Estudo sobre Filipenses 3:11

Estudo sobre Filipenses 3:11


Paulo busca essa participação na paixão e morte do Cristo com o objetivo de “alcançar, de algum modo, a ressurreição dentre os mortos”. Pois a era vindoura, o éon da ressurreição, possui na presente era mundial seu correspondente oposto. “Fiel é esta palavra: Se já morremos com ele, também viveremos com ele; se perseverarmos, também com ele reinaremos” (2Tm 2.11s). Este éon só consegue entender a manifestação da sabedoria divina como “tolice”, a força divina como “fraqueza”, a glória divina como “cruz”. No entanto, o olhar do apóstolo está voltado para o éon vindouro, que será o último e transformará tudo totalmente.

Mas não tem somente em vista esse éon em geral. Paulo tem um alvo específico que ele formula como “ressurreição para fora dos mortos”. Alguns teólogos explicam que essa formulação não teria nenhum significado especial e seria a mesma coisa que “ressurreição dos mortos”. Mas, nesse caso, por que Paulo não usou simplesmente essa expressão? E, acima de tudo: todas as pessoas experimentarão a “ressurreição dos mortos”, inclusive aquelas que gostariam muitíssimo de evitá-la, para não comparecer diante do grande trono branco (Ap 20.11) e confrontar-se com aquele diante de cujo semblante “fogem” céus e terra. Paulo não teria necessidade de buscar essa ressurreição geral. Porém Paulo está nitidamente falando de uma ressurreição que não inclui todos os mortos, mas que conduz para fora da multidão dos mortos. Falou dela também em 1Co 15.23 de forma sucinta, mas bastante inequívoca. Não devemos permitir que a tradição eclesiástica, mostrada pela Escritura e que já no Credo Apostólico comprime em um único evento a rica e variada história do fim (“de onde há de vir para julgar os vivos e os mortos”), nos deixe cegos para as afirmações bíblicas. A declaração sucinta de 1Co 15.23: “depois, os que são de Cristo, na sua parusia” foi melhor explicada pelo próprio Paulo em 1Ts 4.13-18, da forma mais tangível possível nesses acontecimentos que transcendem qualquer concepção humana. Quando os anjos, conforme o anúncio de Jesus (Mt 24.31,40s), reunirem com sonoras trombetas os eleitos de uma extremidade do céu à outra, Paulo não deseja fazer parte daqueles que são “deixados para trás”, mas daqueles que são capazes de “escapar de todas essas coisas que têm de suceder, e estar em pé na presença do Filho do Homem” (Lc 21.36).

No entanto – porventura Paulo ainda teria alguma incerteza nisso? Por que, então, essa expressão estranhamente tímida: “se de algum modo alcançarei…?” Afinal, em 1Co 15.23 o próprio Paulo não atribuiu essa ressurreição a todos “que pertencem a Cristo”? Também em 1Ts 4.13-18 não se pode perceber a menor insegurança, e ele se considera simplesmente um daqueles que ainda estarão vivos na parusia e serão transformados. Seria esta “ressurreição para fora dos mortos” algo diferente, p. ex., uma ressurreição imediata de certos mártires? É o que pensa Lohmeyer. Contudo não encontramos essas ideias em outros textos de Paulo, e nem mesmo a presente passagem faz alusão a isso. Em decorrência um exegeta tão consciencioso como Ewald tentou dar preferência à relação do presente versículo com Ef 5.14 e Rm 6.13 e entender a “ressurreição para fora dos mortos” como um processo espiritual na atualidade. Nesse caso, porém, torna-se ainda mais difícil a formulação interrogadora “se de algum modo…”, pois conforme Rm 6.13 os cristãos romanos não devem ver se de algum modo chegarão à tal vida da ressurreição, mas se estão se comportando como pessoas que já saíram do meio dos mortos para a vida. Também aos colossenses essa condição de ressuscitados é simplesmente atribuída, em Cl 3.1.

Não: esse “se de algum modo alcançarei a ressurreição dentre os mortos” evidencia mais uma vez que o cristão Paulo é bem diferente de nós. Quando, inertes e tímidos, nos satisfazemos com meias soluções, ele age com poder e faz afirmações sobre a condição cristã diante de cuja magnitude e certeza nós nos espantamos. Porém, quando pensamos que nada mais pode nos faltar, que “obviamente” participaríamos da ressurreição, do arrebatamento e aperfeiçoamento da igreja, ele se detém diante da inconcebível magnitude desse acontecimento e não escreve: “para que eu então chegue naturalmente à ressurreição”, mas: “se de algum modo alcançarei a ressurreição”. Não se trata de insegurança ou dúvida, mas de uma reverente admiração e de humildade não-artificial. É como uma criança antes do Natal: a criança sabe que a sala se abrirá, que o pinheirinho estará aceso, e apesar disso não consegue captar que tudo realmente estará lá de novo: “será que de fato vou ver isso outra vez?” Quando Paulo fala da igreja e simplesmente se junta à igreja, ele escreve as serenas e determinadas afirmações: “Nós seremos…” Mas quando olha em frente por si mesmo – e a presente passagem constitui testemunho pessoal do começo ao fim – então, nessa atitude de admiração e veneração, ele só consegue dizer: “se de algum modo alcançarei…”.