Romanos 8 — Comentário Evangélico
Comentário Evangélico da Bíblia
Romanos 8
Nesse capítulo, alcançamos a culminância da seção sobre “santificação” (caps. 6—8) e encontramos as respostas para as questões levantadas a respeito da Lei e da carne. O Espírito Santo domina o capítulo, pois é por intermédio da habitação dele que vencemos a carne e temos uma vida cristã produtiva. Podemos resumir o capítulo em três frases: sem condenação, sem obrigação e sem separação.
Na verdade, esses versículos são a conclusão do argumento do capítulo 7. Lembre-se que Paulo, no capítulo 7, não tratou da salvação, mas de como o crente pode fazer alguma coisa boa tendo uma natureza tão pecaminosa. Como um Deus santo pode aceitar qualquer coisa que façamos, se não temos nada de bom em nós? Ele teria de condenar todos os pensamentos e todas as obras! No entanto, “não há condenação”, já que a habitação do Espírito Santo cumpre a justiça da Lei em nós. A Lei não nos pode condenar porque estamos mortos para ela. Deus não nos pode condenar, pois o Espírito capacita o crente a “andar no Espírito” e, dessa forma, satisfazer as santas exigências do Senhor.
Que dia glorioso para o crente é aquele em que percebe que os filhos de Deus não estão sob a Lei, e que o Senhor não espera que façam “coisas boas” sob o poder da velha natureza. O cristão percebe que a habitação do Espírito agrada a Deus e ajuda-o a agradá-lo quando compreende que já não há “nenhuma condenação”. Que salvação gloriosa nós temos! Em Gálatas 5:1, Paulo adverte: “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão”.
O crente pode ter duas “inclinações” (mentes): ele pode inclinar-se para as coisas da carne e ser um cristão carnal (“carnal” significa “da carne”), a quem Deus tem aversão; ou inclinar- se para as coisas do Espírito e ser um cristão espiritual e desfrutar a vida e a paz que o Senhor nos oferece. Apenas o Espírito em operação em nós e por nosso intermédio agrada a Deus, jamais a carne.
O cristão não tem obrigação com a carne: “Assim, pois, irmãos, somos devedores, não à carne como se constrangidos a viver segundo a carne” (v. 12). Nossa obrigação é com o Espírito Santo. E o Espírito que nos condena e mostra que precisamos do Salvador. E o Espírito que nos concede a fé salvadora, que põe a nova natureza em nós e que testemunha todos os dias que somos filhos de Deus. Temos um débito enorme com o Espírito! Cristo nos amou tanto que morreu por nós; o Espírito ama-nos tanto que vive em nós. Todos os dias, ele suporta nossa carnalidade e nosso egoísmo e sofre com nossos pecados; todavia, ele nos ama e permanece em nós como o selo de Deus e o “penhor” (“expectativa”, 2 Co 1:22) da bênção que nos espera na eternidade. A pessoa em quem o Espírito não habita não é filha do Senhor.
Paulo chama o Espírito Santo de “espírito de adoção” (v. 15). O Espírito leva-nos a uma vida gloriosa de liberdade em Cristo, enquanto o viver na carne ou sob a Lei (e pôr- se sob a Lei significa ir em direção ao viver na carne) leva à escravidão. Para o crente, liberdade nunca quer dizer autonomia para fazer o que lhe agrada, pois esse é o pior tipo de escravidão! Antes, a liberdade do cristão, no Espírito, livra-nos da Lei e da carne a fim de que possamos agradar a Deus e nos tornar o que ele quer que sejamos. No Novo Testamento, o termo “adoção” não tem o mesmo sentido de hoje, ou seja, de pegar uma criança e torná-la um membro legal da família. O sentido literal da palavra grega é “ocupar o lugar de filho” — o que quer dizer pegar um menor (da família ou de fora dela) e torná-lo herdeiro legítimo. Todo crente é filho de Deus por nascimento e seu herdeiro por adoção. Na verdade, somos co-herdeiros com Cristo; portanto, ele não pode receber sua herança em glória até que estejamos lá para compartilhá-la com ele. Graças a Deus, o crente não tem obrigação de alimentar a carne, de mimá-la ou de lhe obedecer; em suma, ele não tem obrigações com a carne. Em vez disso, temos de “mortificar” as obras da carne pelo poder do Espírito (v. 13; veja Cl 3:9ss) e permitir que ele guie nossa vida diária.
