Estudo sobre Filipenses 1:7
Filipenses 1:7
Essa certeza não é apenas uma imagem tranquilizante do desejo. Nesse caso não teria veracidade nem força. Ela é “certeza” somente porque Paulo pode prosseguir: “Pois é justo para mim pensar assim por todos.” No texto esse “justo” reveste-se de seriedade muito maior do que em nossa língua, onde perde peso objetivo em formulações com o sentido de “para mim é certo”. Quase deveríamos traduzir: “É meu dever.” Ao pensar assim pelos filipenses, Paulo não segue desejos pessoais, mas faz algo correto, algo que lhe foi atribuído. Paulo escreve “por vós todos”, não “sobre vós todos”. Afinal, ele não está emitindo sobre a confiabilidade e laboriosidade dos filipenses, mas olha para aquilo que Deus fará pelos filipenses por causa da fidelidade dele.
Por que será “justo” que ele pense assim por eles? A justificativa subsequente não combinará com aquilo que ela visa justificar enquanto tornarmos equivocadamente autônomo o “porque vos trago no coração”. O mero “trazer no coração” pode transformar-se no máximo em uma certeza humana e subjetiva. Mas para Paulo isto não é de forma alguma uma recordação afetuosa, e sim o poderoso fato de que os filipenses “são seus participantes da graça em suas algemas e na defesa e fortalecimento do evangelho”. Como tais participantes ele os traz no coração, como expressa mais nitidamente a construção da frase grega por meio do particípio subsequente ao “vos”, ao contrário da dissolução do particípio em frase independente na versão portuguesa.
Paulo estava “em algemas”. Seria isso o fim de sua grande atuação? Ele mesmo nunca considerou isto dessa forma! Declara posteriormente no v. 16 que está ali “para a defesa do evangelho”. Foi o que o próprio Jesus predisse a seus discípulos: “Por minha causa também sereis levados à presença de governadores e de reis, para lhes servir de testemunho, a eles e aos gentios” (Mt 10.18). Isso não representa um estorvo que impeça seu serviço, mas constitui parte diretamente inerente ao serviço deles. Por essa razão as “aflições”, que no caso de Paulo são sempre sofrimentos por amor de Jesus, também para Paulo fazem parte, com divina obrigatoriedade (At 14.22; 1Ts 3.3; 2Co 4.7-10), da mensagem de um Redentor crucificado. Logo, sua prisão naquela hora não é para ele uma interrupção incompreensível (“Como pode Deus permitir algo assim?”) de seu belo trabalho, mas cumprimento da tarefa que Jesus dispôs para a sua vida: “Este é para mim um instrumento escolhido para levar o meu nome perante os gentios e reis, bem como perante os filhos de Israel; pois eu lhe mostrarei quanto lhe importa sofrer pelo meu nome” (At 9.15s). Justamente no cativeiro e durante seu processo ele dá continuidade àquela “defesa e confirmação do evangelho” à qual dedica toda a sua vida. Ao utilizar aqui expressões correntes do linguajar penal, Paulo deixa particularmente claro que seu processo não é importante para ele mesmo, nem para sua pessoa, nem para seu destino, mas para o evangelho. Diante do tribunal ele tampouco defende a si mesmo, mas a mensagem da qual foi incumbido. Como isso se torna explícito nos grandes discursos de defesa que nos foram transmitidos nos Atos dos Apóstolos (At 22; 24; 26)!
Foi isso que os filipenses entenderam! Não se distanciam dele, inseguros e constrangidos. Apoiam-no, participam intimamente de sua trajetória, oram por ele e empenham-se ativamente em prol dele por meio da oferta de amor enviada à prisão. Por isso são “seus participantes na defesa e confirmação do evangelho”.
Na sequência aparece uma das formulações surpreendentes que o apóstolo, que vive e raciocina no Espírito Santo, constantemente nos concede em suas cartas. Não são “seus” participantes, nem mesmo “participantes em seus sofrimentos”, mas seus “participantes da graça”. Com quanta nitidez Paulo vê “graça” nas aflições de seu cativeiro e de seu processo tão grave, que pode lhe custar a vida! Com a mesma intensidade ele deseja que também os filipenses não participem delas gemendo e aflitos, mas saibam que ter o privilégio de experimentar tudo isso com Paulo é graça! Então Paulo tem justas razões de esperar por eles que Deus consumará a obra neles iniciada até o dia de Jesus.
Participantes da graça – “vós todos” acrescenta Paulo. Pela quarta vez nessas poucas linhas (v. 1,4,7 no começo e no final) ele destaca o “todos”. Ainda que seja numericamente pequena, uma igreja abrange pessoas muito diversas, fortes e fracas, talentosas e ineptas, jovens e velhas. Evidentemente Paulo tem o objetivo de que todos, inclusive os pequenos, precários e insignificantes, saibam que são interpelados e considerados. Todos eles participam justamente dessa graça da comunhão com o Paulo sofredor, também aqueles que puderam contribuir apenas com uma pequena moedinha para o sustento do apóstolo, também aqueles cuja oração talvez tenha sido acanhada e desajeitada. Paulo sempre teve a preocupação de proteger os “fracos” (cf. 1Co 8; Rm 14). Porque diminuir os “pequenos” é violar a irmandade na igreja de Jesus.
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Filipenses 1:7