Lucas 2 — Estudo Devocional
Lucas 2
Lucas 2 é um capítulo que nos leva ao cerne da história do Natal, capturando o profundo significado do nascimento de Jesus Cristo. Revela a orquestração divina por trás da Sua chegada, as humildes circunstâncias do Seu nascimento e o impacto transformador da Sua presença na Terra. Ao explorarmos este capítulo, somos convidados a refletir sobre temas de humildade, salvação e esperança que o nascimento de Cristo traz ao mundo.
O capítulo começa com o conhecido relato do censo, que leva Maria e José a Belém, a cidade de David. Aqui, num estábulo simples e despretensioso, nasce o Salvador do mundo. Este cenário destaca a humildade do nascimento de Cristo, quando o Rei dos Reis entra no mundo no meio da pobreza e da obscuridade. Isto nos ensina que os caminhos de Deus muitas vezes desafiam as expectativas humanas; Ele escolhe o humilde e o comum para realizar propósitos extraordinários.
O anúncio dos anjos aos pastores é outro momento crucial em Lucas 2. A proclamação de “boas novas de grande alegria” ecoa através dos tempos, declarando o nascimento do tão esperado Messias. A resposta dos pastores a esta mensagem celestial é de obediência imediata. Deixam os seus rebanhos e correm para a manjedoura para testemunhar o cumprimento da promessa de Deus. O seu exemplo lembra-nos que encontrar Cristo requer um coração receptivo e uma vontade de deixar para trás o que é familiar em prol de um relacionamento mais profundo com Ele.
Simeão e Ana, duas pessoas devotas do templo, também aparecem com destaque neste capítulo. O seu reconhecimento de Jesus como o cumprimento do plano de salvação de Deus sublinha a esperança que o nascimento de Cristo traz. As palavras de bênção de Simeão e o louvor de Ana refletem a alegria que advém do encontro com o Messias. As suas vidas são um testemunho de uma fé paciente e de uma esperança inabalável nas promessas de Deus, mesmo na espera.
Lucas 2 apresenta-nos o presente supremo: o dom da salvação através de Jesus Cristo. O nascimento de Jesus marca o momento crucial em que o plano divino de Deus para redimir a humanidade começa a desenrolar-se. A encarnação preenche a lacuna entre Deus e a humanidade, oferecendo-nos a oportunidade de experimentar o perdão, a graça e a vida eterna através da fé em Cristo.
Ao contemplarmos Lucas 2, lembremo-nos do poder transformador do nascimento de Cristo. Abordemos esta época com corações cheios de humildade, reconhecendo que Deus muitas vezes trabalha de maneiras inesperadas. Respondamos com alegria e obediência às boas novas da vinda de Cristo. E apeguemo-nos à esperança que o Seu nascimento traz, sabendo que a Sua presença nas nossas vidas é a fonte da verdadeira paz e da alegria eterna.
Devocional
2.1-7 naquele tempo o imperador Augusto mandou uma ordem. Enquanto isto, também acontecia no mundo dos homens algo novo: um decreto que desse ao imperador condições de saber quem são os seus súditos. Era preciso dizer perante a lei dos homens a quem pertencem e a que região, assim ele não perderia o controle sobre os seus. José da Calileia, como todos os demais do povo, junto com Maria, sua mulher grávida, subiu para se alistar, na cidade de Davi, chamada Belém, cidade de origem de José, que era descendente da família do rei Davi. A vinda de Jesus é um belo exemplo de como nossa biografia se relaciona com a História, e a vida familiar com o cenário político e social. Em ambiente precário, com simplicidade tal como milhões de mulheres de nosso mundo, Maria deu à luz. O esposo parteiro recolhe o filho e o protege. Assim começa a jornada terrena de Jesus, num contexto de insegurança política e social e pobreza material. Mas o casal se apresenta unido, confiante na Providência de Deus. Para dar à luz, diz a tradição que José teria levado Maria a uma gruta próxima. Um lugar obscuro da Palestina, periferia do Império Romano, se tornou o porto de entrada do filho de Deus na história humana. Há um grande poder simbólico neste cenário e acontecimento. A encarnação de Deus em homem se deu com seu abrigamento no útero de uma moça virgem, que dá a luz ao filho numa espécie de útero da terra. Aquele que o universo inteiro não pode conter, se conteve no útero de uma mulher, no útero da terra. Imagine qual a dimensão da primeira célula humana e perceba um dos sentidos do autoesvaziamento de Deus para se fazer humano! (Fp 2.7).
