Hebreus 4: Significado, Devocional e Exegese

Hebreus 4

Hebreus 4 representa o desdobramento natural do argumento iniciado no capítulo 3, no qual o Salmo 95 foi apresentado como advertência solene. Agora, essa advertência se transforma em promessa: o “descanso” permanece acessível, mas exige fé e obediência. O autor propõe um dos conceitos mais teologicamente ricos da epístola — o “κατάπαυσις” [katápausis, “descanso”] — como metáfora escatológica e soteriológica da comunhão eterna com Deus. Em vez de se restringir a um evento passado (como a entrada em Canaã), o descanso é projetado como realidade espiritual e futura, inaugurada por Cristo, o novo Josué. Paralelamente, o capítulo apresenta a Palavra de Deus como viva, eficaz e penetrante, antecipando a transição para o sacerdócio de Cristo, que ocorre a partir do versículo 14. Assim, Hebreus 4 funciona como um elo entre a promessa e o sacerdócio, entre a advertência e a consolação, entre o ontem do deserto e o hoje da salvação em Cristo.

I. Estrutura e Estilo Literário

O capítulo se divide em duas partes bem marcadas: a primeira (vv. 1–13) é construída em torno do conceito de descanso e do uso extensivo do Salmo 95, enquanto a segunda (vv. 14–16) introduz a figura do sumo sacerdote celestial, preparando o caminho para a grande exposição doutrinal que ocupará os capítulos 5 a 10. A primeira parte é marcada por um estilo argumentativo denso, com uso de partículas condicionais e concessivas, como μήποτε [mḗpote, “para que não”], ἐὰν [eàn, “se”] e οὖν [oûn, “portanto”]. O raciocínio é desenvolvido em forma de comentário midráshico, com paralelismos, jogos de palavras e retomadas temáticas (por exemplo, o refrão “σήμερον” [sḗmeron, “hoje”]). A linguagem adquire uma cadência quase homilética.

O estilo muda subitamente no versículo 12, onde surge um hino à Palavra de Deus: “ζῶν γὰρ ὁ λόγος τοῦ θεοῦ” [zōn gar ho logos tou theou, “viva é a Palavra de Deus”]. Essa perícope apresenta um estilo mais sapiencial, com ritmo e paralelismo intensos, evocando provérbios e salmos sobre o poder penetrante da Palavra. Já a última seção (vv. 14–16) assume tom pastoral e exortativo, marcada por vocativos (“ἔχοντες οὖν ἀρχιερέα μέγαν” [gr.: echontes oûn archierea megan, “tendo, pois, um grande sumo sacerdote”]) e por verbos no subjuntivo hortativo, como προσερχώμεθα [proserkhṓmetha, “aproximemo-nos”]. O estilo retoma a tonalidade elevada da introdução de Hebreus 1, mas agora a serviço da consolação do fiel.

II. Hebraísmos no Texto Grego

A linguagem de Hebreus 4 continua fortemente moldada por construções hebraicas, tanto na formulação das ideias quanto na seleção de vocabulário. O uso do termo κατάπαυσις [katápausis, “descanso”] — que ocorre nove vezes em Hebreus (mais do que em qualquer outro livro do NT) — traduz o hebraico מְנוּחָה [menûḥāh, “repouso”], termo carregado de conotações escatológicas nos Salmos e em Deuteronômio (cf. Salmo 95:11; Deuteronômio 12:9). O refrão “σήμερον” [sḗmeron, “hoje”], repetido de Hebreus 3, traduz o adverbial הַיּוֹם [hayyôm], e carrega o peso da convocação divina contínua — um hoje eterno e urgente. A presença desse “hoje” estrutura o argumento como um ciclo temporal, no qual o tempo da decisão permanece aberto até que se feche no juízo final.

A perícope sobre a Palavra de Deus (v. 12) também é hebraizante em sua cadência e imagens. A descrição de uma “espada de dois gumes” — μάχαιρα δίστομος [mákhaira dístomos] — remete ao hebraico חֶרֶב פִּיפִּיּוֹת [ḥérev pipiyyôt], como em Salmo 149:6, e sugere o poder julgador e discriminador da Palavra divina. A linguagem de corte, divisão entre alma e espírito, articulações e medulas, segue o paralelismo binário típico da poesia hebraica. Já a imagem do sacerdote que “penetrou os céus” — διεληλυθότα τοὺς οὐρανούς [dielēluthóta toùs ouranoús] — retoma a ascensão sacerdotal do Sumo Sacerdote no Dia da Expiação (Yom Kippur), analogamente ao verbo עָבַר [ʿāvar, “atravessar”] usado em Levítico 16:15–17.

A expressão “πλησιάζωμεν μετὰ παρρησίας” [plēsíazōmen metà parrēsías, “aproximemo-nos com confiança”] (v. 16) traduz o hebraico נִקְרַב בְּטַח [niqrav betáḥ, “aproximemo-nos com segurança”], indicando não apenas um gesto físico, mas uma ação cultual plena, associada ao acesso ao santuário. Assim, todo o capítulo é moldado por um ethos cultual veterotestamentário, expresso em linguagem grega com estrutura semítica.

III. Versículo-Chave

Hebreus 4:9

Portanto, resta um descanso sabático para o povo de Deus.

Este versículo sintetiza o argumento do capítulo ao introduzir o neologismo σαββατισμός [sabbatismós, “descanso sabático”], único no Novo Testamento. O termo traduz não apenas o descanso físico, mas a consumação escatológica da comunhão com Deus. Resta — ἀπολείπεται [apoleípetai] — indica continuidade da promessa; sabbatismós é o antítipo do sábado mosaico, transfigurado como repouso eterno. A estrutura gramatical é solene, e seu conteúdo une a escatologia à tipologia mosaica. Trata-se de uma das afirmações mais ricas da soteriologia de Hebreus: a salvação é entrar no descanso sabático final.

IV. Intertextualidade com o Antigo e o Novo Testamento

Hebreus 4 opera uma complexa releitura de textos veterotestamentários, especialmente o Salmo 95, que funciona como eixo hermenêutico. A referência ao descanso está ancorada em Gênesis 2:2 — “וַיִּשְׁבֹּת בַּיּוֹם הַשְּׁבִיעִי מִכָּל־מְלַאכְתּוֹ” [vayyishbōt bayyôm hashĕvîʿî mikkāl-melakhtô, “e descansou no sétimo dia de toda a sua obra”], citado em Hebreus 4:4. O autor interpreta esse descanso não como um ato concluído no passado, mas como uma realidade aberta, na qual os crentes podem entrar — se não forem como a geração incrédula do deserto (cf. Números 14:28–35).

A imagem do “hoje” como tempo de resposta ecoa Deuteronômio 30:15–19, onde a escolha entre vida e morte é colocada diante do povo “neste dia” — הַיּוֹם [hayyôm]. Essa dimensão de urgência é teologicamente reforçada por passagens proféticas como Isaías 55:6 (“Buscai o Senhor enquanto se pode achar”) e Salmo 95:7b (“Hoje, se ouvirdes a sua voz...”). A noção de Palavra viva e penetrante (v. 12) encontra paralelos em Isaías 55:11 (“assim será a minha palavra… ela não voltará vazia”) e em Jeremias 23:29 (“a minha palavra não é fogo… e martelo que esmiúça a rocha?”).

No Novo Testamento, a relação entre descanso e escatologia é desenvolvida em Apocalipse 14:13 (“Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor… descansarão das suas fadigas”). A imagem da entrada nos céus como ação do sumo sacerdote remete a João 14:2–3 e Apocalipse 5:6. A Palavra de Deus como espada (v. 12) encontra eco em Efésios 6:17 (“a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”) e Apocalipse 1:16 (“de sua boca saía uma espada afiada de dois gumes”).

V. Lição Teológica Geral

Hebreus 4 ensina que a promessa do descanso sabático permanece em vigor para o povo de Deus. Este descanso não é mera pausa física, mas a comunhão plena e consumada com Deus. A epístola conclama os crentes a não imitarem a desobediência dos antigos, mas a entrarem pela fé nesse repouso. A Palavra de Deus é o meio de discernimento que separa incredulidade e perseverança; é viva, cortante e conhecedora dos corações. Ao final do capítulo, o autor apresenta o Cristo como sumo sacerdote entronizado nos céus, tornando possível o acesso confiante ao trono da graça. A teologia aqui é integradora: une escatologia e soteriologia, culto e criação, Palavra e sacerdócio. O descanso é presente e futuro, condicional e gracioso, celestial e sabático. A entrada nesse repouso é o clímax da jornada cristã: perseverar na fé até o fim, confiando naquele que entrou primeiro, como pioneiro e intercessor.

VI. Comentário de Hebreus 4

Hebreus 4 argumenta que a promessa de “entrar no descanso” permanece aberta no “Hoje” de Deus, porque o descanso não se esgotou em Canaã, mas está enraizado no descanso do próprio Criador e é oferecido agora e consumado no porvir; por isso, devemos temer com reverência, crer e diligentemente buscar esse descanso, para não repetir a desobediência da geração do deserto [Hebreus 3:7-19; Hebreus 4:1-11; Gênesis 2:2-3; Salmo 95:7-11; Josué 21:43-45; 2 Coríntios 6:2; Mateus 11:28-29; Apocalipse 14:13]. O meio divino para impedir a queda e conduzir-nos ao descanso é a Palavra viva e eficaz, mais penetrante que espada de dois gumes, que julga pensamentos e intenções e desnuda tudo perante Deus, de modo que nenhum autoengano resista à sua ação que corta para curar e suscita fé obediente [Hebreus 4:11-13; Isaías 55:10-11; Jeremias 23:29]. E a âncora pastoral dessa perseverança é Jesus, o Filho de Deus, nosso grande Sumo Sacerdote que atravessou os céus e, por ter sido tentado em tudo sem pecado, compadece-se das nossas fraquezas; por isso, devemos segurar firme a confissão e aproximar-nos com ousadia do trono da graça, para receber misericórdia e achar graça para socorro oportuno, sustentados por sua intercessão contínua e pelo acesso aberto pelo seu sangue [Hebreus 4:14-16; Hebreus 1:3; 8:1-2; 9:11-12,24; 10:19-22; 7:25].

A. A Promessa de um Descanso Permanece (Hebreus 4:1-10)

Hebreus 4:1 Temamos, (O imperativo phobēthōmen não ordena pânico, mas “temor reverente” que protege da presunção e move à diligência santa. É o mesmo princípio de “servir ao Senhor com temor” e “alegrar-se com tremor” [Salmo 2:11], do “temor do Senhor” como princípio da sabedoria [Provérbios 1:7], e do “desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor” que caminha junto com a operação graciosa de Deus em nós [Filipenses 2:12-13]. Em Hebreus, o “temor” é antídoto à dureza do coração do deserto [Hebreus 3:7-19] e expressão de fé que leva a Deus a sério [Hebreus 12:28-29].) ...portanto, que, sendo-nos deixada a promessa de entrar no descanso de Deus, (O “portanto” liga 4:1 ao exemplo negativo de 3:7-19: a geração do êxodo ficou fora do descanso por incredulidade; assim, permanece para nós uma promessa (epangelia) de entrar (eiselthein) no katapausis — “descanso” — de Deus. Esse “descanso” não é meramente Canaã: ele é ancorado no descanso sabático do próprio Deus na criação [Gênesis 2:2-3], reaberto pelo “Hoje” do Salmo 95 [Salmo 95:7-11] e oferecido em Cristo como paz presente e herança futura [Mateus 11:28-29; Hebreus 4:3-11; Apocalipse 14:13]. A palavra “deixada” aponta que a promessa não caducou com a morte daquela geração; ela persiste na nova aliança [Hebreus 4:6-7].) ...suceda parecer que algum de vós tenha falhado (“Falhado” traduz hysterēkenai: “ficar aquém, faltar” — o mesmo verbo em “todos pecaram e carecem [hysterountai] da glória de Deus” [Romanos 3:23]. O perigo aqui não é perder um prêmio secundário, mas ficar aquém do descanso por incredulidade prática [Hebreus 3:12, 18-19]. O “parecer” (dokei) não sugere mera aparência enganosa; é advertência pastoral: que não se constate, em nenhum de vocês, um padrão que os deixe de fora, como aconteceu no deserto [Números 14:22-23].)

Hebreus 4:2 Porque também a nós foram anunciadas as boas-novas,... (O verbo euangelizomai mostra continuidade: Israel recebeu “boas novas” de libertação e entrada em Canaã [Êxodo 3:7-10; Deuteronômio 1:21], assim como nós recebemos o evangelho de Cristo e de Seu Reino [Marcos 1:14-15; Hebreus 2:3-4].) como se deu com eles;... (O autor identifica “eles” com a geração do êxodo, especialmente em Cades-Barnéia [Números 13–14]. Ou seja, ambos — Israel e a igreja — ouviram promessas divinas de entrada no que Deus preparou.) ...mas a palavra que ouviram não lhes aproveitou,... (Ouk ōphelēsen ho logos tēs akoēs: a “palavra da audição” não trouxe benefício. Não faltou evidência — “viram as minhas obras por quarenta anos” [Salmo 95:9] —, faltou resposta de fé. A Escritura repete que “o ouvir” sem obedecer é inútil [Tiago 1:22-25; Ezequiel 33:30-32].) ...visto não ter sido acompanhada pela fé naqueles que a ouviram. (Textualmente: mē sygkekramenos tē pistei — “não misturada com fé”. A metáfora culinária/química: a Palavra precisa ser mesclada com pistis para produzir fruto [Hebreus 11:1; Lucas 8:15]. Em Cades, a congregação “não creu” na promessa e chamou Deus de mentiroso na prática [Salmo 106:24-26; Números 14:11; 1 João 5:10].)

Hebreus 4:3 Nós, porém, que cremos, entramos no descanso, (Tempo presente: “entramos”. Hebreus trabalha com escatologia inaugurada: quem crê já participa do descanso — paz com Deus e alívio do jugo de autojustificação [Romanos 5:1; Mateus 11:28-29] — e ainda aguarda a consumação escatológica [Apocalipse 14:13; Hebreus 4:9-11]. A fé é a porta de entrada real agora [Hebreus 10:22; 11:6].) ...conforme Deus tem dito: Assim, jurei na minha ira: Não entrarão no meu descanso. (Cita [Salmo 95:11]. O juramento divino no deserto mostra que incredulidade exclui do descanso. O autor usa esse juramento para duas coisas: manter a ameaça real contra a presunção [Hebreus 3:18-19] e, paradoxalmente, sustentar que o descanso é de Deus e, portanto, maior do que Canaã — pois Deus diz “meu descanso” [Hebreus 4:5].) Embora, certamente, as obras estivessem concluídas desde a fundação do mundo. (Duas camadas. 1) Criação: “as obras” criacionais foram concluídas no princípio [Gênesis 2:2]; por isso existe um descanso de Deus anterior a Josué/Davi, disponível na história redentiva. 2) Decretos: Deus “anuncia o fim desde o princípio” [Isaías 46:10], “nos escolheu nele antes da fundação do mundo” [Efésios 1:4]; no conselho eterno, a obra da salvação tem uma certeza pré-temporal, embora se realize no tempo por Cristo [Atos 2:23; 2 Timóteo 1:9-10]. Assim, o autor não diz que uma obra histórica foi concluída antes de começar, mas que o padrão do descanso — e o propósito de Deus — é anterior e fundacional à história de Israel.)

Hebreus 4:4 Porque, em certo lugar, (O autor não cita “de memória falha”; “em certo lugar” é uma fórmula retórica recorrente em Hebreus que desloca o foco do “endereço” bibliográfico para o Sujeito divino que fala nas Escrituras [Hebreus 2:6; 4:4]. Além disso, Hebreus não identifica seu autor; a tradição paulina é discutida. O ponto do autor não é ostentar erudição, mas mostrar que Deus fala na Escritura [Hebreus 3:7; 10:15].) assim disse, no tocante ao sétimo dia: E descansou Deus, no sétimo dia, de todas as obras que fizera. (Citação direta de [Gênesis 2:2]. O “descansou” de Deus não é cansaço, mas cessação e deleite soberano na obra perfeita [Gênesis 1:31; Salmo 104:31]. Esse descanso sabático é o arquétipo do descanso prometido ao povo: participação na ordem, paz e comunhão de Deus [Isaías 58:13-14; Apocalipse 21:3-5].)

Hebreus 4:5 E novamente, no mesmo lugar: (Volta ao mesmo Salmo 95, agora para reforçar o lado negativo da tipologia: há exclusão para o coração duro.) Não entrarão no meu descanso. (Repetir [Salmo 95:11] fixa a tese: porque Deus chama o descanso de “meu”, e porque Davi o repropõe séculos depois, conclui-se que o descanso é maior do que Canaã e continua aberto — mas não para o coração incrédulo [Hebreus 4:6-7].)

Hebreus 4:6 Visto, portanto, que resta entrarem alguns nele... (Apoleipetai — “resta”. A promessa continua válida e aberta; Deus preserva um povo que entrará [Romanos 11:5; Hebreus 12:22-24].) ...e que, por causa da desobediência, não entraram aqueles aos quais anteriormente foram anunciadas as boas-novas,... (A falha histórica foi apeitheia — desobediência incrédula — no próprio coração do povo que recebeu as boas novas [Números 14:1-4; Salmo 106:24-26]. Conclusão do autor: não foi a promessa que falhou; foi a resposta deles. Portanto, a promessa continua para “alguns” — os que respondem com fé obediente [Hebreus 4:2-3; João 3:36].)

