver Erato, 1.1.6), John Gill conta-nos um caso ocorrido em seus dias. Damien, um louco, feriu um rei francês. O homem foi executado, e o lugar onde ele nasceu foi demolido. Cf. este versículo com II Fieis 10.27.

2.6
Mas se me declarardes o sonho e a sua interpretação... Qualquer indivíduo, dentre os magos, ou a coletividade deles, se fosse capaz de dizer qual fora sonho esquecido do rei, e então o interpretasse corretamente, obteria riquezas e honras e seria elevado a um alto ofício no reino. E o rei disse: “Portanto, agora façam isso!”. Talvez o rei tenha raciocinado que, se um vidente não pudesse lembrar o passado, então também não poderia predizer o futuro Os estudos dos fenômenos psíquicos têm demonstrado que o retroconhecimento e a precognição não andam de mãos dadas, necessariamente, na mesma pessoa. Mas é verdade que a maioria das pessoas que pode prever o futuro tem outras habilidades psíquicas, de alguma sorte. Todas as pessoas, em seus sonhos, têm discernimento quanto ao futuro, especialmente nos sonhos que ocorrem ao alvorecer do dia. Ver na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia o? verbetes chamados Precognição e Sonhos.

2.7,8
Responderam segunda vez, e disseram. Os magos insistiram em ouvir primeiramente o sonho, mas este desaparecera da memória do rei. Para preservar os sonhos, uma pessoa geralmente tem de anotá-los por escrito imediatamente. Se não fizer isso, na maior parte dos casos, os sonhos são esquecidos. Eles se encontram nos arquivos do cérebro, mas não podem ser lembrados conscientemente. A hipnose, entretanto, pode trazê-los de volta, O rei acusou os “magos” de tentarem “ganhar tempo”, pois falavam e não agiam (vs. 8), O rei mencionou novamente despedaçá-los e destruir suas casas (vs. 5), caso eles não conseguissem fazer o que era requisitado. E por causa dessa tremenda ameaça eles tentavam ganhar tempo, esperando que algo acontecesse, sem que tivessem de revelar sua total ignorância. Se eles continuassem tentando ganhar tempo, o rei poderia esquecer a questão ou então relembrar o sonho.

2.9
Isto é: Se não me fazeis saber o sonho... Aqueles psíquicos profissionais ocupavam sua posição de confiança como conselheiros do rei, por serem capazes de realizar o seu serviço. Os fenômenos psíquicos funcionam melhor quando não são forçados, mas o rei não sabia disso nem ouviria tal argumento. Se os magos não dessem resposta ao rei, não passariam de mentirosos comuns. O rei chegou a acusá-los de conspiração. Eles tinham acordado em enganar ao monarca. Continuavam a contar mentiras, esperando alguma mudança da parte do rei, conforme é sugerido no vs. 8. Alguns psíquicos muito poderosos podem produzir fenômenos quando solicitados, mas não são muitos os que conseguem esse feito. E aqueles que conseguem nem por isso solucionam os problemas das pessoas. Este versículo revela a crença de que tais poderes operam melhor em certos dias. Cf. Est. 3.7. Estudos demonstram que, de fato, há dias melhores e piores para os fenômenos psíquicos, e outro tanto acontece no caso dos sonhos. Algumas vezes, sonhos significativos nos ocorrem como se fossem enxurradas, Mas não entendemos a razão de tudo isso. Essas razões podem ser cósmicas ou pessoais. Se tais poderes se devem a energias genuínas da personalidade humana, então tais energias podem ser influenciadas pelos campos magnéticos que nos rodeiam ou por outras energias naturais. Ou, então, conforme diz certo cântico popular: “Em um dia claro, pode-se ver para sempre”

2.10,11
Não há mortal sobre a terra que possa revelar o que o rei exige. Os psíquicos profissionais da Babilônia apelaram então para a história. Não havia nenhum caso registrado de homem, rei ou não, que tivesse feito tal exigência a um psíquico, para receber com sucesso a resposta que buscava. Nabucodonosor exigia o tipo de coisa que somente um deus seria capaz de realizar (vs. 11). Aqueles homens confessaram as limitações de sua profissão, limitações que desaparecem quando o Espírito de Deus está envolvido.

Daniel mostrou estar à altura da tarefa. A sabedoria humana, pois, aparece nesse caso como débil, e esse é um dos grandes temas do capítulo. “Os deuses não vivem no meio do povo” (afirmaram eles), pelo que não podiam ser invocados para ajudar. Mas Yahweh, o Deus de Daniel, estava sempre presente, e daria poder a Seu servo para fazer o que somente o poder divino era capaz de realizar. O judaísmo é glorificado às expensas do paganismo, e esse é, igualmente, um tema do livro de Daniel. Aqueles magos tinham deuses deístas, os quais nunca intervêm na histeria humana, mas estão em algum outro lugar, ocupados em seus próprios negócios.

2.12-13
Então o rei muito se irou e enfureceu. Nabucodonosor perdeu a paciência e ordenou um decreto terrível: toda a classe dos psíquicos profissionais (magos de vários tipos) seria executada. Entre eles estavam Daniel e seus amigos. Torna-se óbvio, através do vs. 13, que Daniel, em sua educação geral, fora treinado para ser um dos sábios (o grupo combinado dos mágicos, astrólogos e feiticeiros, vs. 2). Essa não é a linguagem evangélica. Os judeus naturalmente estabeleciam uma distinção: Daniel era inspirado por Yahweh, e os demais eram dotados apenas de sabedoria humana, inspirados quem sabe por qual tipo de poderes estranhos.

“... a coletividade inteira de sábios, que, de acordo com Dan. 1.20, incluía Daniel e seus amigos. A expressão “sábios” ocorre onze vezes no livro como nome geral para os sábios da corte, e duas vezes (2.27 e 5.15) como nome para uma classe como tal: astrólogos, mágicos, encantadores. No Oriente Pró­ximo, esses adivinhos, feiticeiros sacerdotais etc. formavam uma espécie de classe. O rei estava decidido a livrar-se daquele corpo inteiro de sábios. Decreto: A mesma palavra era usada para indicar uma sentença judicial (vs. 9)” (Arthur Jeffery, in ioc.).