2.6 e o deitou numa manjedoura. Maria coloca seu filho na manjedoura, um cocho onde normalmente os animais comem. Não há nada mais real para dizer que não há lugar para esta criança no mundo dos homens. Por outro lado, isso mostra o absoluto desprendimento das riquezas dos homens. O valor está no menino que nasceu, no ser que ele representa. Ao imaginarmos a cena, qual a figura principal? É possível sentir e perceber que o menino nada carrega consigo a não ser a Verdade e a Vida. Os panos à sua volta são o aconchego, o olhar de Maria o aquece e o encaminha nos primeiros passos. Cada pessoa neste mundo pode receber o Espírito Santo gerador da vida, recebendo Jesus em seu coração, abrigando-o em seu íntimo, qual gruta-útero. A partir deste acolhimento gerador, possível a homens e mulheres, somos unidos espiritualmente a Deus que nos regenera. Sem este recebimento, perecemos. Abrigando-o, em voluntária submissão a Deus — como Maria e José — participaremos da graça e da verdade, e da glória do unigênito de Deus (Jo 1.14).
2.9-20 uma boa notícia para vocês. O céu encontra a terra nesta aparição de anjos, fenômeno extremamente raro. Em milhares de anos cobertos pelas Escrituras, temos apenas poucas ocorrências, em situações de grande importância. Este anúncio foi feito a pastores que agrupavam suas ovelhas e as vigiavam durante a noite. Eram homens atentos, sensíveis, simples, cuidadores e dedicados a guardar do inimigo as suas ovelhas. Eles ficam aterrorizados. O encontro com manifestações da Suprema Realidade tem sempre algo de espantoso, aterrorizante e sublime, tal como com Abraão e Moisés. O anjo fala do nascimento do Salvador, o esperado Messias, e dá os sinais para que os pastores possam encontrá-lo. A boa notícia substituiu o terror pela paz e alegria, que encheria o povo todo. Uma magnífica celebração acontece com o cântico de milhares de anjos: Glória a Deus nas alturas e paz na terra para as pessoas a quem ele quer bem (v. 14). Tem-se assim a origem do termo evangelho. Receber esta revelação é a maior dádiva possível. Homens simples que trabalham à noite recebem a visitação do Anjo do Senhor e ficam diante da Glória de Deus. Qualquer pessoa, por menor e mais simples que seja, é vista amorosamente por Deus. Ele conhece nossos caminhos e coração, e quer vir ao nosso encontro. Assim, reafirma nossa dignidade e nos dá a salvação.
2.12 esta será a prova. Deus fornece prova da mensagem tão extraordinária. A criança em condição de simplicidade, do desprendimento, da Verdade, de algo em comum com estes pastores. Nasceu o menino Jesus, filho de Deus, o que veio para redimir o seu povo.
2.13-14 Glória e paz. O testemunho que vem das alturas anuncia a fórmula da paz e da alegria: reconhecer e declarar a soberania de Deus sobre tudo e todos. Assim teremos as bênçãos que alegrarão nossa vida.
2.17 contaram o que os anjos tinham dito. Os pastores foram conferir as coisas que lhes tinham sido reveladas, após o que se tornam testemunhas e primeiros evangelistas; confiaram que foram visitados por Deus e lhes havia sido confiada uma mensagem muito boa. A mensagem do evangelho, as boas notícias anunciadas pelos anjos, é relembrada a cada ano. O verdadeiro espírito e sentido do Natal é honrar e celebrar a Jesus. E este é de fato o desejo de Deus: paz na terra para com os homens. Pela fé Maria acolheu o Espírito que lhe gerou o filho. Pela fé recebemos a Cristo, como enviado de Deus, para nosso livramento da morte, pela regeneração e doação da salvação eterna, que estabelece a paz entre nós e Deus. Quando se crê, a mensagem que passamos é percebida pelo outro como íntegra e verdadeira.