Hebreus 4:7 de novo, determina certo dia, Hoje, falando por Davi,.. (Séculos depois de Josué, o Espírito “fixa” um dia chamado “Hoje” por meio de Davi em [Salmo 95:7-8]. Isso prova que Canaã não esgotou o descanso; Deus ainda convoca o povo a entrar agora — “Hoje”.) muito tempo depois, segundo antes fora declarado: (O “muito tempo depois” é o ponto: a voz do Salmo 95 reabre a oportunidade num novo momento da história da salvação, em continuidade com o que “antes fora declarado” na criação e no êxodo. A intenção do autor é canônica: ler todo o AT convergindo para Cristo e para o “Hoje” da nova aliança [Lucas 24:27; 2 Coríntios 1:20].) Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais o vosso coração. (O sēmeron é o “tempo aceitável” [2 Coríntios 6:2]. “Ouvir” na Bíblia significa obedecer [Deuteronômio 6:4-5; Mateus 7:24]; “endurecer” é sklērýnō, processo de insensibilização pela repetição do pecado e da resistência à verdade [Êxodo 9:34-35; Hebreus 3:13]. O autor aplica: respondam agora com fé obediente, antes que a janela do “Hoje” se feche [Hebreus 10:26-27].)

Hebreus 4:8 Ora, se Josué lhes houvesse dado descanso, (No grego, Iēsous = Josué. Se a posse da terra fosse o descanso final, o Espírito não falaria depois por Davi de outro “Hoje”. Como [Josué 21:43-45] registra um descanso típico, mas não definitivo, o Salmo 95 aponta além de Josué.) ...não falaria, posteriormente, a respeito de outro dia. (Logo, a “katapausis” prometida é escatológica: é o descanso de Deus, reaberto no “Hoje” do evangelho, que ultrapassa sombras e tipos [Colossenses 2:17; Hebreus 8:5].)

Hebreus 4:9 Portanto, resta um repouso para o povo de Deus. (Aqui surge sabbatismos — único uso no NT — “repouso sabático”. Trata-se da participação real do povo no sabá de Deus: já agora, pela fé, no alívio e culto sob o Senhor do sábado [Mateus 12:8; Hebreus 4:3], e finalmente, no descanso dos santos, “descansarão das suas fadigas, pois as suas obras os acompanham” [Apocalipse 14:13]. Não é legislar o calendário semanal, mas afirmar a realidade para a qual o sabá semanal sempre apontou [Gênesis 2:2-3; Isaías 66:22-23].)

Hebreus 4:10 Porque aquele que entrou no descanso de Deus, (Duas leituras complementares. 1) Cristo: tendo “consumado” Sua obra [João 19:30], “assentou-se” [Hebreus 1:3] e entrou no santuário celeste [Hebreus 9:24]; assim, Ele é o pioneiro do descanso que nos abre o caminho [Hebreus 6:19-20]. 2) O crente: quem entra pela fé já participa do descanso [Hebreus 4:3] e o alcançará plenamente no fim [Apocalipse 14:13]. A teologia de Hebreus permite ambos: Cristo como cabeça e nós como corpo participante.) ...também ele mesmo descansou de suas obras, como Deus das suas. (Analogia com [Gênesis 2:2]. “Descansar de suas obras” não significa cessar de praticar boas obras — pois fomos criados em Cristo “para boas obras” [Efésios 2:10] —, mas cessar da obra penosa de autojustificação e da peregrinação sob maldição; é entrar na paz consumada do pacto, recebendo a herança por graça [Romanos 4:4-5; Hebreus 10:14]. Agora, vivemos de obras que fluem do descanso em Cristo, não para comprá-lo [Tito 3:5-8].)

B. A Palavra de Deus como Meio para Entrar no Descanso (Hebreus 4:11-13)

Hebreus 4:11 Esforcemo-nos, pois, por entrar naquele descanso,... (O imperativo spoudasōmen exprime diligência zelosa: empenho sério, aplicado, não confiança em méritos próprios. Em Hebreus, promessa e responsabilidade caminham juntas: Deus promete o descanso, e nós respondemos com fé obediente e diligente [Hebreus 4:1-3; 6:11-12]. Essa “pressa diligente” ecoa o chamado a “procurar” firmar a vocação e eleição [2 Pedro 1:5-11], a “trabalhar” a salvação com temor porque Deus opera em nós [Filipenses 2:12-13], a “correr com perseverança” fixos em Jesus [Hebreus 12:1-2] e a “esforçar-se por entrar pela porta estreita” [Lucas 13:24]. A fé bíblica não é passiva: usa os meios de graça — Palavra, oração, comunhão — para caminhar rumo ao descanso [Atos 2:42; Romanos 10:17].) ...a fim de que ninguém caia,... (Finalidade negativa: hina mē tis pēsē — “para que ninguém venha a cair”. “Cair” evoca o juízo histórico: “seus cadáveres caíram no deserto” [Hebreus 3:17; Números 14:29-35]. O NT aplica a mesma advertência: “aquele que julga estar em pé, veja que não caia” [1 Coríntios 10:12]; “guardai-vos… para que não percais aquilo que temos realizado” [2 João 8].) ...segundo o mesmo exemplo de desobediência. (En tō autō hypodeigmati tēs apeitheias: hypodeigma = modelo/exemplo; apeitheia = incredulidade desobediente. Em Hebreus, incredulidade e desobediência são faces do mesmo mal [Hebreus 3:18-19; João 3:36]. O “modelo” é o de Massá/Meribá e Cades-Barnéia — ouviram promessas, viram obras, mas recusaram crer e obedecer — e por isso ficaram fora do descanso [Salmo 95:7-11; Números 13–14].)

Hebreus 4:12 Porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, ... (“Porque” introduz a base: o instrumento pelo qual Deus impede a queda e conduz ao descanso é Sua Palavra. Ho logos tou theou zōn kai energēs: “viva” (zōn) — tem a própria vida de Deus e opera no presente — e “eficaz” (energēs) — realiza o que promete e ordena [Isaías 55:10-11; Jeremias 23:29; 1 Tessalonicenses 2:13]. Pela Palavra nasce e se nutre a fé que entra no descanso [Romanos 10:17; 1 Pedro 1:23-25].) ...e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, ... (gr.: Tomōteros hyper pasan machairan distomon: a “espada de dois gumes” corta em qualquer direção; figura comum para o poder penetrante da revelação [Isaías 49:2; Efésios 6:17; Apocalipse 1:16]. A Palavra não afaga ilusões: ela fere para curar, mata a incredulidade para vivificar a fé [Oseias 6:1; João 6:63].) ...e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, ... (gr.: Achri merismou psychēs kai pneumatos, harmōn te kai myelōn: “até a divisão de alma e espírito, juntas e medulas”. Não é um esquema anatômico para separar “partes” da pessoa, mas hipérbole literária para dizer: nada em nós — dimensão espiritual (pneuma), afetiva/psíquica (psychē) e até a base das faculdades corporais (“juntas e medulas” harmōn… myelōn) — fica fora do alcance do exame da Palavra. Ela vai onde nenhuma lâmina humana alcança [Provérbios 20:27; 1 Tessalonicenses 5:23].) ...e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração. (gr.: Kritikos enthymēseōn kai ennoiōn kardias: kritikos = juiz/avaliador. A Palavra julga “pensamentos” e “intenções” — aquilo que motivou os israelitas a murmurarem e recuarem [Salmo 95:10; Salmo 139:23-24]. Ela revela o que está escondido, como quando os segredos do coração se tornam manifestos e alguém reconhece: “Deus está, de fato, no meio de vós” [1 Coríntios 14:24-25; Jeremias 17:9-10; Lucas 2:35]. Assim, a Palavra é o bisturi que extirpa o “engano do pecado” que endurece [Hebreus 3:13] e o mapa que guia o peregrino ao descanso [Salmo 119:105].)

Hebreus 4:13 E não há criatura que não seja manifesta na sua presença; ... (A onividência divina torna inútil toda máscara: ouk estin ktisis aphanēs enōpion autou — nenhuma criatura está oculta diante dEle [Salmo 139:1-12; Provérbios 15:3]. O Deus que chama “Hoje” vê o coração que crê e o que endurece; nada do deserto interior Lhe escapa [Hebreus 3:12; 1 Samuel 16:7].) ...pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas. (Panta gymna kai tetrachelismena… pros hon hēmin ho logos: “todas as coisas nuas (gymna) e com a garganta exposta (tetrachelismena)” — imagem sacrificial/forense: como a vítima cujo pescoço é puxado para trás, ou o lutador imobilizado, ficamos completamente expostos diante do Juiz [Levítico 1:5; Malaquias 3:2-3]. Pros hon hēmin ho logos pode significar “com quem temos de tratar” ou “a quem prestaremos relatório/palavra”: há um jogo intencional com logos — o “Logos” que nos sonda exigirá nosso “logos” (prestação de contas) [Eclesiastes 12:14; Mateus 12:36; Romanos 14:10-12; 1 Coríntios 4:5]. Conclusão: a Palavra viva expõe a incredulidade, cria fé e orienta o povo a perseverar até entrar no descanso; por isso, acolhê-la hoje é questão de vida e descanso [Hebreus 4:7; Tiago 1:21-25].)

C. Cristo, o Sumo Sacerdote, como Âncora da Confiança (Hebreus 4:14-16)

Hebreus 4:14 Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus,... (O “pois” conecta com o argumento anterior: se o descanso permanece e a Palavra sonda tudo, nossa única segurança é Jesus. Chamá-lo “Filho de Deus” (ho huios tou theou) retoma a cristologia de Hebreus 1: Ele é o Herdeiro, o Resplendor da glória e o Agente da criação [Hebreus 1:2-3, 10; Colossenses 1:15-17], e, ao mesmo tempo, o Filho que se fez semelhante aos irmãos [Hebreus 2:14-17]. Essa identidade dupla garante que Sua obra sacerdotal tem valor infinito e empático.) ...como grande sumo sacerdote que penetrou os céus,... (gr.: archierea megan dielēlythota tous ouranous): “grande” porque supera todo o sacerdócio levítico [Hebreus 7:23-28]; “penetrou os céus” indica a ascensão e entronização após o sacrifício, entrando no santuário verdadeiro, não feito por mãos, como o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos com sangue no Dia da Expiação [Levítico 16; Hebreus 8:1-2; 9:11-12, 24]. Assim, Ele é sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque, Rei-Sacerdote entronizado [Salmo 110:1,4; Hebreus 6:19-20].) ...conservemos firmes a nossa confissão. (kratōmen tēs homologias): “agarrar com força” o testemunho público de fé (que Jesus é Senhor, Sacerdote e Filho) [Romanos 10:9-10; Hebreus 3:6; 10:23]. Em meio a provações, não retroceder [Hebreus 10:35-39], mas perseverar olhando para Ele [Hebreus 12:1-3].)

Hebreus 4:15 Porque não temos sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas;... (Dupla negação para ênfase: nosso Sumo Sacerdote pode sympathēsai — sofrer junto — nossas “fraquezas” (astheneiai: cansaço, dor, pressões, limites da condição humana, não inclinação culpável) [Salmo 103:13-14; Mateus 26:38; João 11:35; Hebreus 2:17-18]. Ele é “misericordioso e fiel” precisamente porque conhece por experiência o peso das provações [Hebreus 2:17].) ...antes, foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança,... (gr.: pepeirasmenon kata panta kath’ homoiotēta): “em todas as coisas” não significa cada tentação particular em espécie, mas todas as categorias que pressionam o humano (fome, carência, dor, rejeição, sucesso, poder; cf. tríade de [1 João 2:16]). Ele enfrentou o Tentador no deserto [Mateus 4:1-11; Lucas 4:1-13], suportou oposição e abandono [Hebreus 12:3; João 6:66], e permaneceu fiel sob máxima pressão — “vós sois os que tendes permanecido comigo nas minhas tentações” [Lucas 22:28].) ...mas sem pecado. (gr.: chōris hamartias): impecabilidade real; Ele não cedeu, nem internamente nem externamente [2 Coríntios 5:21; 1 Pedro 2:22; 1 João 3:5]. Isso não torna as tentações menos reais; ao contrário, Ele sentiu a força plena que nós raramente suportamos até o fim. Sua pureza garante a eficácia de Seu sacrifício e a segurança de Sua intercessão [Hebreus 7:26-27; 9:14].)

Hebreus 4:16 Acheguemo-nos, portanto, confiadamente, junto ao trono da graça,... (gr.: proserchōmetha meta parrēsias): o “portanto” deduz a prática: porque temos um Sumo Sacerdote entronizado e simpático, aproximemo-nos com franqueza filial (não atrevimento irreverente) do “trono da graça”. Em Cristo, o trono que seria apenas tribunal torna-se propiciatório para os Seus [Hebreus 10:19-22; Efésios 3:12; Romanos 5:2; Êxodo 25:22].) ...a fim de recebermos misericórdia... (“Misericórdia” para nossas quedas passadas e misérias atuais: perdão, compaixão, restauração [Salmo 51:1; Lucas 18:13-14; 1 Timóteo 1:13-16]. O caminho está aberto porque o Filho ofereceu Seu próprio sangue [Hebreus 9:12; 10:14].) ...e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna. (gr.: charin eukairon boētheian): “graça” como favor atuante que ajuda no tempo certo — o auxílio pontual de Deus que sustenta sob tentação, provê sabedoria e fortalece para obedecer [1 Coríntios 10:13; Salmo 46:1; Isaías 41:10; 2 Coríntios 12:9; Hebreus 7:25; Romanos 8:34]. A intercessão contínua de Cristo assegura esse socorro até entrarmos plenamente no descanso [Hebreus 4:9-11; 7:25].)

VII. Devocional de Hebreus 4

A. O descanso que Josué não pôde dar (Hebreus 4:1–10)

Há palavras na Escritura que, à primeira leitura, parecem promessas para um amanhã distante; mas, quando as olhamos com a devida reverência, percebemos que são convocações para hoje. “Temamos, portanto, que, sendo-nos deixada a promessa de entrar no descanso, suceda parecer que algum de vós tenha falhado” (Hebreus 4:1). O autor não fala de um alívio nebuloso, reservado a um além remoto; fala de um descanso real, oferecido agora, que pode ser perdido por incredulidade como foi perdido no deserto, e que só é alcançado quando Deus é trazido de volta à conta. Israel ouviu as boas novas do descanso de Canaã, mas nada lhes aproveitou, porque os ouvintes estavam destituídos de fé. Eles não disseram “Deus pode”, disseram “poderá Deus?” (Salmo 78:19). Viram seus inimigos como gigantes e a si mesmos como gafanhotos (Números 13:33), e, ao fazerem esse cálculo sem Deus, condenaram-se à exaustão da peregrinação sem chegada. Tire Deus da equação e tudo se agiganta; traga Deus de volta ao centro — e nós nos levantamos como gigantes, e nossos temores diminuem a ponto de parecer gafanhotos.

É exatamente aqui que Hebreus 4 nos coloca: Cristo oferece descanso a todos nós, não apenas na outra vida, mas nesta. O texto é explícito: “nós, os que cremos, entramos no descanso” (Hebreus 4:3); e, mais adiante, o apelo insistente: “procuremos, pois, entrar naquele descanso” (Hebreus 4:11). Não se trata de inatividade ociosa, mas do cessar do fardo que nos quebra as costas — descanso do peso da culpa, descanso das inquietações e cuidados que roem por dentro, descanso do pacote diário de ansiedades e maus presságios. É o descanso que chega quando entregamos todas as nossas preocupações a Cristo e recebemos d’Ele tudo o que nos é necessário (1 Pedro 5:7; Filipenses 4:6–7). É o que o próprio Senhor prometeu: “Vinde a mim… e eu vos aliviarei… e achareis descanso para a vossa alma” (Mateus 11:28–29). O ponto não é se essa promessa existe; a pergunta é: já entramos nessa experiência?

O autor, com a sabedoria de um médico de almas, expõe a raiz do fracasso no deserto e a raiz do nosso fracasso hoje. Em Hebreus 4:6 e 4:11, a A.V. vertia “unbelief” (incredulidade), ao passo que a R.V. lia “disobedience” (desobediência). Dois termos, uma mesma chaga. Se desobedecemos, é porque não cremos; e, quando de fato cremos, inevitavelmente obedecemos. A incredulidade veste às vezes a aparência de prudência, de cálculo ponderado, de realismo; mas Deus a chama pelo nome: desobediência. Israel não entrou porque “não pôde por causa da incredulidade” (Hebreus 3:19), e essa incredulidade se manifestou em atos, decisões, recuos — em desobediência. A fé, ao contrário, traz Deus para dentro da conta e, ao fazê-lo, obedece ainda que o mar esteja à frente e o exército de Faraó às costas.

Mas que descanso é esse? O autor responde apontando para duas cenas que se espelham. A primeira é primitiva: “E descansou Deus no sétimo dia de todas as suas obras” (Hebreus 4:4; Gênesis 2:2). O descanso sabático de Deus não foi a fadiga de quem esgota forças; foi a satisfação do “muito bom”: a obra concluída, perfeita, digna de ser contemplada. A segunda cena é mais gloriosa: “Aquele que entrou no descanso de Deus, ele mesmo também descansou das suas obras” (Hebreus 4:10). Aqui somos dirigidos ao nosso Senhor ressuscitado, que concluiu a redenção e descansa — como Deus descansou quando pronunciou a criação “muito boa”. Quando compreendemos o alcance do Seu “Está consumado” (João 19:30), nós também descansamos. Descansamos da obra que jamais poderíamos realizar — a autossalvação, a autorrustificação — e descansamos em Sua obra perfeita, já feita de uma vez por todas. Não é indolência; é cessar das tentativas de nos justificarmos, é abandonar a urgência ansiosa do fariseu interior, é lançar fora a mochila de méritos e de medos, para viver na obediência grata de quem já foi aceito. “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo” (Romanos 5:1). Esta paz é o início do descanso.

Repare como o autor mantém sempre juntas duas realidades que nossa carne gostaria de separar: o descanso dado e o esforço diligente. “Nós… entramos no descanso” (Hebreus 4:3) — presente, dom, graça. E, sem contradição: “procuremos, pois, entrar naquele descanso” (Hebreus 4:11) — empenho, vigilância, diligência. A alma que descansa da autossalvação é a mesma que se levanta para obedecer com santo zelo. O descanso não é licença para a apatia; é força para a obediência. É só depois que cessamos de tentar ser nossos próprios salvadores que nos tornamos realmente livres para fazer a vontade de Deus sem o tique-taque da neurose moral. Quem descansa em Cristo trabalha com alegria; quem confia na própria obra trabalha com medo.