O Intérprete Daniel (2.14-45)
O Decreto do Rei e Suas Consequências (2.14-19)


2.14
Então Daniel falou avisada e prudentemente. O judeu Daniel agora representa o sábio ideal, o homem educado que tinha a vantagem de possuir o Espírito de Yahweh, o que o distinguia dos demais sábios. Desse modo, fica demonstrada a superioridade do judaísmo em relação ao paganismo. Misericordiosamente, Daniel, sob o poder de Yahweh, salvou toda a casta dos sábios, o que era a coisa
decente e humanitária a fazer.

Já exibindo sua sabedoria superior, mesmo antes de ter recebido qualquer orientação da parte de Yahweh, Daniel respondeu ao inquisidor com habilidade e começou a contornar a dura situação. Arioque, capitão da guarda do rei, recebeu a tarefa de cuidar da execução geral dos sábios, e Daniel e seus amigos foram localizados e informados quanto à sentença. O título desse homem é usado em II Reis 25.8. Ver também Jer. 39.9 e 52.12 ss. Literalmente, o título significa “chefe dos executores”. A execução de inimigos do rei fazia parte de seus deveres, que entretanto não se limitavam a isso. O homem era um dos principais oficiais do rei, parte de sua guarda pessoal. Daniel respondeu com prudência e discrição (Revised Standard Version) ou com “sabedoria e habilidade” (NCV). Ver no Dicionário verbete intitulado Arioque, segundo ponto, quanto a detalhes.

2.15
E disse a Arioque, encarregado do rei. Daniel caracterizou o decreto de severo e quis saber por que o rei tinha ordenado tão drástica medida. Sem dúvida alguma maldade significativa tinha provocado aquele ato. Foi assim que Arioque explicou a questão inteira, a qual, para Daniel, podia ser facilmente remediada por uma interpretação bem-sucedida. À raiz da palavra aqui traduzida por “severo”, está a ideia de “pressa indevida”. Mas a palavra também denota severidade.

Alguns estudiosos, porém, defendem a ideia de peremptório. O rei não tinha esperado por um segundo pensamento sóbrio, conforme os gregos aconselhavam que fosse feito.

2.16
Foi Daniel ter com o rei e lhe pediu designasse o tempo. Daniel aproximou-se ousadamente do rei, sem dúvida com a mediação de Arioque (ver o vs. 24), solicitando uma entrevista pessoal. Dessa forma, Daniel deixaria a questão descansar, satisfazendo a demanda do rei por informações. Daniel dependia do auxílio da fonte divina, Yahweh. Ele não tinha tal confiança em si mesmo. “A providência sem dúvida influenciou sua mente. A Daniel seria concedido algum favor especial” (Fausset, in ioc.). A hora era de ousadia, e não de humildade, pelo que o profeta agiu com grande decisão. A humildade seria apropriada para uma ocasião menos dramática.

2.17
Então Daniel foi para casa. O Apoio da Oração. Tanto a experiência quanto a experimentação (incluindo a de variedade científica) mostram que a oração é mais poderosa quando feita em grupo. Energias espirituais geradas por pessoas unidas em um propósito não podem ser geradas por indivíduos comuns. Dessa forma, Daniel buscou apoio na oração. Ele apelou para seus três amigos. Quatro amigos tinham uma só mente, e esperavam grandes coisas da parte de Yahweh.

Mais coisas são efetuadas pela oração
Do que este mundo sonha.

(Tennyson)


Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á.
(Mateus 7.7)


2.18
Para que pedissem misericórdia ao Deus do céu. ‘Naquele tempo de testes, Daniel manteve a calma. Ele voltou para casa, procurou seus três amigos, e, juntos, eles oraram pedindo misericórdia da parte do Deus do céu. Esse título é usado para indicar Deus seis vezes no livro de Daniel (ver 2.18,19,28,37,44 e 5.23), nove vezes no livro de Esdras e quatro vezes no livro de Neemias. Em outros lugares do Antigo Testamento, ocorre somente em Gên. 24.3,7; Sal. 136.26 e Jon. 1.9” (J. Dwight Pentecost, in Ioc.). No contexto do livro de Daniel, aponta para Yahweh como o Deus Altíssimo, em contraste com os deuses babilônicos ausentes (ver o vs. 11). Os babilônios tinham uma espécie de deísmo idólatra, pois a força criativa era vista como inativa entre os homens, porquanto abandonara sua criação às leis naturais.

Em contraste com isso, a fé dos hebreus era teísta. O teísmo ensina que o poder criativo continua no universo, intervindo, recompensando e punindo, de acordo com as demandas da lei moral. Ver sobre ambos os termos no Dicionário. “O Deus do céu é o equivalente judaico do nome cananeu Ba’al samem. Esse era o título que os persas usavam para referir-se ao Deus dos judeus. Parece que caiu de uso em tempos posteriores, por assemelhar-se muito ao termo grego Zeus Ouranios(Arthur Jeffery, in Ioc.).

2.19
Então foi revelado o mistério a Daniel. O mistério do sonho do rei foi resolvido por meio de uma visão noturna. Talvez esse termo fosse distinguido dos sonhos como algo superior, conforme se vê em Joel 2.28. Mas parece que no livro de Daniel o sonho espiritual é considerado de mesmo nível que as visões. Ver no Dicionário os artigos Sonho e Visão (Visões). É verdade que na experiência humana algumas vezes precisamos de uma orientação especial que vem por meio da inspiração mística. A Daniel foi conferida essa bênção, em sua hora de necessidade. 

O próprio Daniel algumas vezes mostrou-se incapaz de obter orientação por sua sabedoria, a qual era muito superior à nossa. Assim sendo, é óbvio que, algumas vezes, precisamos de orientação especial por meio de eventos extraordinários. Cf. este versículo com Gên. 46.2 e Jó 33.14,15. Daniel e seus amigos oraram durante a noite, e eis que no meio da noite a resposta chegou. Algumas vezes precisamos de respostas rá pidas! Daniel estava abordando um mistério, mas, através da oração, até mistérios podem ser revelados pela sabedoria de Deus (vs. 30)” (Oxford Annotated Bible, comentando sobre o vs. 18).