2.19 guardava... em seu coração. Maria tinha sensibilidade afinada com o Espírito Santo, tinha ouvidos atentos e coração receptivo. Não compreendemos tantas coisas na vida, nem temos condições de sabê-las agora. Acolher os mistérios da vida e confiar no cuidado de Deus é sabedoria espiritual. Nem tudo é questão de saber, mas de crer. Veja v. 5 7, nota.
2.20 voltaram... cantando hinos de louvor. O encontro com Jesus ainda bebê trouxe tanta alegria aos pastores que estes declamaram, cantaram e talvez até compuseram belos louvores a Deus. As coisas que Deus faz, o modo como faz e a beleza de seu caráter são maiores do que nossa fala comum pode expressar. O lado artístico da alma humana tem lugar importante e recebe inspiração de Deus.
2.21 chegou o dia de circuncidar. Completados oito dias do nascimento do menino, seu pai o leva ao sacerdote da localidade para a circuncisão, ato cirúrgico ritual. Maria e José sabiam da verdadeira identidade de seu filho primogênito, mas não deixaram de cumprir com a lei de Moisés, levando-o com oito dias para circuncidá-lo, dando-lhe o nome de Jesus ("O Senhor Deus salva"), porque este havia sido o nome revelado pelo anjo a Maria antes de concebê-lo. Ao oitavo dia o organismo da criança encontra-se num ponto ótimo de resistência imunológica e preparado para a retirada da cobertura peniana, local de constantes infecções. Porém a preocupação aqui não é o ganho em assepsia, mas a confirmação do menino como pertencendo ao povo da aliança (Gn 17.10-14), feita por Deus com Abraão. Não deixaram de cumprir a lei de seu povo, consagrando o filho mais velho ao Senhor, e a ofertarem segundo a lei — desde o princípio Jesus seguiu a trajetória humana de seu povo.
2.22-38 cerimônia da purificação. Cerca de 40 dias após o parto, segundo a Lei de Moisés, a mulher precisava se purificar (Lv 12). levaram a criança... a fim de apresentá-la ao Senhor. Pais e mães têm o privilégio de apresentarem cada filho a Deus. Consagrar conscientemente filhos ao Senhor é ato que implica o desejo e compromisso dos pais ou cuidadores de educá-los nos caminhos da vida, iluminados pela Palavra de Deus. É também apresentá-los ao povo de Deus, e assim iniciar a apresentar Cristo a seus filhos, que é o caminho, a verdade e a vida. duas rolinhas. Essa oferta só poderia ser apresentada por famílias pobres (o normal seria uma ovelhinha). Jesus nasceu pobre. Lá no Templo também se encontrava o velho Simeão. Justo e piedoso homem, que esperava a consolação de Israel, foi levado pelo Espírito Santo a identificar Jesus como a encarnação desta consolação, o Messias prometido. Simeão sabia entender quando Deus o visitava, sabia escutar suas palavras e suas promessas. Em seu coração havia a esperança em Deus. Deus muitas vezes nos revela fatos e oportunidades, porém nem sempre as identificamos como um envio do Senhor, não conseguindo buscar o silêncio suficiente para discernir no meio dos sons externos o desejo do Pai. uma espada afiada. O que era boa notícia para os estrangeiros e glória para Israel (vs. 29-32) significaria uma espada atravessada no coração de uma mãe, Maria (v. 35), mãe que presenciaria a torturante morte do filho 30 anos depois (veja o quadro "A espada e a vida", Mt 2). Outra celebrante, Ana, a profetiza anciã, passava o tempo todo no Templo, jejuando e fazendo orações. O jejum e a oração libertam-nos de nossas regras e possessões, permitindo uma entrega a Deus sem domínios próprios; o jejum e a oração tornam o nosso ser mais leve, mais sensível à voz de Deus. O jejum (que deve ser exercido com bom senso e respeito à nossa condição física) serve para retirar nossas energias, nosso controle, e deixar o caminho mais aberto para sentirmos o coração do Pai.