Alguém dirá: “Mas Josué não nos conduziu ao descanso?” Hebreus responde de modo lapidar: “Se Josué lhes houvesse dado descanso, Deus não falaria, depois, de outro dia” (Hebreus 4:8). Havia uma Canaã histórica, sim; mas a entrada naquela terra não esgotou a promessa. O descanso que Josué podia dar era limitado, temporal, sujeito a inimigos, colheitas, estações; o Descanso de que fala a Escritura, o sabbatismós — sabbatismós, “repouso sabático” — “resta para o povo de Deus” (Hebreus 4:9). Resta, isto é, permanece aberto, atual, oferecido hoje. Por isso o autor volta ao refrão do Salmo 95: “Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endureçais os vossos corações” (Hebreus 4:7; Salmo 95:7–11). O “hoje” da graça é tão sério quanto generoso. O perigo do ontem é a nostalgia que paralisa; o perigo do amanhã é a procrastinação que engana; o hoje é o tempo de entrar.

E como se entra? Não há segredo oculto, há fé obediente. A alma que entra nesse descanso faz três movimentos claros. Primeiro, ela toma Deus em conta. Cessa de calcular a vida como se Deus fosse uma variável incerta, e passa a confessar: “Deus pode”. Onde a incredulidade vê gigantes, a fé vê a mão do Senhor; onde a carne se enxerga como gafanhoto, a fé se lembra de que “maior é o que está em vós do que o que está no mundo” (1 João 4:4). Segundo, ela entrega seus pesos: não alguns, todos. “Lançando sobre Ele toda a vossa ansiedade, porque Ele tem cuidado de vós” (1 Pedro 5:7). Não é uma metáfora delicada; é um ato vigoroso de transferência: tirar do coração e colocar nas mãos de Cristo o que não fomos feitos para carregar. Terceiro, ela recebe de Cristo tudo o que precisa. Não apenas perdão, mas provisão diária; não apenas justificação, mas paz, mansidão, coragem, domínio próprio. O descanso não é o vazio; é a presença do Próprio Cristo suprindo “todas as vossas necessidades, segundo a sua riqueza em glória” (Filipenses 4:19).

Pergunto, então, como o autor perguntaria: já entramos nessa experiência? Não pergunto se conhecemos a doutrina, se decoramos os versículos, se apreciamos a homilia; pergunto se, quando o fardo lateja e a mente racha, nós vamos a Cristo e, de fato, descansamos. Pergunto se o “Está consumado” governa a consciência quando a culpa nos revisita; se a providência do Pai pesa mais do que as manchetes do dia; se a paz de Deus guarda o coração e a mente em Cristo Jesus (Filipenses 4:7). Pergunto se, na prática, temos trocado “poderá Deus?” por “Deus pode”.

E não fujo do aviso grave que o texto traz. O descanso é dom, mas pode ser falhado por incredulidade que se disfarça de desobediência, e desobediência que se alimenta de incredulidade (Hebreus 4:6; Hebreus 4:11). Não há fé que perdure sem obediência; não há obediência que floresça sem fé. Por isso o apóstolo une graça e zelo: “procuremos, pois” — literalmente, empenhemo-nos, apressemos-nos — “entrar naquele descanso, para que ninguém caia no mesmo exemplo de desobediência” (Hebreus 4:11). É um chamado à vigilância ternamente severa: temamos, não como quem se encolhe diante de um tirano, mas como quem teme perder um tesouro. Teme o que ama, quem ama não brinca com o que é santo.

E, para que ninguém confunda descanso com apatia, o autor nos coloca diante do Cristo que trabalhou até o fim e então descansou. Ele é o nosso Josué maior e definitivo. Josué distribuiu lotes; Jesus distribui graça. Josué conquistou cidades; Jesus conquistou a morte. Josué venceu cananeus; Jesus venceu o acusador. Josué deu repouso por uma estação; Jesus dá repouso que começa aqui e culmina na glória. Quando o Cordeiro bradou “Está consumado” (João 19:30), o céu não ouviu um suspiro de derrota, mas o selo da obra perfeita. E agora, porque Ele descansa como Deus descansou, nós podemos, pela fé, descansar de nossas obras — não da obediência, mas do delírio de nos salvar por elas — e nos lançar com santa diligência na vida que agrada a Deus.

Apliquemos, então, sem evasivas. No coração, descanso é paz com Deus e paz de Deus: cessar de medir o amor do Pai pela oscilação dos sentimentos, e crer no Cristo que nos justificou. No lar, descanso é trazer Deus para a conta das conversas e decisões, é crer que Ele pode, mesmo quando tudo grita que não. Na igreja, descanso é culto vivo, sem performance; é corpo que leva fardos uns dos outros porque aprendeu a entregá-los a Cristo. No trabalho, descanso é integridade sem ansiedade, é diligência sem idolatria; é fazer tudo para o Senhor, sabendo que o Senhor cuida de tudo. Na sociedade, descanso é coragem mansa: falar a verdade, praticar a justiça, amar a misericórdia, porque o governo real pertence a Cristo. E, diante da morte, descanso é a liberdade dos que já foram libertos “do medo da morte” (Hebreus 2:15): quem entrou no descanso de Cristo não se despede no escuro; atravessa confiando, porque o seu Josué já foi à frente.

“Resta, portanto, um repouso sabático para o povo de Deus” (Hebreus 4:9). Resta — está de pé, está aberto, está oferecido. Hoje, se ouvirdes a Sua voz, não endureçais o coração. Tragam Deus de volta à conta, entreguem os fardos, recebam de Cristo tudo o que precisam. E, entendendo o que Ele quis dizer com “Está consumado”, descansem — e, descansando n’Ele, obedeçam com a alegria dos que já ouviram o “muito bom” da nova criação.

B. Entrar pela fé, permanecer pela oração (Hebreus 4:11–16)

“Procuremos, pois, entrar naquele descanso” (Hebreus 4:11). O autor não ocupa o nosso ouvido com devaneios religiosos; ele convoca a vontade. O descanso de Deus é dom, mas não é indiferença; é graça, mas não é passividade. O mesmo Espírito que nos diz “nós, os que cremos, entramos no descanso” (Hebreus 4:3) agora nos toma pelo ombro e sussurra com santa urgência: empenhem-se, vigiem, não se contentem com a borda do átrio — entrem. E imediatamente ele nos mostra por que tanta seriedade: não há fuga possível para a desobediência e a incredulidade, “porque todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar” (Hebreus 4:13). Podemos escapar do exame dos homens; não escaparemos do olhar de Deus.

Aqui a Escritura nos detém diante da Palavra viva que nos perscruta. “A palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é juiz dos pensamentos e intenções do coração” (Hebreus 4:12). O quadro que segue é deliberadamente sacrificial: a concepção dos versículos 12–13 é a de uma vítima destinada ao altar, lançada de costas, o pescoço exposto, para que o fio do cutelo faça sua obra com precisão. O termo que o autor usa para “expostos” tem o sentido de pescoço descoberto, como o animal imobilizado para o sacrifício. Se essa imagem, tão vívida, já seria suficiente para calar a nossa presunção, a Escritura vai além e nos diz que a escrutinação divina é ainda mais afiada. O sacerdote podia errar um golpe; a Palavra de Deus não erra jamais. Ela não corta para destruir; corta para revelar, para separar, para curar. Há tanto da alma — nossas opiniões, impulsos, atividades, agendas — até mesmo naquilo que chamamos de “serviço a Deus, ” que confundimos facilmente o que nasce de nós com o que nasce do Espírito (João 3:6). Mas Deus distingue. Ele separa entre o que é apenas movimentação nossa e o que são impulsos do Seu Espírito. O que é da carne pode impressionar por um tempo; somente o que é nascido do Espírito permanecerá ao teste da eternidade (cf. 1 Coríntios 3:12–15).

À luz disso, a consciência faz a pergunta inevitável: não falharemos nesse exame? Ele não detectará em nós “um perverso coração de incredulidade” (Hebreus 3:12)? Não verá, por trás de muito zelo aparente, a autoexaltação; por trás de muitas palavras, o vazio; por trás de algum louvor, a busca de aplauso? E a Escritura não nos poupa do choque: “não há criatura que não seja manifesta na Sua presença; pelo contrário, todas as coisas estão descobertas e patentes aos Seus olhos” (Hebreus 4:13). É aqui que muitos param, esmagados. Mas o Evangelho não para aqui. O mesmo Deus que tudo perscruta proveu um Sumo Sacerdote para os examinados; Aquele que nos vê por dentro é o mesmo que nos recebe por meio de Cristo.

“Tendo, pois, um grande Sumo Sacerdote, Jesus, o Filho de Deus, que penetrou os céus, retenhamos firmemente a nossa confissão” (Hebreus 4:14). Observem a transição: da mesa cirúrgica à sala do trono; da lâmina que discerne ao intercessor que abraça; do “todas as coisas nuas e patentes” à certeza de que alguém nosso já atravessou o véu, já entrou por nós, já permanece por nós na presença de Deus. Ele é grande, porque “passou pelos céus” — não apenas através do véu do templo, mas por todos os céus, até o próprio santuário eterno. Ele é “Jesus, o Filho de Deus” — verdadeiro homem, verdadeiro Deus. E porque Ele entrou, nós não desfalecemos: “retenhamos firmemente a nossa confissão”.

O texto nos apressa a desfazer um equívoco comum: não temos um sacerdote incapaz de se compadecer. Ao contrário, “temos um Sumo Sacerdote que pode compadecer-Se das nossas fraquezas, tendo sido tentado em tudo, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hebreus 4:15). A mesma Palavra que nos expõe é a Palavra encarnada que nos compreende. Ele não contempla a nossa fraqueza à distância; Ele entrou nela. Foi tentado em tudo — nas pressões da fome, da solidão, da rejeição, da calúnia; sentiu o peso da oferta fácil, do atalho brilhante, do escape pecaminoso — e, no entanto, sem pecado. Justamente por isso, não apenas nos entende; socorre. Ele não oferece conivência; oferece graça que sustém. E é essa dupla certeza — onisciência que discerne, compaixão que socorre — que nos abre a porta final do parágrafo: “Aproximemo-nos, portanto, com confiança, do trono da graça, para que recebamos misericórdia e encontremos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hebreus 4:16).

Aqui está a tese do Espírito para a nossa alma: entramos no descanso pela fé (v. 11) e nele permanecemos pela oração (v. 16). A fé nos une ao Cristo que já concluiu a obra; a oração nos leva, de modo contínuo, ao trono onde a obra concluída é aplicada. E o que recebemos quando nos chegamos? O texto não deixa margem a dúvida: “misericórdia” e “graça para socorro em tempo de necessidade”. Misericórdia para os pecados — limpeza real, restauração da comunhão, sangue que fala melhor do que o de Abel. Graça para a fraqueza — poder para o agora, auxílio para a hora exata, sustentação na fadiga, domínio no assédio, coragem no medo. A misericórdia trata do passado culpado; a graça equipa o presente impotente. E ambas vêm do mesmo trono, que já não é para nós “trono de juízo”, mas “trono de graça”, porque um Sumo Sacerdote vivo permanece ali por nós (Hebreus 7:25).

Voltemos, então, à lâmina da Palavra. Ela não nos corta para nos perder; corta para nos conduzir ao Trono. Se, ao expor os pensamentos e intentos do coração, ela revela incredulidade e desobediência, não é para nos lançar ao desespero, mas para nos empurrar à fé obediente que se aproxima, confessa, recebe. Não é sem propósito que o parágrafo começa com “procuremos entrar” e termina com “aproximemo-nos, portanto”. O esforço da fé culmina na ousadia da oração; a diligência contra a incredulidade se prova na frequência com que nos chegamos ao trono. É assim que se vive diante do Deus que tudo vê: não fugindo do Seu olhar, mas buscando-o em Cristo; não escondendo feridas, mas expondo-as à Palavra e à graça; não confiando em nossas obras, mas descansando na obra consumada, e apresentando, dia a dia, a nossa necessidade ao Sumo Sacerdote que nunca dorme.

Talvez você diga: “Mas e se eu falhar no exame? E se, na hora em que a Palavra me abre, tudo o que aparece é um emaranhado de orgulho, vaidade, medo, tibieza?” Não suavize o diagnóstico; traga-o ao Trono. A promessa não foi feita ao forte, mas ao necessitado: “graça para socorro em tempo oportuno”. A expressão carrega a ideia de socorro à medida e no momento exato. Não graça teórica, mas auxílio preciso, como pão fresco para o faminto da manhã, como luz acesa no corredor escuro da tentação, como mão firme no tropeço de agora. Vá, portanto. Vá com culpa, para receber misericórdia. Vá com fraqueza, para receber graça. Vá com pressa, porque o “hoje” ainda soa (Hebreus 3:13), e o Trono, por causa de Cristo, está aberto.

E não esqueça: o Deus que tudo vê é o Deus que tudo provê em Seu Filho. A onisciência que nos desnuda é a mesma que conhece o que nos falta antes que peçamos; a Palavra que nos corta é a mão que nos sara; o Sumo Sacerdote que nos examina é o Irmão que nos sustém. Entramos, pois, no descanso pela fé — e mantemos esse descanso pela oração que se aproxima. É assim que a igreja caminha com passos firmes: bíblia aberta sobre o coração, joelhos dobrados diante do Trono, boca cheia de confissão e confiança, mãos cheias de socorro recente. E, enquanto for “tempo de necessidade”, haverá sempre, do outro lado do véu, uma voz que não se cala e um Trono que não se fecha.

VIII. Pregação de Hebreus 4

DESCANSO DA ALMA

NOTAS CRÍTICAS E EXEGÉTICAS (Hebreus 4:1-11)

ESTE capítulo não deveria ter sido separado do anterior, pois é uma continuação da passagem exortatória. Há, contudo, uma quebra no tratamento do assunto. Na cláusula de Hb 4:1-13, o escritor tem em mente possíveis objeções ao seu modo de tratar as Escrituras do Antigo Testamento. Poder-se-ia dizer (1) que o “descanso” de que se fala era meramente a posse tranquila de uma herança terrena, e não tinha aplicações espirituais mais profundas. Ou poder-se-ia dizer (2) que a exclusão dos israelitas de Canaã se baseou em sua murmuração e rebelião, e não em sua incredulidade; e assim, o caso não sustentava adequadamente a exortação do escritor. Ele, portanto, se detém mais longamente sobre o ponto. Realmente, o “descanso” que foi oferecido aos crentes nos tempos antigos é o “descanso” oferecido aos crentes agora; e eles ainda podem perder o descanso por incredulidade. O descanso realmente oferecido, então e agora, é espiritual; é o “descanso” da confiança e obediência a Jeová.

Hb 4:1. Temamos. — Não no sentido de “ter medo de que algo aconteça”, mas significando, “tomemos cuidado; estejamos alertas como aqueles que estão em meio a perigos; ajamos vigilantemente.” Que nos foi deixada. — Ou, “visto que uma promessa ainda permanece por se cumprir.” O sentido usual da palavra é “negligenciar”. Para que, por negligência da promessa a nós feita. Stuart prefere “deixada para trás”, “ainda existente”. Então a ideia é que “a promessa que foi implicitamente feita aos crentes entre o antigo povo de Deus ainda está em vigor, e é feita a nós, cristãos.” Seu descanso. — Dito para ampliar nossas ideias sobre seu caráter. É o Seu descanso e, como Ele, é espiritual. Dele fiquemos aquém. — Falhar em obtê-lo: ver Hb 12:15; Rm 3:23; 1Co 1:7. O ponto aqui é a participação cristã nos significados mais profundos das promessas de descanso do Antigo Testamento. Para os escritores do Novo Testamento, o Antigo Testamento brilhava sob a luz cristã.

Hb 4:2. O evangelho pregado. — Não as doutrinas evangélicas, mas a bondade de um descanso prometido. Não lhes aproveitou. — Porque a condição de sua parte estava ausente. Essa condição era a fé, expressa em confiança e obediência.

Hb 4:3. Entramos no descanso. — As cláusulas do versículo precisam ser reorganizadas. “Mas ainda assim as obras foram concluídas desde a fundação do mundo, como Ele disse: Assim como jurei na Minha ira, se eles entrarem no Meu descanso”; ou, “eles não entrarão.” A citação é feita por causa das palavras “Meu descanso”, para indicar que a referência era ao próprio descanso de Deus. Seu descanso espiritual celestial, e não meramente a um descanso material, físico ou nacional provido por Deus. O descanso de Deus após o trabalho é a sugestão e a figura do descanso espiritual. “O imenso peso de significado atribuído a expressões escriturísticas incidentais, como ‘Meu descanso’ e ‘hoje’, era uma das características da exegese rabínica, bem como da alexandrina” (Farrar).

Hb 4:4-5. — Estas citações são introduzidas para provar que a promessa não se referia meramente ao descanso de Canaã. A passagem em Gênesis não poderia se referir a Canaã, nem a passagem tirada do Salmo 95, visto que foi escrita muito depois de o descanso de Canaã ter sido conquistado.

Hb 4:6. Alguns hão de entrar. — A promessa ainda está aberta. Não podemos pensar que Deus faz e renova Suas promessas em vão. Evidentemente, uma cláusula foi omitida aqui, seja por acidente ou propositalmente para fins retóricos. Podemos suprir de Hb 4:1: “Temamos, pois, que também fiquemos aquém.” Incredulidade. — Aqui ἀπείθειαν (apeitheian), a desobediência que é o sinal e a expressão da incredulidade.

Hb 4:7. — Referência novamente à citação do salmo, a fim de mostrar que a promessa foi renovada muito depois de Canaã ter sido conquistada, e que o descanso sempre poderia ser obtido “hoje”. Deve, portanto, ser um descanso espiritual. A declaração “em Davi” é equivalente a “no livro dos Salmos”, que era conhecido pelo nome de Davi. Mas na versão da LXX, o Salmo 95 é de fato atribuído a Davi.

Hb 4:8. Jesus. — A forma grega do hebraico יהושע, Josué. Compare com Atos 7:45, em que o grego lê Ἰησοῦ. O nome é interessante. A princípio Oséias, tornou-se Josué, ou o Ajudador; então o nome Divino foi prefixado, e tornou-se Je-Josué, contraído para Josué, Deus o Ajudador. A R.V. (Revised Version) dá o nome neste versículo como Josué.