O Hino de Louvor de Daniel (2.20-23)

2.20
Disse Daniel: Seja bendito o nome de Deus. A grande vitória alcançada foi a inspiração para o significativo hino de agradecimento e louvor ao Poder que prestara grande favor aos jovens judeus. Os que conhecem a literatura poética, conforme ela existia na antiga nação de Israel, dizem-nos que o poema a seguir consiste em quatro estrofes de três e quatro linhas, sendo corretamente classificado como um hino. Trata-se de um tema que louvava a sabedoria e o poder de Deus. Cf. I Cor. 1.24. Deus intervém na história humana, e nós agradecemos e O louvamos por isso. Encontramos sentimentos similares em Sal. 41.13; Jó 12.12,12; Nee. 9.5 e Est. 1.13.

O segredo foi revelado facilmente, pois Deus sabe de tudo. A visão noturna deu a Daniel toda a informação de que ele precisava, e eram informações salvadoras. A fonte dessas informações foi o Deus do céu. Ver as notas expositivas sobre o vs. 18 quanto a esse título. A oração dos quatro amigos mostrou ser realmente poderosa.

Poder na oração, Senhor, poder na oração;

Aqui em meio aos pecados, à tristeza e aos

cuidados da terra:
Homens perdidos e moribundos, almas em desespero.
Oh, dá-me poder, poder na oração.

(Albert Simpson Reitz)

Em vista dessa realidade, que solucionou o problema de Daniel, ele abençoou o Nome de Elah, o Poder que se manifestou nessa situação particular. Esse título divino é caldeu e, ao que parece, equivale a Elohim. Quanto a nome, ver Sal. 31.3; e quanto a nome santo, ver Sal. 30.4 e 33.21. O Deus de Poder compartilha com os homens Seu poder e Sua sabedoria (cf. o vs. 23). O Poder solucionou o problema de Daniel e lhe deu vitória em uma hora crítica de prova­ção. Sua sabedoria e Seu poder duram para sempre, literalmente “de eternidade a eternidade” (cf. Sal. 41.13; 90.2 e 103.17).

2.21

É ele quem muda o tempo e as estações. Deus é o Deus das mudanças. Ele intervém na história humana, individual e coletiva, e esse é o ensino do teísmo. Ele muda os tempos e as estações, fazendo a rotação dos ciclos da história parecerem as estações do ano. Nisso, Ele levanta reis e derruba reis. Ele determina o curso das nações. Ele é a fonte de toda a sabedoria e conhecimento, e é generoso em Seus dotes, compartilhando-os com os homens, de acordo com a necessidade de cada um. Cf. Isa. 44.28; Jer, 25.9; 27.9. Ver no Dicionário verbete chamado Soberania de Deus.


2.22
Ele revela o profundo e o escondido. Deus nunca se encontra no escuro. Ele nunca fica sem compreensão; jamais fica perplexo; nunca hesita entre duas opiniões. Ele revela o que está escondido nas profundezas; conhece todos os segredos e os transmite a homens em necessidade. Deus é a Luz e reside na luz, onde todos os mistérios são esclarecidos e a mente dos homens é iluminada. Quanto a coisas profundas e misteriosas, cf. Jó 12.22; I Cor. 2.7,10. Ele revela; Ele sabe (ver Sal. 139.12). Ele ilumina. “O homem mesmo requer iluminação de uma fonte externa. Essa fonte é Deus; Ele é o sol da alma humana, em quem a luz habita como se Ele fosse o palácio do sol. Em Sua luz, vemos a luz (Sal. 36.9)” (Ellicott, in loc.). Ver no Dicionário os verbetes intitulados Luz, Metáfora da e Iluminação.

2.23
A ti, ó Deus de meus pais. O hino termina com uma nota de louvor. Ver no Dicionário o artigo chamado Louvor. O Deus de Daniel era o Deus de seus antepassados (cf. Deu. 1.21; 26.7; II Crô. 20.6 etc.). Subjacente à sua fé, havia muita tradição, uma história de homens santos que confiavam no mesmo Deus Todo-poderoso e Todo-conhecedor e obtinham os mesmos resultados quando oravam. No caso de Daniel, havia poder para salvar a sua vida e a vida de seus amigos, bem como a vida de todos aqueles pobres psíquicos profissionais. No caso de Daniel, havia sabedoria para dar-lhe discernimento tanto nos sonhos do rei quanto na sua devida interpretação. Em outras palavras, Deus não deixou Daniel no escuro.

Deus de nossos pais, cuja mão todo-poderosa
Conduz, em beleza, todas as hostes estelares
De mundos brilhantes, em esplendor, pelos céus.
Nossos cânticos agradecidos se elevam
diante de Teu trono.
Leva-nos da noite para o dia interminável.
(Daniel C. Roberts)

A Interpretação do Hino (2.24-45)

2.24
Por isso Daniel foi ter com Arioque. Agora Daniel tinha as respostas, pelo que disse a Arioque que suspendesse o processo de execução e o levasse à presença do rei, a fim de mostrar-lhe o poder e a sabedoria de Deus na solução do mistério. As técnicas profissionais dos psíquicos tinham fracassado. A sabedoria pagã falhou no momento da provação. Mas Daniel mostraria a diferença. Ele não ousaria (por temor de perder a vida) chegar à corte do rei. Assim sendo, apelou para seu intermediário, e isso concorda com o que sabemos sobre os procedimentos nas cortes orientais e sobre a etiqueta palaciana. A passagem de Est. 4.11 está correta quando diz que ninguém podia apresentar-se ao rei. Daniel teria de ser chamado. Heródoto (Hist. III.40) mostra-nos que esse era o costume entre os persas.

Daniel desejava que não houvesse perda de vidas humanas por razões ridí­culas, como o capricho do rei, que estava irado com seus conselheiros e videntes. Sua intercessão diante do rei salvaria o dia. Cf. Eze. 14.14. Este versículo mostra-nos que o vs. 16 não deve ser interpretado como se Daniel fosse culpado de um ato apressado, ao correr para a presença do rei. Daniel tinha mais bom senso do que isso.