2.39-40 crescia e ficava forte. Jesus se desenvolveu como as crianças, adolescentes e jovens de sua terra. Ele foi alfabetizado, aprendeu um ofício com o pai e tinha sua rede de parentes e amigos. Sua família, muito parecida com outras famílias, mostrou-se bastante funcional. O ideal de desenvolvimento humano passa por etapas de maturação física, mental, relacionai e espiritual (também vs. 51-52). Nascemos com tremendos potenciais inscritos em nossa natureza geneticamente. Cabe a cada família, auxiliada pelas instituições de ensino, a tarefa da socialização adequada de cada criança e sua formação moral, ética, e espiritual. e era abençoado por Deus. Deus acompanha e abençoa o desenvolvimento humano; no caso do menino Jesus, essa "dupla paternidade", humana e divina, é ressaltada por Lucas, no v. 52.
2.41-52 doze anos. Este é o início da puberdade, época de grandes transformações internas e externas, quando despertam funções sexuais, se intensifica o crescimento físico e o desenvolvimento cognitivo (v. 47). No tempo de Jesus, como ainda hoje nas pequenas cidades e zonas rurais, os meninos e meninas desta idade ajudavam em trabalhos e na manutenção da casa. Entre os judeus é a época para o Bar Mitzvá, cerimônia que sinaliza a capacidade dos jovens de compreenderem as Sagradas Escrituras e a elas dedicarem obediência, seus pais não sabiam disso. José e Maria demonstram ter sido tranquilos, cuidadosos com os filhos e não possessivos. Conheciam os amigos e familiares dos filhos, e na viagem para Jerusalém, Jesus caminhava entre amigos e outras famílias. Uma boa rede de relacionamentos é essencial para ampliar os horizontes culturais e afetivos das pessoas. E ao fim de um tempo de maturação, cada filho deverá se encontrar em condições de poder deixar pai e mãe. Desde a puberdade esta dinâmica psicológica se anuncia: é o caminho para a individuação e autonomia psíquica próprias da vida adulta.
2.46-47 Três dias depois. Jesus desligou-se dos familiares e companheiros de viagem. Esteve como que desaparecido e somente no terceiro dia foi encontrado pelos pais. Uma interessante coincidência com sua morte e ressurreição (Lc 24.7). estavam muito admirados. Jesus surpreendeu a todos nesta ocasião. Seu interesse estava nas coisas referentes a Deus, junto aos mestres do Templo. Ele propôs questões inteligentes e deu respostas sábias aos eruditos sacerdotes.
2.49 não sabiam que eu devia estar na casa do meu Pai? Quando Jesus recebeu a pergunta-desabafo de sua mãe, respondeu com outra pergunta. Reação típica de adolescente, que os pais precisam absorver para não ser criado um impasse. Aos doze anos, Jesus cuidava das "coisas" de seu Pai e na sua pré-adolescência já começava a tomar suas próprias iniciativas e raciocínios. Pais e filhos podem e devem conversar e expor seus sentimentos e sua compreensão dos fatos, sempre respeitosamente, sem acusações e ameaças. Foi o que aconteceu nesta rica cena familiar. Ao mesmo tempo em que demonstrava uma autonomia inteligente, Jesus se submeteu aos pais humanos, que o amavam e criaram num ambiente de liberdade, confiança e responsabilidade. Em sua resposta, Jesus também introduz algo raro na compreensão humana de quem é Deus: Deus como pai. Esta forma, até então pouco usada entre o povo de Deus, possibilitou uma compreensão inteiramente nova da ordem de relacionamento dos humanos com Deus, diferentemente de todas as construções metafísicas, teológicas, legalistas e persecutórias que vigoraram até então na história. Deus é uma Pessoa, e deseja se relacionar conosco de uma maneira íntima e familiar.
2.51 sua mãe guardava tudo isso no coração. Essa atitude é típica de Maria (Lc 1,29; 2.19) Para Maria, desde que recebeu o anúncio de que seria a mãe do Filho de Deus, várias coisas e acontecimentos eram inesperados e incomuns. Sua atitude de "guardar no coração" é a maneira mais sábia de lidar com situações novas. Significa, segundo o Dr. Hans Bürki, não ignorar nem rejeitar aquilo que não conseguimos entender, mas registrar o fato e levá-lo na memória, continuando a tentar compreendê-lo, mais ou menos como se faz com um quebra-cabeças: sem afobação, ir examinando as possibilidades de "encaixar" essa peça diferente no todo da vida.
2.52 Conforme crescia. Aqui temos o caminho para a saudável autonomia do sujeito, ser físico, relacionai e espiritual: crescer em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e das pessoas.