Hb 4:9. Permanece. — Ou a promessa claramente se abre para nós. “Poucas coisas são mais impressionantes na epístola do que a constante apresentação do pensamento de que a linguagem das Escrituras é permanente e sempre presente. A promessa implícita, portanto, repetida sempre que o ‘hoje’ é ouvido, deve ter seu cumprimento” (Moulton). Povo de Deus. — O Israel espiritual de todas as épocas.

Hb 4:11. — O ponto desta exortação é que temos de lidar com Alguém que discernirá, e certamente punirá, a mais secreta desobediência, a mais íntima apostasia. Trabalhemos. — Sejamos zelosos; empreguemos toda a diligência; façamos todo o devido esforço. Ver 2Pe 1:10-11; Fp 3:14.

NOTAS CRÍTICAS E EXEGÉTICAS (Hebreus 4:14-16)

Os versículos 14-16 devem ser considerados como uma transição. O Sacerdócio de Cristo fora mencionado nos capítulos Hb 2:17, Hb 3:1. De fato, todos os pontos previamente abordados são relembrados em Hb 4:14-15. O Sumo Sacerdote: Sua exaltação (caps. Hb 1:3, Hb 4:13, Hb 2:9); Sua Filiação Divina (caps. 1, Hb 3:6); Sua compaixão (Hb 2:11-18).

Hb 4:14. Grande Sumo Sacerdote. — Na época do escritor, o termo “sumo sacerdote” era aplicado a mais de uma pessoa. “Grande” separa este “Sacerdote” de todos os outros. Nos céus. — Lit. “através dos céus” (διεληλυθότα), como o sumo sacerdote da antiga economia “através do véu”. No idioma hebraico, Deus habita acima do firmamento; Cristo é representado como passando através dele.

Hb 4:15. Compadecer-se. — Com a simpatia de uma experiência compartilhada. Fraquezas. — Não sofrimentos, não pecados, mas distintamente as fragilidades que tornavam a apostasia um perigo. Tentado. — Não há pecado em estar sujeito à tentação. Se Jesus não pudesse ser tentado, Ele não era um homem; se Ele cedesse à tentação, Ele não poderia ser um Salvador. Sem pecado. — Isto não é difícil de entender quando reconhecemos que o pecado é uma coisa da vontade — isto é, de nós mesmos, de nossas almas.

Hb 4:16. Ousadamente. — Lit. “com liberdade de expressão.” Em tempo de necessidade. — Stuart, “assistência oportuna.” Alford, “para ajuda a tempo, enquanto ainda nos está aberta.”

HOMILÉTICA PRINCIPAL DO PARÁGRAFO — Hb 4:1-11

O Descanso de Deus para o Seu Povo em Toda Época. — Nesta passagem, há um olhar para trás, para o descanso de Canaã, prometido aos pais, mas perdido por eles através da incredulidade. Há um olhar para frente, para o descanso ainda não realizado do celestial, a fim de obter um impulso para novo zelo no serviço cristão. Mas o descanso que mais especialmente se apresenta, e tem aplicação presente ao povo de Deus, é aquele descanso da alma que depende da fé constante — o verdadeiro descanso sabático, do qual o descanso de Canaã era apenas um tipo pobre e imperfeito. Esse descanso da alma é um bem inesgotado e inesgotável. A promessa dele permanece aberta e ainda não cumprida.

I. O que é o descanso de Deus? — Faz-se referência neste capítulo ao descanso sabático da criação, considerado como Deus cessando de Seus labores ativos. Isso pode servir para ilustrar o descanso de Deus; não pode ser o verdadeiro descanso que Ele promete ao Seu povo. Também se faz referência ao descanso que Israel encontrou, como nação, na terra de Canaã, após longa escravidão no Egito e longa peregrinação no deserto da Arábia. Isso também pode servir de ilustração; mas mesmo para o povo de Israel não era o verdadeiro descanso de Deus. Sua promessa a eles era muito maior do que quaisquer contentamentos corporais, quaisquer circunstâncias fáceis e prósperas. Nem o Sábado nem Canaã são mais do que símbolos do verdadeiro descanso de Deus. Pode-se dizer o seguinte sobre esse descanso. Visto que Deus o provê para Suas criaturas, ele deve ser (1) semelhante a Ele mesmo; (2) adaptado ao que há de mais profundo e melhor nelas. 1. Se o descanso de Deus é semelhante a Ele mesmo, deve estar relacionado ao caráter, não às condições, e não aos atributos. A guerra no céu, da qual Milton canta, não pode ser pensada como perturbadora do eterno descanso de Deus. Mas a paz infinita de Deus não deve ser descrita de modo a separá-lo dos interesses humanos e produzir a impressão de que os variados estados de Suas criaturas nunca O movem à piedade, simpatia ou pesar. Deus está sempre em descanso, porque as mudanças de circunstância nunca põem em perigo os princípios basilares de Seu caráter. Ao redor d’Ele estão sempre pendentes “nuvens e escuridão”; banhando o Seu próprio escabelo pode estar o mar sempre inquieto; mas “justiça e juízo” são a habitação do Seu trono. Somos “espíritos inquietos, desassossegados”, como Keble nos chama, não porque estamos em meio a condições e circunstâncias variáveis, ou porque estas afetam nosso sentimento; mas porque essas circunstâncias variáveis põem em perigo os princípios de nosso caráter. Não estamos centrados, estabelecidos, fixados para sempre, em nossa confiança e bondade, e assim somos levados por todo vento e agitados. Se um homem cristão entra em tribulação, ele começa imediatamente a questionar o fundamento de sua esperança. Podemos pensar em Deus como tendo descanso eterno, porque mesmo que “os elementos se derretessem com calor ardente, e a terra, e tudo o que nela há,” fossem queimados, Deus jamais poderia questionar a retidão de Seu ser, ou os princípios de Seu governo eterno. Devemos pensar assim d’Ele se Ele é o Eternamente Bom. Ou pode ser colocado desta forma: o descanso vem do domínio de uma faculdade em nós; sob seu governo, todos os vários poderes de nossa natureza entram em ordem, tomam seu lugar e mantêm a paz. A guerra pode ser uma coisa da alma, bem como das circunstâncias; e a guerra interior consiste no conflito de motivos. Mente, vontade, juízo e afetos, quando em desarmonia, fazem guerra na alma. Ora, não podemos conceber nada semelhante em Deus. Ele está em descanso porque, em Sua natureza Divina, há a ordem e a harmonia que se seguem ao governo da faculdade mais elevada — e isso em Deus só pode ser o amor. A lei funciona para nós também. Devemos dar o domínio à nossa faculdade mais elevada — e para a criatura, isso é a confiança. 2. O descanso de Deus provido para o homem deve ser adaptado ao homem, ao que há de mais profundo e melhor nele. O homem, como homem, está sempre buscando descanso. A Bíblia nos apresenta como lutando para reconquistar um Paraíso perdido. A poesia entoa um lamento melancólico sobre a “Idade de Ouro” que se foi, e nos convida a obter descanso em ternas memórias, e elevadas imaginações, e belos pensamentos, elevando-nos assim acima da dura, severa, idade de ferro do presente. O homem, como pecador, está sempre buscando descanso. Quem rolará o fardo? O homem, como redimido, ainda busca descanso. Descanso para as mentes, na grande agitação de teorias conflitantes. Descanso para as vontades em meio às reivindicações de deveres opostos. Diferimos tanto uns dos outros que o que pode ser descanso para um de nós não seria descanso para outro. No entanto, para todos há uma única lei — o descanso nunca vem pelo saber, sempre pelo confiar. O descanso de Deus começa dentro de nós, na fé que depositamos em Deus. Ele se espalha por todas as forças e expressões de nosso ser, e assegura o descanso de um caráter estabelecido e firme. Alcança nossas circunstâncias, influenciando-as, modificando-as, trazendo-as à sua obediência; e assim cresce de ser o descanso da alma para se tornar o descanso eterno do céu.

II. Quem pode esperar alcançar este descanso presente de Deus? — Como o descanso da fé, deve ser para aqueles que creem. Mas a fé não é a mera aceitação intelectual de uma sentença encarnada em um credo. É o espírito de confiança. É dependência, submissão. É a entrega do eu a Deus. É o firmar do coração em Deus. É a confiança pessoal no amor do Pai. É o agarrar do coração à justiça e bondade Divinas, como reveladas em Jesus Cristo. Mas o crer que traz descanso não é um ato único, ou mesmo um estado uma vez alcançado. A língua grega tinha uma vantagem sobre a nossa. Podia expressar, pela forma do verbo, a ideia de ter começado e de continuar ainda. Não é “nós cremos”, mas “começamos a crer e estamos mantendo a confiança”. E porque a confiança é mantida dia a dia, o descanso da alma é renovado dia a dia.

III. Até que ponto este “descanso de Deus” pode ser uma posse presente e consciente? — É um erro supor que todos os fatos e processos da vida religiosa devem chegar ao reconhecimento consciente. Todas as coisas mais finas no crescimento da alma iludem a observação. As melhores violetas geralmente estão escondidas sob as folhas. As graças mais delicadas não suportam um olhar ou um toque. Assim, o “descanso” pode ser a posse de uma alma, e a mente pode não estar colocando o fato diante de si para consideração. E o descanso nunca será alcançado buscando-o diretamente. Será alcançado simplesmente cumprindo nosso dever; mantendo aquela confiança que encontra sua melhor expressão na obediência; vivendo para Cristo; crescendo à Sua semelhança; aperfeiçoando nossa simpatia com os grandes e beneficentes propósitos de Deus; pela perseverança no bem-fazer; “retendo firme a confissão da nossa esperança, sem vacilar”. “Sede firmes e constantes, sempre abundantes na obra do Senhor”, e será evidente o suficiente que alcançastes o descanso da alma de Deus. Devemos esperar pela plenitude de nosso descanso; nenhum de nós precisa esperar pelos primórdios de nosso descanso. Se não podemos ter a fruição, podemos ter o antegozo. Podemos receber agora o “fim da nossa fé”, a saber, a “salvação de nossas almas”.

NOTAS SUGESTIVAS E ESBOÇOS DE SERMÕES

Hb 4:1. O Descanso da Filiação. — O descanso para qualquer homem só pode vir de encontrar o Pai no céu. Ninguém pode encontrar o Pai até que receba o Espírito do Filho em seu coração.

I. Descanso para o homem. — Há (1) descanso do fardo dos ritos cerimoniais; (2) descanso do fardo das tristezas da vida; (3) descanso do fardo da escravidão do pecado; (4) descanso do corpo; (5) descanso da mente; (6) descanso da consciência; (7) descanso da morte; (8) descanso do céu. Mas os homens querem descanso de seus problemas, e o único descanso digno é o descanso em nosso problema. Descanso de uma consciência sobrecarregada os homens querem; o descanso mais elevado de uma natureza mudada e renovada eles pouco valorizam. Há um descanso melhor possível de se alcançar: descanso na tribulação; descanso na submissão; descanso no efeito santificado da tribulação. O espírito de um filho, esse é o segredo do descanso.

II. Descanso para Cristo e em Cristo para o homem. — Cristo não teve descanso das tribulações terrenas, mas teve descanso de coração em meio às tribulações. Mas sem esse descanso interior da alma, a vida humana de Cristo não poderia ter sido vivida. O descanso veio da voluntariedade com que Ele suportou os fardos que Seu Pai Lhe impôs. Era o descanso da submissão, do carregar da cruz, do sacrifício, da mansidão e humildade de coração, da filiação obediente e acalentada. Para encontrar descanso, somos direcionados ao próprio Cristo. N’Ele podemos encontrar o descanso de (1) um amor que tudo satisfaz, (2) uma sabedoria que tudo supre, (3) um poder onipotente. Quando perguntamos como este descanso da alma em Cristo se torna nosso em meio aos deveres, ansiedades e tristezas da vida, então somos direcionados ao jugo de Cristo e ao carregar do jugo. Podemos obter descanso carregando o mesmo jugo, e carregando-o da mesma maneira. Cristo carregou Seu jugo no espírito de um filho. Deixe que Ele lhe ensine a glória de ser uma criança, um filho. Se apenas você fosse filial em espírito, satisfeito, em casa com Deus, amando a vontade de um Pai, você descobriria que o pecado se foi de seu poder; e enquanto o jugo da vida repousasse sobre você, você sentiria quão verdadeiras eram as palavras do Salvador: “Meu jugo é suave e o meu fardo é leve.”

Hb 4:2. As Causas da Audição Infrutífera. — A censura aqui passada pelo apóstolo sobre certos ouvintes que falharam em se beneficiar da pregação da palavra refere-se mais imediatamente aos israelitas sob Moisés no deserto. A infrutuosidade da pregação tem, em toda a cristandade, sido objeto de queixa para alguns e de lamentação para outros. Os ouvintes dizem que a palavra pregada é infrutífera, não por sua falta de fé ou piedade, mas por falta de zelo, habilidade, discrição, energia, originalidade do pregador. Pode ser, contudo, por perversidade, desatenção ou incredulidade nos ouvintes.

I. A audição infrutífera é o resultado da frequência irregular à casa de Deus. — A ausência frequente dos cultos do santuário nunca pode ser compatível com a edificação. Os cultos são frequentes, regulares; os convites para ouvir são audíveis e inteligíveis. Saúde, prazeres, negócios, estudo, são as desculpas. A graça de Deus não deve ser esperada pelo adorador irregular.

II. Outra falha nos ouvintes: aqueles que, por estarem ausentes em mente e espírito, tornam sua presença corporal de nenhum proveito. — É possível que a mente esteja tão inteiramente abstraída de qualquer assunto em discussão a ponto de mal perceber que um discurso está sendo pregado. Outros pretendem ouvir, mas sua atenção é facilmente desviada para outros objetos. Os ouvintes de mente leviana estão particularmente sujeitos a essa tendência; mas aqueles que professam mais solidez de caráter muitas vezes não são menos culpados de atenção imperfeita e vacilante.

III. Outra falha nos ouvintes: aqueles que comparecem com disposições inadequadas, seja em relação ao ministro ou aos seus co-ouvintes. — Aqueles que criticam o pregador de maneira arbitrária e ditatorial, e para com outros ouvintes, são propensos a ser censuradores em sua aplicação da verdade ou do dever inculcado. Eles criticam as doutrinas proferidas, ou o arranjo do assunto, ou o estilo da composição. Qualquer variedade que possa ser permitida em nossos discursos deve ser encontrada apenas em nossa aplicação da doutrina, e nunca na própria doutrina. Podemos ocasionalmente nos aventurar em novas ilustrações, mas nunca em novas descobertas.

IV. Aqueles que apontam as farpas de sua crítica não tanto ao pregador, mas aos seus co-ouvintes. — Todo discurso prático e edificante expõe o vício à vergonha e à reprovação, e recomenda e impõe a virtude; pelas ameaças de Deus, adverte o pecado, a incredulidade e a instabilidade espiritual, e por Suas promessas, encoraja a fé, a piedade e a santidade perseverante. O ouvinte censurador desses louvores e denúncias aplica os primeiros a si mesmo e os últimos ao seu próximo. A falta de caridade é um sinal indubitável de incredulidade. Oremos por fé, para que estejamos dispostos a receber instrução sem insistir arbitrariamente em métodos favoritos próprios como indispensáveis à justificação, e para que sejamos preservados da censura; e para que, desejando o aprimoramento para nós mesmos, bem como sendo caridosos para com os outros, possamos, antes de presumir remover o argueiro do olho de nosso irmão, considerar a trave que está no nosso próprio. — William Sinclair, D.D.

Misturado com Fé. — As tentativas que são continuamente feitas para avaliar a palavra de Deus por outros padrões que não o da fé deixam os homens em dúvida quanto à sua origem Divina. O conflito entre ciência e revelação, como isso acontece? Aplicando o mesmo teste a ambos. O astrônomo e o químico — observação por um, leis de combinação pelo outro.

I. Misturado com fé por causa da natureza Divina da palavra, sim, poder-se-ia dizer, a natureza mais Divina da palavra. — Uma peça de artesanato, quando examinada, fornecerá muita informação a respeito do artesão — sabedoria, poder, etc.; mas a pessoa está fora de vista até que você a encontre. Assim é com Deus; Suas obras revelam Seus atributos, mas não a Si mesmo — exemplo de Jó. “Ah, se eu soubesse onde o poderia achar!”, etc. (Jó 23:2-9). Mas um momento de reflexão sobre o método da revelação levará à crença de que Deus Se revelou no sonho, na visão, no sacrifício, na inspiração, etc. Devemos tomar esses caminhos, devemos cair nesses sulcos, sermos saturados com este espírito para que a palavra possa nos aproveitar. A fé, então, é aquela simpatia com as coisas espirituais que nos capacita a distinguir entre elas. É nossa experiência comum que estar no espírito da coisa é necessário seja para sua execução ou para seu desfrute. Quanto mais nas esferas mais elevadas da vida — gênio, arte, estética. João no Espírito em Patmos, etc.

II. Misturado também com fé, pois esta é a única entrada para nossa vida interior. — Existem três classes de observações. A comum, como quando a atenção de alguém é atraída para um objeto para observá-lo. A segunda é a procura por esse objeto, a fim de um conhecimento mais profundo dele. A terceira é a assimilação do objeto e de nós mesmos. Assim, existem três classes de ouvintes — o acidental, o honesto e o fervoroso. No caso deste último, o sonho, a visão, o sacrifício, a inspiração, tornam-se nossos. Ver com o olho de um profeta, sentir com o coração de um sacerdote, manusear com o toque de um apóstolo. Se tomarmos uma comparação — a união da videira e dos ramos — essa união é Divina, misteriosa, comunicativa, completa. A seiva viaja ao longo dos vários dutos para cada parte, até mesmo o galho e a folha. Olhe para isso, e você perceberá que a fé é a união da alma com Cristo, pela qual tudo o que Ele é para nós como Salvador flui para nossa experiência. Não pode haver entrada se a porta não for aberta. Não pode haver vida a menos que o alimento seja assimilado. Não pode haver salvação a menos que o coração esteja em simpatia com Cristo. Os israelitas foram sepultados no deserto. Os pecadores morrem na cruz.

