Explicação de Juízes 19

Em Juízes 19, é apresentado um relato trágico e perturbador. A história segue um levita sem nome e sua concubina enquanto viajam pelo território da tribo de Benjamim. Eles encontram abrigo na cidade de Gibeá, mas os habitantes da cidade mostram maldade quando uma turba cerca o alojamento do levita, exigindo relações sexuais com ele. Em vez disso, o levita oferece sua concubina à turba, que abusa dela durante a noite. Ela morre na porta de manhã.

O levita pega o corpo de sua concubina e o desmembra, enviando partes para cada tribo de Israel para mostrar o crime horrível cometido em Gibeá. As tribos ficam horrorizadas com a notícia e se reúnem para discutir o assunto. Eles enviam representantes à tribo de Benjamim, exigindo que os perpetradores sejam entregues à justiça. Os benjamitas, porém, se recusam a obedecer, levando a um conflito entre as tribos.

Juízes 19 pinta um quadro sombrio de degradação moral e ilegalidade, com o relato destacando a profundidade da depravação na sociedade naquela época. O incidente revela o desrespeito à dignidade e aos direitos das mulheres, bem como a ausência de justiça e liderança. Os trágicos eventos prepararam o terreno para um conflito maior entre as tribos de Israel e a tribo de Benjamim, demonstrando as consequências da decadência moral e da ruptura social.

Explicação

O levita e sua concubina (cap. 19)
19:1–12 Chegamos agora a uma história de incrível corrupção moral — o relato do levita e sua concubina. Este levita em particular tinha uma concubina que viera de Belém de Judá. Ela o abandonou para voltar para sua casa e viver como uma prostituta. Ele foi à casa do pai dela para buscá-la e se divertiu lá dia após dia. Cada vez que ele tentava sair com sua concubina, o pai dela convencia-o a ficar um pouco mais. Finalmente ele partiu, na noite do quinto dia, com seu servo, seus dois burros selados e sua concubina. Já era tarde quando chegaram a Jebus (isto é, Jerusalém), mas não pararam porque aquela cidade ainda era habitada pelos pagãos jebuseus. George Williams observa:
Teria sido melhor para o levita ter passado a noite com os pagãos do que com os professos filhos de Deus, pois estes já haviam se tornado mais vis do que os primeiros. (George Williams, The Student’s Commentary on the Holy Scriptures, p. 132.)
19:13–21 Ao pôr do sol chegaram a Gibeá, no território de Benjamim. Ninguém se ofereceu para hospedar a caravana, então o levita relaxou temporariamente na rua. Então, um velho efraimita que morava em Gibeá se ofereceu para levar o grupo para sua casa, e a oferta foi aceita.

19:22–24 Naquela noite, um bando de pervertidos sexuais cercou a casa e exigiu que o levita visitante fosse até eles. A única outra vez em que lemos sobre tal comportamento debochado é nos dias de Ló (Gn 19). Infelizmente para a jovem, não havia anjos da guarda presentes em Gibeá, como havia em Sodoma. Ambos os incidentes trouxeram consequências graves para os infratores. O Senhor abomina a homossexualidade. A depravação humana dificilmente pode afundar mais. O dono procurou satisfazer esses perversos benjamitas oferecendo sua filha virgem e a concubina do levita. Arthur Cundall comenta sobre sua conduta da seguinte forma:
Em sua preocupação com as convenções aceitas de hospitalidade, o velho estava disposto a quebrar um código que, para o leitor moderno, parece ser de uma importância infinitamente maior, ou seja, o cuidado e a proteção dos fracos e desamparados. A feminilidade era pouco estimada no mundo antigo; na verdade, é em grande parte devido aos preceitos da fé judaica, e particularmente ao esclarecimento que veio através da fé cristã, que as mulheres desfrutam de sua posição atual. O velho estava disposto a sacrificar sua própria filha virgem e a concubina do levita aos desejos distorcidos dos sitiantes, em vez de permitir que qualquer mal acontecesse a seu principal hóspede. (Arthur E. Cundall, Judges and Ruth, p. 197.)
19:25–30 Finalmente, temendo por sua própria pele, o levita covarde enviou sua concubina até eles. Como resultado de seu abuso vil e angustiante dela, ela morreu durante a noite. Sem desculpar os benjamitas, podemos apontar que, se ela não tivesse se entregado à prostituição de antemão (v. 2), ela não teria sofrido a morte de uma prostituta. O pecado recompensa impiedosamente seus seguidores. O levita encontrou seu corpo na soleira da porta pela manhã. Ele ficou tão furioso que tal grosseria fosse praticada em Israel que cortou o corpo dela em doze pedaços e enviou uma parte para cada uma das doze tribos com um relato do que havia acontecido.

