Estudo sobre Apocalipse 2:2-3

Estudo sobre Apocalipse 2:2-3



Apocalipse 2:2-3

Como um exemplo dessa energia que fluía da esperança para a vida eclesial em Éfeso, o Senhor menciona a força de superar criticamente manifestações da atualidade: não podes suportar homens maus, e que puseste à prova os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são, e os achaste mentirosos. Obviamente essas pessoas não se apresentavam de antemão como os “maus”. Pelo contrário, alegavam experiências espirituais extraordinárias, usurpando, por isso, autoridade apostólica, ou seja, autoridade fundamental. Seus ouvintes pareciam ter todos os motivos para se submeterem à reivindicação de liderança por parte deles. A opinião geral lhes era favorável.

Tanto mais digna de reconhecimento é a atitude da comunidade em Éfeso, que segundo 2Co 11.3,4,13-15; Gl 1.6-9; 1Ts 5.20,21 e 1Jo 4.1-3 costumava submeter os apóstolos à prova. Na medida em que a igreja aguardava a vinda de Cristo, tudo o que era atual se tornava provisório e questionável, por mais que se agigantasse diante dela. “Examinai tudo!” (1Ts 5.21 [rc]). Quanto mais sensacional algo se mostrava, tanto mais a igreja se sentia impelida para uma implacável crítica cristã: qual é a posição que vocês dão a Jesus enquanto Palavra encarnada e Crucificado, o portador do nome acima de todos os nomes, ao qual se dobrarão todos os joelhos? Essa verificação era incômoda para os examinados. Vingavam-se trazendo sofrimento aos fiéis. Sim, tens perseverança, e suportaste por causa do meu nome (“por amor do meu nome”). Será que nesse ponto é realmente necessário ser tão perseverante? É certo manter essa posição estreita? Não seria possível deixar as coisas correrem um pouco soltas? Quantas vezes uma solução assim deve ter se oferecido! Mas depois de um demorado e tortuoso processo de seleção, constata-se acerca de Éfeso: não te deixaste esmorecer.

Somente no fim dessa prova conflituosa flamejam diante dos olhos de todos os termos-chave que subitamente estabelecem a relação com Gn 3: homens maus, e que puseste à prova… e os achaste mentirosos. Aqui, maldade não é simplesmente uma flagrante maldade moral, mas uma incredulidade difícil de ser perscrutada. Os hereges elevaram-se a uma alta espiritualidade por meio de mentiras. Era por isso que se repetia Gn 3. Lá, nos primeiros começos (Jo 8.44), Satanás já era o chefe dos mentirosos, apresentando-se como aparente teólogo. Suas vítimas são aparentes filhos de Deus, assim como Jesus acusa os judeus, cujo verdadeiro pai não é Deus, mas o diabo.187 Assim, a igreja em Éfeso enfrentou a astúcia satânica nesses mentirosos.

Desde o começo, Satanás não apenas é o mentiroso, mas também o homicida, ou seja, desde Gn 3.4. Astúcia ou violência, sedução ou perseguição são seus dois caminhos para o mesmo alvo: apagar a vida e destruir o paraíso. O ser humano deve decair de Deus como a folha cai da árvore, e secar. Todas as comunidades têm a ver de uma ou outra maneira com essa serpente e com sua tentação do cristianismo aparente ou a perseguição anticristã. Já em Mt 24.9-11 o Senhor declarou aos discípulos: “Sereis perseguidos e sereis enganados”. Quando o inimigo não obtém sucesso fácil pela hostilidade aberta, ele tenta usar a aparência da fraternidade. Entretanto, independentemente se a perseguição é com violência ou com “benefício”, o alvo inalterado é causar a queda.

Nesse ponto, cabe fixar uma preocupação fundamental do livro: pelo fato de que por trás do ato violento como também do ludíbrio tentador está o mesmo, Satanás, também é possível que de repente ele troque uma tática por outra. E de fato trocará! Numa visão geral, a tolerância ainda predominava nas sete cidades. Como profeta, porém, João anuncia a virada da brutalidade. A história se repete: os mesmos lábios que exclamaram Hosana, gritaram certa vez os coros falados: Fora, fora! (Jo 19.15). O mesmo Pilatos, que por três vezes tentou libertar Jesus, entrega-o por fim aos algozes. As comunidades na província da Ásia experimentariam situações semelhantes. O Apocalipse era preparação para o martírio. Sua profecia se cumpriu. E pelo fato de que depois isso realmente aconteceu, o livro experimentou uma divulgação extraordinária. João havia revelado de modo pertinente o que é e o que será: é sedução, será perseguição! O v. 6 dará ocasião para abordar os movimentos de tentação na província mais de perto. Agora, a partir da mesma justiça que constatou e deixou valer ponto por ponto o que era digno de louvor, segue-se uma implacável acusação (excurso 1c). A tríade trabalho – perseverança – amor (cf. o exposto sobre Ap 2.1) em Éfeso não está mais incólume. A terceira coluna – o amor – está se esmigalhando. Já 1Co 13 abordou uma cisão entre serviço prático e amor. Por meio dela tudo perde seu valor, inclusive o louvável “ódio” ao mal no v. 6.