III. Misturado com fé também, pois o estágio é preliminar — um não de posse real, mas de confiança e expectativa. — A fé está ocupada com fundamentos, começos, preliminares, planos e materiais. “Irmãos, não julgo que o haja alcançado.” A vida que Deus prescreveu — a coleta de materiais para a nova Jerusalém. Profetas, sacerdotes e reis viveram essa vida, a expectativa inspirando a ação para preparar. O mesmo plano Divino existe novamente na vida do crente: “Porque não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir.” O grande tempo está por vir. Olhemos para ele. Acima da dúvida ou do medo, livre do pecado, liberto das influências das circunstâncias, elevado à comunhão íntima com Deus e à comunhão de Seu Filho. Em vista desse período, a fé diz: “Estejamos prontos.” Mais oração, mais confiança, mais de Sua palavra no coração: “Segundo a vossa fé vos seja feito.” — Anôn.

As Promessas se Mostram Maiores que as Realizações Através das Fraquezas do Homem. — Às vezes parece que as promessas de Deus não são cumpridas; e somos até tentados a dizer que eram grandes demais para serem cumpridas. Mas devemos ter o cuidado de não admitir a ideia de que Deus alguma vez conduza Seu povo com promessas e esperanças que Ele nunca pretende cumprir. As promessas de Deus sempre representam o que Ele faria se pudesse; mas, vendo que Deus lida com seres morais, a quem Ele confiou a responsabilidade de vontades livres eficazes, mas limitadas, nenhuma promessa que Deus jamais faça pode ser absoluta; ela deve ser condicionada, e a condição afeta o homem. A promessa não pode ser cumprida a menos que o homem esteja em tal estado que a promessa possa fazer por ele o que Deus pretendia que fizesse. Somente o homem estraga o cumprimento completo de tudo o que Deus prometeu.

Hb 4:4. O Primeiro Descanso do Sétimo Dia. — Se Deus pretendia que guardássemos o Sábado como santo, por que Ele não deu ao homem, desde o início, um mandamento mais definido e enfático a respeito dele? Pode-se responder que Deus designou a guarda do Sábado para ser um ato moral de voluntariedade, lealdade e santa imitação; não deveria ser uma questão de mera obediência forçada. Se nossos primeiros pais tivessem mantido sua comunhão com Deus, teria sido seu esforço jubiloso ser como Ele em todas as coisas. O exemplo é uma força maior e mais universal que o mandamento. Mandamentos damos a meras crianças. Exemplos são a inspiração dos homens. A princípio, Deus lidou com Suas criaturas como seres morais que foram feitos à Sua própria imagem e eram capazes de desfrutar de Sua comunhão. Quando o homem se deteriorou, Deus graciosamente Se acomodou à sua condição baixa, ignorante e infantil, e lhe deu mandamentos. O exemplo de Deus significa que Sua presença constante conosco é apreendida, e é a alegria e o poder de nossas vidas. E todos para quem essa presença Divina é uma realidade sentirão que nada pode tornar o Sábado tão sagrado para eles quanto o exemplo d’Aquele que descansou de Sua obra no sétimo dia, o santificou e o consagrou. Deus pôs de lado Sua relação com as coisas materiais como seu Criador e ocupou-Se no mundo do espírito; e esse foi o Seu descanso. O nosso pôr de lado nossa relação com o trabalho da vida comum, e a ocupação do pensamento e do coração com as coisas do espírito, as coisas invisíveis e eternas, seria nossa imitação humana do exemplo Divino, e nosso descanso. Santo Agostinho diz: “Deus descansou — não como se estivesse cansado. Não, o ‘Criador dos fins da terra não se cansa nem se fatiga’; mas Ele viu que o que havia feito era bom, e contemplou Suas próprias obras, e regozijou-se nelas; e assim nos recomendou o estado de contemplação como superior ao do trabalho, e como um estado a ser alcançado pelo trabalho.”

Hb 4:7. O Presente. — Fazemos bem em olhar para trás, para que, vendo nossas bênçãos passadas, sejamos gratos por elas; vendo os erros passados, sejamos humilhados; observando suas consequências, sejamos advertidos. Devemos olhar para a frente para medir nossa própria força, refrescar nossos espíritos e ver a luz brilhando nas colinas distantes. Nossa verdadeira vida — a única vida com a qual podemos contar — é agora.

I. Cada dia tem seus próprios dons. — Todos os bons dons são exatamente o que fazemos deles. Oremos para que Deus nos ensine a usar corretamente os dons de cada dia.

II. Cada dia tem também suas oportunidades imediatas. — Leve pode ser, mas cheia de possibilidade de bênção. Muitos passam seus dias fazendo indelicadezas, em críticas levianas, depreciações ciumentas — mulheres cujas vidas inteiras se reduzem a algum riacho ácido de fofoca, calúnia e despeito. Com que frequência espíritos melhores perdem preciosas oportunidades de agradar a Deus realizando atos de bondade inomináveis. Uma palavra dita a seu tempo, quão boa ela é. “Tempo é dinheiro.” Isso é o mínimo que ele é — pois tempo é eternidade.

III. Também suas próprias reservas de felicidade pura e inocente. — Para aqueles que caminham pelo mundo com os olhos abertos, cada dia revela algo belo — na natureza, na vida da cidade, na vida doméstica. Em lamentações ociosas, em egoísmo descontente, perdemos tudo. Nossas melhores esperanças, nossos tesouros mais ricos, nosso destino na terra, sim, o próprio céu, não estão no futuro visionário, mas no aqui e agora.

IV. Cada dia tem seus deveres. — Riquezas podem voar, fama pode desaparecer, amigos podem morrer, mas o dever nunca cessa. Somos felizes? Trabalhemos. Infelizes? A ação é o melhor dos consolos. Amargamente desapontados? Se não podemos construir sobre os fundamentos, construamos sobre as ruínas. O futuro é incerto? Seja o que for, ele virá. Sempre há algo a ser feito. Cada dia tem seu dever. Após a Ressurreição, os apóstolos encontraram Cristo no trabalho fiel.

V. Cada dia tem também seu dever supremo — o dever de arrependimento, de se aproximar de Deus e ver Seu rosto. — Se este dever for negligenciado, nenhum outro dever pode substituí-lo. Há uma coisa necessária. “Não sabemos o que um dia ou uma hora trará.” “Põe a tua casa em ordem, porque morrerás, e não viverás.”

VI. Cada dia tem sua ajuda graciosa. — Há Alguém de infinita ajuda sempre à mão. Deus é nossa ajuda e nossa força. Ele nos ama e não nos abandonará. Aquele que deu Seu próprio Filho por nossos pecados, não nos dará também com Ele, gratuitamente, todas as coisas? Jesus, nosso Intercessor. O Espírito Santo, nosso Ajudador. A escada de ouro entre a terra e o céu é a oração. Peçamos a Jesus que nos tome pela mão, e então, o que quer que o futuro possa nos reservar, seremos capazes de enfrentá-lo com a dignidade inalienável e a vontade invencível do homem. — F. W. Farrar, D.D.

Hb 4:7. O Poder do Homem sobre seu Próprio Coração. — “Não endureçais o vosso coração.” O conselho é inútil a menos que esteja no poder do homem endurecer seu coração. Que ele pode fazê-lo recebe sua prova e ilustração mais impressionantes do relato bíblico de Faraó Meneftá. As calamidades que não subjugam o coração, o endurecem. O próprio endurecimento é judicial e justo, quando é uma consequência de hábitos previamente formados.

I. O homem tem poder sobre seu coração através de seu intelecto. — Ele pode rejeitar — recusar-se a receber ou acreditar — nas coisas que agiriam persuasivamente sobre seu coração.

II. O homem tem poder sobre seu coração através de sua vontade. — Ele pode se recusar a deixar o coração ceder a influências suavizantes e subjugantes.

III. O homem tem poder sobre seu coração através de seus interesses próprios. — Ele pode fazê-los esmagar as suscetibilidades mais ternas.

IV. O homem tem poder sobre seu coração através de seus hábitos. — Ele pode fazê-los efetuar uma escravidão vitalícia que as emoções mais intensas serão impotentes para quebrar. Assim, um homem pode endurecer seu próprio coração.

Hb 4:8. Uma Missão Externa e Temporária. — Josué é especialmente interessante quando visto de um ponto de vista. Sua missão não era, no sentido usualmente aceito, religiosa. Era nacional; dizia respeito a relações externas e coisas materiais. E isso era para Josué religião, sua missão religiosa. Estamos constantemente errando ao fazer distinções desnecessárias entre o secular e o sagrado, e ao colocar honra superior em missões de vida que classificamos como sagradas. Mas se um homem trabalha para Deus, seu trabalho deixa de ser secular; torna-se sagrado. A divisão se perde por completo. O trabalho material e externo de Josué, de guerra, assentamento, organização, divisão, era em todos os aspectos tão sagrado quanto o trabalho de Moisés na revelação e na religião. O que torna uma missão de vida sagrada é o espírito e o propósito acalentados do homem que a realiza. E o espírito que enobreceu e santificou a missão externa e temporária de Josué é plenamente revelado em sua declaração: “Porém eu e a minha casa serviremos ao Senhor.”

Hb 4:9. Descanso da Alma para Hoje. — A palavra “portanto” introduz a conclusão e a aplicação de um argumento. Esta conclusão lança luz sobre a revelação do Antigo Testamento e nos dá o direito de usar as antigas promessas para nosso fortalecimento e conforto. As promessas de Deus nunca são dadas como meros acidentes; elas vêm em ocasiões especiais, mas repousam sobre raciocínios e juízos Divinos; elas podem se encaixar precisamente em uma circunstância particular, mas a circunstância é ilustrativa de outras circunstâncias, e a promessa se encaixa na necessidade semelhante que sempre recorre. As experiências humanas são estranhamente repetidas através dos séculos; e as experiências morais e espirituais também são estranhamente semelhantes. As promessas de Deus se traduzem de novo para aplicação a cada nova geração, as palavras antigas sempre assumindo um significado novo e vivo. A promessa feita a Abraão — “Na tua semente serão benditas todas as famílias da terra” — era uma promessa especial para ele e para sua raça particular. Mas ela permanece verdadeira hoje; pois todas as famílias da terra são abençoadas no testemunho de cada homem que vive uma vida de fé como a que Abraão viveu. Os homens de fé são hoje os salvadores da sociedade. Nenhuma promessa material que Deus já fez pode ser esgotada em quaisquer circunstâncias providenciais. Cada uma delas tem sua contraparte espiritual, que carrega suas contínuas aplicações. Deus prometeu “descanso” ao Seu povo. A princípio, significava o descanso de uma terra estabelecida e cultivada, após longos anos de cansativa peregrinação no deserto. Mas não poderia se esgotar com isso. A promessa não está desgastada. Deus a cumpriu, em vários sentidos, repetidas vezes. Mas ela ainda mantém seu antigo frescor e sua antiga plenitude, e é rica em significados e aplicações para todos nós hoje. “Resta” um descanso. Ainda é a provisão Divina. Está sempre disponível, sempre diante de nós, a inspiração de todos os verdadeiros trabalhadores. Há, de fato, um sentido em que esse descanso pode ser e é alcançado mesmo agora. “Nós, os que temos crido, entramos no descanso.” Há um sentido em que esse descanso é sempre mantido bem diante de nós, fora de alcance, o ânimo e a inspiração de todo esforço. A promessa de Deus ao Seu povo em todas as épocas se resumirá em uma palavra — “descanso”. Mas devemos colocar um significado maior e melhor no termo do que meramente deitar-se em cansaço e ociosidade. Esse é apenas o descanso de que corpos frágeis e débeis podem precisar. Para as almas, a realização é descanso, a conclusão do trabalho é descanso, a contemplação dos resultados de um esforço ansioso e árduo é descanso. O estudante ganha descanso quando se eleva acima da tensão ansiosa de lidar com os primeiros princípios e dificuldades. É descanso poder fazer seu trabalho com facilidade. O homem de meia-idade ganha descanso à medida que encontra o negócio estabelecido, a renda regular e estável, e uma boa soma guardada para o “dia chuvoso”. O ancião encontra descanso na Terra de Beulá, onde pode sentar-se por um tempo e pensar com gratidão em uma vida útil, fervorosa e devotada, em todas as cujas cenas a graça de Deus foi abundantemente magnificada. Descanso — o verdadeiro descanso — não é sono; isso é apenas uma imagem dele, e uma imagem de apenas uma de suas características. Não é a morte; só chamamos a isso de descanso quando nosso sofredor sofreu tão intensamente, e a tensão sobre o moribundo e sobre os que vigiam foi tão grande, que a morte é bem-vinda como uma libertação de uma agonia e aflição quase insuportáveis. Não é o céu, a menos que sejamos capazes de pensar no céu como um estado em vez de um lugar, e possamos entrar nas coisas espirituais materialmente figuradas para nós em portões de pérola, e ruas de ouro, e muitas mansões. O descanso é uma condição da alma, que cria seu próprio ambiente. O céu está ao nosso redor quando a celestialidade está dentro de nós. A “mentalidade celestial” é o “descanso que resta para o povo de Deus”, e podemos tê-lo e mantê-lo agora. Para nos aprofundarmos nisso em mais detalhes, podemos ver que o cumprimento da promessa de descanso de Deus é —

I. Adaptado às condições. — Olhe para a vida e veja quão variadas são as ideias de descanso que são mantidas sob a pressão das várias circunstâncias da vida. Tome uma única vida e observe como são mutáveis as ideias de descanso que os homens têm em momentos diferentes, e quando dominados por preocupações variadas. O viajante anseia pelo descanso do lar; o estudante anseia pelo descanso da realização. O homem de mente crítica anseia pelo descanso da fé simples. Os tentados anseiam pelo descanso da segurança. O trabalhador sobrecarregado anseia pelo descanso da limitação. Os fracos anseiam pelo descanso da saúde. O sofredor anseia pelo descanso do sono. O ancião, deixado sozinho em meio aos túmulos de seus amados, muitas vezes suspira por descanso, e encontra sua alma explodindo e dizendo: “Oh, quem me dera asas como de pomba! Então voaria e estaria em descanso.” É curioso notar como as concepções do céu correspondem à condição. Isso é levado longe demais por aqueles que fazem do céu a contraparte espiritual do terreno, e então dizem que tudo o que um homem mais deseja aqui, e não pode alcançar aqui, ele terá plenamente suprido lá. A promessa de descanso do Antigo Testamento foi parcialmente cumprida na provisão do descanso do Sábado — aquele afastamento semanal das labutas e preocupações da vida ordinária que tem sido a beatitude de todas as gerações, o antegozo e sugestão semanal do céu. Para o povo judeu, foi cumprida quando Josué dividiu entre eles os campos e as cidades dos cananeus conquistados, e os cansados peregrinos do deserto se estabeleceram em lares próprios. Foi cumprida para a nação judaica quando saíram da luta e da tensão de um tempo formativo para o descanso e a paz do governo davídico. De certa forma, foi cumprida para o próprio Davi quando, com grande regozijo de coração, ele conseguiu trazer a Arca sagrada para Sião. Em um pequeno sentido, foi cumprida quando aquele pequeno grupo de exilados que retornavam entrou na cidade de seus pais, embora a cidade fosse apenas uma ruína, o Templo destruído, os muros derrubados e os portões queimados. Eles tentaram pensar que era lar e descanso — era um lar pobre e nenhum descanso. “Resta um descanso.” É para o povo de Deus hoje. Mas depende de sua condição; varia para eles de acordo com sua condição variável. Somos carnalmente inclinados? Nosso céu corresponderá à nossa condição. Somos espiritualmente inclinados? Nosso céu corresponderá à nossa condição. Somos jovens e olhamos para a vida com grandes olhos de esperança? Então nosso céu, nosso pensamento de descanso, corresponderá à nossa condição. Somos velhos, a vida está quase toda para trás, e nossos amados estão apenas ali, na outra margem? Então nosso céu corresponderá à nossa condição. Somos pobres, lutando quase em vão para manter um lugar e ganhar o pão de cada dia? Então o descanso e o céu serão moldados para nós por nossas lutas diárias. Somos ricos, de modo que as necessidades da hora são plenamente atendidas? Então nosso céu tomará forma a partir de nossa condição, e parecerá ser uma continuidade e permanência dos privilégios presentes. Mas não é cheio de conforto ter a certeza de que a promessa de Deus pode vir em tal adaptação direta a cada um de nós, e ser a satisfação do que há de mais profundo e melhor em cada indivíduo? O descanso de Deus é para nós como somos para ele. Melhore nossa condição moral e espiritual, e o descanso se torna mais nobre, se enche de um significado mais rico e ganha mais força inspiradora. Ele perde seu invólucro material e aparece como o que é — o descanso da alma em Deus, que inclui tudo. Faber expressa o descanso eterno da alma em Deus em linguagem poética e mística, quando diz: — “Prostrado diante de Teu trono jazer, / E sempre contemplar a Ti.”