2.25
Então Arioque depressa introduziu Daniel na presença do rei. Arioque sabia que estava ocupado em uma missão urgente, que salvaria muitas vidas, pelo que anelava realizar logo a sua tarefa. Além disso, ele sentia haver encontrado um homem que poderia resolver o mistério do sonho do rei, e estava ansioso por sentir a seu senhor. Ele receberia favor, mas era um bom servo no cumprimento de seus deveres, e isso já era uma recompensa para ele. A descoberta foi feita em um lugar um tanto inesperado (para Arioque), entre os humildes cativos de Judá. Provavelmente o homem não tinha consciência de Daniel e de suas realizações já significativas (Dan. 1.19,20). Mas ele reconheceria um homem bom assim que o visse, e havia algo na atitude segura de Daniel que inspirava Arioque a confiar no profeta. Não havia dúvida'. Daniel tinha a resposta para o problema.

Arioque correu, excitado, para o rei. Uma esplêndida mudança de eventos acontecera. Oh, Senhor, concede-nos tal graça!

2.26
Respondeu o rei, e disse a Daniel. Arioque entrou na presença do rei com um olhar de confiança no rosto. E apresentou Daniel, o solucionador do problema, ao rei. O rei lançou um olhar inquisitivo ao rapaz. O rei sabia quão bom era Daniel, mas seria ele assim tão bom? Poderia ele fazer o que os psíquicos profissionais não tinham conseguido fazer? Ele teria de passar pelo mesmo teste a que eles tinham sido submetidos. Em caso contrário, o decreto de execução ocorreria conforme já estava decretado. É grandioso quando um homem é, realmente, tão bom quanto sua reputação, o que por muitas vezes não acontece. No entanto, Daniel, dotado por Yahweh, era o homem do momento. Ninguém ficaria desapontado.

Nenhuma habilidade, nem poder, nem mérito nos pertence.
Conquistamos somente pelo Seu poder.
(George W. Doanne)

Daniel mostrou-se capaz. “És tu capaz?”, pergunta-nos o Senhor. E os sonhadores respondem: “Senhor, somos capazes”. Alguns poucos são; alguns poucos vencem. A maioria é derrotada no calor da batalha.

2.27
Respondeu Daniel na presença do rei, e disse. Daniel não piscou quando seu olhar encontrou o olhar do rei. Ele sabia que tinha consigo a resposta divina. Ele concordou com os psíquicos profissionais: somente um deus poderia resolver aquele caso (vs. 11). Mas como Daniel tinha consigo o seu Deus, tudo estava bem. A casta inteira dos magos foi mencionada por suas partes constitutivas: sábios, encantadores, magos, astrólogos, adivinhos, tal como se vê no vs. 2. Eles estavam certos quanto a um detalhe. Eles não podiam, nem individual nem coletivamente, solucionar o problema do rei. Porém, um único indivíduo, com a ajuda divina, poderia resolver o problema do rei. E Daniel era esse homem. O profeta, pois, estava mostrando a debilidade da sabedoria divina, que não é inspirada pela Fonte divina de toda a sabedoria; e é possível ser essa a mensagem principal que a história tenciona ensinar. Pode ficar subentendido que os sábios da Babilônia não conseguiriam solucionar o problema, mesmo que se consorciassem com os deuses (falsas divindades). Há coisas que só podem ser resolvidas pelo Deus do céu (vs. 28). Poderes preditivos são atribuídos somente a Deus. Cf. Gên. 20.3; 41.16,25,28; Núm. 22.35. Estudos demonstram que o poder de prever o futuro é uma habilidade natural da psique humana, e certamente existem profetas não-bíblicos na antiguidade e na modernidade. Mas isso era ignorado pelos hebreus. Esse fato, porém, não enfraquece o argumento de Daniel (vs. 28).

2.28
Mas há um Deus nos céus. Onde psíquicos profissionais e sábios e deuses pagãos falham, o Deus do céu é bem-sucedido. Ver o vs. 18 quanto a esse título. A expressão “nos últimos dias” é sempre usada do ponto de vista do autor, e não de nosso século! Portanto, significa “mais tarde” ou, talvez, “em tempos remotos do nosso”, e não necessariamente nos últimos dias, imediatamente antes da era do reino etc. Se as profecias deste capítulo atingem a época dos romanos, então o tempo estava bastante afastado de Daniel para merecer a expressão; mas a verdade é que a visão de Daniel mergulhou num tempo ainda mais distante. “Do ponto de vista de Jacó (ver Gên. 49.1), isso significou o fim da ocupação de Israel da Terra de Canaã. Do ponto de vista de Balaão (ver Núm. 24.4), significou o fim da independência de Moabe e Edom... Mais freqüentemente, porém, essa frase é usada escatologicamente para indicar o fim da era presente, os últimos dias antes do Reino de Deus, a nova era. Ver Isa. 2.2; Jer. 23.20; Eze. 38.16; II Tim. 3.1; II Ped. 3.3 etc.” (Arthur Jeffery, in loc.). Ver no Dicionário o verbete chamado Últimos dias, quanto a detalhes.

O seu sonho e as visões da tua cabeça. Se Joel 2.28 faz distinção entre as duas coisas, no livro de Daniel esses termos parecem sinônimos. Ver no Dicioná­rio os verbetes chamados Sonhos e Visão (Visões). Ambas as coisas são consideradas reveladoras dos propósitos e da vontade de Deus, uma maneira pela qual um homem pode olhar para além dos limites do conhecimento humano ordinário. Daniel não tomou o crédito para si mesmo.



2.29

Estando tu, ó rei, no teu leito. A Nabucodonosor, embora fosse ele um rei pagão, foi dada uma visão. A tentativa de limitar as visões aos judeus e aos cristãos não passa nos testes da investigação. O Logos opera universalmente, e Ele tem agentes e servos não-cristãos. Os Logoi Spermatikoi (as sementes do
Logos) estão por toda a parte. Ver sobre esse termo na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia.

Deus é aquele que revela, e Ele não escolhe, necessariamente, agentes que merecem nossa aprovação. O rei pode ter estado a meditar sobre o futuro. Seu coração (a sede da inteligência) estava ativo. Mas a visão ocorreu espontaneamente, de acordo com o propósito divino.


Escopo da Visão. A visão cobriu a história do mundo em grandes lances, a começar pelos tempos de Nabucodonosor, tocando de leve em vários impérios mundiais e terminando com o reino eterno. “Esse mesmo período é chamado de ‘tempo dos gentios’, em Luc. 21.24” (J. Dwight Pentecost).


