Estudo sobre Colossenses 3:2

Estudo sobre Colossenses 3:2


Em termos de conteúdo essa santificação é caracterizada inicialmente com uma frase dupla que designa basicamente seu lado positivo e seu lado negativo: “Buscai o que está no alto.” “Atentai para as coisas do alto, não para as que estão sobre a terra.” A vida não para e não pode parar. Viver é necessariamente uma permanente “busca” e aquisição. Na vida humana e pessoal isso não acontece instintiva e irrefletidamente, mas ao “atentarmos” para algo: em imaginações e imagens interiores surge diante de nós aquilo que desejamos e “buscamos” e aquilo que em seguida transformamos voluntariamente em alvo de nosso aprendizado. Onde localizamos o conteúdo desse atentar e buscar? O ser humano o encontra na natureza sobre esta terra. O crente, porém, de fato morreu e encontrou sua verdadeira vida, única e completa, em Jesus. Por isso ele, somente ele, passa a ser o objeto e o alvo de toda reflexão e de todo empenho. Contudo, Jesus não está sobre a terra! Está “no alto”, sentado à direita de Deus. Portanto também nossa “busca”, e até mesmo nossa “ponderação” interior se volta “para o que está o alto, não para o que está sobre a terra”. Quem vive nesse tipo de reflexão e busca, desprendidas da terra e voltadas para o alto, vive na santificação.

Contudo, notemos bem: para Paulo isso não é determinado pelo fato de ele ilustrar a glória do “céu” para si e para nós e apresentar a terra com todo seu sofrimento e toda a sua escuridão. Justamente tentou livrar os colossenses dessa devoção egoísta, que gosta de referir-se a uma palavra assim quando tenta evadir-se do duro engajamento no mundo e refugiar-se no doce sossego do céu. A formulação tampouco acompanha o filósofo Platão, para o qual a terra em si, como matéria, é antidivina e a alma como tal é divina e pertence ao reino da luz. Em Paulo tudo é exclusivamente determinado pela pessoa de Jesus! Se Jesus estivesse aqui embaixo, com certeza seria preciso dizer: busquem o que está sobre a terra, onde se encontra o Cristo. Quando tudo é determinado pela pessoa de Jesus, nisto reside ao mesmo tempo toda a certeza. Porque a essa pessoa nós conhecemos! Ela não é fantasia, não é um ideal ilustrado, não é uma suposição de como poderíamos imaginar a beleza do céu. Ela é a realidade com a qual nos deparamos, que nos venceu, ligando nossa fé com ele. É dessa pessoa do Cristo que depende tudo.

No entanto, se essa orientação e atitude de vida necessariamente estão alicerçadas sobre a fé no Cristo e decorrem dele, por que, então, precisamos aqui de mais uma exortação, um imperativo? Será que ainda é preciso que alguém diga a uma noiva enamorada: fique atenta, coloque coração e vontade no lugar em que se encontra seu amado!? Não e sim! Toda “ordem” obviamente seria vã e resultaria tão-somente em compulsão insincera se o amor não movesse “automaticamente” o coração da noiva. Porém: somos e continuamos sendo “pessoas”, e nada em nossa vida acontece de forma tão “automática” quanto uma pedra voa automaticamente para o alvo determinado pela trajetória em que foi lançada. Visto, porém, que nós precisamos constantemente “querer”, também é possível e necessário exortar e ordenar. Para nós que vivemos sobre a terra a pressão e a relevância, e por isso também a força de atração da terra, são poderosas. Diariamente ela atrai para si, com tudo o que tem a oferecer e demandar, nosso pensamento e busca. Por essa razão, apesar de tudo, só é possível manter e implementar a orientação e atitude de fé necessária e diretamente decorrentes da fé por meio de um determinação séria sempre renovada. Por isso a exortação permanente é necessária também na igreja de crentes. Nem mesmo a santificação “evangélica”, inerente à própria fé, deixa de ser questão de obediência, de vontade, de luta. A santificação evangélica se distingue da legalista não pelo fato de que somente nela haveria ordem e empenho sérios, e nesta um franco progresso em doces sonhos. Também a livre santificação evangélica é e continua sendo um “fugir” e “correr atrás”, determinados pela vontade (Mt 5.29,30; Rm 1.28; Rm 6.6).

Justamente por isso Paulo recorda aqui nas frases fundamentais a penosa dificuldade de uma atitude de vida assim e sua solução definitiva vindoura. A terra com seus bens é visível. A vida, porém, que encontramos em Cristo, está “oculta”, é invisível. Não apenas por causa da ciência e da visão de mundo modernas, mas essa terra visível e palpável sempre ameaçava ser a única “realidade”, ao passo que aquela vida oculta em Deus , invisível e indemonstrável, porém, corria o risco de ser “auto-sugestão”. Nem mesmo o crente está simplesmente isento dessa tentação! Ainda mais que não dispõe a qualquer momento de sentimentos, vivências e experiências da esfera de vida do Cristo. Há períodos de fé “nua e crua”. Há períodos em que o crente não tem a menor percepção desse “ter morrido” e “estar ressuscitado”, e até mesmo momentos em que toda a sua existência sentida e vivida contradiz isso. Nessa situação ele tem o privilégio de saber que “estar oculto” é uma condição transitória. O Cristo, agora oculto, na verdade há de “ser manifesto” perante todo o mundo. Então também nós, que conduzimos nossa vida “com” ele e “dentro” dele mediante uma permanente busca intencional, cheia de lutas, pelas coisas que estão no alto, haveremos “de ser manifestos com ele em glória”.

Expressões como “no alto” e “sobre a terra” não devem nos desviar para o apego às concepções “gregas” que penetraram tão profundamente na igreja, mesmo nas linhas dos fiéis cristãos. Tanto aqui quanto em todas as partes do NT o alvo não está “no alto”, não “no céu”, de sorte que lá estaria “a glória”, em que haveremos de ser manifestos com Cristo. Mais uma vez torna-se importante o fato de que aqui o glorioso não é o “no alto”, onde também está Jesus, mas que somente Jesus conta, e que “no alto” apenas se torna decisivo para nós porque o Cristo está lá neste momento. Importante é também que o texto não traz artigo junto à palavra “glória”, como se fosse certo fenômeno espacial. Aqui consta “em glória”. Trata-se de uma forma e maneira de existência, cuja localização ainda não foi declarada com nenhuma palavra. Conforme o testemunho do NT, porém, essa nova existência maravilhosa não surge pelo fato de que “vamos para o céu”, mas porque o Cristo volta a se manifestar em seu trono à direita de Deus, consumando sua obra neste mundo, em toda a criação. A sequência paralela de ideias em Fp 3.20s nos mostra o que Paulo entendeu por nova “revelação do Cristo” e por nossa “manifestação com ele em glória”. Quando Jesus nos tiver renovado e glorificado até mesmo em nosso corpo físico, então terá sido alcançado o alvo de nossa “busca” e “intenção”. A santificação é viver intencionalmente em direção desse poderoso alvo, a partir do fato fundamental de que já alcançamos esse alvo quando morremos e fomos ressuscitados com ele.