II. O cumprimento da promessa de descanso de Deus depende de nossas preparações. — Por que o cumprimento é muitas vezes tão decepcionante? Porque o descanso foi meramente desejado; não foi preparado. Muitos homens deixam os negócios — se aposentam, como se diz — e esperam desfrutar de alguns anos de delicioso descanso, e ficam terrivelmente desapontados. Ele não consegue descansar: fica entediado até a morte com o tédio de não ter nada para fazer; ele se irrita diariamente desejando poder colocar o arreio novamente. O fato é que, embora ele quisesse o descanso, nunca pensou em se preparar para ele. E um homem não pode desfrutar mais do tempo de aposentadoria sem preparação para ele, do que um homem pode ganhar o poder de se aposentar, através da eficiência nos negócios, sem um aprendizado de preparação. Deus não deixou Israel entrar em sua terra de descanso até depois de longa disciplina no Egito e longas provações no deserto. Pense no descanso celestial que resta para o povo de Deus, e podemos ser lembrados de que toda a vida, na condução Divina, é preparação para ele. O que tememos a nosso respeito e a respeito dos outros é que a vida diária que estamos vivendo não é uma preparação adequada ou suficiente. Nem por um momento sugeriríamos que a preparação para o céu é algo diferente ou distinto da preparação para a vida, a vida diária. O céu é a justiça estabelecida; mas então é precisamente essa justiça que se estabelece aqui — essa justiça que nós, que levamos o nome de Cristo, deveríamos estar trabalhando para cultivar todos os dias. Prepare-se para viver — ao fazer isso, você se prepara para morrer, e ao fazer isso, você se prepara para o céu. O céu é a vida frutificada. Pense no descanso buscado pelo povo de Deus como descanso do coração da preocupação — o descanso que vem agora, e que um homem mantém no meio de seus problemas e aflições. “Todos nós já ouvimos a experiência de sofredores de longa data de dor física. Eles nos contaram como se irritavam e se afligiam para serem livres, quando o jugo da impotência e da angústia vitalícia foi colocado sobre eles pela primeira vez; eles gastaram seus corações contra o jugo. Mas aprenderam de Cristo a submeter-se, não a se irritar e se afligir, a suportar — como Keble expressa tão primorosamente, ‘Desejando, não mais lutando para ser livre.’ E em seus rostos calmos e olhos profundos e pensativos você pode ler o descanso de seus corações — ‘o descanso que resta para o povo de Deus.’“ Mas a realização desse descanso do coração depende de cultura e preparação — preparação muitas vezes na disciplina providencial de Deus, respondida pela cultura do coração daquele que anseia por entrar neste descanso presente. Deus não pode dar a alguns de nós o descanso presente, porque não nos preparamos para ele. Deus tem que manter alguns de nós por muito tempo nas sombras do terreno, porque não avançamos com nossas preparações para o celestial.

III. O cumprimento de qualquer uma das promessas de descanso de Deus abre o caminho para novos anseios por descanso. — Pois nenhum descanso que Deus dá deve ser confundido com satisfação, com o fim da iniciativa e da esperança. Se assim for, podemos muito bem deixar de ser criaturas, seres morais que deveriam ter uma possibilidade ilimitada neles. A realização abre a perspectiva de realização. O alpinista alcança um pico apenas para ver os picos se erguendo muito acima dele. É assim com o “aprender”, e é assim com a “arte”. Robert Buchanan clama assim a seu amigo poeta no céu, David Gray, — “Deve durar para sempre, / O esforço apaixonado, / Sim, tendes vós, aí no céu, corações para pulsar e ainda aspirar? / Na vida que conheceis agora, / Tornada branca como a neve agora, / Surge uma nova cordilheira, e acena mais alto — mais alto? / Estais sonhando, sonhando, / Vossa alma ainda está vagueando, / Ainda olhando para cima como olhávamos, outrora, no crepúsculo de outono?” Todos os lugares de descanso terrenos são apenas caramanchões na “Colina da Dificuldade”, que sobe íngreme, para cima e para cima, até os portões eternos. Nos caramanchões Deus nos deixa passar por um tempo; mas não há como fazer tenda ou tabernáculo, e permanecer ali. Avante, para cima; sempre avante, sempre para cima, até que a nuvem branca nos envolva, e nós também estejamos com Deus. A alma que busca pode entrar no descanso da entrega total. E tal alma nunca esquece a paz Divina que vem quando a última amarra do eu é solta, o olho é fixado no crucificado e ressurreto, e o amor se derrama totalmente em uma sublime auto-entrega e sacrifício. A alma sincera e fervorosa anseia por alcançar o caramanchão da confiança plena e inteira. Ela gostaria que o primeiro ato apaixonado do primeiro amor passasse para o hábito repousante da confiança, que mantém a alma em paz. O grande impulso às vezes nos sobrevém, e ansiamos pelo descanso da santidade — o descanso de um domínio permanente e fácil da inclinação pecaminosa. E então a alma se põe a ansiar pelo descanso do céu; que é apenas isto — a santidade inserida em um ambiente santo. O descanso do céu é o descanso que um cristão fervoroso e de mente espiritual deseja; é o descanso da bondade desimpedida, a “coroa da justiça”. Nossa vida segue por etapas. A realização é descanso e uma etapa. O material está sempre conduzindo ao espiritual, e o espiritual está sempre se abrindo para o celestial. Nosso limite atual de concepção é o descanso celestial; mas isso só pode ser algum novo tipo de trabalho; e adiante, à frente dele, deve estar a inspiração de algum descanso ainda mais elevado para os trabalhadores de então, assim como este céu é o descanso para os trabalhadores de agora. Isto podemos dizer para assegurar nossos corações — Aquele que tão ansiosamente provê descanso para os cansados certamente provê graça para o trabalhador; e a vida agora é o descanso de Seu serviço. E isto podemos dizer — o segredo de todo descanso é o descanso do coração. E isso todos nós podemos ter agora. É o descanso da fé. Nós — sim, nós — os filhos do trabalho, do cuidado e do medo, que muitas vezes estamos tão cansados das preocupações, fraquezas e incompreensões da terra que podemos lamentar com Marianna da Granja Fosso, e dizer, — “Estou exausta, estou exausta; / Quisera Deus que eu estivesse morta!” — nós — mesmo nós — podemos entrar agora, e possuir agora, o “descanso que resta para o povo de Deus.”

Duas Palavras para Descanso. — Em Hb 4:8 “descanso” significa descanso do cansaço. O “descanso” em Hb 4:9 é outra palavra — mais nobre e mais exaltada. Significa o descanso de uma alma aperfeiçoada. É a paz interior do Sábado. Não é o descanso da insensibilidade, o descanso do adormecido, inconsciente da presença de agências boas ou más ao seu redor. O descanso de Deus não é o descanso da inatividade. As coisas de Deus chegam à perfeição. Perfeição significa dar frutos, e dar frutos significa trabalho. Não há ociosidade nem mesmo no céu. O descanso de Deus é perfeito, nada pode perturbá-lo. Anos atrás, nossa frota foi destruída por um vendaval violento. Descobriu-se, no entanto, que alguns navios não foram afetados por sua violência. Eles estavam no que os marinheiros chamam de “o olho da tempestade”. Enquanto tudo ao redor era desolação, eles estavam seguros. Assim, os filhos de Jeová descobrem que, em meio às turbulentas ondas da tempestade da vida, “resta um descanso para o povo de Deus”. Por que não podemos ter descanso perfeito na terra? Falta-nos conhecimento. Não há nada mais terrível do que o suspense. Você está esperando por informações — você não consegue descansar. Não apenas o conhecimento é imperfeito aqui, tudo é imperfeito. Portanto, não podemos descansar. O egoísmo produz inquietação. O medo é uma grande causa disso. “O perfeito amor lança fora o medo.” Quando você sabe, como São João sabia, que encontrou o seio de Deus, e que Ele tem todo o poder no céu e na terra, você está em descanso. — Homilias de Hawthorn.

O Descanso de Deus. — E eu sorri ao pensar que a grandeza de Deus fluía em torno de nossa incompletude, Em torno de nossa inquietação, Seu descanso. E. B. Browning.

Hb 4:9-10. Entrada no Descanso de Deus. — A verdade ensinada aqui é que a Fé, e não a Morte, é a porta para a participação no descanso de Cristo — que o descanso permaneceu após Moisés e o Judaísmo, mas entrou em posse sob e por Cristo. O antigo sistema tinha em si, em seu próprio âmago, uma promessa de descanso; mas tinha apenas uma promessa. Não podia dar a coisa que apresentava. Não podia, pela natureza do sistema. O salmista representa a entrada nesse descanso como um privilégio ainda não realizado, mas esperando para ser agarrado pelos homens de sua época cujos corações estavam amolecidos para ouvir a voz de Deus. Aquele descanso era apenas uma bela visão, e este escritor diz que ele permanece não possuído ainda, mas para ser possuído. A palavra de Deus foi empenhada. A misericórdia Divina não será frustrada em seus propósitos pela incredulidade dos judeus: o descanso permanece para todos os que creem participarem. A posição de que o descanso prometido ao judeu permanece para ser herdado pelo cristão é estabelecida em um segundo fundamento. Cristo, nosso Senhor, entrou em Seu descanso — paralelo à tranquilidade Divina após a criação. E vendo que Ele o possui, certamente nós o possuiremos se apenas nos apegarmos a Ele.

I. Este descanso Divino, de Deus e de Cristo. — O escritor está traçando um paralelo entre o cessar de Deus de Sua obra criativa e a entrada naquele descanso do Sábado, quando Ele “viu tudo o que havia feito, e eis que era muito bom”, e o cessar de Cristo da obra de redenção e a passagem para os céus para o Sábado de Seu repouso eterno. O “descanso de Deus” é difícil de entender. Ele pertence necessariamente à natureza Divina. É a profunda tranquilidade de uma natureza autossuficiente em sua infinita beleza, calma em sua força eterna, plácida em sua alegria mais profunda, imóvel em sua energia mais poderosa; amando sem paixão, querendo sem decisão ou mudança, agindo sem esforço; quieto, e movendo tudo; fazendo todas as coisas novas, e Ele mesmo eterno; criando, e não conhecendo diminuição pelo ato; aniquilando, e não conhecendo perda, ainda que o universo fosse estéril e despovoado. Deus é, Deus está em toda parte, Deus é em toda parte o mesmo, Deus é em toda parte o mesmo amor infinito, e a mesma autossuficiência infinita; portanto, Seu próprio ser é descanso. O descanso de Cristo é como o descanso de Deus, mesmo no que diz respeito a esta natureza Divina e infinita. Além deste repouso que pertence à natureza Divina, há o descanso que é o cessar tranquilo de Deus de Sua obra, porque Deus aperfeiçoou Sua obra. Deus não descansa como cansado, mas como tendo feito o que pretendia fazer. O descanso de Deus é a expressão da perfeita complacência Divina na perfeita obra Divina. E assim se diz que Cristo descansa quando Sua obra de redenção foi concluída. Além disso, a tranquilidade Divina é um descanso que está cheio de trabalho. “Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também.” E a obra de redenção de Cristo, terminada na cruz, está perpetuamente em andamento. O glorioso repouso de Cristo está cheio de energia para Seu povo. Ele intercede acima. Ele trabalha neles; Ele trabalha através deles; Ele trabalha por eles. O descanso de Deus, a tranquilidade Divina, está cheio de trabalho.

II. O descanso de Deus e de Cristo é o padrão do que nossa vida terrena pode se tornar. — Podemos chegar a ser como Ele — como Ele na substância de nossas almas; como Ele — cópia de Suas perfeições; como Ele — sombra e semelhança de alguns de Seus atributos. E aqui reside o fundamento para a crença de que podemos “entrar em Seu descanso”. A fé, que é o meio de entrar no descanso, tornará a vida uma semelhança não indigna d’Aquele que, triunfante acima, trabalha por nós, e, trabalhando por nós, descansa de todo o Seu labor. Confie em Cristo! e uma grande bênção de repouso tranquilo desce sobre a mente calma e o coração estabelecido.

III. Este descanso Divino é uma profecia do que nossa vida celestial certamente será. — O céu é a vida terrena de um crente glorificada e aperfeiçoada. Se aqui, pela fé, entramos no início do descanso, lá, através da morte com fé, entraremos na perfeição dele. — A. Maclaren, D.D.

Hb 4:11. O Descanso Celestial. — Estas palavras ilustram a verdade de que toda a história da Igreja Judaica foi uma longa profecia e tipo da Igreja Cristã em todas as épocas. O descanso de Canaã tipificava o “descanso do céu” mais elevado e nobre, e somos advertidos no texto que a incredulidade certamente excluirá daquele descanso.

I. A revelação do evangelho atende a todas as necessidades mais profundas do homem. — Ela lhe oferece, cansado do conflito da vida, a esperança de uma vida eterna. Na plenitude do vigor juvenil, a promessa de descanso pode ser ignorada como algo pouco valorizado; mas, com o passar dos anos, acolhemos o pensamento de descanso perfeito, como o viajante cansado acolhe o vislumbre do lar.

II. A revelação do evangelho promete um “descanso” compatível com a mais nobre e elevada atividade de todos os poderes que o homem possui. — Após um tempo de descanso perfeito, nossas naturezas começariam a ansiar por uma “renovação da juventude”, por novos esforços e realizações. A esperança nos é oferecida de trocar um corpo frágil por um “ressuscitado em glória” e “em poder”, com capacidades de esforço e resistência inimagináveis aqui; e a alma, para sempre livre de suas limitações de conhecimento e de seu pecado, se elevará a alturas desconhecidas de elevação intelectual e espiritual. Ser possuidores da “vida eterna”, quando todos os poderes de nossa natureza estão sendo exercidos em sua plena capacidade de energia em realização e serviço, e ainda ter toda a paz e repouso que “descanso” significa, este é um céu que satisfaz plenamente o homem, e este é o futuro que o evangelho revela. O céu é muitas vezes carnalizado em um lugar de facilidade sensual e gozo egoísta; mas o evangelho não é responsável por nossas perversões de sua revelação.

III. A fé é a condição necessária desta vida espiritual. — A vida em Deus deste lado da sepultura é a condição da vida em Deus do outro lado. Essa vida está “escondida com Cristo em Deus”, e só podemos vivê-la à medida que vivemos “por fé, não por vista”. A advertência da exclusão de Israel da terra da promessa por incredulidade vem a nós: “Procuremos, pois, entrar naquele descanso, para que ninguém caia segundo o mesmo exemplo de desobediência.” — G. S. Barrett, B.A., D.D.

ILUSTRAÇÕES PARA O CAPÍTULO 4

Hb 4:1. Naufrágio Espiritual. — Há alguns anos, um nobre navio deixou as costas da Inglaterra para uma colônia distante. Ele tinha uma valiosa carga de emigrantes, forçados de sua pátria pelos decretos de um destino amargo — noivas cujos seios brilhavam com o glorioso entusiasmo do amor juvenil — crianças também retornando ao seio de pais amorosos, que longos anos haviam separado. O navio navegou majestosamente, e parece-me ouvir agora a música e a dança nos conveses durante as calmas noites de luar. Finalmente, “Terra à vista!” é gritado por uma centena de lábios. Seu país adotivo surge à distância. Eles se apressam para se preparar para o desembarque. Apenas mais uma noite precisa ser passada no mar, mas é a última deles neste mundo. A escuridão espessa os envolve como uma mortalha fúnebre, os ventos se levantam como para cantar seu réquiem de morte, e em um momento fatal aquele nobre navio se parte nas rochas! E agora gritos selvagens de desespero lutam com o uivo da tempestade, e logo tudo acaba, enquanto toda a companhia daquele navio, exceto um, afunda em uma sepultura aquática. O navio se torna um naufrágio à vista do porto! Um homem pode ir muito longe em direção à religião e ainda assim se perder. — Henry Gill.

Hb 4:3. O Descanso de Confiar no Cristo Vivo. — Um cristão idoso, quando questionado sobre sua esperança, costumava imediatamente aludir à data de sua conversão, e só mostrava ansiedade em ter certeza de que seu primeiro ato de fé fora um ato salvador. Ele foi visitar uma jovem cristã que jazia morrendo de tuberculose. Suas faculdades estavam todas claras, e seu coração estava cheio do “descanso de Deus”, o descanso da simples confiança. Aquele cristão idoso temia por ela, porque ela não mostrava ansiedade sobre seu primeiro ato de fé. Em resposta a ele, ela disse: “Por que eu deveria me preocupar com tais coisas? Não diz: ‘O sangue de Jesus Cristo nos purifica de todo pecado’? Não é apenas ‘purificou’; é isto, ‘está me purificando’ todos os dias. Estou nas mãos do Senhor Jesus, e certamente posso deixar isso inteiramente com Ele.”

Verdadeiro Descanso. — Descanso não é deixar a carreira agitada; Descanso é o ajuste do eu à esfera; É o movimento do riacho, claro sem conflito. Fluindo para o oceano, após sua vida. Devoção mais profunda em nenhum lugar se ajoelhou, Emoção mais plena o coração nunca sentiu; É amar e servir ao mais alto e ao melhor, É seguir em frente, sem desviar, e isso é o verdadeiro descanso. T. Sullivan Dwight.

Descanso após o Labor. — Dormir após o labor, porto após mares tempestuosos, Alívio após a guerra, morte após a vida, agrada grandemente. — Spenser, “A Rainha das Fadas”.

