Estudo sobre 1 Coríntios 1:22-23

Estudo sobre 1 Coríntios 1:22-23


Nesse “crer” se restabelece o verdadeiro relacionamento entre Deus e o ser humano. Por meio da queda do pecado ele havia sido pervertido de um modo terrível e blasfemo. O ser humano caído apresenta-se perante Deus como alguém que exige. A pessoa apresenta suas reivindicações a Deus, e o Deus santo e vivo deve satisfazer essas demandas do ser humano. Os “judeus pedem sinais”. Deus deve identificar-se perante as pessoas por meio de feitos maravilhosos. E se alguém quiser ser o “Messias”, o Rei e Auxiliador enviado por Deus, terá de solidificar ainda mais sua reivindicação por meio de “sinais do céu” (Lc 11.16) antes que se “creia” nele.53 Um Messias e Filho de Deus, porém, que acaba impotente e abandonado como um criminoso no madeiro,54 é simplesmente “um escândalo para judeus”.

O “grego” se posiciona de forma igualmente exigente diante de Deus. Ele “busca sabedoria”. Deus não precisa se comprovar a ele por meio de milagres, mas se demonstrar ao raciocínio dele. Deus tem de caber em nosso sistema intelectual e explicitar sua existência como “logicamente necessária” dentro desse sistema intelectual, dentro de nossa ciência e nossa visão de mundo. Um “Filho de Deus” que tenha de fato vindo da parte de Deus precisa fornecer essa prova de Deus, precisa responder todas as perguntas e solucionar todos os problemas. Se o fizer, também eu aderirei a ele. Um suposto Filho de Deus, porém, que não apresenta absolutamente nada excelente, que “encerrou uma vida precária com uma morte miserável” (como diz Celsus, filósofo grego e antagonista dos cristãos, por volta de 177-180 d.C.), é uma “loucura”, sobre a qual apenas podemos menear a cabeça e sorrir ironicamente. E por trás desse sorriso arrogante ou da indignada rejeição está o orgulho do ser humano que rejeita energicamente o fato de que outra pessoa teve de sangrar e morrer para salvá-lo.


“Nós, porém, anunciamos Cristo como Crucificado”, proclamamos um “Messias crucificado”. Ainda que se agite a indignação dos “judeus” contra esse “escândalo” e a zombaria de rejeição dos “gentios” sobre essa “loucura” ressoe de modo grosseiro ou refinado – quantas vezes Paulo experimentou ambas as reações! – persistiremos nesse serviço de arautos. Pois esse Cristo crucificado é “poder de Deus e sabedoria de Deus”. Aqui a maravilhosa sabedoria de Deus encontrou o caminho para alcançar a humanidade decaída que vagueia em suas próprias “sabedorias”. Aqui o poder de Deus é eficaz para salvar perdidos e transformar pecadores merecedores da maldição em filhos amados de Deus. Por isso é preciso trazer essa mensagem sob quaisquer circunstâncias a um mundo em vias de corrupção. Paulo e todos os demais mensageiros de Jesus – Paulo escreve “nós”, o que possui um peso especial diante do “eu” geralmente utilizado na carta – são impelidos a levar incansavelmente, mediante sacrifícios, sofrimentos e privações, essa palavra do Redentor crucificado às pessoas perdidas. Que se rebelassem ou rissem, zombassem ou perseguissem, essa palavra tinha de ser dita a eles. E nessa proclamação os mensageiros também experimentam o oposto: essa palavra abre corações.


Notas:
53 Todos nós por natureza temos essa orientação!

54 A palavra que costumamos reproduzir com “cruz” significa literalmente “estaca”. Talvez devêssemos usar novamente com mais frequência esse termo. Uma “estaca” não é tão fácil de ser transformada em enfeite inócuo e engenhoso. Uma “estaca” é um objeto rústico e feio, que nos faz lembrar melhor que a conhecidíssima “cruz” o aspecto terrível da morte de Jesus. Podemos questionar até mesmo, se essa morte e seu grito do abandono de Deus realmente podem ser sublimados artisticamente e, assim, tornados inofensivos, como nas composições de J. S. Bach sobre a Paixão. É assustador que a história da Paixão tenha podido tornar-se um deleite estético-musical.