2.30

E a mim me foi revelado este mistério. Daniel era apenas o transmissor é a visão e de seu significado, não a causa ou o realizador; e Daniel queria que o rei soubesse disso, a fim de que não elogiasse o homem, em vez de louvar a Deus, uma vez que reconhecesse que Daniel entendera o sonho inteiro. Além disso, cumpria ao monarca saber que, embora ele fosse um grande homem, um Rei de reis exercia autoridade sobre ele, e esse Rei também havia determinado o reinado de Nabucodonosor, a sua natureza, os seus limites e o seu fim. E outro tanto dizia respeito aos demais reinos. Cf. Gên. 41.16. José não reivindicou crédito algum para seus dons proféticos.


“Quanto ao que me toca nesta questão, não posso atribuir coisa alguma a mim mesmo. Tudo é devido ao Deus do céu, tanto a recuperação do sonho quanto a sua interpretação” (John Gill, in loc.). A passagem ensina-nos que os homens são capazes de obter o conhecimento dado por Deus, especificamente através dos processos místicos, como os sonhos e as visões. Ver o artigo detalhado na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia chamado O Conhecimento e a Fé Religiosa. E ver no Dicionário o artigo intitulado Misticismo.

2.31
Tu, ó rei, estavas vendo. A Essência dos Sonhos e das Visões. O rei vira uma imagem gigantesca e grotesca, sob a forma de um imenso homem. A imagem rebrilhava como bronze fundido; era “gigantesca, rebrilhante e assustadora” (NCV). A imagem exalava poder e esplendor. Os sonhos espirituais envolvem imagens incomuns que deixam a pessoa estonteada, e foi isso o que aconteceu a Nabucodonosor. Os antigos do Oriente Próximo e Médio costumavam fazer imagens colossais, mas essa imagem tomou de surpresa o próprio Nabucodonosor, embora ele fosse um ativo construtor. “Suas dimensões e sua aparência eram formidáveis, fazem do rei parecer insignificante diante dela” (J. Dwight Pentecost, in loc.).

Os vss. 31-36 fornecem a visão. Em seguida, os vss. 36-38 dão a interpreta­ção. Portanto, sigo o mesmo piano, apresentando a interpretação naqueles versículos, e não no começo. Conforme veremos, as várias porções da imagem representavam reinos mundiais. “Havia algo na fisionomia da imagem que era ameaçador e terrível. A forma inteira, tão gigantesca, encheu o rei com profunda admiração, pois lhe pareceu terrível. Talvez isso denote o terror que os reis, sobretudo os arbitrários e despóticos, projetam sobre seus súditos” (John Gill, in loc.).

2.32,33
A cabeça era de fino ouro. Os Elementos da Imagem Representam Quatro Reinos:

1. A cabeça era de ouro
2. Os braços e o peito eram de prata
3. O ventre e as coxas eram de bronze
4. As pernas eram de ferro, enquanto os artelhos eram parte de ferro e parte de barro

Essas quatro partes representam quatro reinos, que surgiriam sucessivamente. Seriam impérios mundiais. Os vss. 37-43 dão as interpretações sobre as figuras.

Observações sobre os Vss. 32-33:

1. Note o leitor a qualidade descendente dos metais: ouro, prata, bronze, ferro, ferro misturado com barro.

2. O grego de épocas remotas, Hesíodo, falava em eras do mundo em termos de metais. Aqui descemos do ouro ao barro. A descida parece ser de valor, e não de força. O quarto reino seria mais forte que os demais, tal como o ferro é mais forte (porém menos valioso) que os outros metais listados.

3. A prata é um metal nobre, mas não tão valioso quanto o ouro. O bronze é ainda menos valioso, porém mais forte que a prata. Provavelmente está em vista o cobre, que, misturado com o estanho, fica mais forte do que o simples cobre, e essa liga produz o bronze.

4. O ferro é o mais forte e o mais útil dos metais listados, mas essa força é debilitada pela mistura com o barro, ou melhor, com o barro cozido, duro, mas não tão duro quanto um metal. O barro cozido fala de vulnerabilidade e fraqueza inerente, a despeito da demonstração de força. Todos os reinos, como é natural, têm os pés feitos de barro.

5. Os quatro reinos representam toda a história da humanidade, contada rapidamente, e o Reino de Deus é o quinto reino. A vasta porção da história do mundo é deixada de fora. A visão é um símbolo do que acontece no mundo e mostra as limitações do escopo do profeta, que só podia ver essa parte do total, e teve de fazê-la representar os reinos do mundo, ou os tempos dos gentios (ver Luc. 21.24).

2.34
Quando estavas olhando, uma pedra foi cortada. Temos aqui, na “pedra”, o quinto império, não feito por mãos humanas. A pedra era uma Grande Pedra, que demoliu a imagem, em suas partes de metal. A imagem e suas diversas partes eram produtos humanos e, por isso mesmo, teriam de chegar ao fim. 

Eram apenas temporais. Já a Grande Pedra é eterna, e não está sujeita à dissolução. Com um simples golpe nos pés, ela levou a imagem feita pelo homem a cair em forma de poeira, ou seja, de forma irrecuperável. A interpretação sobre essa Pedra aparece nos vss. 44-45.

2.35
Então foi juntamente esmiuçado o ferro, o barro, o bronze, a prata e o ouro. Contínua aqui o poder destruidor da Grande Pedra. Os metais, de várias qualidades, não puderam resistir ao golpe da Grande Pedra, e todos se reduziram a uma poeira finíssima, que o vento levou embora. As eiras eram lugares abertos situados de tal maneira que podiam ser tangidos por qualquer brisa que passasse, para que o grão, lançado ao alto, fosse facilmente separado da palha, que era então levada pelo vento. Essa é uma figura usada com freqüência nas Escrituras. Cf. Osé.13.3; Sal. 35.5; Jó 21.18; Isa. 41.15,16; Mat. 3.12.

“Os fragmentos desapareceram tão completamente que nem um traço deles podia ser encontrado. Assim mostram Sal. 103.16; Jó 7.10; 20.9 e Apo. 20.11. A finalidade do golpe desfechado pelo Pedra foi assim indicada, uma característica da literatura apocalíptica” (Arthur Jeffery, in loc.). A Pedra veio a tornar-se uma grande montanha, que encheu toda a terra. Ver comentários sobre os vss. 44-45.