Hb 4:7. Procrastinação. — Poucos exemplos podem ser encontrados na história que ilustram mais surpreendentemente o perigo da procrastinação do que o da “tragédia de Glencoe”; e embora hoje quase dois séculos tenham se passado desde que o terrível relato primeiro aterrorizou as mentes daqueles que o ouviram, ainda hoje ele nos fala com uma voz de advertência. A primeira parte do reinado do Rei William III foi muito perturbada pelo descontentamento e rebelião entre as tribos turbulentas no norte da Escócia. Orgulhosos e ferozes eram por natureza, e seus hábitos de vida, que não eram diferentes dos de algumas das tribos beduínas da Arábia (pois seu principal sustento era pelo saque e pelo roubo), os tornavam peculiarmente intratáveis quando o Rei William tentou colocá-los sob as leis saudáveis às quais seus vizinhos mais pacíficos no sul já estavam sujeitos. Vários meios foram tentados para conciliá-los, e grandes somas de dinheiro oferecidas como compensação por qualquer perda que pudessem sofrer com a nova regra, mas sem efeito, e foi necessário apelar para o braço forte da lei. William, portanto, emitiu uma proclamação, que ele circulou devidamente entre os chefes rebeldes, para que todos se dirigissem a um local determinado em ou antes de 31 de dezembro, e lá assinassem uma declaração e prestassem juramento de lealdade ao rei. Todos os que negligenciassem cumprir este comando no tempo determinado seriam tratados como foras da lei e estariam sujeitos à morte como traidores da Coroa. Era, é claro, inútil para qualquer um desses chefes rebeldes, com seu punhado de seguidores, ou, de fato, para todos eles combinados, terem tentado resistência ao exército bem treinado e poderoso de William. De modo que se poderia razoavelmente supor que todos os chefes teriam se apressado imediatamente a cumprir o comando; mas foi um golpe severo em seu orgulho, e por muito tempo muitos deles se recusaram a assinar. Finalmente, à medida que o tempo se aproximava, um por um eles cederam, e até 31 de dezembro todos haviam aposto seus nomes no papel e prestado os juramentos, exceto um chefe. Mac Ian era o líder da menor, mas mais altiva das tribos, e não era fonte de pouca gratificação para ele ver um e outro de seus vizinhos mais poderosos se submeterem ao rei, enquanto ele sozinho se mantinha à parte. Não que ele pretendesse, por um momento, resistir finalmente; ele sabia que com a pequena força a seu comando (não mais de duzentas almas no total) isso era impossível, mas ele esperava ser o último dos chefes escoceses a se submeter, e assim ser considerado o mais corajoso de todos. Um ou dois dias antes do dia 31, ele partiu para Dunbar, mas uma forte nevasca havia tornado as estradas quase intransitáveis, e assim impediu seu progresso que, embora fizesse os esforços mais desesperados, não chegou até quase uma semana após o prazo, quando descobriu que o mensageiro do rei havia partido para Londres, e sem sua assinatura. Aconteceu que os três homens em cujas mãos estava a execução da ameaça de vingança do rei sobre aqueles que negligenciassem cumprir seu comando eram inimigos mortais de Mac Ian, e apenas se regozijaram ao ver que seu tolo atraso o havia colocado em uma posição em que ele era passível de ser tratado como um traidor, e na chegada do mensageiro em Londres se apressaram em executar o julgamento sobre o ofensor. Uma tropa de soldados foi imediatamente levantada e comissionada para se apressar para Glencoe, o pequeno vale onde Mac Ian e seus seguidores moravam, para cercar todas as saídas pelas quais eles pudessem escapar, e passar todos à espada. Em uma determinada noite, o ataque foi feito, e Mac Ian e muitos de seus seguidores caíram vítimas da soldadesca, que não poupou nem velho nem donzela, mas massacrou todos que encontrou no caminho. Muitos, de fato, escaparam se escondendo nas rochas, embora destes não poucos pereceram de frio, e exposição à geada, e de fome. Houve, sem dúvida, muita crueldade em executar tão rigorosamente o comando do rei, especialmente porque o chefe estava disposto a se submeter; mas a lição mais vigorosamente ensinada é: “Não deixe para amanhã o que deve ser feito hoje.” Quantos tolos por esta terra agora arriscam sua alma como Mac Ian arriscou sua vida, adiando fazer as pazes com o grande Rei dos reis! que agora oferece misericórdia a todos que se arrependerão e se submeterão ao Seu gracioso governo, mas que um dia fechará o livro, e então todos cujos nomes não estiverem inscritos em suas páginas abençoadas estarão para sempre expostos à Sua justa ira e indignação.

NOTAS CRÍTICAS E EXEGÉTICAS

Hb 4:12. Palavra de Deus. — Ou (1) a Palavra pessoal, o Λόγος; ou (2) a palavra revelada, à qual o escritor tem apelado; ou (3) a palavra falada de Deus, que pode vir aos homens através de agentes humanos agora. Provavelmente a segunda é a explicação mais preferível, porque para este escritor a Escritura é constantemente pensada como uma enunciação Divina direta. Não é simplesmente a palavra escrita, mas essa palavra como a voz para cada era do Deus vivo. Viva. — Ativa, operante. Alma. — ψυχή (psyché), a alma animal, espírito; πνεῦμα (pneuma), aquela parte de nossa natureza na qual o Espírito Divino opera. Não uma separação dessas coisas umas das outras, mas uma divisão de modo a expô-las ambas à vista. “O despertar e o alarme da consciência, a sentida abertura, a dissecação dos princípios últimos da vida moral e espiritual, é o efeito da palavra aqui pretendido” (Webster e Wilkinson). Para a figura da espada, ver Is 49:2; Ef 6:17; Ap 1:16; e Sab 18:15-16. Juntas e medulas. — Uma figura muito forte. Dividindo as juntas ou membros do corpo, e perfurando através do próprio osso até a medula. “A cominação divina é da mais mortal eficácia punitiva.”

Hb 4:13. Nuas. — Ou expostas; como a garganta de uma vítima é desnudada para o sacrifício; Grego, “agarrar pelo pescoço”, como fazem os lutadores. Talvez o melhor significado seja “totalmente exposto à vista”. Nenhuma auto-ilusão pode esconder a verdade de Deus. Farrar sugere que a figura pode ser tirada do exame anatômico das vítimas pelos sacerdotes, que era chamado de momoskopia, já que era necessário que toda vítima fosse “sem defeito”. Mas ele prefere o uso de Fílon, que decide que o significado é “prostrado” para exame. R.V. “nuas e patentes”.

HOMILÉTICA PRINCIPAL DO PARÁGRAFO. — Hb 4:12-13

O Poder Perscrutador da Palavra Viva. — Esta passagem afirma o poder perscrutador e provador da Palavra de Deus. Observe a conexão em que ela se encontra. Cuidado para não cair da profissão cristã. Cuidado com a incredulidade e a presunção. Seus perigos são muitos e grandes. As observações e provações Divinas são muito exatas e perscrutadoras. “Tu conheces o meu assentar e o meu levantar; de longe entendes o meu pensamento.” “Viva”, com a ideia de duradoura ou de atividade. A Palavra está em operação real; não é uma coisa de meras possibilidades. “Mais cortante do que qualquer espada de dois gumes”; a ideia bíblica de agudeza — discriminação perfeita. “Alma e espírito”; vida material e espiritual. “Juntas e medulas”, ou osso e medula; metáfora da estrutura corporal. “Pensamentos e intenções”; meras ideias, e ideias quando formadas em resoluções; metáfora da vida intelectual. Note a impressão de perscrutação presente, perfeita e sutil que é produzida pelos termos do texto. Nenhuma linguagem poderia ter sido mais eficaz.

I. O que é esta Palavra de Deus. — Despoje a mente da ideia de que as Escrituras são principal ou unicamente referidas. Esse é o uso comum do texto como citado em orações cristãs de improviso. Em uma época, o termo Palavra era uma expressão muito mais importante do que é agora. Para os primeiros cristãos, e na filosofia da Igreja primitiva, o termo Palavra, ou Logos, tinha seu próprio significado especial. Sabemos o quanto São João faz uso dele no prólogo de seu evangelho; e ele escreveu em uma época em que uma filosofia meio judaica e meio pagã estava ganhando influência na Igreja. Como é usado na Escritura, o termo inclui: 1. As condições sob as quais nossos primeiros pais tinham seus direitos ao Paraíso. A Palavra de Deus dada a Adão. O modo de comunicação não podemos saber agora. De alguma forma, o pensamento e a vontade de Deus foram inteligentemente transmitidos às suas mentes. 2. As manifestações de Deus e Sua vontade aos homens na era patriarcal. Os modos de comunicação sendo visões, sonhos, aparições angélicas, vozes vivas — todos sendo Palavras de Deus. Ilustre com a ideia judaica do Memra, como a Segunda Pessoa da Trindade. 3. A revelação especial da mente Divina concernente a um povo particular. Os modos de comunicação sendo por um mediador, Moisés, e por um culto cerimonial. 4. A vida humana na terra do Filho de Deus, a quem chamamos de Palavra Encarnada. Esta é, no mais alto sentido, a Palavra de Deus. 5. A energia ativa do Espírito Divino operando nos corações dos homens. Na medida em que é reveladora e instrutiva, torna-se a Palavra de Deus. 6. A Palavra Escrita, como contida nas Escrituras do Antigo e Novo Testamentos. Através da impressão e da educação, esta se tornou a forma mais eficaz da Palavra. A partir deste esboço das formas da Palavra, pode-se mostrar que ela é essencialmente isto: a manifestação de Deus aos homens; a comunicação do pensamento e da vontade de Deus aos homens; a tradução da mente de Deus em alguma forma de linguagem que os homens possam entender. Afirma-se da natureza: “Não há fala nem linguagem, (ainda assim) sua linha se estende por toda a terra.” Existem graus mais ou menos perfeitos em que as palavras expressam pensamentos. Elas servem tanto para transmitir quanto para ocultar nosso significado. Assim, na Palavra de Deus há diferentes graus de clareza. Encontramo-la dada sob uma variedade de condições, e em formas apropriadas a cada condição. A Palavra em Cristo, e ensinada por Seu Espírito, representa a forma mais elevada de comunicação Divina.

II. Como a Palavra de Deus perscruta e prova os homens? — A Palavra, vimos, é Deus se colocando em tais relações com os homens que os homens podem perceber. A Palavra é Deus. É essencial a Deus que Ele deva ser um poder perscrutador onde quer que Ele venha. Isso é afirmado na Escritura e pela experiência dos crentes. “Todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar.” O que é verdadeiro de Deus mesmo é verdadeiro de todos os modos de Sua Palavra. 1. A Palavra Escrita. Ela perscruta pela força de seus mandamentos, exemplos, conselhos, advertências — encaixando-se maravilhosamente em todas as circunstâncias da vida. O homem pecador teme as Escrituras. 2. A Palavra Encarnada. Perscruta pelo contato de Sua pureza e perfeição. Nenhum homem pode deixar de admitir a perfeição moral de Cristo. Um homem a sente. Todo o poder é exercido que acompanha a colocação do padrão, do modelo, ao lado da cópia. Jesus é o único e exclusivo modelo de um homem que alcançou o céu por Sua própria bondade. 3. A Palavra Viva, ou Espírito Santo. Declara-se que este é o efeito de Sua operação interior — Ele “convence do pecado, da justiça e do juízo”; e esta é Sua operação constante na alma cristã. Esta qualidade perscrutadora deveria estar ligada à Palavra pregada: ela está sempre que é realmente a Palavra de Deus.

NOTAS SUGESTIVAS E ESBOÇOS DE SERMÕES

Hb 4:12-13. O Divino Leitor de Pensamentos. — “Todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar.” Muito se faz agora da habilidade de ler pensamentos que parece ser o dom especial de pessoas particulares. A afirmação é feita de que Deus é, em um sentido absoluto e inqualificável, o “discernidor dos pensamentos e intenções do coração”. Se pudermos explicar o poder de leitura de pensamentos do homem, a explicação nos ajudará a entender o perfeito poder de leitura de pensamentos de Deus. I. Se a leitura de pensamentos é um dom ou dotação incomum, uma forma particular de gênio humano, é uma dádiva Divina, ou melhor, uma confiança; e Deus não pode dar o que não possui: o que Deus possui O constitui o que Ele é. Ele tem este gênio da leitura de pensamentos em uma perfeição da qual o poder limitado do homem não pode dar uma ideia adequada. O poder do homem está em limitações corporais. II. Se a leitura de pensamentos depende da simpatia, deve ser um atributo Divino. Familiar para os homens muito antes de se ouvir falar de “leitura de pensamentos” era o poder de pessoas em íntima simpatia — como amigos, ou maridos e esposas — de se entenderem sem o uso de palavras. Amigos simpáticos constantemente sabem o que os amigos estão pensando. A Deus associamos as revelações de uma simpatia perfeita. III. Se a leitura de pensamentos é um resultado do conhecimento das leis mentais, Deus tem o conhecimento perfeito. O pensamento está inteiramente sob o controle de leis. E os pensamentos de cada homem são a estrita operação de leis, que sempre funcionam como funcionam em qualquer caso. Deus sabe o que pensamos, pois Ele conhece todo o funcionamento das leis do pensamento.

O Poder Testador do Logos. — Mostre como o discernimento dos pensamentos e intenções do coração é atribuído a Deus. Que tal discernimento é característico da Palavra Encarnada, ou Evangelho; da Palavra Escrita, ou Escrituras; e da Palavra Viva, ou Espírito. Deveria ser uma característica marcante da Palavra pregada, ou ministério.

ILUSTRAÇÕES PARA O CAPÍTULO 4

Hb 4:12. A Faca de Dois Gumes. — O sacerdote judeu necessitava de uma mão forte e hábil para fazer o trabalho ordinário de seu santo chamado. Eram necessários tanto força quanto perícia para deitar a vítima sobre o altar, para guiar a afiada faca sacrificial de dois gumes diretamente através da carcaça, até que a própria espinha dorsal fosse cortada, tudo fosse exposto, e as próprias juntas e medulas fossem reveladas e separadas. Por esta razão (bem como por ser ele um tipo d’Aquele que é perfeito), porque tais pessoas ordinariamente são deficientes em força corporal, nenhuma pessoa deformada poderia ser sumo sacerdote, pois não conseguiria fazer o trabalho exigido dele. Há uma faca mais afiada do que aquela espada de dois gumes, e uma mão para guiar sua lâmina e aplicar seus fios e ponta mais forte e mais segura do que a do sacerdote judeu. Essa faca é a palavra de Deus: é uma palavra “viva”; ela tem um poder para expor corações muito maior do que aquela faca sacrificial tinha para desnudar os corpos do sacrifício; seu fio é mais afiado do que o da espada de dois gumes; e quando cravada e dirigida pela mão do Espírito Todo-Poderoso, “penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas”, e desnuda “os pensamentos e intenções do coração.” — W. W. Champneys, M.A.

A Força da Consciência. — Um homem que era notável por sua ignorância e maldade estava visitando alguns de seus parentes no último dia em que nossa tenda de missão foi usada. Eles tentaram persuadi-lo a vir à nossa reunião de encerramento; mas, descobrindo que seus rogos de nada valiam, um deles perguntou se ele iria, contanto que alguém lhe desse uma quantia em dinheiro. Ele respondeu: “Sim, faria qualquer coisa por dinheiro.” “Iria por um xelim?” “Iria por uma refeição?” “Sim.” “Então eu lhe darei uma.” Um pão foi então partido em dois, e metade dele, com um pouco de manteiga e queijo, foi depositada em uma cabana perto da tenda, ficando entendido que o homem a receberia imediatamente após o término do culto. Feito isso, o homem veio à tenda. Meu sermão, sendo baseado em “O fim de todas as coisas está próximo”, etc., versou bastante sobre o juízo futuro, e abriu caminho para algumas observações do Sr. Pocock, no decorrer das quais ele descreveu o Juiz descendo, o julgamento estabelecido, e os livros abertos; e então, observando que cada palavra, e cada obra, e cada coisa secreta seria então exposta, ele exclamou: “Quem foi que em tal tempo abriu o poço de batatas de seu vizinho e privou uma pobre família de seu estoque de provisões de inverno? Ali está ele; tragam-no à frente — o quê! é aquele ali?”, etc. A consciência agora feriu este homem; ele havia sido culpado deste mesmo crime e, cheio de alarme, foi para casa sem suas provisões. Na manhã seguinte, ele foi à mulher cujo poço de batatas ele havia roubado e confessou seu crime, acrescentando: “O Sr. Pocock não teria me conhecido, mas meu lenço não estava amarrado como o de mais ninguém!” O que é especialmente notável neste caso é que o Sr. Pocock não sabia nada sobre o homem, nem jamais tinha ouvido falar de tal circunstância como um poço de batatas sendo aberto e roubado na vizinhança; mas ele simplesmente acertou na observação como envolvendo uma coisa geral, sem a menor ideia de qualquer caso individual. Certamente havia algo mais do que acaso em tudo isso. Quem pode dizer que esta mesma ocorrência não salvou este pobre sujeito da forca? — Memórias do Rev. John Pyer.

Hb 4:13. Examinando as Entranhas. — A palavra grega aqui é tirada das práticas que acompanhavam a oferenda de animais em sacrifícios. Diz-se que, em nações antigas, quando o animal que seria sacrificado era morto, o sacerdote examinava microscopicamente todas as entranhas e vísceras, e observava certas manchas ou sintomas, a partir dos quais ele argumentava sucesso ou infortúnio no empreendimento em que o ofertante estava embarcado; e, portanto, o apóstolo diz que todas as coisas são tão claramente notadas por Deus quanto as entranhas da vítima eram expostas e examinadas pelo sacerdote. — Dr. Cumming.