A nação de Israel ficou pasma!

Notas Adicionais
19.1 Efraim.
Ficou no centro da Palestina, região mais tarde conhecida por Somaria.

19.3 Falar-lhe ao coração. Frase idiomática que no hebraico significa amor, carinho e generosidade no falar.

19.7 Instando com ele. Encontra-se, nestas linhas, uma visão profunda da vida social da Palestina, nos remotos tempos de há 3.000 anos passados. A hospitalidade sem restrições, especialmente com relação aos viajantes, era encarada com a mais alta seriedade.

19.9 Vai-se o dia acabando. Lit. “o acampamento do dia” lembrando os anos de peregrinação nômade no deserto.

19.10-12 Jebus... cidade estranha. Antes da conquista de Jerusalém por Davi (2 Sm 5.6s), essa cidade era a fortaleza dos jebuseus e denominada Jebus. Ficava apenas a uns 10 km ao norte de Belém, a mesma cidade onde Jesus nasceu.

19.13 Gibeá. Fundada na época da conquista da Palestina pelos israelitas e habitada pelos benjamitas; distava uns 7 km mais para o norte de Jebus. Posteriormente, tornou-se a cidade de Saul (1 Sm 10.26). Ramá ficava a uns 3 km mais distante. Depois de escurecer era perigoso viajar por aquelas paragens.

19.15 Não houvera quem os recolhesses. Um sinal de trato extremamente grosseiro era o não oferecer abrigo a um viajante, especialmente quando o hospedeiro nada gastaria em provisões. A essa falta, no tocante à hospitalidade, seguiram-se crimes piores.

19.16 Homem velho. Este homem, conterrâneo do viajante, não era benjamita. Isto explica, em parte, as atitudes dos cidadãos de Gibeá para com ele.

19.18 Viagem para a casa do Senhor. A casa do Senhor, a essa altura, encontrava-se em Siló. Até este ponto, nenhuma menção se fez deste propósito adicional. A Septuaginta reza “minha casa”, no lugar de “do Senhor”, e é possível que o texto original tivesse este sentido.

19.22 Filhos de Belial. A origem da palavra é desconhecida. Pensa-se haver, talvez, alguma relação com a deusa babilônica da vegetação, também deusa do Sheol, o túmulo. Cf. Sl 18.4, 5, “torrentes de impiedade” (heb belial) corresponde, no paralelismo poético, a “laços de morte” e “cadeias infernais”. Batendo à porta. No heb “bater” se acha na forma intensiva deixando subentendida a intenção de arrombar a porta. É de se notar a semelhança do comportamento dos homens de Gibeá com os de Sodoma (Gn 19.9ss).

19.23 Está em minha casa. Os costumes da ética reinante impediram que o homem velho entregasse seu hóspede aos homens de Gibeá. Pior que a lascívia e a perversão, era faltar com a hospitalidade. Loucura. O heb nebalah tem significado ainda mais forte. “Impiedade”, “devassidão” (cf. 1 Sm 25.25) talvez representem melhor seu sentido.

19.25 Concubina.. entregou. Para se manter uma lei ética, quebra-se outra que, no moderno sistema de valores, seria infinitamente mais importante.

19.28 Levanta-te. A narrativa não demonstra a profunda revolta que aqueles acontecimentos em Gibeá inculcaram, no coração do viajante.

19.29 Despedaçou. O verbo usado no original é o mesmo usado para o ritual dos sacrifícios (Êx 29.17; Lv 1.6; 8.20). As doze partes (cf. o caso de Saul, 1 Sm 11.1-8) simbolizavam as doze tribos de Israel, deixando clara integral responsabilidade da nação, diante de Deus, e diante daquela abominação dos benjamitas.

19.30 A importância deste acontecimento revela-se no fato da unificação da nação de Israel, o que não acontecera até então.

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