Os ímpios... são como a palha que o vento dispersa.
(Salmo 1.4)

2.36
Este é o sonho. O sonho foi descrito nos vss. 31-35. A interpretação é dada agora, nos vss. 37-45.


A Cabeça de Ouro (2.37-38)

2.37
O autor deixa claro que Nabucodonosor e seu império babilônico eram a cabeça de ouro. Esse monarca era um rei de reis entre os homens, pleno de grande força e glória. Foi o “Deus do céu” (ver as notas em Dan. 2.18) que predestinou esse reino e seu rei. Pois Yahweh é quem se encarrega dos destinos humanos, individuais e coletivos (as nações). Deus é soberano (ver sobre Soberania, no Dicionário). Ele é tanto o Criador como o Interventor em Sua criação, recompensando, punindo e dirigindo em consonância com a lei moral. Ver a respeito o artigo chamado Teísmo, no Dicionário.

“Rei de reis” era um título comumente dado aos reis da Pérsia (ver Esd. 7.12). Encontra-se em inscrições do antigo Oriente Próximo e Médio, incluindo o caso de reis vassalos, como os reis armênios ou os reis selêucidas. É usado para indicar Nabucodonosor, em Eze. 36.7 e Isa. 36.4. O título, claramente, é atribuído a Yahweh e, então, a Jesus, o Rei-Messias. Cf. Dan. 47.5; Jer. 27.6,7; Apo. 17.14 e 19.16. Cf. Jer. 52.32. 

2.38 
A cujas mãos foram entregues os filhos dos homens. Continua aqui a descrição do poder do “rei dos reis” (Nabucodonosor). A cabeça de ouro era a cabeça de tudo em seus dias. Yahweh havia entregado todas as coisas em suas mãos, tanto os seres humanos como os animais. Nabucodonosor se tornou o governante universal do mundo conhecido em sua época, através de muitas e brutais conquistas que não deixaram adversário de pé. Os “animais do campo’ são animais ferozes, e não domesticados. Cf. Jer. 27.6; 28.14. Ver também Isa. 56.9; Deu. 7.22 e Jó 40.20. A Septuaginta adiciona “e os peixes do m ar, o que, obviamente, é secundário. Os monarcas antigos do Oriente Próximo e Médio (incluindo Salomão) tinham seus jardins zoológicos particulares, onde criavam toda a espécie de animais estranhos, desconhecidos nas regiões onde esses reis governavam. A expressão, seja como for, enfatizava a universalidade do governo de Nabucodonosor. A vida, tanto animal quanto humana, foi posta a seus pés. Cf. isso com o vs. 44 deste mesmo capitulo e também com 7.17,24.

O império neobabilônico durou de 626 a 539 A. C., ou seja, oitenta e sete anos. Quanto a descrições completas, ver o artigo do Dicionário chamado Babilônia. Ouro provavelmente refere-se às riquezas da Babilônia, e não à sua força. Dignidade e glória fazem parte da figura como descrições que os versículos esclarecem.

O Peito e os Braços de Prata (2.39a)


2.39a
Depois de ti se levantará outro reino. Este segundo reino (mencionado em meio versículo) significa: 1. os medos e os persas; ou 2. De acordo com alguns intérpretes antigos e modernos, apenas os medos. Ver no Dicionário o verbete intitulado Média (Medos). O império medo-persa, em seu conjunto, perdurou por mais de duzentos anos (539-330 A. C.). Eles conquistaram a Babilônia em 539 A. C.


O Ventre e as Coxas de Bronze (2.39b)


2.39b
Esse terceiro reino, de acordo com vários intérpretes antigos e modernos é formado: 1. pelos persas, em distinção aos medos; ou 2. pelo império grego. O leitor deve tomar consciência de que a identificação do quarto império como Roma não aconteceu senão quando Roma realmente apareceu, e então a interpretação do quarto império foi ajustada a esse fato. O quarto rei dos medos, Artiages, foi traído por suas próprias tropas em 550 A. C., e seu poder foi entregue a Ciro, o persa, que tinha sido um de seus vassalos. Foi dessa forma que Ciro se tomou o cabeça do reino medo-persa. Assim também, nos capítulos 5 e 6 de Daniel, essas duas potências aparecem intimamente ligadas. Ver as observações sobre os vss. 32-33, que preenchem detalhes quanto à natureza desses reinos.


As Pernas de Ferro, com os Artelhos em parte de Barro Cozido (vs. 40)


2.40
O quarto reino será forte como ferro. Esse quarto reino era: 1. ou o império de Alexandre. 2. Ou Roma. No início prevalecia a primeira dessas posi­ções, mas a segunda passou a predominar quando Roma apareceu. O quinto capítulo sofre a mesma variação quanto à interpretação. O ferro é o mais forte dos metais, e certamente essa interpretação se adapta à Grécia ou a Roma. Mas a mistura de ferro cozido com ferro (vs. 41) fala de uma fraqueza inerente e, provavelmente, de divisão, como quando o império grego foi dividido entre os quatro generais de Alexandre. A descrição do vs. 40 pode aplicar-se igualmente bem a Alexandre ou aos romanos, pois ambos se ocuparam de uma conquista mundial, quebrando e subjugando os povos.

Como o ferro quebra todas as cousas. “Todos os outros reinos” é a tradu­ção da NCV, que contudo provavelmente está incorreta. A ideia não é que esse poder esmagaria todos os reinos que existiram antes, mas, antes, que esmagaria todos os oponentes de sua própria época e, assim, obteria domínio mundial.

Alexandre derrotou todos os oponentes e espalhou o idioma e a cultura grega por todas as partes. O mundo foi “helenizado”. Mas outro tanto sucedeu com Roma, que se transformou no maior dos impérios antigos, quando o mar Mediterrâneo se tornou o “lago” romano. O latim veio a tornar-se outro idioma universal, e, através do latim vulgar, espalhou-se por toda a Europa. Linguagens separadas surgiram a partir do latim vulgar, incluindo o nosso idioma português, a última das línguas neolatinas a desenvolver-se, sendo a caçula desses idiomas.