HOMILÉTICA PRINCIPAL DO PARÁGRAFO. — Hb 4:14-16

O Sumo Sacerdote Divino-Humano. — Esta passagem introduz a consideração do sacerdócio de Cristo, à qual se faz breve referência em Hb 3:1. Três coisas são argumentadas: 1. Sua extraordinária dignidade. 2. Seu caráter perfeito. 3. Sua gloriosa obra. O sumo sacerdote era o homem proeminente, o exemplo, da dispensação do Antigo Testamento. Há uma importante distinção entre um modelo e um exemplo, que precisa ser mantida em vista. F. W. Robertson explica habilmente essa distinção. “Você copia o contorno de um modelo; você imita o espírito de um exemplo. Cristo é nosso Exemplo, não nosso Modelo. Você poderia copiar a vida de Cristo, torná-lo um modelo em cada ato, e ainda assim você poderia não ser um pingo mais cristão do que antes. Você poderia lavar os pés de pobres pescadores como Ele fez, e viver uma vida errante, sem ter onde reclinar a cabeça. Você poderia andar ensinando, e nunca usar outras palavras senão as Suas palavras, nunca expressar a verdade religiosa exceto na linguagem da Bíblia; não ter lar, e se misturar com publicanos e pecadores. Então Cristo seria seu Modelo; você teria copiado Sua vida como um quadro, linha por linha, e sombra por sombra, e ainda assim você pode não ser semelhante a Cristo. Por outro lado, você poderia imitar a Cristo, obter Seu Espírito, respirar a atmosfera de pensamento que Ele respirou, não fazer um único ato que Ele fez, mas cada ato em Seu Espírito; você poderia ser rico, enquanto Ele era pobre; nunca ensinar, enquanto Ele estava sempre ensinando; levar uma vida em todos os particulares externos o exato contraste e oposto da d’Ele; e ainda assim o espírito de Sua auto-devoção poderia ter saturado todo o seu ser, e penetrado na vida de cada ato, e na essência de cada pensamento. Então Cristo teria se tornado seu Exemplo; pois só podemos imitar aquilo de que captamos o espírito.” Mas se fazemos de Cristo nosso Exemplo, duas coisas precisam ser cuidadosamente explicadas. 1. Ele deve estar em nosso plano, ou não podemos esperar segui-lo ou ser como Ele. 2. Ele deve estar fora de nosso plano, Ele deve pertencer a um plano superior, ou não podemos ficar satisfeitos com Ele. Fixando o pensamento n’Ele figurado como nosso Sumo Sacerdote, observe —

I. Cristo era um com os homens. — Nos registros que nos foram deixados de Sua vida, há um esforço mais evidente para nos convencer de Sua humanidade verídica do que de Sua Divindade. É como se os homens certamente fossem se deparar com a ideia de Ele ser extraordinário, e precisasse ser provado que Ele era realmente homem. Em sua primeira epístola, São João não argumenta ou afirma que Cristo era Deus. Isso parece ter sido crido. São João exige a crença em Cristo como tendo “vindo em carne”. Ilustre: 1. A significância de nosso Senhor ter vivido por tanto tempo, trinta anos de vida humana comum e ordinária, plenamente reconhecido durante esse tempo como um homem entre os homens. 2. A apreensão distinta de Sua masculinidade ordinária por Seus irmãos e pelo povo de Nazaré. 3. A perfeita humanidade dos hábitos e sentimentos exibidos na vida de Cristo. Sensibilidade ao sofrimento, corporal e mental. Ele era humanamente afetado em relação ao caráter e à conduta dos outros. Ele estava cansado, com fome, com sono. 4. O simples caráter humano da morte de nosso Senhor. Poder-se-ia esperar que tal Ser morresse de alguma forma sublime. Mas, fisicamente, a morte de nosso Senhor foi apenas a morte comum e usual de um homem; e, moralmente, foi notável como a morte inocente de um homem bom. Com a ideia da humanidade de Cristo diante de nós, não podemos deixar de sentir que Seu caráter é a expressão, a vivência, de nosso ideal de humanidade; é o caráter perfeito realizado para um homem.

II. Cristo era distinto dos pecadores. — É importante estimar claramente a distinção entre um homem e um pecador. A condição de nosso mundo seria sem esperança se os dois termos fossem conversíveis. Tudo o que pertence ao homem estava em Cristo, mas nada que pertence ao pecador. Mas Cristo não era distinto dos pecadores porque Sua natureza era imperfeita, incompleta, em qualquer lado. Era um todo. Alguns podem ser separados dos pecadores apenas em alguns pontos, porque não têm capacidades para certos pecados particulares. Não há virtude em sua impecabilidade, assim como não há honestidade em um ladrão cujas mãos foram cortadas. Este senso da distinção de nosso Senhor foi produzido em todos os que entraram em contato com Ele. Ilustre: Os discípulos — como no chamado de Mateus. O povo — “fala com autoridade, e não como os escribas.” Inimigos e indiferentes — veja os cambistas nos pátios do Templo. “Nunca homem algum falou como este homem.” Seu juiz e os soldados romanos — veja o temor de Pilatos, e a exclamação do centurião. A mesma verdade nos é transmitida pelo registro. À medida que estudamos o homem, sentimos que Ele é mais do que homem, diferente do homem. Há dois aspectos em que Sua distinção dos pecadores é impressionantemente mostrada. 1. Seus atos nunca são duvidosos. Nunca houve uma vida meramente humana sem alguns incidentes de verdade e virtude questionáveis. Na vida de Cristo não há registro de nenhum, mas uma impressão distinta nos é deixada de que não havia nenhum para registrar. Esta é uma moeda que você não precisa testar duas vezes. 2. Seus atos nunca foram egoístas. Isso é amplamente característico dos atos humanos; é constantemente a “mosca” nos melhores potes de unguento. Os atos de Cristo foram todos realizados sob um profundo senso de dever, e sob um sublime impulso de amor. Os atos eram corretos na forma, e a vida e o sentimento que os inspiraram também eram corretos.

III. O Sumo Sacerdote Divino-Humano exerce o poder mais enobrecedor e santificador sobre nós. — Precisamente o que o homem precisava era da salvação por Deus através do homem, através da humanidade; o que ele precisava era de uma redenção moral. O Salvador do mundo deve ser um homem Divino. Somente tal Salvador — 1. Poderia demonstrar a distinção entre homem e pecado. 2. Poderia trazer à luz as possibilidades mais elevadas que existem na natureza humana como Deus a projetou. 3. Poderia exibir a influência enobrecedora dos dois grandes princípios de nossa natureza — a dependência e o senso de dever. Sempre perto de Deus, sempre fazendo a vontade de Deus, estes são os essenciais da verdadeira masculinidade. 4. Poderia mostrar o encanto que o caráter, a excelência moral, pode colocar em todas as relações da vida. 5. E poderia revelar um futuro sublime para a raça: como Sumo Sacerdote, trabalhando até que todos os que Ele representa se tornem como Ele de fato. Então, nós devemos ser o povo pertencente a este grande Sumo Sacerdote, o Filho de Deus. O que tornou os homens discípulos de Cristo enquanto Ele estava na terra? Isso torna os homens discípulos agora.

NOTAS SUGESTIVAS E ESBOÇOS DE SERMÕES

Hb 4:14-16. Segurança através do Grande Sumo Sacerdote. — A epístola aos Hebreus é um argumento contra a apostasia. Em toda parte, ao longo desta epístola, as luzes de sinalização de perigo são acionadas ao longo do caminho cristão. O medo que às vezes assustava o coração firme e heroico de Paulo — de que, tendo pregado a outros, ele mesmo pudesse ser um náufrago — é declarado ser, nesta epístola, para cada cristão um medo razoável e substancial (Hb 6:4-6). Contra a tendência muito comum de colocar a ênfase principal da vida cristã em seu início, de contar com o céu porque alguém imagina que uma vez esteve em um estado de espírito cristão, embora certamente não esteja agora, esta epístola é uma prolongada advertência Divina. “Retenhamos firmes a nossa confissão”, ou, como diz o original, “sejamos fortes em nos apegarmos a ela” — essa é a exortação solene e vigorosa desta epístola. E para tornar sua advertência real e segura, a epístola recorre à Escritura antiga e apresenta um exemplo claro de um bom começo e um mau fim (Hb 4:11). Os hebreus começaram bem. Mas as experiências do deserto foram demais para eles. Eles nunca desfrutaram do descanso de Canaã. Eles foram indignos e apóstatas. Suas carcaças apodreceram no deserto. Agora, estes hebreus posteriores, a quem esta epístola foi dirigida, haviam começado bem. Eles haviam reconhecido Jesus como seu Moisés espiritual — o Messias da promessa e da profecia. Sob Sua liderança, eles haviam começado sua marcha para fora do Egito espiritual, através deste deserto mundano, para a Canaã espiritual — para o céu, o lar e o descanso daqueles que creem e seguem a Cristo. Mas o deserto mundano estava cheio de dificuldades, e estes cristãos hebreus mostravam sinais de vacilação. A nação hebraica estava contra eles; o resplandecente e ainda de pé Templo estava contra eles; o sucesso mundano e a chance de sustento estavam contra eles; o desprezo e a injúria amargos estavam contra eles. No entanto, esta epístola lhes assegura que não há segurança na apostasia; há segurança apenas na firmeza. A apostasia é a destruição. Ainda assim, eles devem reter firmes sua profissão (Hb 4:1; também Hb 4:11). — Homiletic Review.

Retendo Firme nossa Profissão. — Agora a questão vem: “Podemos reter firme nossa profissão?” Sim, e nosso grande Sumo Sacerdote é a razão e o poder. Não somos deixados em uma peregrinação solitária. Não somos deixados a um conflito de mãos únicas. 1. Visto que Ele é Sumo Sacerdote, Ele fez expiação por nós. 2. Visto que Ele é Sumo Sacerdote, Ele agora faz intercessão por nós. 3. Sua expiação é aceita, e Sua intercessão é digna, pois Sua ressurreição selou triunfalmente sobre elas. “Ele passou para os céus.” 4. Ele mesmo foi provado, “tentado em todos os pontos como nós somos.” Assim, Ele está vibrando de simpatia. 5. Ele conhece a tentação, mas a venceu; Ele é sem pecado. Nisto reside uma ajuda peculiar — a ajuda de uma força vitoriosa.

Hb 4:15. A Simpatia de Cristo com os Enfermos. — Quantos estão sobrecarregados com um senso de deficiência, com sua dessemelhança com os outros — sua incapacidade de fazer o que os outros podem, ou talvez o que eles podiam antes; quantos veem outros virem à casa de Deus e se angustiam porque, por fraqueza, não podem; quantos se sentem um fardo para os outros, que prefeririam que outros os sobrecarregassem; quantos lamentam que suas vidas são inúteis e inativas! Eles querem alguém que tome seu partido, os conforte com sua ternura, os sustente com seu braço. No texto está esse alguém.

I. Considere o fato da simpatia do Senhor Jesus. Ela é assegurada por — 1. Sua experiência humana pessoal. 2. Seu perfeito conhecimento e amor. 3. Sua união vital com Seu povo.

II. Considere esta simpatia em sua conexão com Sua obra sumo-sacerdotal. 1. Como Sumo Sacerdote, Ele tem intercurso direto conosco. 2. Ele ora pelo suprimento de nossa necessidade. 3. Ele nos leva ao Pai.

III. Considere que esta simpatia com a enfermidade é o padrão para Seu povo. 1. Ela repreende nossa dureza. 2. Ela mostra uma das grandes necessidades do mundo. 3. Ela sugere uma recompensa para o sofrimento. Ele sofreu para que pudesse simpatizar com os sofredores; é por isso que nós sofremos. — Charles New.

Tentado, não vencido pela Tentação. — “Em todos os pontos tentado” não deve ser tomado como significando em todos os pontos compartilhando nossa experiência ao lidar com a tentação. Cristo não compartilhou a experiência de ninguém de ceder à tentação. Ele nunca foi vencido pela tentação. Mas isso não era essencial à experiência humana. Essa era a experiência do homem caído. E Cristo era homem, não homem caído. Encontre o que é essencial ao homem. Cristo experimentou isso.

Hb 4:15-16. A Simpatia de Cristo. — De acordo com estes versículos, o Sacerdócio de Jesus Cristo baseia-se na perfeição de Sua humanidade; e isso implica que Ele era possuído de uma alma humana, bem como de um corpo humano. 1. Consequentemente, na vida de Cristo encontramos duas classes distintas de sentimento. Quando Ele teve fome no deserto, etc., Ele experimentou sensações que pertencem ao departamento corporal da natureza humana. Mas Sua dor, amizade, medo, etc., eram as aflições de uma alma humana agudamente sensível, viva a toda a ternura, esperanças e angústia com que a vida humana está preenchida, qualificando-O para ser “tentado em todos os pontos como nós somos.” 2. O Redentor não apenas foi, mas é homem. Imagina-se que na história da existência de Jesus, uma vez, por um período limitado e para propósitos definidos, Ele tomou parte na frágil humanidade; mas que, quando esses propósitos foram cumpridos, o homem pereceu para sempre, e o espírito reascendeu, para se unir novamente à Deidade pura e sem mistura. Mas a vida de ressurreição de nosso Senhor deveria ser o corretivo para essa noção. E isso sugere a verdade do coração humano de Deus. O homem se assemelha a Deus. Amor não significa uma coisa para o homem e outra para Deus. A masculinidade presente de Cristo transmite esta verdade profundamente importante, que o coração Divino é humano em suas simpatias. 3. Há uma conexão entre o que Jesus foi e o que Jesus é. Ele pode ser tocado agora porque foi tentado então. Sua experiência passada deixou certos efeitos duradouros em Sua natureza como ela é agora. Ela O dotou de certas qualificações e certas suscetibilidades que Ele não teria tido sem essa experiência.

I. As preparações do Redentor para Seu Sacerdócio. — A preparação consistiu em ser tentado. Mas a tentação, aplicada a um Ser perfeitamente livre de tendências para o mal, não é fácil de entender. Tentação tem dois sentidos: significa teste ou provação; significa também prova, envolvendo a ideia de dor ou perigo. A prova colocada diante de um Ser sem pecado é inteligível o suficiente no sentido de provação; é um teste de excelência. E a Escritura afirma claramente isso como o caráter da tentação de Cristo. Não apenas teste, mas prova. Não havia apenas teste na tentação, mas havia também dor na vitória. Como isso poderia ser sem qualquer tendência para o mal? Analise o pecado. Em cada ato de pecado há dois passos distintos: há o surgimento de um desejo que é natural e, sendo natural, não é errado; e há a indulgência desse desejo em circunstâncias proibidas, e isso é pecado. O pecado não consiste em ter desejos ou paixões fortes: nas naturezas mais fortes e mais elevadas, tudo, incluindo os desejos, é forte. O pecado não é uma coisa real. É antes a ausência de algo, a vontade de fazer o certo. O pecado não está nos apetites, mas na ausência de uma vontade controladora. Havia em Cristo todos os apetites naturais da mente e do corpo. Conceba então um caso em que a gratificação de qualquer uma dessas inclinações era inconsistente com a vontade de Seu Pai. Em um momento, era ilícito comer, embora com fome: e sem uma única tendência a desobedecer, o jejum deixou de ser severo? Cristo sofreu com a força do desejo. Embora não houvesse hesitação se devia obedecer ou não, nenhuma luta na vontade, no ato de domínio havia dor. Havia abnegação; havia obediência à custa de sentimento torturado. Não pela relutância de uma sensação pecaminosa, mas pelo tremor e pela angústia do sentimento natural quando é pisoteado por uma vontade elevada, Jesus sofreu, sendo tentado. Sua alma foi tentada.

II. O Sacerdócio do Redentor. — Por Sacerdócio entende-se aquele ofício pelo qual Ele é o meio de união entre o homem e Deus. A capacidade para isso foi indelévelmente gravada em Sua natureza por Sua experiência aqui. Toda essa capacidade se baseia em Sua simpatia. Mal nos damos conta de quanto a soma da felicidade humana no mundo é devedora a este único sentimento — a simpatia. Desta simpatia, Cristo, em sua plenitude, era suscetível. A simpatia de Cristo não era meramente amor aos homens em massa; Ele tinha também simpatia discriminadora e especial com indivíduos. Os poderes sacerdotais transmitidos por esta faculdade de simpatizar são dois: 1. O poder da misericórdia. 2. O poder de ter graça para ajudar. Há dois que são inadequados para mostrar misericórdia: aquele que nunca foi provado; e aquele que, tendo sido tentado, caiu sob a tentação. A qualificação no texto, “sem pecado”, é muito notável; pois é a que menos pensaríamos. Sem pensar, diríamos que ter errado tornaria um homem leniente; mas não é assim. Apenas aquele é apto para mostrar misericórdia varonil que, como seu Mestre, sentiu o poder da tentação em sua força e saiu ileso da prova. Não devemos dar muita importância à simpatia como mero sentimento. O sentimento com Cristo levou a isto: “Ele andou fazendo o bem.” A simpatia com Ele era isto: “Graça para ajudar em tempo de necessidade.” A simpatia do Divino-humano! Ele sabe que força é necessária. Em conclusão, tire duas inferências: 1. Aquele que simpatizaria deve contentar-se em ser provado e tentado; deve contentar-se em pagar o preço da educação custosa. Mas é ser tentado em todos os pontos, mas sem pecado, que torna a simpatia real, varonil, perfeita, em vez de uma mera ternura sentimental. 2. É esta mesma simpatia humana que qualifica Cristo para o julgamento. O Pai confiou todo o julgamento a Ele, porque Ele é o Filho do homem. A simpatia de Cristo se estende às fragilidades da natureza humana, não à sua culpa endurecida; Ele é “tocado com o sentimento de nossas enfermidades”. — F. W. Robertson.

Hb 4:16. Ousadia no Trono da Graça. — O trono da graça é a realidade figurada no propiciatório, ou a tampa da Arca, que estava no Santo dos Santos. Assim como o sumo sacerdote na antiga dispensação entrava uma vez por ano com o incenso e o sangue, e trazia bênçãos para o povo daquele trono de graça, assim Jesus, como o grande Sumo Sacerdote da raça, entrou no Santo dos Santos espiritual, e obteve bênçãos para nós do “trono da graça”. Apenas com esta distinção: o antigo sacerdote saía; Cristo, nosso Sacerdote, permanece lá dentro — o véu nunca se fecha atrás d’Ele, e nós podemos entrar; o caminho está aberto para irmos e pedirmos bênçãos, e podemos ir ousadamente porque Ele está lá, para ser o fundamento de nossa aceitação e para interceder por nós.

ILUSTRAÇÕES PARA O CAPÍTULO 4

Hb 4:15. A Ajuda das Experiências Humanas de Nosso Senhor. — Dizem-nos que em algumas terras sem trilhas, quando um amigo passa pelas florestas sem caminhos, ele quebra um galho de vez em quando enquanto avança, para que aqueles que vêm depois possam ver os vestígios de sua passagem por ali, e possam saber que não estão fora do caminho. Oh, quando estamos viajando pela noite escura, e pelos bosques sombrios da aflição e da tristeza, é algo encontrar aqui и ali um ramo quebrado, ou um caule frondoso curvado com a pegada de Seu pé e o roçar de Sua mão quando Ele passou, e lembrar que o caminho que Ele trilhou Ele santificou, e que há fragrâncias persistentes e forças ocultas na lembrança, “em todos os pontos tentado como nós somos”, suportando a dor por nós, suportando a dor conosco, suportando a dor como nós. — A. Maclaren, D.D.

Fonte: EXELL, Joseph S.; BARLOW, George; TUCK, Robert. The Preacher’s Complete Homiletical Commentary. Traduzido por Eduardo Galvão, [S.l.]: [s.n.], 1892.

Índice: Hebreus 1 Hebreus 2 Hebreus 3 Hebreus 4 Hebreus 5 Hebreus 6 Hebreus 7 Hebreus 8 Hebreus 9 Hebreus 10 Hebreus 11 Hebreus 12 Hebreus 13

Bibliografia

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