Os crentes, embora sofram no presente, desfrutarão de glória quando Cristo retornar. Na verdade, graças ao pecado de Adão, toda a criação (vv. 19-21) está sujeita à escravidão do pecado. Cristo libertará toda a criação dessa escravidão quando, por fim, prender Satanás, e, desse modo, toda a natureza desfrutará conosco “a liberdade da glória dos filhos de Deus” (v. 21). Temos uma salvação sensacional: estamos libertos da pena do pecado, porque Cristo morreu por nós (cap. 5); libertos do poder do pecado, porque morremos, com Cristo, para a carne (cap. 5) e para a Lei (cap. 7); e, um dia, seremos libertos da própria presença do pecado, quando a natureza for libertada da escravidão.
Temos o Espírito de adoção, mas estamos “aguardando a adoção de filhos, [isto é,] a redenção do nosso corpo” (v. 23). A alma foi redimida, mas não o corpo. Entretanto, aguardamos, em esperança, pois Deus deu-nos a habitação do Espírito em nós como “primícias” do que nos espera no futuro. O Espírito, que nos sela até o dia da redenção (Ef 1:13-14), vivificará nosso corpo se morrermos (v. 11).
Nos versículos 22-26, repare os três “gemidos”: (1) toda a criação geme (v. 22); (2) o crente geme à espera da vinda de Cristo (v. 23); e (3) o Espírito que habita em nós geme em intercessão por nós (v. 26). Em João 11, observe como Jesus “agit[ou]-se novamente em si mesmo” ao visitar o túmulo de Lázaro. Como o coração do Senhor está pesado por causa da escravidão da criação. Cristo pagou um preço alto para libertar-nos.
Raulo salienta que temos o privilégio de orar no Espírito enquanto, em esperança, passamos por esse sofrimento. Talvez muita de nossa oração seja da carne — orações longas, belas e “piedosas” que glorificam o homem e repugnam a Deus (Is 1:11-18). Raulo sugere que talvez a oração mais espiritual seja um gemido inexprimível do coração! A Bíblia na Linguagem de Hoje traduziu o versículo 26 desta forma: “Gemidos que não podem ser explicados por palavras”. O Espírito intercede por nós, o Pai examina nosso coração e sabe o que o Espírito quer e nos concede isso. O Espírito sempre ora de acordo com a vontade do Senhor. Qual é a vontade de Deus? Que o crente se conforme à imagem de Cristo (v. 29). Por isso, podemos reivindicar a promessa do versículo 28. No versículo 30, observe que todos os verbos estão no pretérito: o Senhor chamou os crentes, justificou-os e glorificou-os. Por que padecer neste mundo se já fomos glorificados? Nós aguardamos a revelação dessa glória no retorno de Cristo.
Paulo encerra o capítulo com cinco perguntas (vv. 32-35) e responde a elas com clareza. Não precisamos nos atormentar a respeito da vontade do Senhor, pois ele é por nós, não contra nós. A prova disso é que deu o que tinha de melhor na cruz. Em vista disso, certamente ele nos dará graciosamente tudo o que precisarmos. Alguém pode acusar- nos de pecado? Não! Fomos justificados, e essa posição diante de Deus não muda. Alguém pode condenar- nos? Não! Cristo morreu por nós e, agora, vive à direita do Pai como nosso Advogado (intercessor). Alguma coisa pode nos separar do amor do Senhor? Não! Nem mesmo o demônio (“nem os principados [...] nem os poderes celestiais” — v. 38).
Sem condenação — sem obrigação — sem separação! “Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou.”
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