2.41,42
Quanto ao que viste dos pés e dos dedos. Esse poderoso quarto império tinha herdado fraquezas porque seus pés eram feitos de ferro e barro cozido, um misto de fortalezas e fraquezas. Neste ponto não são mencionados os dez artelhos, mas é natural vinculá-los aos dez chilres de Dan. 7.24. Se a Grécia está em vista, então a divisão do reino significa a distribuição do império de Alexandre entre os seus quatro generais, quando ele morreu. As duas pernas, nesse caso, apontariam para as duas principais divisões dessa divisão, os selêucidas e os ptolomeus. Mas a palavra “dividido”, aqui usada, poderia ser mais bem traduzida por “composto”, uma referência à mistura do ferro e do barro cozido que representa fortaleza e fraqueza.

Mas se Roma está em pauta, então pode estar em mira a divisão desse império em dez partes subordinadas. A visão dispensacionalista deste versículo, em seguida, liga os dez artelhos, e os dez chifres, aos dez chifres de Apo. 17.3.

Esses dez chifres, por parte de alguns estudiosos, são então as dez nações do Mercado Comum Europeu, ou dez centros de poder no mundo, concebidos como um reavivamento do império romano nos últimos dias, o qual será encabeçado pelo anticristo. Visto que o Mercado Comum Europeu consiste agora em mais do que dez nações membros, a teoria do “poder central” atualmente é mais popular.

Não sabemos o quanto dessa forma de interpretação está correta e quanto dela não passa de fantasia. Os críticos pensam que é ridículo tentar adaptar tais profecias (ou história!) ao mundo conhecido atualmente. Ver as notas em Apo. 17.3 no Novo Testamento Interpretado.

Barro de oleiro. Dizem assim muitas traduções, mas barro cozido (ver o vs. 33) provavelmente é o que está em vista. O barro cozido é aparentemente duro, mas inerentemente fraco, e o fato de estar misturado com o ferro tornava a liga mais precária. O barro cozido é quebradiço, embora pareça ser forte. O vs. 43 diz “barro cozido” (NIV), mas algumas traduções dizem “barro de lodo”, conforme se vê em nossa versão portuguesa.

2.43
Quanto ao que viste do ferro misturado com barro de lodo. O ferro e o barro são elementos precários quando se misturam, sem importar se o barro estiver cozido ou em sua forma semilíquida. O resultado é a fraqueza, conforme vimos nas notas sobre o vs. 42. Houve uma mistura dos homens fortes de Alexandre com as filhas das nações, pelo que o caráter grego distintivo foi poluído. O próprio Alexandre encorajava casamentos mistos, com povos conquistados, em sua visão universalista das coisas, e ele, como é natural, seria o rei do império mundial. Os reis selêucidas e ptolomeus continuaram a política dos casamentos mistos, e em breve o que era grego transformou-se em apenas outra forma de expressão gentílica. Se Roma está em mira, então temos o declínio gradual da força romana. A descentralização destruiu o império romano. A anarquia passou a reinar em alguns lugares: houve o governo da plebe, ou seja, das classes populares. Em outros lugares, a democracia enfraqueceu o poder centralizado, e o resultado foi a fragmentação. Portanto, vários tipos de “casamento” debilitaram o que antes fora muito forte. Não está em vista a mistura do cristianismo com o paganismo, na época da igreja, embora certamente isso tenha acontecido e continue acontecendo.

2.44,45
Mas, nos dias destes reis, o Deus do céu suscitará um reino. O quinto reino é o Reino Divino da era do reino e do Messias. Este versículo interpreta a Grande Pedra dos vss. 3 4 -3 5 .0 reino universal de Deus destruirá todos os outros reinos, reduzindo-os a um pó tão fino que qualquer brisa será capaz de soprar para longe. Mas o próprio reino do Messias será invencível e indestrutível. Perdurará para sempre. 

Tornar-se-á ímpar e único. Os dispensacionalistas vêem os dez artelhos como, especificamente, reinos a serem esmigalhados. A Grande Pedra é a Rocha, o Messias. Cf. Sal. 118.22; Isa. 8.14; 28.16; I Ped. 2.6-8. A Grande Pedra tornou-se uma montanha, tão poderosa e imensa será (ver Dan. 2.35).

Essa montanha encherá toda a terra. A montanha simboliza um grande reino. Essa montanha é distinta da imagem. É de origem divina e tem uma qualidade eterna, ao passo que a imagem feita pelo homem é reduzida a pó.

“Os reinos anteriores tinham sido destruídos ou pela corrupção interna ou por algum conquistador vindo de fora. Mas esse novo reino nunca será destruído, pois permanecerá para sempre. A soberania de Deus jamais passará... O escritor sacro, pois, estava dizendo que o Novo Reino não será apenas outro reino, que chegou e logo passará. Não estará nas mãos de algum grupo nacional, mas nas mãos de Deus” (Arthur Jeffery, in loc.). Esse intérprete passa então a fazer do quinto reino a nação de Israel, o que, em certo sentido, é verdadeiro, porquanto o reino do Messias será manifestado através da restaurada nação de Israel. No entanto, será mais do que isso.

“Por ocasião de Sua volta, o Messias subjugará todos os reinos a Seus pés, levando-os assim ao fim (ver Apo. 11.15; 19.11-20). E então Ele governará para sempre no milênio e no estado eterno” (J. Dwight Pentecost, in loc.). Os amilenistas acreditam que o reino milenar foi estabelecido por Cristo em Seu primeiro advento, e que a Igreja é esse reino. Eles também imaginam que o cristianismo crescerá até tornar-se uma grande montanha. Os pré-milenaristas acreditam que o reino messiânico será estabelecido por ocasião do segundo advento de Cristo. Ver no Dicionário os verbetes Amilenismo e Milênio, onde essas questões são mais detalhadas.

História ou Profecia? Alguns intérpretes creem que as chamadas profecias de Daniel são, de fato, “declarações de fatos já acontecidos’ . Também supõem que o autor não tenha sido o profeta Daniel, que viveu entre os judeus cativos na Babilônia, e, sim, um pseudo-Daniel, que teria vivido em cerca de 165 A. C., durante o período dos macabeus. O autor sagrado teria falado sobre coisas que já haviam acontecido, exceto o império romano, que foi então adicionado às tradi­ções interpretativas, quando surgiu em cena. E eles pensam de evidências históricas para essas tais afirmações. Ver a introdução a este livro, seção III, Autoria, Data e Debates a Respeito. Seria útil ao leitor ler toda a Introdução, pois há inúmeras observações sobre o livro de Daniel.



Epílogo (2.46-49)




2.46
Então o rei Nabucodonosor se inclinou. O impacto das palavras de Daniel sobre Nabucodonosor foi muito grande. Ele sabia que o que Daniel tinha dito era verdadeiro, e o rei tremeu diante de uma genuína demonstração do poder de Yahweh. Essa é uma das lições que o autor do livro de Daniel queria que aprendêssemos: a superioridade de Yahweh sobre os deuses pagãos; e também a superioridade dos judeus sobre os pagãos. Daniel tinha afirmado a verdade do que ele dissera (vs. 45), e Nabucodonosor reconheceu, em seu coração, que recebera excelente revelação de Yahweh, que nem ao menos fazia parte do seu panteão. Os judeus, que receberam o livro de Daniel, estavam sob o amargo domínio de um poder pagão, mas seriam livrados desse domínio e triunfariam no fim. Essa é outra lição do texto. O rei de reis, Nabucodonosor, humilhou-se diante de Daniel, o cativo judeu! Cf. Gên. 41.37 ss. e Est. 10.3.

O medo do rei soltou seus músculos e ele perdeu o autocontrole, pelo que caiu de cabeça no chão. E prestou homenagem a Daniel, ou talvez até o tenha adorado, conforme dizem algumas traduções. Talvez tenha pensado que um deus aparecera de súbito em seu reino, disfarçado de cativo judeu, e essa talvez seja a razão pela qual lhe ofereceu oferendas e incenso. Ou então, conforme o vs. 47 parece dar a entender, o rei ofereceu essas coisas a Elohim, que é o Deus dos deuses, ao honrar a Daniel. Seja como for, a autoridade divina de Daniel foi reconhecida. O autor deixa de fora a usual retratação que caracteriza tais histórias, mas provavelmente queria que entendêssemos que Daniel rejeitou as honrarias indevidas que pertenciam exclusivamente a Deus.

2.47
Certamente, o vosso Deus é Deus dos deuses. Por causa da bem-sucedida interpretação do sonho, Nabucodonosor pode ter pensado que Daniel era um deus-mensageiro que representava um poder ainda maior. Ele chamou esse poder maior de Deus de deuses e Senhor de senhores. A palavra para Deus, aqui, é o termo caldaico Elah, que pode representar Elohim, o Poder. Seja como for, esse Deus está acima de todos os outros, em Seu poder e dignidade. A autoridade Dele ultrapassa a autoridade de todas as outras alegadas divindades. O rei babilônico não abandonou seu politeísmo, mas elevou o Deus dos judeus acima do resto. Esse Deus era um revelador de mistérios, ao passo que os psíquicos profissionais não tinham contato suficiente com os deuses (vs. 11), a ponto de serem capazes de invocá-los para serem ajudados. Seus deuses eram deístas, ao passo que o Deus de Daniel era teísta, pois intervinha no curso dos eventos e fazia conhecidos o Seu poder e a Sua vontade. Ver no Dicionário os artigos chamados Teísmo e Deísmo. Marduque, o chefe do panteão babilônico, era chamado, pelos babilônios, de “Senhor dos senhores” e “Senhor dos deuses”. Xerxes, nas suas inscrições, falava de um “grande Deus, o maior dos deuses”. Portanto, o que os pagãos atribuíam às suas divindades principais agora era atribuído ao Deus dos judeus. E o rei da Babilônia foi forçado a reconhecer que o seu poder derivava de Yahweh-Elohim, uma admissão muito significativa para um rei pagão.

2.48
Então o rei engrandeceu a Daniel. Daniel recebeu o que havia sido prometido aos psíquicos profissionais e aos sábios (vs. 6), Tornou-se um homem rico, alguém considerado dentro do império babilônico. A história babilônica faz silêncio sobre tudo isso. A cidade de Babilônia foi posta às ordens de Daniel, que se tornou seu prefeito. Essa é uma declaração fabulosa, não confirmada pela história secular. O versículo subentende que a autoridade de Daniel se estendia por todo o império babilônico, e não somente sobre a capital do império. Nesse caso, Daniel é retratado como uma espécie de sub-rei, que só prestava contas ao próprio imperador. Além disso, ele se tornou o líder da casta dos sábios, enumerados no vs. 2 deste capítulo.

Alguns estudiosos dizem que temos aqui um notável caso de hipérbole oriental, mas aceitam a essência da hipérbole: Daniel tornou-se grande e rico, e detinha considerável poder. Visto que a Babilônia estava dividida em muitas satrapias, podemos imaginar que Daniel tornou-se sátrapa de uma dessas satrapias, aquela sobre a qual se localizava a casa real. Mesmo assim, a declaração é muito significativa. Por isso, alguns a reduzem à ideia de que Daniel se tornou o magoem-chefe, mas é evidente que a declaração envolve muito mais do que isso. 

2.49 
A pedido de Daniel, constituiu o rei a Sadraque, Mesaque e AbedeNego. Daniel não esqueceu os amigos que o tinham ajudado com orações no momento da crise (vss. 17-18). Também solicitou que o rei lhes desse posições de autoridade como subsátrapas. Eles seriam delegados de Daniel, enquanto este permanecesse na corte do rei, dirigindo as atividades. Cf. Est. 2.19,21. Mordecai permaneceu na porta do rei. Os papiros elefantinos retratam Ahiqar como “posto na porta do palácio”. A expressão “diretor da porta do palácio” aplicava-se a certos oficiais da corte de Hamurabi. “O portão originalmente era a entrada da câmara de audiências do rei. Ali os oficiais permaneciam esperando ordens, julgando casos de justiça e dando suas próprias ordens. Supõe-se que Daniel tenha sentido os judeus cativos de modo especial, visto que agora tinha autoridade para assim agir. Ele serviu como mediador e obteve para eles certos privilégios que não seriam desfrutados de outra maneira. Ver as três deportações dos judeus para a Babilônia, nas notas sobre Jer. 52.28.

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